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N.º 21. SESSÃO DE 28 DE JUNHO. 1853

PRESIDENCIA DO SR. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presentes 79 srs. deputados.

Abertura: — Ao meio dia e um quarto.

Acta: — Sobre ella disse

O sr. Santos Monteiro: — Hontem estavam em discussão dois requerimentos, um do sr. Cezar, e outro do sr. Antonio da Cunha Sotto-Maior, que foram retirados pelos seus auctores, e a acta diz unicamente — que elles foram retirados — mas não consta da acta a razão porque o foram. Parece-me porém que o objecto é de tal natureza, que convém que conste da acta a razão porque foram retirados. Eu tinha pedido a palavra, como v. ex.ª sabe, sobre este objecto, porque o meu amigo o sr. Placido declarou aqui, em referencia a uma das materias de que tractavam os requerimentos, que uma questão que dura ha 2 annos, ia ser resolvida conforme a justiça, e a conveniencia publica o exigia, e até o requerimento dos proprios interessados; e lendo eu elaborado um projecto ha mais de 2 mezes, sobre esta materia, deixei de o apresentar na esperança de verificar-se a promessa que me fizeram n'essa occasião, e que se realisa agora. Por isso deve constar da acta esta declaração feita pelo sr. Placido, na qualidade de relator da commissão de guerra, porque foi em virtude della que o sr. Cezar de Vasconcellos, e em segundo logar o sr. Cunha Sotto-Maior, reinaram os seus requerimentos.

O sr. Vice-Secretario (Costa e Silva): — Na acta só se costumam lançar as resoluções da camara; mas se o sr. deputado quer que se faça essa declaração, tenha a bondade de a mandar para a mesa.

O sr. Santos Monteiro: — Sim sr. eu vou mandar para a mesa uma proposta para que se consigne na acta que os requerimentos dos srs. Cezar e Cunha foram retirados por seus auctores, em consequencia das declarações feitas pelo sr. Placido de Abreu, na qualidade de relator da commissão de guerra.

Foi approvada a acta com esta declaração.

CORRESPONDENCIA.

Uma declaração do sr. Pinto de Almeida, participando que o sr. Gomes Corrêa não póde comparecer á sessão de hoje, e a mais algumas por incommodo de saude. — Inteirada.

Officios: — 1.º Do sr. Pinto Basto (José), participando que não póde comparecer a sessão de hoje. — Inteirada.

1855.

2.º — Da camara dos dignos pares, participando que foram ali adoptadas as Ires proposições de lei, que lhe foram enviadas por esta camara: 1.ª fixando a força de mar para o seguinte anno economico; 2.ª auctorisando o governo para a cobrança e applicação dos rendimentos do estado no seguinte anno economico, e a 3.ª sobre o tractado de commercio e navegação entre Portugal e a França; as quaes, reduzidas a decretos das cortes, vão ser submettidas á sancção Real. — Inteirada.

Representações: — 1.ª Da camara municipal de Campo Maior, pedindo que se crie naquella villa uma cadeira de mestra de meninas, e que se eleve o ordenado do professor de latim a 240$000 réis; e o do professor de instrucção primaria a 100$000 réis. — Á commissão de instrucção publica.

2.ª — Da mesma camara municipal, pedindo ser alliviada do pagamento da contribuição para a universidade, e da terça do concelho. — Á commissão de fazenda, ouvida a de administração publica.

SEGUNDAS LEITURAS.

Requerimento: — Requeiro que se peça ao governo, pelo ministerio da fazenda, cópia de uma portaria do thesouro publico, datada de 24 de novembro de 1843, e bem assim cópia de quaesquer officios, ou representações das auctoridades das ilhas adjacentes, em que se tracta da applicação do decreto de 22 de agosto de 1843 ás classes inactivas das dictas ilhas. — Miguel do Canto.

Foi remettido ao governo.

O sr. Pinto de Almeida: — Sr. presidente, pedi a palavra para ainda mais uma vez, instar com os membros da commissão das obras publicas desta camara, para vêr se apresentam o seu parecer sobre o projecto apresentado pelo sr. deputado Justino de Freitas, e assignado por quasi todos os deputados pelo districto de Coimbra, devendo notar que este projecto foi apresentado e lido nesta camara ha 4 mezes!! E apezar dos continuos esforços que tenho feito tanto nesta camara, pedindo a palavra para que a commissão de obras publicas dê o seu parecer, como instando em particular com alguns dos seus dignos membros, nada tenho conseguido. Ha perto de mez e meio disse o sr. deputado Placido de Abreu, respondendo a uma das minhas instancias, que dentro em pouco tempo viria a esta camara o parecer, o que comtudo ainda não veiu; e nessa occasião disse-se, que a causa era a commissão estar occupada com o parecer sobre o

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contracto do caminho de ferro, mas até hoje não tem apparecido nem este parecer, nem o parecer sobre o projecto do sr. Justino de Freitas, para o melhoramento dos campos do Mondego, cujo estado é lastimoso: ali não se vê senão a fome e a peste, tudo filho do estado pantanoso, em que se acha aquelle campo.

Faria mais algumas observações, se estivesse pie sente algum dos dignos membros da commissão das obras publicas, mas como não o estão, ficarei por aqui.

O sr. Julio Guerra: — Peço ser inscripto para apresentar um projecto de lei.

O sr. Leão Cabreira: — Igualmente peço a v. ex.ª me inscreva para apresentar um projecto de lei.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Sr. presidente, ha já alguns mezes apresentei uma representação da camara municipal de Leiria, pedindo a concessão do convento de S. Francisco; parece-me porém que a illustre commissão de fazenda remetteu para o governo todas as representações de camaras municipaes, que versavam sobre concessão de bens nacionaes, por que se intendeu que pelo artigo de uma das leis da dictadura, o governo podia conceder edificios publicos. Eu intendo que ao governo não pertence conceder esses edificios; por isso pedia á illustre commissão de fazenda, que houvesse de pedir ao governo esses mesmos papeis que lhe remetteu, para a camara deliberar.

Por esta occasião mando para a mesa uma representação da misericordia da villa de Constança, queixando-se de que, sendo a maior parte dos seus rendimentos em papel-moeda, pelo diminuto preço que tem no mercado, acha-se quasi sem rendimento, e pede providencias que melhorem a situação desta moeda.

Igualmente pede que os legados pios não cumpridos, que pertencem áquella villa, sejam applicados para as despezas da misericordia, o que me parece de toda a razão. Como este negocio está affecto a uma commissão especial, remetto a representação para a mesa, e v. ex.ª lhe dará o devido destino.

O sr. Nazareth: — Sr. presidente, quando hontem se suscitou nesta camara um debate por occasião das censuras feitas á commissão de legislação por um sr. deputado, pedi a palavra, porque intendi não dever ficar silencioso em tal assumpto: porém o debate encerrou-se, e não tive occasião de uzar da palavra, Hoje, porém, não posso prescindir de dizer algumas palavras. Não serei eu que venha renovar questões, que intendo prejudiciaes á causa publica, e ao credito do systema parlamentar, que todos devemos empenhar-nos em manter. E necessario que todos e cada um se haja com toda a consideração e deferencia para com os seus collegas, porque de outra fórma rebaixa-se a dignidade da camara, e transtorna-se a gravidade que deve reinar nos debates parlamentares. Pela minha parte tenho-me imposto este dever, e dado o exemplo da sua observancia.

Eu poderia desaffrontar vantajosamente a commissão de legislação das immerecidas censuras, que lhe foram irrogadas; mas não só porque não vejo presente o sr. deputado, que tão severo foi com ella (O sr. Cezar de Vasconcellos: — Estou presente) mas porque prometti não renovar questões desagradaveis, farei a bem da ordem o sacrificio de resignar á mais justa das defezas. Os documentos do zelo, e assiduidade dos trabalhos da commissão de legislação tem sido presentes á camara, e quando se fizer a estatistica dos trabalhos das commissões, por certo que não será esta a que ficará mais empenhada.

Declaro, pois, que hoje já não pertenço á commissão de legislação, e assim o declarei aos seus membros, meus collegas, e depois do que se tem passado, intendi da minha dignidade fazer esta declaração á camara.

Aproveito esta occasião para declarar que uno os meus votos aos do sr. Pinto de Almeida, e peço á illustre commissão das obras publicas haja de dar quanto antes o seu parecer ácerca dos projectos sobre os campos do Mondego, e declaro franca e lealmente, que não faço este pedido, como represalia ao digno presidente desta commissão. Este assumpto é da maior importancia, e é necessario acudir com providencias promptas ao estado daquelles povos, que todos os annos se arruinam e esterilisam, além da pessima influencia na saude publica, proveniente deste estado, e da falla das obras competentes. Por tanto, lendo a illustre commissão affectos ha mezes dois projectos sobre este assumpto, seria para desejar que breve dê o seu parecer.

O sr. Cezar de Vasconcellos: — Sr. presidente, respondendo ao pedido do sr. Pinto de Almeida tenho a observar, que a commissão de obras publicas tem-se occupado attentamente dos trabalhos, que lhe tem sido commettidos, reunindo-se para esse fim quasi todos os dias ás 10 horas da manhã, e ás vezes antes; e tem resolvido quasi todos os negocios, que foram submettidos ao seu exame, e que são muitos, o muito importantes.

A commissão de obras publicas hade apresentar dentro de muito poucos dias o seu relatorio, que já se está hoje copiando, e que é immenso: elle abrange todo o systema que a commissão adoptou neste importante ramo de publica administração. Nesse immenso relatorio, que comprehende 30 e tantas folhas, e que se está pondo em boa letra para se poder imprimir, a camara verá que vem resolvidas todas quantas questões foram presentes á commissão de obras publicas; comtudo a commissão reserva-se para apresentar pareceres em particular sobre diversos objectos que são de sua natureza especialissimos. Ainda neste momento acaba de resolver seis negocios importantes, cujos pareceres e projectos logo que estejam copiados pelo illustre secretario da commissão o sr. Palma, serão presentes a camara, o que terá logar na proxima sessão.

Na primeira reunião da commissão ella ha-de tractar do projecto relativo ás obras do Mondego: é um negocio tambem urgente e muito grave; e eu espero que ainda antes de se encerrar a actual sessão, a commissão ha-de apresentar o seu parecer, e que não será com justiça que se farão censuras á commissão de obras publicas.

O sr. Presidente: — Agora vou consultar a camara sobre se concede a escusa que o sr. Nazareth pediu de pertencer á commissão de legislação. Não foi concedida.

O sr. Arrobas: — Sr. presidente, ha muito tempo que foi dirigido a esta camara um requerimento dos operarios do arsenal da marinha, em que se queixam de se lhes descontar uma decima nos seus salarios. A commissão de fazenda foi remettido este requerimento, e a commissão de fazenda desejou ouvir a commissão de marinha, a qual deu o seu parecer.

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Agora desejo ser informado se a commissão de fazenda tenciona apresentar o seu parecer antes de se discutir o orçamento do ministerio da marinha, por que eu intendo que é conveniente e necessario resolver este negocio antes da discussão desse orçamento.

O sr. Santos Monteiro: — Não sei em que qualidade o sr. Arrobas pede esta resolução. (O sr. Arrobas: — Na de deputado) A commissão de fazenda pediu um conselho á commissão de marinha, e foi por isso que o illustre deputado teve occasião de vêr esse pedido; e creio que a commissão de fazenda ha de seguir o conselho da commissão de marinha. Na occasião de se discutir o orçamento do ministerio da marinha, ha de vir esse negocio, por ser essa a occasião propria.

O sr. Arrobas: — Sr. presidente, as verbas do orçamento são o resultado das leis. Aos operarios do arsenal da marinha foram feitos descontos contra lei; esses descontos veem computados no orçamento, e é preciso que se decida antes que chegue o orçamento da marinha, o que podêmos resolver pró ou contra, ácerca deste negocio; ao contrario e misturar duas cousas diversas. Decida-se pois, se e ou não de lei o fazerem-se aquelles descontos, e decida-se isto antes da discussão do orçamento da marinha; porque na occasião da discussão do orçamento não se discutem as leis, não se revogam, não se modificam, não se alteram, nem se resolvem pertenções particulares; na occasião do orçamento verifica-se, se as verbas que estão alli, o estão em virtude das leis, e se estão conformes com ellas; e as que não são de lei, que o são por effeito de necessidades a attender, devem ser conservadas, diminuídas, augmentadas, ou mesmo eliminadas conforme parecer mais conveniente. Estas é que devem ser as questões que pertencem ao orçamento; não ha que tractar ahi de pertenções de particulares. Repito, os operarios do arsenal da marinha dizem que contra lei se lhes fazem descontos nos seus salarios, e é preciso decidir antes da discussão do orçamento respectivo, se esses descontos devem fazer-se ou não; não se misturem duas questões inteiramente distinctas.

A commissão de fazenda diz, que ha de seguir o conselho que deu a commissão de marinha; pois quer siga quer não siga, o que eu peço é que dê o seu parecer quanto antes.

