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se impozeram aos servidores do estado, e mais ainda aos credores. Se fossemos a acreditar tudo quanto se tem dicto e escripto, o resultado de tudo seria não haver deficit, e haver um saldo positivo; mas o facto e que não ha tal saldo positivo.
Na verdade é muito digno de notar-se, que tendo o governo portuguez subscripto com um terço das acções para o caminho de ferro, e alguns inglezes com dous terços, quer dizer, estando o capital todo subscripto, e para notar que não se começasse ainda a feitura do caminho de ferro, e que a commissão respectiva não apresentasse ainda o seu parecer a respeito do contracto do caminho de ferro!...
O sr. Presidente: — Peço ao illustre deputado que se restrinja ao ponto da discussão.
O Orador: — Agradeço a v. ex.ª a observação que acaba de dirigir-me, e peço perdão se saí fóra da ordem. Por agora nada mais tenho que dizer.
O sr. Cazal Ribeiro: — Desejo contrair-me sempre ao objecto da discussão, principalmente tractando-se do orçamento; porque mesmo a discussão especial do orçamento offerece campo vasto para cada um dos deputados fazer as suas considerações; mas não me parece que seja mais conveniente agrupal-as todas menos a proposito, em uma ou outra parte do orçamento; todas essas questões se podem alli tractar, mas cada uma tem o seu logar proprio. Por exemplo, nada póde haver mais deslocado do que tractar a questão do caminho de ferro na occasião em que se tracta dos juros da divida externa. Pela minha parte não desejo restringir a discussão, nem creio que o nobre deputado possa attribuir esses desejos á commissão de fazenda, porque um de seus membros fez uma moção procurando encaminhar a discussão no sentido que intendeu conveniente. A commissão de fazenda nada tem com isto, a commissão de fazenda acceila a discussão ampla, deseja-a amplissima.
O illustre deputado que encetou o debate, contrahiu-se propriamente ao assumpto em discussão, e encaminhou muito habilmente as suas observações para fallar nos arranjos com os credores da divida externa. Disse s. ex.ª que approvava a alteração proposta pela commissão, não só pelas razões que ella apresenta, mas em vista dos arranjos que podiam vir a fazer-se com os bond-holde rs. Ora eu devo dizer, que este augmento não foi proposto pelo governo, foi a commissão que se lembrou de propôl-o e o governo adoptou-o, mas nos motivos que levaram a commissão a proceder assim, não houve idéa alguma de facilitar nem difficultar o arranjo com os bond-holde rs. Isto não quer dizer que cada um dos membros da commissão de per si, que eu, por exemplo, não desejo que se chegue a um arranjo rasoavel com os bond holders, mas quer dizer que não foi esse o pensamento que dictou a alteração. Não vejam os nobres deputados aqui um principio de arranjo com os bond holders, não vejam porque era isso uma illusão, não estava nas vistas da commissão nem do governo.
Ora ainda que eu como disse, deseje sempre contrahir-me ao assumpto em discussão, V. ex.ª ha de concordar que, como membro da commissão de fazenda vejo-me em uma posição realmente embaraçosa e difficil. A commissão de fazenda é arrastada a cada passo para o debate, trazem-se a proposito de cada verba questões que não teem relação com ella, a commissão calando-se, por um respeito religioso ao regimento como em verdade deve fazer, mas devem-o fazer todos, póde parecer aqui e póde parecer lá fóra, que é porque ella não tem razões com que sustentar a sua obra: por tanto não me parece que possa ser o nosso direito mais restricto que o dos outros srs. deputados, e então permitta-me v. ex. que ainda que pouco tenha a accrescentar ás observações do sr. ministro da fazenda, eu responda alguma cousa ao sr. Carlos Bento sobre o deficit.
S. ex.ª não hoje, mas n'um dos dias passados, e hoje quasi que repetiu as suas observações, procurou mostrar que entre a apreciação do deficit feita pelo governo e a apreciação feita pela commissão, havia certa dissidencia. Peço licença as. ex.ªs para lhe observar, que nenhuma das palavras do relatorio que está impresso e sujeito a discussão da camara, póde auctorisar similhante interpretação. A commissão não deu ao deficit o nome amavel de divida fluctuante, amavel seria s. ex.ª se quizesse reconhecer que não leve razão nenhuma para interpretar deste modo as palavras da commissão. Divida fluctuante, antecipações e deficit, são idéas inteiramente diversas e distinctas como s. ex.ª sabe perfeitamente. A commissão não tractou de apreciar o deficit neste relatorio, e só o póde fazer quando apresentar a lei de meios e comparar a receita com a despeza; e ainda assim sabe perfeitamente o nobre deputado, que o deficit não póde ser apreciado com a exactidão precisa, porque vemos que se votam creditos supplementares; por isso quando se diz que o deficit é de 24, 30 ou 100 contos, não se póde dizer que a esta cifra corresponde uma exactidão mathematica, e se por um lado os creditos supplementares vem augmentar o deficit calculado, por outro lado o deficit póde ser attenuado porque muitas despezas vem calculadas que não tem de effectuar-se; o nobre deputado sabe que se votam os quadros completos, mas tambem sabe que em virtude da lei das accumulações e de outras muitas despezas que se votam, não se verificam. Mas isto nada tem com o deficit, nada absolutamente; é a divida fluctuante que passa de um para outro anno economico e á qual corresponde a receita equivalente.
Em quanto ao mais sei bem que não está em discussão o decreto de 3 de dezembro, nem o decreto de 18 de dezembro. Eu não venho repetir nesta occasião á camara as opiniões que por mais de uma vez tenho pronunciado. V. ex.ª sabe e sabe a camara a minha opinião a respeito do decreto de 3 de dezembro, que já foi approvado, na parte relativa á capitalisação; V. ex.ª sabe que fallei contra elle na sessão passada e na sessão actual, e tambem contra o decreto de 18 de dezembro; aqui porém, no orçamento tracta-se de acceitar os factos como elles existem.
Não sei a parte que o nobre deputado teve na confecção do decreto de 3 de dezembro, não sei em que qualidade foi chamado ao conselhos do governo, mas sei o que se passa aqui publicamente (Apoiados) e por isso não posso deixar de admirar-me das suas considerações adversas ao decreto de 3 de dezembro, porque sei que o nobre deputado o sustentou calorosamente, e sei que o nobre deputado dirigiu fortes increpações a este lado da camara por impugnar esse decreto. (Apoiados) (Interrupção da parte do sr. Carlos Bento, que não se ouviu) Quer dizer que o nobre deputado mudou de opinião a esse respeito. (O sr. Carlos Bento: — Não senhor; ao contrario, os outros é que mudaram) Eu não mudei, e ainda este