O sr. Santos Monteiro: — O illustre deputado explicou á commissão de fazenda e á camara o que é o orçamento. A questão a que o illustre deputado se refere, não é como se lhe affigura, e por o não ser é que deve ser tractada por occasião da discussão do orçamento da marinha. Se por ventura a questão devesse ser encarada como o illustre deputado a suppõe, então o logar proprio de a tractar não era no orçamento da despeza, mas sim na occasião da discussão do orçamento da receita; mas a questão não é como se affigura ao illustre deputado; e s. ex.ª ha de ficar satisfeito, quando a commissão de fazenda der a sua opinião e apresentar as razões que tem para a apresentar lai como ella a submetter á resolução da camara. Essa opinião virá, quando se discutir o orçamento da marinha. Agora se o sr. Arrobas tem muita vontade que se tracte e resolva já essa questão, então será bom, por fazer a vontade ao illustre deputado, que se prefira a outros orçamentos a discussão do orçamento do ministerio da marinha, só assim é que se póde resolver depressa o negocio e satisfazer á vontade do illustre deputado. O que é certo, é que a commissão de fazenda não póde apresentar a sua opinião acêrca deste objecto senão quando se discutir o orçamento do ministerio da marinha.

O sr. Cardozo Castello Branco: — Sr. presidente, eu tenho a declarar que não posso nem devo continuar a tomar parte nos trabalhos da commissão de legislação; e quando um deputado declara, que não póde nem deve continuar a tomar parte nos trabalhos de uma commissão, esta camara de certo não póde nem deve forçal-o a prestar um serviço que elle não póde nem quer prestar.

O sr. Presidente: — Mas eu é, que, apesar da declaração do illustre deputado, não posso nem devo deixar de consultar a camara sobre sequer acceitar a escusa do illustre deputado; depois o illustre deputado fará o que intender, se a camara lh'a não acceitar, como não acceitou a do sr. Nazareth.

Consultada a camara, não acceitou a escusa do sr. Cardozo Castello Branco.

O sr. Luz Pita: — Mando para a mesa uma representação de varios habitantes da freguezia do Porto da Cruz na ilha da Madeira, que pedem ser dispensados de pagar as rendas da agua de levada do Furado, á similhança do que se practica com os interessados na levada do Castelejo, offerecendo em compensação encarregarem-se de todas as despezas que o estado faz com aquella levada. Peço que vá á commissão respectiva.

O sr. Macedo Pinto: — Sr. presidente, mando para a mesa, a fim de ser distribuida pelos srs. deputados, a copia de uma representação, que a associação industrial Portuense dirigiu ao governo, na qual se queixa de que a ultima reforma das pautas prejudicou altamente algumas das industrias daquella cidade; pede que se attenda a este facto; e indica o remedio que lhe parece opportuno.

Sr. presidente, a população e a industria são os dois principaes elementos, as duas bases mais solidas, em que se funda a prosperidade e grandeza das nações modernas. Esta unica consideração seria bastante para que eu devesse levantar a minha debil voz sobre estes assumptos; mas no presente caso outras razões mais me levam a isso. E que á confiança que em mim depositaram as industriaes da cidade do Porto, devo a cadeira que aqui tenho; eleição que não pedi, nem sol licitei, nem desejei, mas com que muito me honro; e por isso não posso deixar, antes muito me apraz de nesta occasião lhes tributar a minha gratidão.

A associação industrial Portuense, fundada por um benemerito cidadão, cujo nome a nossa historia industrial terá sempre de repetir com louvor e gratidão, mas cuja modestia, e a amisade com que me honra, me vedam de pronunciar o seu nome neste logar; a associação industrial Portuense, digo, tem apenas pouco mais de um anno de existencia, mas neste curto praso são já relevantissimos os serviços que ella tem prestado á industria e ao paiz. (Apoiados) Não pertendo enumeral-os todos, nem fazer o seu elogio, mas basta lembrar á camara — que esta associação conta já perto de 800 socios, alguns em paizes estrangeiros; que publica de 15 em 15 dias em periodico, todo elle destinado ao progresso e melhoramento da nossa industria, e que fundou uma escola industrial, que tem sustentado a expensas suas, e de alguns donativos de varios cidadãos do Porto, ao patriotismo e generosi-

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dade dos quaes jamais se recorre debalde em assumptos desta ordem.

São já 3 as aulas pertencentes a esta escola, que se acham em exercicio, cursadas por mais de 400 alumnos, comprehendendo entre elles os da aula de instrucção primaria, ou leitura repentina pelo methodo de Castilho, methodo que a associação muito tem -concorrido a fazer conhecer e propagar nas provincias do norte, convidando as camaras municipaes das mesmas a mandar commissionados á escóla da associação, que se tornou assim uma escola normal para este methodo.

E, sr. presidente, não é só da instrucção da classe industrial que se tem occupado a associação, porque conhecendo esta que o credito, ou a abundancia e barateza dos capitaes e inquestionavelmente um dos primeiros quesitos, um dos elementos mais necessarios para a facilidade e barateza da producção, a associação tem procurado desenvolver e augmentar, ou, antes direi, crear o credito industrial, afim de que este nas suas diversas fases ou transformações possa prestar aos industriaes todos os auxilios de que possam necessitar nas diversas eventualidades da vida industrial, e mesmo domestica; e com este fim occupa-se actualmente a associação de fundar um estabelecimento complexo, que deve abranger um monte de piedade e auxilio aos desvalidos, uma caixa economica e um banco de emprestimos e descontos.

Sr. presidente, não me cançarei em expor quanto a industria e o paiz tem a esperar desta associação;, o que deixo referido e bastante para concluir que a associação tem bem merecido da patria; que ella é digna da protecção desta camara e do governo, e que a sua representação deve ser attendida.

Os industriaes, que assim comprehendem a sua missão, não serão elles por certo que venham pedir ao governo e a esta camara um favor não merecido, uma protecção excessiva, desordenada e injusta, para á sombra della cruzarem os braços, e se locupletarem á custa dos consumidores; bem pelo contrario a representação da associação funda-se em principios economicos de incontestavel justiça: o que os industriaes pedem é rasoavel, é justo, é até muito moderado; pedem que por meio da pauta da alfandega se lhes faculte a protecção, strictamente necessaria e indispensavel, para que os productos de nossas industrias possam concorrer no mercado com os productos congéneres da industria estrangeira. E note a camara, que elles se contentam com que esta protecção lhes seja concedida só temporariamente; porque confiam em si, e nos seus esforços; porque teem fé no nosso futuro, na nossa regeneração industrial.

Termino aqui: a representação que mando para a mesa fallará por mim, e por seus auctores, os industriaes da cidade do Porto. Estimarei que a commissão revisora das pautas traga este assumpto quanto antes á discussão, porque confio que esta camara ha de fazer inteira justiça aos nossos industriaes (Apoiado); e por ultimo peço que um exemplar desta representação seja dirigido á commissão revisora das pautas.

A representação ficou sobre a mesa para ter o competente destino na sessão seguinte.

O sr. Vasconcellos e Sá: — Mando para a mesa uma representação de 3 proprietarios no campo de Villa-nova de Anços, em que se queixam do máo estado das motas do rio Soure; e pedem que se mandem concertar as quebradas, da mesma maneira como se concertam os marachões do Mondego, por isso que teem iguaes direitos aos dos donos das propriedades que confinam com o Mondego.

Tambem ficou sobre a mesa para ter destino na sessão seguinte.

O sr. Corrêa Caldeira: — Eu pedia em primeiro logar que o sr. presidente désse para a ordem do dia, com a brevidade possivel, o parecer sobre as vagaturas que ha na camara; em segundo logar que pela secretaria da casa se annunciasse novamente ao sr. ministro das obras publicas que tenho necessidade de verificar a minha interpellação, ha muito tempo annunciada, sobre celleiros communs; e por ultimo usarei da palavra para mandar para a mesa um requerimento, o qual sou movido a fazer, por vêr um artigo em um periodico, que se publica nesta capital, e que pelo nome que nelle vem assignado se deve reputar official, no qual se diz que o governo possue conhecimento não só das residencias, mas do estado de solvibilidade de cada um dos accionistas do caminho de ferro, e que se esses esclarecimentos não foram mandados á camara, é porque não tinham sido pedidos, por isso é que faço um requerimento, que mando para a mesa, pedindo esses esclarecimentos. (Leu)

Ficou sobre a mesa para ter ámanhã o competente destino.

O sr. Placido de Abreu: — Peço a v. ex.ª que dê para ordem do dia o projecto ácerca dos bachareis, e que seja publicado no Diario do Governo é parecer da commissão de guerra sobre os reformados.

O sr. Presidente: — Eu nada posso dar para ordem do dia, em quanto não acabar a discussão do orçamento, e sómente na quinta feira se occupara uma parte da sessão com a leitura de pareceres de commissões, porque ha muitos sobre a mesa, e por que os srs. ministros não podem nesse dia estar presentes ao principio da sessão,!por isso que é dia de despacho; em quanto ao parecer da commissão de guerra ácerca dos reformados, eu consulto a camara sobre a sua publicação no Diario do Governo.

Decidiu-se que fosse publicado.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do orçamento da despeza.

O sr. Presidente: — Consta-me que o ministerio teve de ir ao Paço, e é provavelmente essa a razão porque nenhum dos srs. ministros se acha presente.

O sr. Corrêa Caldeira: — V. ex.ª preveniu-me; a observação que eu queria fazer, é precisamente essa, e não intendo que possa continuar a discussão do orçamento, estando ausentes todos os ministros: por conseguinte peço que a discussão se adie até estar presente algum dos srs. ministros (Vozes: — Não é necessario; já hontem se decidiu isso.)

Consultada a camara, resolveu-se que ficasse adiada a discussão do orçamento até estar presente algum dos srs. ministros.

O sr. Presidente: — Neste caso vão ser lidos alguns pareceres de commissões.

O sr. Santos Monteiro: — Eu lembro a v. ex. que seria conveniente que fossem dados para a ordem do dia subsidiariamente alguns projectos pequenos para se discutirem, quando o governo não possa estar pre-

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tente á discussão do orçamento, e nomeadamente aquelle a respeito da publicação das contas das camaras legislativas.

Procedeu-se na mesa á leitura dos seguintes pareceres de commissões.

1.º — Um parecer da commissão de fazenda sobre o requerimento de D. Úrsula Margarida Maya, em que pede a confirmação da pensão, que lhe foi concedida por decreto de 22 de setembro de 1337. — A commissão e de parecer, que, não obstante ter verificado que existe o referido decreto, não tendo sido desde então renovada a iniciativa por parte do governo, é a este que a supplicante se deve dirigir.»

O sr. Vellez Caldeira: — Este parecer involve uma questão que ainda não está decidida, mas que a commissão dá por decidida, isto é, que as propostas sobre pensões devem ser renovadas; e eu intendo que, depois de decretada pelo governo uma pensão, não e necessario que elle renove esse decreto, nem o póde renovar.

O sr. Corrêa Caldeira: — Sr. presidente, parece-me que o illustre deputado nas observações que fez, não tem razão, (Apoiados) É doutrina corrente que as propostas do governo, feitas durante uma legislatura, caducam na legislatura seguinte, e para que tenham andamento é necessario que sejam renovadas: ora não tendo sido renovada a iniciativa desta proposta de pensão, o parecer da commissão não póde ser differente daquelle que ella deu.

O sr. Arrobas: — Eu concordo com o sr. Corrêa Caldeira em que as propostas do governo apresentadas n'uma legislatura caducam na seguinte; mas se isto em geral é assim, não o é no caso especial das pensões, porque estas segundo a carta são decretadas pelo governo e approvadas pela camara; o governo não póde retirar uma pensão depois de decretada; depois da graça feita, ninguem a póde retirar, e a questão subsequente só póde ter logar em quanto aos meios porque a pensão ha de ser paga, e para isso é que ella vem á camara; de maneira que é, para assim dizer, uma questão de expediente depois de decretada a pensão. Por consequencia intendo que as propostas de pensões não são comprehendidas na regra geral das outras propostas do governo, porque depois de decretada uma pensão, O decreto subsiste, e não póde ser renovado.

O sr. Nogueira Soares: — Eu não concordo com o illustre deputado que me precedeu; pelo contrario sou da opinião do sr. Corrêa Caldeira, porque é principio corrente e confirmado pela practica do parlamento, que as proposições subsistem tão sómente em quanto subsiste a legislatura, e não vejo a razão pela qual esta regra não deva ter applicavel ás propostas sobre pensões, porque tambem é necessario que o governo tome a responsabilidade dessas propostas, e o governo que decreta uma pensão, póde por um outro decreto retirar essa pensão, assim como o parlamento fazendo uma lei, póde retira-la por outra lei. Um governo que succede a outro que concedeu uma ponsão, póde intender que o seu antecessor não obrou bem, que não se seguiram os verdadeiros principios na concessão dessa pensão, e por isso não estar resolvido a trazer á camara a proposta do seu antecessor; e não basta que a pensão esteja decretada, é necessario que alguem a sustente no parlamento, e esse alguem não póde ser senão o governo. Por consequencia a camara não póde tomar conhecimento desta proposta de pensão sem o governo declarar se insiste por ella, renovando-a; o portanto voto pelo parecer da commissão.

O sr. D. Rodrigo de Menezes (Sobre a ordem): — Para motivar a proposta que vou fazer, preciso dizer duas palavras. Eu tambem intendo que as propostas do governo sobre politica caducam n'uma nova legislatura, porque póde ler mudado a politica do governo; mas as pensões não estão no mesmo caso, e não me parece que o governo, decretando hoje uma pensão, ámanhã se contradiga; por isso proponho o adiamento da questão até estar presente algum dos srs. ministros.

O sr. Presidente: — Pára esclarecimento da camara mandei buscar a lei que regula a este respeito. O sr. Secretario Rebello de Carvalho: — (Leu.) O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Como a lei que acaba de ser lida na mesa, se refere a projectos de lei das camaras, e não a propo-las do governo, eu continuo a insistir pelo adiamento até que esteja presente o governo.

Foi apoiado o adiamento e approvado sem discussão.

Parecer (n.º 63 H) — A commissão ecclesiastica foi presente a representação da camara municipal de Castello de Vide, na qual pede a suppressão de uma das 3 freguezias, que existem no sobredito concelho.

A commissão é de parecer, que seja remettida ao governo, ao qual pertence deferir nos lermos competentes, e na fórma da lei de 10 de dezembro de 1811. = M. J. Cardozo Castello Branco = José Jacinto Tavares = Joaquim Manoel da Fonseca Castello Branco = José Antonio Pereira Bilhano = Alves Martins.

Foi approvado sem discussão. Parecer (n.º 63 G): — A commissão de fazenda foi remettido o incluso requerimento dos possuidores das leiras chamadas da Bahia, ponderando que requerem desde 1823, e pedindo o seu pagamento.

Os supplicantes não tem menos direito do que outros credores, que nesta sessão recorreram á commissão; e como os requerimentos de todos se remetteram ao governo, para os incluir na medida geral, parece á commissão que o mesmo se deve fazer a este. o para o mesmo fim.

Casa da commissão, em 8 de junho do 1853. — J. Damazio Roussado Gorjão, presidente interino = V. da Junqueira = Francisco J. Maya = Justino Antonio de Freitas = A. Xavier Palmeirim = Antonio dos Santos Monteiro = José Maria do Casal Ribeiro. Foi approvado sem discussão. Parecer (n.º 63 F): — No incluso requerimento, que foi mandado á commissão de fazenda, podem alguns proprietarios e lavradores do Douro, residentes na cidade do Porto, serem isentos de pagar direitos de generos produzidos nas suas propriedades, e que mandam vir para consumo proprio na mesma cidade.

Sendo os direitos, a que se referem, sobre o consumo effectuado em uma certa e determinada localidade, devem-se logo que a entrada do genero se verifique para esse fim. O que acontece no Porto a respeito de poucos, acontece na capital com todos os generos, ainda que tenham sido produzidos nas propriedades dos consumidores, e que sejam importados por sua propria conta.

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Os lealdamentos e as liberdades de direitos concedidos a individuos e corporações, acabaram ha muito tempo, e seria de summa inconveniencia que se estabelecessem de novo.

Parece pois a commissão que o requerimento não póde ser attendido.

Casa da commissão, 8 de junho de 1853. — José Damazio Roussado Gorjão, presidente interino = José Maria do Cazal Ribeiro — F. Joaquim Maya Justino Antonio de Freitas — F. da Junqueira = Augusto Xavier Palmeirim = Antonio dos Santos Monteiro.

Foi logo approvado sem discussão.

Parecer (n.º 63 E): — A commissão de fazenda foi mandada a inclusa representação da junta de parochia, da freguezia de S. Thiago da cidade de Tavira, para dar o seu parecer sobre o seu conteudo, ouvida a illustre commissão de administração publica.

Pertende a junta ser alliviada de pagar a quantia de 203$000 reis, que os antigos administradores da fabrica da mesma igreja tomaram de emprestimo ao extincto convenio da Graça, da dicta cidade, e de pagar o juro annual da mesma quantia. Funda-se na quasi absoluta falla de meios, o quaes não chegam para as despezas do culto divino, e pondera que se fôr compellida ao pagamento, a igreja lerá de se fechar nos dias em que se commemoram os mysterios da redempção, com grave escandalo e sentimento dos fieis.

Ainda que estas rasões são de algum peso, a commissão de fazenda não só se conforma com o parecer da illustre commissão de administração publica, porem ainda observa que se a junta supplicante fosse attendida, teriamos aberto um precedente, que outras corporações em analogia de circumstancias viriam logo allegar para serem absolvidas do pagamento de direitos da mesma natureza. E intende por tanto que a representação não póde sei attendida.

Sala da commissão, 9 de junho de 1853. — J. D. Roussado Gorjão, presidente interino = F. J. Maia — Justino Antonio de Freitas — A. Xavier Palmeirim — Visconde da Junqueira = Antonio dos Soutos Madeiro — José Maria do Cazal Ribeiro. Foi approvado sem discussão. Parecer (n.º 63 D): — D. Margarida Augusta Ozorio de Sá Coutinho Sotto-Maior, o sua irmã D. Maria Julia pedem á camara conceda ás supplicantes pensões alimenticias, que intendem pertencer-lhes: — 1.º porque tendo os seus antepassados até seu pai o direito de padroado na igreja de Santa Comba de Fornellos, arcebispado de Braga, e achando-se os parochos alli constituidos na obrigação de darem pensões alimenticias ás supplicantes, perderam este beneficio pela extincção dos dizimos nos termos do decreto de 30 de julho de 1832; o — 2.º porque sendo a sua casa a proprietaria de um dos officios de escrivão dos orfãos na cidade de Braga, soffreram igualmente as supplicantes a perda da mesma com a nova reforma judiciaria.

Estes factos acham-se provados pelos documentos juntos, parecendo igualmente inquestionavel o direito de serem indemnisadas as supplicantes na presença do artigo 10.º do citado decreto do 30 de julho e do decreto de 16 de janeiro de 1831.

Como porem as coites não pertence o propôr pensões, é a opinião da commissão que este requerimento deve ser remettido ao governo para lhe deferir como for justo, em attenção ás tristes circumstancias das supplicantes e ao direito que lhes assiste.

Sala da commissão, 10 de junho de 1853. — J. Damazio Roussado Gorjão, presidente interino = F. Joaquim Maia — V. da Junqueira = Antonio dos Santos Monteiro — A Xavier Palmeirim = José Alaria do Cazal Ribeiro.

O sr. Vellez Caldeira — intendo que este parecer esta regular, menos n'uma parte, que é aquella em que a commisão emitte unia opinião; por que isto é prohibido pelo regimento (Apoiados). A camara quando remette ao governo algum projecto, não emitte opinião alguma. Portanto elliminada esta parte do parecer, eu voto por elle.

O sr. Justino de Freitas — Declaro a v. ex.ª e á Camara, que a Commissão não tem duvida alguma em alterai a redacção da conclusão do parecer, dizendo-se — para o governo definir como parecer de justiça — em logar de — como parece justo, ainda que eu tenho visto que as practicas da camara parecem auctorisar o contrario daquillo que disse o Vellez Caldeira.

O sr. Vellez Caldeira. — Se a commissão concorda na redacção que o illustre deputado acabou de enunciar, escusa de mandar para a mesa proposta alguma.

O sr. Secretario Rebello de Carvalho — Parece-me que feita a alteração indicada pelo sr. Justino de Freitas, ainda será necessario fazer outra; onde se diz — e o direito que lhes assiste; — parece pois que o parecer fica mais regular sendo redigido do seguinte modo — como porem ás côrtes não pertence propôr pensões, é opinião da commissão, que este requerimento deve ser remettido ao governo para lhe deferir como parecer justo, em attenção ás tristes circumstancias das supplicantes, e do direito que lhes assistir.

Foi approvado o parecer com esta redacção.

Parecer (n.º 63 C): — A commissão de fazenda foram mandados 2 requerimentos de João Antonio Gomes Henriques, um delles datado de 25 de fevereiro de 1852, — e o outro de 4 de maio deste anno queixando-se em ambos da demora havida para se lhe conceder uma prestação a que se considera com direito, e que requer ha annos

Para poder interpor parecer pediu a commissão informações do governo, que vieram -um demora. Das mesmas informações e documentos conta.

Que ao supplicante sendo ainda menor fora concedida a sobrevivencia do officio do almoxarife e juiz dos direitos reaes de Samora. Da merco foi-lhe passado alvará em 16 de dezembro de 1842, e para poder servir cumulativamente com seu pai, se lhe passou provisão pela extincta junta do Infantado em 17 de fevereiro de 1843.

Tendo sido extincto aquelle emprego em 1833, só em 8 de janeiro de 1844, e que requereu pelo tribunal do thesouro publico, a prestação a que se suppõe com direito segundo as disposições do decreto de 16 de janeiro de 1834. Para se lhe deferir, determinou o tribunal em 2 despachos de 8 de fevereiro e 29 de março de 1841, que junta-se o original da sua carta.

Não podendo satisfazei a exigencia, alias juta, recorreu directamente pela secretaria de estado dos negocios da fazenda, pedindo que o alvará da so-

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brevivencia servisse como carta, por isso que não possuia outro documento. O requerimento foi remettido para o thesouro para lhe deferir como fosse justo, ou consultar sendo necessario; sob parecer da repartição competente foi o processo ao tribunal de contas, para informar se os diplomas que o suplicante juntara, eram os unicos que tinham taes empregos ou se se lhe passaram posteriormente contas com previo pagamento de direitos. O tribunal de cartas informou em officio de 22 de abril de 1816, porém até agora, isto é ha sete annos, tem o negocio estado parado, e é disso que o supplicante se queixa.

A commissão expondo o que consta dos papeis que lhe foram remettidos, é de parecer que se remetta novamente o processo ao governo, para que resolva a questão como fôr de justiça.

Sala da commissão 6 de junho de 185.1. — J. Damásio Roussado Gorjão — presidente interino, Visconde da Junqueira — F. Joaquim Maia — Justino Antonio de Freitas — A. Xavier Palmeirim = Antonio dos Santos Monteiro = J. M. do Cazal Ribeira

Foi approvado sem discussão.

Parecer (n.º 63 D.): — No incluso requerimento feito á Camara transacta e mandado á actual commissão de fazenda, queixam-se João Teives, e Henriqueta Guilhermina Teives, de lhe não ter sido entregue no ministerio da marinha a quantia de réis 1:766$960 em ouro, producto do espolio de seu pai, o 2.º tenente da armada Victorino do Nascimento Teives, fallecido em Angola, e queixa-se ainda de se lhe não ter declarado por certidão o destino dado aos fundos votados em 1850, para pagamento de dividas de similhante natureza.

Por informação da secretaria desta camara, consta que um requerimento identico dos supplicantes foi remettido ao governo em julho de 1853, a fim de Os contemplar na verba que já estava votada. O requerimento incluso parece á commissão que não póde ter melhor sorte.

O decreto de 26 de julho de 1852, que rege até ao fim deste anno economico, approvou a verba de 20 contos de réis para restituição de deposito e pagamento de letras do ultramar, devendo ser rateada pelos credores. Seja nessa verba ou na que se votar para o futuro anno, tem o governo os meios de satisfazer como o comportam os recursos do thesouro a reclamação dos supplicantes. Para o referido fim intende que o memo requerimento se envie ao governo pela secretaria de estado dos negocios da marinha.

Sala da commissão 6 de junho de 1853. — J. Damásio Roussado Gorjão = presidente interino = Visconde da Junqueira — F. J. Maia = Justino Antonio de Freitas = A. Xavier Palmeirim = J. M. Cazal Ribeiro = Antonio dos Santos Monteiro. Foi approvado sem discussão. Parecer (n.º 63 A). — A commissão de infracções examinou o requerimento do cidadão Manoel José de Amorim Vianna Junior, em que se queixa do ministerio publico por lhe ter promovido um processo no 3 0 districto criminal, e do governo por lhe não ter attendido as suas reclamações que não especifica nem documenta, e conclue pedindo á camara a decisão dos negocios do supplicante todos de intervenção do ministerio publico, havendo-se dá secretaria de estado dos negocios da justiça o requerimento deferido em 16 de agosto de 1850 e o ultimo em 11 de outubro de 1852 com as respectivas informações aquella do procurador geral da corôa, e esta do procurador regio. A pertenção do supplicante concebida nos temos era que está apresentada, parece á commissão que não póde ser attendida.

Sala da commissão, 9 de junho de 1853. — F. Guilherme da Silva Pereira, presidente = F. J. Duarte Nazareth — Justino Antonio de Freitas = V. Ferreira de Novaes — A. P. da Fonseca Ozorio secretario = J. Feio Soares de Azevedo. Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — Como está presente o sr. ministro da fazenda, continuamos na discussão do orçamento.

Foram approvados sem discussão os capitulos 6.º e 7.º do orçamento da junta do credito publico.

O sr. Presidente. — Passamos á discussão do orçamento do ministerio da fazenda.

E o seguinte

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MINISTERIO DOS NEGOCIOS DA FAZENDA.

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Foi approvado sem discussão o capitulo 1.º

Entrou em discussão o capitulo 2.º

O sr. Corrêa Caldeira: — Se eu não estou enganado, parece-me que pelo regulamento novo do correio, foi annullada a franquia das cartas, que tinham os membros do corpo legislativo, em quanto duravam as sessões; e esta annullação de franquia principia a estar em vigor do 1.º de julho em diante. Desejava, pois, que o sr. ministro da fazenda tivesse a bondade de declarar, qual aproximadamente, a verba resultante desta economia, que s. ex. teve em vista fazer pelo novo regulamento do correio; o se julga que a economia, que suppoz obter por este meio, o compensada pelas difficuldades de correspondencias, que necessariamente hão-de resultar desta determinação para os membros do corpo legislativo, que, no exercicio do seu mandato, tem de estar em correspondencia com todos os cidadãos que a elles se dirijem, o que tem necessidade de saber tudo quanto se passa no paiz.

Se os membros do corpo legislativo forem obrigados a pagar as correspondencias de interesse publico, que lhes são enviadas, isto será impôr aos membros das duas camaras um encargo com que elles não podem; porque haverá alguns srs. deputados para quem o subsidio será pouco para pagar essa correspondencia. Pedia portanto ao sr. ministro que tivesse a bondade do dar algumas explicações sobre este objecto.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Começo por dizer que a annullação de franquia, a que allude o nobre deputado, não foi levada a effeito como uma questão de economia, mas sim como uma questão de organisação. O systema que se adoptou, como o illustre deputado sabe, não e um regulamento, mas sim um decreto que foi approvado nas duas casas do parlamento, e por conseguinte é uma lei do estado. O systema é outro, é differente daquelle que se seguia; porque em logar de pagar as cartas quem as recebe, paga quem as escreve. E esta disposição foi generica, abrangeu todas as classes do estado, todos os individuos, todas as repartições officiaes, as secretarias de estado, e os ministros; abrange, por consequencia, os membros das duas casas do parlamento. Agora se o nobre deputado intende que esta disposição é inconveniente, póde propôr a sua revogação, para os membros da camara dos deputados.

Eu não podia inserir no orçamento senão aquillo que estava auctorisado por lei.......

O sr. Corrêa Caldeira: — Mas v. ex.ª não sabe em quanto se calcula a economia para o thesouro.

O Orador: — Pela minha parte não posso dizer desde já qual e a importancia correspondente a esta economia; o que tomo a dizer é, que se o illustre deputado intende, que os membros das duas camaras não devem ser excluidos do antigo favor que gosavam, nesse caso póde fazer a sua proposta, e a camara decidirá como melhor intender.

O sr. Nogueira Soares. — Levanto-me para apoiar as observações feitas pelo nobre deputado o sr. Corrêa Caldeira. Na verdade o subsidio dos deputados esta tão reduzido, que a serem obrigados a pagar as correspondencias que lhes suo dirigidas, e que são quasi sempre sobre negocios publicos, acontecerá que muitas vezes não chegará para isso mas diz o sr. ministro que este objecto não o uma questão do economia, mas sim uma questão de mobilisação; para não transtornar, pois, esta organisação, parece-me que o meio mais conveniente é votar um credito supplementar para pagar as despezas em que puderem importar as cartas que são distribuidas po-los deputados. Intendo que este é o meio mais regular para se não atacar a organisação desta repartição.

Intendo, pois, que se devem deixar estar as cousas, com relação aos deputados, no mesmo estado em que se achavam até aqui; o neste sentido vou mandar para a mesa uma proposta.

O sr. Corrêa Caldeira — Se pela nova organisação dada ao correio resulta o que acabou de dizer o sr. ministro, de certo que as ponderações que ha pouco fiz, não tem grande pezo; quero dizer, se pela nova organisação dada ao correio fosse imposta a todos os cidadãos em geral, a obrigação de franquear as cartas que remettessem, então tinha s. ex.ª muita razão; mas eu peço licença para dizer ao sr. ministro que está em um equivoco a este respeito, porque essa obrigação imposta pelo regulamento só exite para as cartas de pequena posta, para aquellas que são derigidas para a mesma terra; mas já não estão no mesmo caso aquellas que são dirigidas de um qualquer ponto do reino para Lisboa: e são estas as que fazem mais pezo aos deputados. Por consequencia ainda insisto que este negocio não deve ser resolvido do leve, porque as considerações que apresentei, não me parece que sejam susceptiveis de demonstrações em contrario.

Se depois desta resolução se impuzer aos membros do corpo legislativo a obrigação de pagar todas as correspondencias que receberem de interesse publico, este encargo ha de ser muito superior ao subsidio que recebem, e collocal-os-ha na necessidade de rejeitar as correspondencias! que lhes forem dirigidas, e por consequencia deixarão de ser informados do factos muitas vezes da maior importancia para o serviço publico, e ma) poderão desempenhar a missão que teem a desempenhar.

Ora se eu estou bem informado (e é por isso que eu tinha feito a pergunta ao sr. ministro da fazenda, se sabia a quanto montava esta economia) por alguem versado nesta materia, a economia resultante para o thesouro, quando a sessão durar muito tempo, como tem succedido, orça para as duas casas do parlamento, quando muito, 800$000 réis.

Ora, sr. presidente, eu não me opporia a que se tomasse esta deliberação, o se marchasse neste caminho, se eu visse que nisto havia coherencia; eu quando eu vejo cortar á larga a respeito de despezas que se podem bem reduzir, e ser só mesquinho a respeito destes negocios tão insignificantes, intendo que tenho toda a razão do me queixar.

Por tanto pelas considerações que acabo de fazer, eu inclino-me a votar pela propo-la do sr. Nogueira Soares, e convidarei s. ex.ª a mandal-a para a mesa; e no caso que o não faça, ou terei o cuidado de a formular.

Foi lida na mesa a seguinte

Proposta: — Proponho que se vote um credito supplementar para pagar os portes da correspondencia dirigida aos membros das camaras legislativas. — Nogueira Soares.

Foi admittida, e ficou tambem em discussão.

O sr. Palmeirim: — Sr. presidente, ou sinto ter de combater tanto a proposta do sr. Nogueira Soa-

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Res, como as reflexões que em favor della se tem feito, tendente, a isentar os srs. deputados do pagamento de suas correspondencias.

A circumstancia de haver feito parte da commissão que consultou a Sua Magestade a actual reforma postal, decretada em dictadura, habilitou-me a ajuizar deste assumpto, que provocou larga discussão, illustrada pelo respectivo presidente da commissão, o sr. João de Sousa Pinto de Magalhães, que já foi presidente desta camara, e cavalheiro muito conhecido por suas luzes e prudencia, e não menos por seu respeito ao parlamento. Da discussão resultou saber-se que nenhuma lei existia que estabelecesse tal isenção, porque foi apenas uma ordem do governo no tempo das côrtes de 1820, que mandou isentar os deputados do pagamento de suas correspondencias, prerogativa que passou desde então ate á actual camara.

A commissão consultou as practicas dos outros paizes em que o serviço postal está bem regulado: leu os regulamentos inglez, francez, belga, hespanhol, brazileiro, etc, e em nenhum encontrou tal privilegio, de que os inglezes todavia tinham gosado.

Por outro lado verificou-se que havia muitos abusos, commettidos a coberto de tal privilegio; e peço ao meu amigo, o sr. Corrêa Caldeira, licença para lhe dizer que a cessação de lucro não é tão baixa, como imagina; devendo notar que as cartas do paquete são pagas pelo governo á empreza da navegação por vapor; e por isso não ha só lucro cessante para com a fazenda, mas damno emergente.

Por acaso tenho comigo uma nota, que foi presente á commissão, da importancia da correspondencia recebida gratuitamente pelos membros do parlamento em 1849 e 1850; e sei que desde então a mesma correspondencia tem continuado na mesma proporção:

[VER DIARIO ORIGINAL]

Por tanto em dois annos perdeu o correio o valor de 4:455$225 réis; e por isto e mais considerações que são obvias, voto contra a proposta.

O sr. Louzada: — Sr. presidente, eu tambem voto para que os deputados não sejam isentos de pagar portes de cartas; mas ha um objecto para que pedi a palavra, que é uma disposição do novo regulamento, que me parece, que não póde ser muito conforme.

Se me não engano, por um artigo desse regulamento determina-se que a carta que não tiver sello ou estampilha, pague um direito differencial; quer dizer, que pague o que deveria pagar e mais um tanto.

Ora já se vê, que se a um deputado fôr dirigida uma carta sem que lenha estampilha, fica em um certo compromisso, se a não recebe para não pagar o direito differencial ou imposto que deve pagar; e se a recebe, póde muitas vezes ficar collocado em uma posição que não é agradavel, tendo de pagar o porte excessivo de uma correspondencia, que mesmo o seu interesse em relação á utilidade publica não comporta.

Parece-me, que se se adoptasse uma outra disposição, que ha no regulamento dos correios em outros paizes, se evitariam alguns inconvenientes; e vem a ser — aquellas cartas que não trazem sello ou estampilha, ou o trazem menos do que devia ser, não teem seguimento — o correio não expede a carta, que está nesse caso, e então todo o inundo tem o cuidado de que a sua caria vá com a estampilha verdadeira, por que sabe-se, que de outro modo não terá expedição.

No Brazil assim acontece: o correio não dá expedição a uma só carta, que não esteja nestas circumstancias.

Por tanto, eu intendo, que deste modo se regula o negocio de uma maneira mais conforme, porque o deputado ficava alliviado de receber a carta e de sollicitar o negocio, a que dizia respeito, se não viesse com o competente sello pago; e uma vez que no regulamento se altere esta parte, os deputados hão de ser alliviados desta despeza, de que teem razão de se queixar.

O sr. Pinto de Almeida: — Sr. presidente, eu pedi a palavra para declarar em alto e bom som, que volto contra a proposta do sr. Nogueira Soares, porque intendo que quando nós temos a fazer economias, não devemos ír augmentar as despezas, querendo, porque somos deputados, ter um privilegio da isenção do pagamento de porte de cartas, que a lei não concede para nenhuma classe.

Aqui está o que diz a lei de 27 de outubro de 1852. (Leu) Então nós que somos os que fazemos as leis, havemos de ficar isentos deste pagamento, e queremos que só lenha applicação para os outros. Parece-me isto contra todos os principios de justiça. (Apoiados)

Eu sou tambem daquelles que recebem correspondencias de interesse publico, e ás vezes bastante volumosas: tenho pago muitos portes do cartas, e nem por isso hei de concorrer com o meu voto, para que se altere a disposição do artigo 43.º da lei de 27 de outubro de 1852.

Eu intende que a proposta do sr. Nogueira Soares imporia uma revogação desta lei, e parece que essa revogação não deveria fazer-se por uma simples proposta, mas apresentar-se um projecto de lei propondo a alteração da lei naquelle artigo. Mas eu não sei como o sr. Nogueira Soares, quando aqui se discutiram as leis da dictadura, em que vinha incluida lei de 27 de outubro de 1852, deixou passar esta disposição, se não queria que ella fosse applicavel aos deputados; e agora vem apresentar uma proposta com uma emenda a essa lei, porque toca só a si.

O sr. S. J. da Luz: — Sr. presidente, não questiono que se tenha commettido algum abuso na correspondencia que se dirige aos membros de ambas as camaras; mas estou intimamente convencido de que a maior parte da correspondencia particular, que é dirigida aos srs. deputados, provém de assumptos in-

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hercules no seu cargo; e se não fosse a circumstancia de serem deputados, de certo não recebei iam similhante correspondencia. Eu serei talvez dos deputados que menos correspondencia tem; por tanto já se vê, que o meu zelo é insuspeito. Eu já na qualidade de chefe e empregado do ministerio da marinha, intendi, que devia quitar uma immensidade de correspondencia, que me era dirigida da provincia á lesta do cujos negocios eu me achava, porque quasi toda essa correspondencia versava sobre assumptos inherentes á minha qualidade de empregado, e como individuo particular intendi, que não devia pagar pelo estado cousas que lhe diziam respeito; mas o resultado foi, que quando foi necessario tractar de uma questão grave em relação á provincia que aqui represento, o sobre a qual me tinham sido enviadas cartas dessa provincia, o ministro mandou a toda a pressa buscar essas cartas ao correio, mas já as não achou, e o assumpto não pôde ser decidido, como seria, se ou tivesse recebido essas cartas.

Em consequencia póde a camara resolver o que intender sobre a materia, mas estou intimamente convencido, que se fôr approvada esta reducção, muitos srs. deputados deixarão de receber correspondencias, que talvez sejam importantissimas, o de interesse geral.

Ora que se faça uma distincção entro a correspondencia de paizes estrangeiros e a correspondencia do reino, isso parece-me justo e equitativo; porque a correspondencia dos paizes estrangeiros não está no caso que acabo de referir. Por consequencia com esta distincção que acabo de fazer, voto pela proposta do sr. Nogueira Soares, com tanto que seja relativa sómente á correspondencia do reino e provincias ultramarinas.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, esta questão não se deve avaliar pelas cifras. Não se pretende que se faça uma economia de 100 contos de reis, que não avulta; o que se pede á camara, o um exemplo para poder reforçar a auctoridade publica em termos, que laça acabar com o escandaloso contrabando que se faz por todas as repartições em nome de todos os empregados, e defrauda consideravelmente este ramo de receita publica. (Vozes: — É verdade) Quando digo, por todos, quero dizer, por todos que o fazem; mas e escandaloso o abuso practicado a este respeito, principalmente na classe militar. Todos os corpos tem aqui um official, que é uma especie de procurador junto ao governo; todos os correios recebem correspondencia das localidades onde estão os corpos, correspondencia não só de militares mas de paisanos, toda debaixo do seu nome; chegam ao correio, entrega-se-lhes um masso immenso, e elles distribuem — toma tu, toma tu, toma tu. Para obstar a este abuso é preciso que a camara mostre que não póde nem quer ter parte nelle. É verdade que contra nossa propria vontade podemos ler correspondencias. Por exemplo, fomos a Pariz, achamos lá um alfaiate que nos servia bem; o alfaiate ficamos com affecto (a mim não me acontece isso, mas póde acontecer a algum dilettanti) e como além de ter bom corte, tem boa penna, escreve no jornal dos alfaiates, e remette-nos o jornal. Eu tenho-o visto na camara. Ora nós a fallar a verdade, lemos uma commissão de commercio e artes, mas eu não intendo que de lai modo sejam particulares os seus misteres, que tenha de dar algum parecer sobre o modo de cortar casacas; por consequencia não tem necessidade do receber o jornal dos alfaiates, nem o paiz deve pagar o porte delle, porque algum sr. deputado o quer receber. (O sr. Cunha Sotto-Maior: — Não sou eu) Não me refiro ao illustre deputado... Isso levar-nos-hia a grandes questões, mas questões de figurino, quero dizer, se o illustre deputado veste exactamente no rigor do figurino de Pariz, ou se é alguma cousa exaggerado.

Ora depois do systema da estampilha, effectivamente não se destroe em nada a facilidade da correspondencia; cada um póde escrever, e escrever mais barato do que escrevia ate aqui. A estampilha vai para toda a parte, e tem vantagens consideraveis. Em primeiro logar é uma grande correcção ao estylo. Nós propendemos algum tanto para o estylo oriental, escrevemos cartas com toda a largura, e escrevemos quasi como um desenfado; quando não temos que fazer escrevemos cartas, mas quando formos obrigados a franqueal-as, forçosamente havemos de tractar de estudar o estylo attico, e sermos um pouco mais apertados.

É necessario pois que dêmos o exemplo, para que o governo possa acabar com todos os abusos que ha a este respeito, porque é preciso que se saiba que em Portugal o levar e trazer uma carta é uma cousa contra a qual não se conhece que ha uma legislação restrictiva; todo o mundo julga que isso é permittido. Por exemplo, agarra-se um homem, porque se lhe achou um bocado de herva sancta do contracto sancto (Riso), do contracto em que não se póde tocar (O sr. Avila: — Apoiado) porque é sancto assim como a herva; o homem é praso o perseguido; mas se se encontra um homem carregado de cartas, que é um monopolio do estado, como qualquer outro, passa liberrimamente, e ninguem o persegue. E necessario pois que o governo seja reforçado com o nosso exemplo, para poder acabar com estes abusos e contrabando de cartas em toda a parte, onde elle se faz; e portanto a economia que d'aqui resulta não é nada, absolutamente nada, mas é tudo o exemplo.

O sr. Cazal Ribeiro — Sr. presidente, esta questão em si é pequena, não póde ler uma grande significação; e sentirei muito que a camara faça uma excepção a seu respeito: eu não quero considerar que a camara a vote como um privilegio concedido a si propria; mas realmente póde ter essa interpretação.

O sr. Corrêa Caldeira — Era o privilegio do serviço publico.

O Orador: — Este foi um dos pontos que mais se discutiu na commissão: a commissão e o governo foram tão escrupulosos a este respeito, que não quizeram que a propria correspondencia official fosse livro de franquia, e creou um sello para por este modo fiscalisar, se se abusava ou não da franquia. E preciso que a camara comece por dar um exemplo, de que deseja a boa fiscalisação dos rendimentos publicos.

Eu, sr. presidente, não vinha preparado para esta discussão; mas peço licença para notar, que esta abolição de franquia para os deputados em Inglaterra foi abolida alguns annos antes da reforma postal, o entretanto lá se aboliu esse privilegio para os membros das camaras, o isto quando os portes das cartas pagavam um imposto, que era quasi dez vezes aquillo que se paga actualmente. E quando em Portugal se propõe a abolição deste privilegio, é quando se propõe um systema que diminue os portes das cartas, fazendo-os pagar por aquelles que as expedem, e não por aquelles que as recebem. Os illustres deputados tem um meio de não receberem a correspondencia á

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sua custa; e vem a ser, declararem, que não recebem correspondencia alguma, que não venha franca de porte, porque isto mesmo é o que fazem as redacções dos jornaes.

Agora em resposta ao sr. Lousada tenho a dizer, que no regulamento tambem se tractou do ponto das cartas estampilhadas, ou que tivessem um sello inferior; mas se se tivesse adoptado o principio que o nobre deputado indicou, parece-me que o resultado não seria melhor. A idéa do illustre deputado é que a carta que não tiver sello, ou mesmo um sello inferior, não seja expedida pelo correio. Parece-me que deste modo podem dar-se grandes inconvenientes, quando pelo contrario quem não quizer receber as cartas, não é a isso obrigado. Portanto eu não acho, nem pelo que disse o meu collega e amigo o sr. Palmeirim, nem pelo exemplo adoptado em outros paizes, nem pelo espirito do decreto que está em vigor, nem por qualquer conveniencia publica, que possa ser adoptada aquella proposta; e se ella não revoga a letra do decreto em vigor, vai em manifesta opposição com o seu espirito: pela minha parte não me resta duvida alguma sobre as vantagens desta disposição.

Concluo pois rejeitando o additamento que se propoz ao capitulo.

O sr. Avila; — Eu quero propôr uma questão de ordem. Eu não recebo subsidio como deputado, por que tenho emprego e vencimento maior; e por consequencia posso dizer alguma cousa relativamente ao gravame da correspondencia paga pelos membros do parlamento, se recair sobre elles essa despeza, e dos inconvenientes que daqui hão de resultar ao serviço. O que me parece, é que esta questão não póde ser tractada convenientemente neste logar, porque intendo que a commissão não se occupou della, quando descreveu esta verba, de que se tracta. Por isso a minha opinião é que este additamento ou proposta do sr. Nogueira Soares deve ir á commissão para apresentar sobre ella o seu parecer.

Sr. presidente, effectivamente ha duas especies, que eu intendo que devem ser consideradas, e vem a ser — a correspondencia do paiz, ea correspondencia dos paizes estrangeiros. Póde haver abuso na correspondencia que vem dos paizes estrangeiros, e por isso intendo que essa correspondencia não póde ser comprehendida na proposta do sr. Nogueira Soares, a qual restrinjo unicamente á correspondencia do reino, que versa quasi toda sobre objectos de interesse publico, e muito pouca sobre objectos de interesse particular dos deputados.

Por consequencia o que julgo melhor é, que a proposta do sr. Nogueira Soares seja mandada á commissão do orçamento para que antes de acabada a sua discussão, traga á camara um parecer a este respeito; porque neste momento não julgo a camara sufficientemente esclarecida para votar esta proposta.

O sr. Presidente: — A questão tem versado até aqui sobre a proposta do sr. Nogueira Soares; mas agora toma uma nova face, porque a proposta do sr. Avila apresenta uma questão previa que cumpre resolver, isto é, se deve ser remettida á commissão do orçamento a proposta do sr. Nogueira Soares.

O sr. Cazal Ribeiro: — Se a camara quer entrar desde já neste debate, a commissão não tem duvida alguma em entrar nelle, e assim estou auctorisado para o declarar á camara por alguns dos meus collegas, membros da commissão, porque ella não tem

parecer a dar sobre a proposta do sr. Nogueira Soares, porque a não póde acceitar.

O sr. Julio Pimentel: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara se a materia da questão previa está discutida.

Julgou-se discutida tanto a questão de ordem, co-mo a questão principal.

O sr. Avila: — Eu peço que se divide em duas partes a votação, quanto á correspondencia do reino, e á dos paizes estrangeiros.

O sr. Nogueira Soares: — Eu, sr. presidente, restrinjo a minha proposta para a correspondencia tão sómente do reino.

Posta á votação a proposta, dividida em duas partes, resultou serem ambas rejeitadas; e foi logo approvado o capitulo 2.º

Passou-se ao capitulo 3.º

O sr. Avila: — Este capitulo comprehende umas poucas de questões graves, porque comprehende — a reducção dos juros do emprestimo de 1335 — a reducção do juro do emprestimo dos 4:000 contos — os juros por diversas operações da thesouraria, e os juros das obrigações do thesouro, creadas pelo decreto de 30 de agosto de 1852.

Não me occuparei das tres ultimas questões, porque apesar de ter sobre os decretos de 18 de dezembro e 30 de agosto, as mesmas opiniões que emitti quando se discutiram os decretos da dictadura, comtudo esses decretos já são lei, e só por lei podem ser revogados, e quanto á verba dos juros das operações da thesouraria, não tenho a menor duvida em votar por esta verba, por isso que, estou certo, o governo a não gastará toda senão tiver necessidade para isso. Quanto ao juro das obrigações do thesouro já expuz á camara as observações que tinha afazer a este respeito, e ouvi com gosto as declarações do sr. ministro da fazenda, pelas quaes me pareceu que s. ex. não está muito arredado da idéa de trocar estas obrigações do thesouro por inscripções de 3 por cento: s. ex.ª disse que uma vez que o banco o requeresse e viesse com o governo a um accôrdo a este respeito, pela sua parte não se opporia a isso. Logo occupar-me-hei por consequencia, unicamente da reducção proposta dos juros do emprestimo de 1835.

Confesso francamente que não acho razão nenhuma, nem no governo, nem na illustre commissão de fazenda para vir propôr esta reducção. Eu considero esta questão por um lado diverso daquelle, porque tem sido encarado da parte da camara: eu apesar das considerações que tenho ouvido fazer aqui sobre a origem e natureza do credito, não posso separar-me das idéas que tenho a este respeito, e estas são — que não ha credito quando senão cumprem religiosamente as estipulações dos contractos que se celebraram.

O banco fez ao governo tres emprestimos em 1835 sobre penhores embolsaveis a 3 mezes e a juro de 5 por cento, como lhe prescreve o seu regulamento: estes emprestimos não tendo sido pagos no prazo em que foram estipulados, foram reformados posteriormente, continuando a pagar-se o juro de 5 por cento, até ao decreto de 24 de julho de 1852, que lhes deduziu 25 por cento, deducção que agora se pertende elevar a 40 por cento, reduzindo o mesmo juro de 5 a 3 por cento. A razão que se póde dar para justificar esta medida, é ou a impossibilidade absoluta de se fazer o que se estipulou, ou pagar o governo me

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nor juro do que o de 5 por cento, pelos emprestimos que contracta: isto porém, não é exacto, porque o governo já confessou que pagava 7 e meio por cento, pelos emprestimos que levanta sobre penhores. Mas ainda mesmo que fosse exacta a asserção de que o governo levantou, ou póde levantar dinheiro a menos de 5 por cento de juro, o que os principios e a boa fé aconselham era propôr o governo ao banco a reducção do juro dos seus emprestimos, e quando o banco não annuisse, levantar dinheiro no mercado a esse juro, e embolsar o banco. E isto o que se faz em toda a parte.

Portanto, esta deducção não tem justificação nenhuma, e é mais um passo que se dá no caminho do descredito em que se tem entrado, e cujas consequencias nos hão de ser fataes. Ninguem ha de dizer que os decretos de 30 de agosto e 18 de dezembro são medidas de credito: estas medidas são medidas que só uma necessidade imperiosa póde justificar, mas esta necessidade imperiosa não se dá para esta reducção, com a qual ninguem pertendera salvar as finanças, e portanto as razões para a reducção dos juros deste emprestimo, não são justificadas.

Fallou-se tambem em antecipações e sem ser da opinião daquelles que disseram que as antecipações se deviam juntar ao deficit do anno, intendo comtudo, que são verdadeiras antecipações todas aquellas que hão de ser pagas á custa das receitas dos annos economicos futuros, e debaixo deste ponto de vista bem longe de senão fallar já em antecipações, como disse ha dias o sr. José Estevão, as antecipações montam hoje a uma cifra maior do que em 31 de março de 1851. Ora os juros dessas antecipações devem ser tanto mais elevado, quanto menor fôr o escrupulo com que o governo satisfizer as estipulações dos contractos, porque além do juro do dinheiro ha o premio do risco.

Quando em toda a parte se fazem operações de credito, o sr. ministro faz o contrario, faz que não haja credito, porque o que se propõe aqui, equivale a mandar chamar o sr. ministro qualquer capitalista e dizer-lhe — emprestai-me dinheiro sobre letras da alfandegas, no desconto de 3 por cento — e depois mandar ordem ás alfandegas para que não paguem essas letras, debaixo do pretexto de que o juro de 5 por cento é um juro elevado.

Em vista pois das considerações que acabo de fazer, concluo dizendo que não acho razão nenhuma para o governo ir violentamente dizer ao banco — não vos quero pagar senão 3 por cento.

O sr. ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, o illustre deputado tem razão, quando diz que a respeito desta verba se podem fazer considerações que aliás não se dão a respeito de outras, porque as duas que restam, são o resultado dos decretos que foram confirmados por lei. Por consequencia não ha nesse caso, se não applicar a lei, ou estabelecer a correspondente cifra no orçamento em relação ás que ella determina. Nesta questão, sr. presidente, o caso é diverso; a camara póde sem duvida votar como intender melhor; o que digo a v. ex. é que não receio que prejudique o credito publico, nem as operações de thesouraria que o governo é obrigado afazer: não receio porque não é nova esta deducção, é nova na escala em que se apresenta, mas não é nova neste titulo. Depois do decreto de 26 de julho de 1852, como v. ex. sabe, que foi approvado pelo corpo legislativo, estabelecia-se a deducção de 25 por cento para todos os juros da divida interna e externa: a razão que então houve para fazer comprehender os emprestimos de 1835 na regra geral, foi a mesma que houve para estabelecer essa reducção a respeito de todos os outros titulos da divida fundada; e parece-me que esta mesma razão subsiste ainda para se applicar aos outros emprestimos.

Não quero no momento actual, nem me parece conveniente, vir acordar todas as susceptibilidades que pela occasião da discussão que houve nesta casa sobre os actos da dictadura, se levantaram por incidente ácerca dos emprestimos de 1835. Parece-me que nessa occasião disse que os emprestimos de 1835 carecem de uma revisão, e parece-me que esse negocio está em parte entregue á commissão de inquerito, nomeada por esta camara, sobre o banco de Portugal; e disse então, e repito hoje, que não desisto nem abdico do direito que o governo tem de fazer analysar esses emprestimos. Parece-me que nas circumstancias actuaes, depois dos sacrificios que se tem imposto aos empregados de todas as classes do estado, ao jurista, e sobre tudo aos possuidores de titulos de dívida interna e externa, e ao banco de Portugal pelo emprestimo dos 4:000 contos, não havia razão alguma plausivel para excluir os emprestimos de 1835. Não intendo, por consequencia, que a reducção que se propõe no orçamento, está fundada nos principios da justiça e de harmonia, relativamente á situação difficil do thesouro, e em relação aos principios que se teem estabelecido a respeito de outros credores da divida fundada; e por tanto parece-me que está no caso de ser approvada pela camara.

Nesta conformidade, sr. presidente, eu, sem querer fazer reviver as questões que se suscitaram por occasião da discussão dos actos da dictadura, em quanto aos emprestimos de 1835, limito-me a fazer estas poucas observações, na certeza de que a camara póde votar como intender.

O sr. Avila: — Ha uma circumstancia que parece que o sr. ministro da fazenda esqueceu, e vem a ser que o decreto de 26 de julho de 1852 foi approvado, bem como todas as outras medidas da dictadura, por considerações politicas, intendendo a maioria da camara que a não approvação dessas medidas importava uma crise ministerial, que a mesma maioria queria evitar: a prova é que quasi todos os membros da maioria que fallaram nessa discussão, se exprimiram neste sentido, e fizeram reservas relativamente á doutrina de um ou outro desses decretos, cuja revogação reputavam necessaria. Não julgo, por consequencia, justo que se cite a approvação dessas medidas como argumento para a approvação da reducção proposta. (O sr. Ministro da fazenda: — Não) O Orador, — Mas o sr. ministro não apresenta outros argumentos.

O sr. ministro disse que esta reducção não póde influir sobre o juro das operações da thesouraria, porém eu não sou desta opinião pelas razões que já expendi. Já disse que as antecipações hoje devem mentar a uma cifra superior á das antecipações em 31 de março de 1851, porque não são só antecipações as que constam dos documentos publicados pelo governo. Segundo esses documentos, as antecipações excedem hoje a 630 contos, a que é necessario juntar todos os desvios de dinheiros de cofres especiaes, que o governo deve necessariamente repôr, taes como

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alguma parte da dotação das estradas, o que se tem recebido do fundo de amortisação, e as prestações mensaes para o emprestimo dos 4:000 contos; e os encargos dessas operações devem ser tanto maiores, quanto menor fôr a exactidão com que o governo cumprir as condicções dos contractos. Esta questão das antecipações ha-de ser tractada mais largamente quando se discutir o orçamento da receita, mas não posso deixar de fazer desde já uma observação, e vem a ser que aquelles que tanto clamavam contra as antecipações, quando eu era ministro, hoje guardam completo silencio, apezar de serem as antecipações n'uma somma maior do que eram naquella época, e terem-se imposto ao paiz graves sacrificios, affiançando-se que o resultado delles seria acabar as mesmas antecipações. Isto prova que só se fazia guerra aos homens, e esta é mais uma lição que oxalá não seja perdida.

Em relação á deducção proposta, digo ainda que o credito do governo não se avalia pelo juro a que o governo levanta dinheiro sobre penhores seguros, com que o credor se póde embolsar, se o governo fallar ás suas promessas; mas sim ao juro, porque o governo descontaria bilhetes do thesouro que et casse, e rujo pagamento só dependesse da boa fé do governo. Supponha o sr. ministro da fazenda que tinha precisão de crear uma divida fluctuante deste genero de 1:000 contos de réis a 7 por cento; o que traria no thesouro um encargo annual de 75 contos de réis. Supponha s. ex. pelo contrario, que mantendo fielmente todas as estipulações dos contractos, podia descontar aquella quantia a 5 por cento, ou por 50 contos de encargo annual, resultaria daqui uma economia de 25 contos de réis annuaes, que seria unicamente devida ao melhoramento do credito.

Fallando ainda ha pouco com um cavalheiro que foi um dos ornamentos desta camara, lhe ouvi uma fraze, que peço licença para a fazer minha, porque exprime completamente o meu pensamento, e é que o fomento é o dinheiro barato — e é assim — porque sem dinheiro barato não ha melhoramentos materiaes possiveis: mas não póde haver dinheiro barato, sem que se restabeleça o credito do governo, isto é, que o governo encontre no mercado dinheiro tal a preço tal, que os capitalistas reconheçam que lhes é muito mais conveniente empregar os seus capitaes em emprezas industriaes, de quaesquer melhoramentos materiaes do que nas operações do thesouro. É este o resultado a que devem tender todos os esforços do governo; mas o caminho que se tem seguido agora, não me parece appropriado para se chegar áquelle fim. Por consequencia acabo dizendo á camara, que não posso votar por esta verba, e acho que é uma medida de descredito, de que só pódem resultar inconvenientes para o thesouro.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, eu vou dar succintas explicações ao illustre deputado; e farei diligencia por lhe mostrar, que comprehendi bem o seu pensamento.

Devo primeiramente observar no illustre deputado, que do imposto das notas para as estradas não se tem desviado somma alguma para as despezas do thesouro. Não acontece porém outro tanto em relação aos rendimentos provenientes do fundo especial de amortisação; e não é a primeira vez, que eu o declaro na camara, porque já noutra occasião disse o mesmo, e justifiquei o meu procedimento. O governo tinha de fazer operações de thesouraria; tinha de representar, a sua receita, linha necessidade de levantar dinheiro, e tinha nos cofres publicos dinheiro sem premio; por consequencia não havia de ir levantal-o na praça para as despezas do thesouro, pagando juro, em quanto tinha alli fundos sem pagar nada. Ora é claro que o governo ha-de necessariamente fazer levantar as sommas necessarias para repor esses fundos nos cofres do thesouro. Mas, se o illustre deputado é o primeiro a reconhecer que o governo fez bem, e que s. ex.ª faria o mesmo, se estivesse no caso em que eu estava, não me parece que lhe mereça censura, nem o nobre deputado ma fez. (Apoiados)

Ora em quanto ás antecipações, devo fazer outra observação; o nobre deputado reconheceu já, isto é, reconheceu e reconheceu bem, de accordo comigo, que não se podia accumullar ao deficit do anno as sommas a que chama antecipações, e que eu chamo divida fluctuante, e peço licença para insistir na minha qualificação...

O sr. Corrêa Caldeira: — Está mais na moda.

O Orador: — Está mais na moda; mas é moda velha; e quando eu me sentava naquellas cadeiras (Apontando para o lado esquerdo) e o illustre deputado n'uma destas (Apontando para o centro) já se chamava divida fluctuante; já não é nova, e não me será difficil citar nos documentos publicos este termo muitas vezes empregado. (Apoiados) Quando mesmo fosse velha ou nova, o caso é que representa a verdadeira idéa que queremos exprimir. Antecipações não podem considerar-se as sommas que o governo tem levantado; e não o são, porque o governo não tem descontado letras correspondentes ao anno economico proximo futuro, nem tem gasto um real por conta de rendimentos das alfandegas, ou de qualquer outra receita no presente anno, que pertença ao proximo anno futuro. O existirem algumas letras de contractos empenhadas, sendo o seu vencimento em annos futuros, isso não prova nada; e peço licença ao illustre deputado para lhe dizer que isso já acontecia no anno passado, e quando chegava o seu vencimento, substituia-se por outro penhor, e deixava de vir á praça; isto não é senão um meio de representar a receita do anno, e uma vez que o governo tenha com que substitua o penhor, nunca póde haver receio de irem á praça.

A comparação entre o que estava antecipado em 31 de março de 1851, e o que está antecipado actualmente, não pertence a mim, que entrei no ministerio da fazenda em 22 de agosto; ha por consequencia um lapso em que se fizeram antecipações; e dizendo isto não quero fazer censura ao ministro que as fez, de quem sou amigo e respeitador; mas tendo-se feito uma antecipação sobre as decimas da contribuição dilecta do anno economico futuro, por consequencia achei já uma somma maior do que a que existia em 31 de março de 1851. Acontece ainda outra cousa, e é desde então para cá tenho pago pontualmente em dia, e se acaso o governo, em logar de pagar em dia, tivesse continuado a pagar como se pagava, 10 mezes no anno, saindo da obrigação em que me colloquei, e que tenho cumprido religiosamente, de pagar um mez em cada 30 dias a todos os servidores do estado, não existia mais divida fluctuante do que aquella que existe no mappa respectivo, e mesmo nem essa existiria. Estou citando factos; não estou fazendo nem allusões, nem censuras; estou justificando-me.

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Ora disse o illustre deputado, que esta reducção imporia, uma violação dos contracto», e que talvez, se obtivesse dinheiro a 4 e a 5 por cento, se não fosse esta violação. Peço licença para dizer ao nobre deputado que acceito os seus bons desejos; mas julgo impossivel que o nobre deputado chame violação de contractos solemnes ao que este governo tom feito a este respeito, quando é certo que as administrações anteriores que nunca violaram contractos desta maneira, estou fallando no sentido da argumentação do nobre deputado, nunca tiveram a fortuna do levantar dinheiro a 4 e a 5 por cento. As operações de thesouraria não se faziam por esse preço; faziam-se por um preço mais subido; e a consequencia dos factos, a consequencia mesmo dessas operações que o governo tem feito, o que os nobres deputados querem dizer que trazem desci edito para o thesouro, mas que os factos demonstram que não, é que as operações do thesouro se fazem hoje a 7 por cento, o em outro tempo se faziam a 12, e a 10; (O sr. Avila: — A 10 e a 9) mas eu faço-as mais baratas, apezar de todo esse descredito. Pois isto de eu as fazer mais barato, não provará alguma cousa a meu favor. O ministro da fazenda parece, pelo que se diz, que está dando machadadas na arvore do credito: mas não acontece assim, e peço licença para invocar este facto do juro, porque encontro dinheiro a meu favor, e para me justificar com elle.

O illustre deputado tem razão: o fomento é o dinheiro barato; tem razão; mas se eu provo que depois da gerencia da administração de que faço parte, o dinheiro esta mais barato que antes, parece-me inquestionavel, mesmo pela argumentação do nobre deputado, que tenho dado alguns passos para o lai fomento, de que tanto se falla de um o outro lado, mas que nem por isso, apezar de tudo quanto selem dito, creio que póde ser desattendido pela camara, nem pelo illustre deputado.

Por consequencia concluindo digo, que fiz estas pequenas e succintas observações para uma vez por outra justificar-me das increpações successivas, que me fazem alguns illustres deputados sobre o descredito publico, e as mas condições em que eu tenho collocado a fazenda; e por ora, depois das observações que eu fiz ha pouco, não me resta mais a accrescentar para insistir ainda na minha opinião primitiva de que esta verba inscripta no orçamento e adoptada pela commissão de fazenda, deve ser approvada.

O sr. Cazal Ribeiro. — Sr. presidente, o illustre deputado, o sr. Avila que encetou este debate, declarou que não podia votar pela verba do artigo 1.º deste capitulo, porque não se conforma com a razão de coherencia apresentada pela commisão do fazenda Para isto o nobre deputado indicou os motivos que o corpo legislativo teve na votação do decreto de 18 de dezembro. Eu peço licença ao nobre deputado para observar que não me parece que possa ser argumento para interpretar uma disposição legislativa, as observações que um ou outro orador produz num debate.

Quanto á minha opinião individual sobre o decreto de 18 de dezembro, pronunciei-a já, e ainda hontem a repeli na camara. Mas hoje não vejo as opiniões isoladas que se produziram no debate, vejo o facto da votação do parlamento, e o facto é que este decreto de 18 de dezembro esta convertido em lei. Resta saber, se os principios que o dictaram são ou não applicaveis nos emprestimos de 1835.

O illustre deputado, para mostrar que não havia analogia entre os emprestimos do 1835, o os emprestimos cujo juro foi reduzido a 3 por cento, recorreu á natureza original daquelles emprestimos. Mas no mesmo ruso dos emprestimos de 1835 estavam os emprestimos que foram postos a cargo do fundo especial de amortisação; esses tambem oram pagaveis, tambem deviam ser pagaveis em curto espaço, e entretanto pelas urgencias do thesouro converteram-se em unia especie de divida fundada.

Foi isto o que succedeu aos emprestimos do 1835, tinham sido contrahidos para se pagarem em curto prazo, mas não foram pagos, continuaram a vencer por muito tempo o juro de 5 por cento, o quando começou a amortisação das notas, foi então que começaram a ter amortisação.

Portanto já se vê que não lendo a outra divida do estado, além do emprestimo dos 4:000 contos, amortisação, estes emprestimos teem além do juro amortisação, e amortisação ainda muito mais forte que outra qualquer divida: por consequencia longe de serem desfavorecidos, comparando estes emprestimos com o resto da divida collocada em identicas circumstancias, ainda ficam estes emprestimos em situação mais favoravel que o resto da divida. Foi por este motivo que a commissão intendeu que procediam as razões de coherencia, e que vendo convertido em lei o decreto de 18 de dezembro não podia deixar de applicar o mesmo principio aos emprestimos de 1835.

Depois desta explicação vou dizer alguma (ousa sobre um outro artigo, que pertence a este capitulo, a respeito do qual preciso tambem dar algumas explicações.

É o artigo 14, que tracta da verba de 136:300$000 réis, para occorrer ao pagamento dos juros das obrigações do thesouro, mandadas crear por decreto de 30 de agosto de 1852, que comprehende os juros pagaveis pela inversão das acções passadas e a passar sobre o fundo especial de amortisação, entrado nestas a divida á companhia das obras publicas de Portugal. A respeito deste artigo devo dizer alguma cousa. Ha questões que costumam trazer a camara uma certa irritação, e eu desejo affastar do debate toda a irritação: eu declaro que no que vou dizer, não tenho censura alguma a fazei, nem emitta o governo que approvou a liquidação, nem contra as pessoas que nella intervieram em qualquer posição official que occupassem. Eu não tenho mesmo uma opinião formada, positiva e invariavel sobre, a justiça ou injustiça desta liquidação; mas sei e sabe toda a camara, e sabe o paiz que sobre a divida do estado a companhia se tem suscitado mui graves apprehensões sobre se effectivamente se deve a companhia tudo quanto se lhe liquidou. A (amara mesmo não ignora que a direcção do fundo de amortisação recusou-se a acceitar uma parte desta liquidação, e que isto deu occasião a graves questões nessa época

Eu não sei de que lado estava a razão, nem e preciso sabel-o para o fim a que me dirijo: se estava do lado do governo, então essa parte comprehendida na liquidação deve tambem ser comprehendida nas obrigações do thesouro, creadas pelo decreto de 30 de agosto de 1852; se a razão estava do lado contrario, então não, porque não se póde reputar comprehen-

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dida na divida que estava a cargo do fundo especial de amortisação essa parte que a direcção recusou tomar.

A companhia tem reclamado por varias vezes á camara, e ultimamente mesmo, contra as disposições do decreto de 30 de agosto de 1852, julgando-se lesada pelas disposições daquelle decreto; por outro lado este juro não tem sido até ao presente pago, e esta é a primeira vez que se vota uma verba para o pagamento deste juro.

Eu repito, não sei se a liquidação é boa ou má, mas sei, e isto sem referencia nem a pessoas nem a cousa particulares, que nós temos tido muitas vezes facilidade em reconhecer dividas, e difficuldade em as pagar. Ora quando se é muito facil em reconhecer a legitimidade de certas dividas, isto traz comsigo a difficuldade de as pagar; a divida cresce muito, e depois não se paga, e isto é bastante inconveniente.

Sei tambem que sobre este ponto da liquidação dos creditos respectivos á companhia das obras publicas de Portugal, houve um projecto de lei apresentado na outra casa do parlamento, assignado por muitos dignos pares, inclusivamente o nobre duque de Saldanha, em que se impugnava esta liquidação, e se pretendia que ella fosse entregue ao poder judicial; propoz-se depois disto uma commissão de inquerito, que não chegou a ser nomeada; sei que entre os documentos que se apresentaram ás camaras ha o parecer do procurador geral da corôa, que impugna em parte algumas das verbas comprehendidas nessa liquidação, e particularmente a verba dos 500 contos pela qual foi contractada entre a companhia das obras publicas e a companhia Lombré a cedencia da estrada de Lisboa ao Porto; nesta parte aquelle illustre magistrado impugna mesmo a legalidade daquelle credito. entre outros documentos apresenta-se tambem um officio do inspector geral das obras publicas em que taxa de exaggerados alguns dos preços propostos pela companhia para a sua liquidação.

Sr. presidente, eu repito que não tenho motivos para suspeitar, nem suspeito; mas n'uma questão que tem suscitado tantas apprehensões; sobre uma divida que é agora a primeira vez que se propõe ao parlamento uma somma para pagamento dos seus juros; e muito principalmente quando os proprios credores recusam essa forma de pagamento, a qual reputam lesiva de seus direitos, quando a camara não ha muito tempo votou um inquerito a respeito de outra liquidação e ácerca de outro objecto, não intendo que a camara possa deixar de applicar a mesma regra á companhia das obras publicas de Portugal. intendo que a camara votando a commissão de inquerito ao banco de Portugal, não por motivos de odio nem aqui póde haver o dio para com este ou outro qualquer estabelecimento publico, (Apoiados) digo, intendo que a camara votando, como votou, a commissão de inquerito com o desejo muito louvavel, como uma coisa necessaria até, de se certificar bem — se todos os creditos do banco de Portugal estavam ou não bem liquidados; se effectivamente se devia aquillo que se dizia ser devido; isto que a camara votou a respeito do banco de Portugal com relação á liquidação dos emprestimos de 1835, logo que sobre essa liquidação appareceram duvidas, o mesmo, e pela mesma razão deve a camara applicar á companhia das obras publicas de Portugal, e por

Isso eu tenho de submetter á approvação da camara uma proposta neste sentido.

Mas antes de a mandar para a mesa, e de terminar as minhas observações, devo declarar que ap provo a verba proposta no orçamento para o pagamento dos juros respectivos á divida do estado para com a companhia das obras publicas de Portugal, assim como approvo a verba dos juros correspondentes aos emprestimos de 1835, feitos pelo banco ao estado. E a commissão de fazenda declarou no seu relatorio, que foi com esta condição que votava estas verbas; isto é, declarou que não entrava na questão de liquidação, a qual não ficava prejudicada, assim como não fica prejudicada a questão de liquidação dos emprestimos de 1835, nem a questão da liquidação da divida do estado para com a companhia das obras publicas de Portugal. A commissão de fazenda declarou no seu relatorio muito claramente, que qualquer que fosse a alteração que possa soffrer a liquidação dos emprestimos de 1835, em virtude do inquerito a que a camara mandou proceder, o pagamento dos juros destes emprestimos devia continuar sem interrupção, tomando se por base as liquidações existentes, sem prejuizo dos direitos do estado; e que partindo deste mesmo principio, e com as mesmas reservas, a commissão propunha a verba de juro respectivo á divida pertencente á companhia das obras publicas de Portugal. Eis aqui está o que a commissão diz; eis aqui está o que eu sigo ainda, e intendo que deve seguir-se nestes dois pontos tão importantes.

Ora para collocar, ou para ficarem, como devem ficar, em perfeita igualdade de circumstancias uma e outra divida, eu passo a mandar para a mesa uma proposta, para que esta camara nomeie uma commissão de inquerito composta de 5 membros, para examinar a legalidade na liquidação dos creditos da companhia das obras publicas de Portugal. A proposta é a seguinte (Leu-a). O sr. Presidente: — A proposta fica sobre a mesa para se lhe dar o andamento na occasião propria.

O sr. Canha Sotto-Maior. — Sr. presidente, tanto o sr. ministro da fazenda, como o sr. deputado que acaba de fallar, não tractaram a questão como ella deve ser tractada. Tanto um como outro puseram de parte o fim principal da questão; não disseram sobre ella uma unica palavra.

A questão é esta: tracta-se dos emprestimos de 1835. Quero que o sr. ministro e o sr. deputado digam, em que decreto, dos 235 da dictadura, vem a determinação da diminuição dos juros dos emprestimos de 1835, de 5 a 3 por cento? O decreto de 18 de dezembro de 1852, que reduziu o juro de toda a nossa divida consolidada interna e externa, que reduziu até os juros do emprestimo de 4:000 contos; a respeito dos juros dos emprestimos de 1835 não diz nem uma palavra; mas agora o governo com a commissão de fazenda accordaram em metter aqui no orçamento essa reducção, de que não resa nem um só dos decretos da dictadura. Isto é uma cousa inteiramente nova. Emprazo o sr. ministro da fazenda; emprazo toda a commissão de fazenda para me dizer qual o decreto, em virtude do qual esta deducção vem no orçamento? A questão tracta-se assim: os emprestimos de 1835 não soffreram reducção alguma nos seus juros, por effeito de determinação de qualquer dos decretos da dictadura; não ha um só que diga uma unica pa-

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lavra a este respeito; se lia algum decreto da dictadura, que reduza os juros do emprestimos de_ 1835, digam-me qual é? (O sr. Cazal Ribeiro: — E o decreto de 26 de julho, que fixa a receita e despeza do estado). Sei muito bem, sei que são os 25 por cento a que o illustre deputado se refere; mas faça a conta, e veja se por essa lei ficam os juros reduzidos a 3 por cento? Aqui está uma cousa que talvez o illustre deputado ignorava; julgou que eu ignorava que existia o decreto de 26 de julho, que estabelece a deducção dos 25 por cento! Esta e muito galante! Eu peço a s. ex.ª que faça a conta, e depois tenha a bondade de me dizer, se os 25 por cento de deducção dào uma reducção dos juros a 3 por cento? Que resultado ou que vantagem tirou o sr. deputado para o seu caso da interrupção que me dirigiu? Quando se interrompe um orador, que está fallando, ha, por via de regra, o fim de fazer uma tal ou qual impressão no animo do orador, e indicar que ficou sem rasão; mas agora não aconteceu assim; quem ficou sem rasão, quem perdeu, não foi o interrompido, foi o interruptor.

O decreto de 18 de dezembro de 1852 tractou de tudo, e tractou tambem da reducção dos juros do emprestimo dos 4:000 contos; mas não tractou dos emprestimos de 1835; ácerca delles não diz nem uma palavra. Eu, quando se tracta aqui das questões do banco, fico envergonhado; eu não tenho nada com o banco; tudo, tudo com a camara, e fico envergonhado da triste figura que faz o governo. A questão dos emprestimos feitos pelo banco em 1835, é exquisita, celebre, extraordinaria e curiosa. Ora, sr. presidente, nomeou-se uma commissão de inquerito, mas ainda não inquiriu, O sr. ministro da fazenda disse que havia de rever, mas ainda não reviu. Isto prova que não ha uma opinião formada definitivamente acerca deste objecto, prova até certo ponto carencia absoluta de razão para se dizer o que se disse; isto mostra que as insinuações, as calumnias que diariamente aqui se assacaram contra o banco por causa dos emprestimos de 1835, eram destituidas de todo o fundamento, e dictadas unicamente pela vontade, proposito e capricho de fallar contra o banco! O que se vê de tudo isto é o seguinte. Fallou-se muito contra os emprestimos de 1835; repito, esta camara nomeou uma commissão de inquerito, mas a commissão não inquiriu; o sr. ministro da fazenda disse, que havia de rever, mas não reviu; e desde certo tempo para cá nem uma palavra se tem dicto mais contra os emprestimos de 1835, e vem designada no orçamento a somma para os juros destes emprestimos, o que prova que estes emprestimos são legaes. Mas apoz isto vem logo a reducção desses juros a 3 por cento! Eu não posso concordar com a reducção que vem proposta no orçamento, porque não ha lei que auctorise essa reducção.

Se pois as verbas que vem no orçamento, todas estão, segundo se tem sustentado, e não podem estar senão em virtude da lei, pergunto qual e a lei que auctorisa esta Verba de que se tracta, e por consequencia a reducção dos juros dos emprestimos de 1835? Emprazo positivamente o sr. ministro da fazenda, assim como a commissão de fazenda para que me digam qual foi a lei ou decreto da dictadura, que auctorisou a reducção dos juros de 3 por cento;

Ora se o juro de 3 por cento é o unico legal que se deve estabelecer para todas as transacções futuras, muito bem; mas a respeito de dinheiros que foram emprestados sobre penhores e com a condição solemne de que se daria por isso o juro de 5 por cento, e uma coisa inaudita! Quer fazer-se uma coisa que a dictadura ainda não fez. A dictadura se reduziu o juro a tudo, comprehendeu até o emprestimo dos 4:000 contos, mas quando chegou aos emprestimos de 1835, não disse uma palavra. Apresentou-se o orçamento; e sem mais nem menos, sem nenhuma declaração disse — reduziram-se os juros dos emprestimos de 1835! — Não intendo a razão disto.

Ha mais ainda; se o juro de 3 por certo deve ser o unico legal, porque rasão para o caminho de ferro, além da amortisação, se estabelece o juro de 6 por cento, e não o de 3 por cento? Para que vamos dar um effeito retroactivo á lei em relação a contractos de ha muito celebrados, desde 1835? Para que é ir estabelecer desde já uma excepção odiosa, dando 3 a quem se prometteu dar 5, e dando 6 quando se diz que o juro legal deve ser de 3 por cento? Em relação a contractos legaes e já celebrados, dizeis que não se deve nem póde dar senão 3 por cento; e em relação a contractos futuros estendeis esse juro a 6 por cento! Eu não approvo este capitulo; sei que da minha approvação ou rejeição não vem nem bem nem mal á camara; mas quero consignar aqui o meu voto, porque não estou para approvar cegamente todas as coisas que o sr. ministro da fazenda e a commissão se lembram de propôr; não sou escravo da gleba, nem forçado das galés, e isto aqui não é um serralho mourisco. Qual é a lei que auctorisa esta reducção nos emprestimos de 1835? Se acaso o sr. ministro e a commissão de fazenda tiverem bastante habilidade para me citarem uma lei, e nessa lei a disposição que eu peço que me mostrem, declaro que me comprometto a votar pelo artigo.

O sr. José Estevão. — Sr. presidente, eu não pedi a palavra propriamente para entrar nesta questão, porque ella tem defensores habeis e naturaes; mas o illustre deputado e nosso sympathico amigo, o sr. Cunha, alludiu aos trabalhos da commissão de inquerito (O sr. Cunha Sotto-Maior: — Não alludi) e disse que a commissão de inquerito não inquiria; por isso eu pedi a palavra para informar o illustre deputado de que a commissão de inquerito não tem largado mão da sua tarefa, e que tem feito as diligencias precisas para haver os documentos sobre os quaes ha de instaurar as suas investigações; o banco tem, com as demoras naturaes de pedidos de contas e esclarecimentos tão complicados, satisfeito ás requisições da commissão. Sobre essas requisições a commissão vai continuar os seus trabalhos, procurando associar a si tudo o que puder esclarece-la e coadjuva-la. Póde por consequencia o illustre deputado estar certo de que a commissão inquire, e que ha de dar conta do seu inquerito.

Sr. presidente, visto que estou de pé, permitta-me v. ex. que enuncie aqui uma opinião, opinião minha a este respeito, que diga a razão do modo porque voto neste artigo.

Eu não sei porque lei está auctorisada a reducção dos 3 por cento applicada aos emprestimos de 1835; não sei qual é a lei da dictadura que o determina; não sei qual é o decreto em que se estipula isto; sei só que esta é a camara dos deputados da nação portugueza, que está regendo a carta constitucional com o seu acto addicional, e que esta (designando o parecer da commissão) é a lei do orçamento.

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Já foi depois de glandes luctas parlamentares dissolvida uma camara, e dissolvido um partido, por sustentai, à tort el à travers, que a lei do orçamento era um acto nullo, não tinha a importancia de uma lei, e o corpo legislativo não estava auctorisado para introduzir nelle, nos diversos ramos de administração publica, todas as reformas que intendesse melhor; -essa doutrina foi portanto stigmatisada por grandes calamidades publicas, por grandes luctas politicas, e para mim, desde então e hoje, sempre foi doutrina corrente que a lei do orçamento e uma lei superior a todas as outras, que o corpo legislativo esta na plenitude do -eu direito para reformar, cortar, additar, augmentar, diminuir ordenados, pensões, juros, e tudo quanto pertencer á despeza publica. Portanto eu intendo que a reducção e feita em virtude desta mesma lei. O illustre deputado diz que os deputados têem alguma distincção, que não e servo da gleba; não lhe contesto isto; mas a fallar a verdade ligar com esta doutrina de independencia um certo escrupulo em votar uma reducção de juros que não estava votada pelas leis da dictadura, e uma grande incongruencia. Pois se o sr. ministro da fazenda pelos seus actos dictatoriaes não se atreveu, ou não oppoz, ou não julgou justo que se applicasse a reducção dos 3 por cento a certo numero de emprestimos, por ventura ficaria inhibida a camara de applicar essa mesma reducção! Pelo menos não julgo que a omissão dos srs. ministros nos obrigue a segui-los irremissivelmente. Portanto, sr. presidente, eu creio que a reducção dos 3 por cento e votada não porque venha ou deixe de vir nas leis da dictadura, mas porque a commissão a propõe, e porque a camara a vota — se a camara a quizer votar.

Sr presidente, é preciso que acabemos de uma vez para sempre com estas distincções de juros, e com estas insinuações sobre caminhos de ferro. Não ha nenhum privilegio para o caminho de ferro a respeito de nenhuma companhia; se o banco de Lisboa (e isto não é insinuação nenhuma, não me importa que se associe ou não a empreza) ou outro qualquer capitalista que o illustre deputado conheça, ou que não conheça, se quizer associar á empreza a que se dá 6 por cento, tem-no na sua mão Se o privilegio fosse dado a certas e determinadas pessoas; se o privilegio não fosse livre have-lo e goza-lo a todos os individuos que se quizerem sujeitar ás condições prescriptas pela lei, então havia razão em se queixarem; mas o privilegio e livre.

Sr. presidente, estes escrupulos sobre a retroactividade das leis e sobre a falta de credito que têem os poderes do estudo para poderem diminuir os juros da divida fundada, permitta-me o illustre deputado que lhe diga, são uma tristissima illusão introduzida pelos grandes patriarchas das finanças na questão do banco, pela qual o querem arrastar aos tribunaes, donde não póde resultar senão protrairem com grave prejuizo das fortunas que lhe estão confiadas, esta questão, privarem o paiz dos beneficios do desenvolvimento do credito, e o banco dos lucros que póde tirar, porque em quanto o banco estiver neste estado, esta em estado de vacillação, e em estado de perigo.

Eu sei que alguns cavalheiros, simplesmente por espirito artistico, por quererem fazer uma demanda de tudo, intendem que indo com o principio da não retroactividade aos tribunaes, o banco sae triunfante a todos os poderes do estado são condemnados; mas o illustre deputado sabe perfeitamente, porque e um homem esclarecido, quando ha a necessidade publica, o que vale o principio da não retroactividade; encarrego ao illustre deputado o sr. Avila que lhe explique essa theoria (Riso) elle sabe-a perfeitamente.

Portanto, sr. presidente, não ha principio nenhum de não retroactividade, quando chega a necessidade publica. Temos lido abundancia de ministros patriotas, e todos têem lido o braço desembaraçado e o coração bastantemente endurecido para darem golpes, e golpes energicos.

O banco pois com o principio da não retroactividade, ainda mesmo desenvolvido em grande pela voz tão eloquente do illustre deputado, está em pessima condição.

Eu voto pela reducção dos juros dos emprestimos de 1835 a 3 por cento. Eu já disse que o decreto da dictadura que reduziu os juros, era o decreto mais civilisador de todos, e vou dizer a camara a razão; e porque em materia de divida fundada foram-se todas as fantasmagorias, e, diga-se a frase, foram-se todas as tranquibernias. Estas cartas estão tiradas das mãos nos financeiros, porque para baixo de 3 por cento é banca-rota, menos não se póde fazer; mais tambem pode ser, porque o paiz não consente; e agora mettidos os financeiros entre estes dois extremos, acabaram as escalas ascendentes, e todas essas alchimias que têem perdido o paiz. O que quero é metter entre estes dois extremos a sciencia tão fecunda dos financeiros, porque o meu empenho é que os financeiros não possam desinvolver a sua sciencia; quanto menos elles desenvolverem a sua sciencia, menos nos mostrarem os seus dotes, mais feliz está o paiz. Menos não póde ser, mais tambem não, ora dentro destes dois extremos que operações se podem fazer? Nenhuma, nem ha escuta ascendente, nem enviados a Inglaterra (Riso) nem cousa nenhuma; acabou tudo, permitta-se-me a frase, o financeiro por aqui vai barrado. (Riso) Agora resta-lhes ainda o valor de exercitar as suas virtudes n'outras cousas, mas daqui estão riscados. Portanto juro de 6 por cento não se póde conceder por principio nenhum, porque é uma uzura. Voto pela reducção do juro a 3 por cento, porque e o juro que se póde pagar para casos ordinarios, e credito simplesmente ordinario; senão tiver resultados melhores, isto é, o de converter-se em bens leaes e positivos, porque quanto a esse credito voto mais, porque este é que é o meu fomento, que representa melhoramentos tangiveis e que se cifra em muitas estradas em todas as direcções; em muitas escólas, em muitos estabelecimentos de caridade, não da caridade antiga, mas da caridade moderna illustrada, caridade que não reconhece só a competencia da camara para remediar certos males.....

O sr. Presidente. — Mas eu pediria ao sr. deputado que voltasse á questão.

O Orador. — Eu como contava já com a admoestação de v. ex.ª ía affouto. Agora tenho concluido. Voto por 3 por cento para toda a divida, e voto por 6, 8 ou 10 para todos os capitaes que se quizerem associar para emprezas reaes e uteis para o paiz; digamos para o fomento, para o fomento que pedia o sr. Avila e pedia o sr. Silva Carvalho, porque o fomento é antigo, mas até agora ainda não vimos os seus resultados..Nas primeiras idades já nós sabemos o que dava até ahi; agora daqui por diante veremos o que da.

O sr. Roussado Gorjão — Sr. presidente, quando

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eu ouvi o meu illustre collega e respeitavel amigo o sr. Cunha fallar a respeito da commissão de inquerito, dizendo — que não inquiria — pedi a palavra, por que não tinha ouvido que o illustre relator da commissão a tivesse pedido. Entretanto já que me levantei, e tive a palavra, intendo que sem indiscrição poderei informar a camara de alguma cousa mais.

Eu estou persuadido que n'um objecto tão serio e tão grave, como é a incumbencia de que está encarregada a commissão de inquerito, ella deve ser neste assumpto o mais circumspecta e mais cautelosamente reservada que possa ser, e como se deve ser em objectos de tal magnitude. Mas eu não creio que falte nem a essa circumspecção nem a essa reserva, quando eu disser a v. ex.ª e á camara que a commissão de inquerito não deixou ainda nem por um momento de se occupar muito seriamente daquelle inquerito. Desde que a commissão recebeu o diploma em que lhe vinham designadas as incumbencias de que linha que tractar, reuniu-se uma vez para conceber o principio do seu plano, e desde logo foi ao local do banco de Portugal, se me não engano foi no dia 29 de março.

A commissão faltaria ao seu dever se deixasse de fazer menção da maneira honrosa, porque foi recebida por aquelle estabelecimento, e não cumpriria o seu dever para com a camara, se deixasse de dizer que naquelle mesmo dia fez a sua primeira requisição. Eu fallo de requisição, porque a commissão intendeu que devia obter tudo quanto eram documentos especiaes em assumptos que podessem servir de ponto de partida para todas as operações que tinha a seguir posteriormente.

A commissão fez pois a sua requisição, e devo dizer que são mais faceis de fazer do que de satisfazer. O banco tomou unicamente o tempo que julgou indispensavel para satisfazer a essas requisições, e por isso posso asseverar a v. ex. e á camara que a commissão não descança um momento em levar á exacta e plena execução tudo quanto lhe foi incumbido, e desde o momento em que intender que deve fazer conhecer á camara qual o resultado dos seus trabalhos, não se descuidará de o fazer.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, eu levantei-me para dizer poucas palavras. Em primeiro logar direi ao illustre deputado — que o orçamento ainda não é lei; é um projecto de lei; mas ainda quando o fosse, eu na qualidade de deputado posso discutir todas as leis, porque tambem posso discutir a constituição do estado que é a lei das leis. Mas este é um projecto que a camara póde approvar ou rejeitar ou alterar, como bem lhe parecer, e tanto já se intendeu assim, que para approvar os juros da divida fundada disse-se da parte da maioria que a camara não podia invocar o orçamento como lei, porque seria contradictoria comsigo mesma, porque já approvou os actos da dictadura. Segundo vejo a mesma razão não vigora para agora.

Eu insisto em perguntar, qual a lei que reduziu estes juros? O dizer-se que o orçamento e uma lei, não estou por isso; o orçamento só é lei depois de passar em ambas as casas do parlamento, e ler obtido a approvação da Soberana.

Agora em quanto ao nobre deputado ter dito — que o juro de 3 por cento e o unico e o ultimo que se póde pagar — com quanto acredite a sinceridade do seu desejo, confesso que tenho muitas desconfianças a este respeito. Parece-me que ainda hoje, (quasi que posso asseverar que é verdade) n'um jornal (a Revolução de Setembro) que passa por ser propriedade do illustre deputado, vi emittida a idéa — que nem os 3 por cento se podiam pagar. — Quando o illustre deputado fôr para casa, peço-lhe que faça o favor de vêr a sua propriedade, e lá achará esta idéa — que os 3 por cento não se podem pagar, que ainda é muito.

Em quanto á diminuição ou augmento do juro, direi que a seu tempo se verá o que é que o conselheiro Paiva Pereira foi fazer a Londres; eu quero esperar pelos factos; então se verá se o juro ou o capital, ha de ou não ser levantado aos credores inglezes. Eu tenho desconfiança que a missão de que se encarregou o conselheiro Paiva Pereira, não foi para conservar os juros a 3 por cento; mas em todo o caso, se o juro não fôr reduzido, e se se augmentar o capital, a cousa é a mesma, porque tanto faz bater-lhe na cabeça como na cabeça lhe dar. (Riso)

Agora é necessario que a camara e o illustre deputado que me increpou severamente, saiba, que eu tambem sou fomentador, e não ha ninguem que deixe de querer a prosperidade do seu paiz mais ou menos desenvolveu (Apoiados). Mas quando ouço fallar em fomentos tangiveis, em estabelecimentos de caridade e de beneficencia, em escólas de instrucção primaria e secundaria, em estradas, em canaes etc, quero que me digam, que estradas, que estabelecimentos, e escólas tem creado?... Sr. presidente, voto contra o artigo tal qual está; e nada mais direi porque conheço que a camara realmente está cançada, e mesmo porque com estes calores caniculares não ha muita maré do argumentar.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Pedi a palavra unicamente para dizer ao illustre deputado, que acabo de fallar, que a razão porque inclui no orçamento esta verba a respeito da reducção dos juros, é porque, bem ou mal, e a camara o decidirá, considerei estes emprestimos de 1835 como divida fundada; e nisto vou coherente com as minhas opiniões anteriores, porque no orçamento que eu apresentei á camara no anno passado, e que não passou em consequencia de ser dissolvida a camara, já vinha incluida esta mesma reducção.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para quinta feira é, em primeiro logar, o parecer da commissão de verificação de poderes a respeito das vacaturas; depois, se houver tempo, o projecto n.º 46, sobre a publicação das contas das camaras legislativas, e a continuação da discussão do orçamento. Está levantada a sessão — Eram quatro horas da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo.

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