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2810 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Aqui tem v. exa. a rasão porque as obras que em 1730 poderiam ser consideradas espectaculosas, o não podem ser na actualidade.
Podia mesmo o illustre parlamentar retroceder um pouco mais; podia ir ao século XV, podia ir ao principio do século XVI.
Houve um período, sr. presidente, em que neste paiz se pensou a serio no desenvolvimento das nossas relações commerciaes.
Foi a idéa fundamental de disputar aos mouros o commercio do oriente que determinou a descoberta de um novo caminho para a India.
E as viagens faziam-se com as dificuldades e delongas e perigos que só podiam ser arrostadas pela heroicidade dos portuguezes!
Por effeito d'esta idéa fundamental e sublime poderam fazer-se essas descobertas, que tanto glorificaram o nome portuguez!
Atraz d'esaa idéa fundamental veiu a idéa da conquista, e á corôa portugueza póde entregar-se a vassalagem do mundo quasi inteiro!
A fé christã estendeu-se, Portugal chegou ao apogeu de toda a sua gloria, e o nome portuguez foi respeitado rio mundo inteiro!
Esta idéa fundamental do desenvolvimento do commercio nacional, que foi causa de tanto lustre e de tanta gloria para o nome portuguez, ainda não teve uma consagração material condigna; porque no espirito do rei venturoso, ao mandar edificar o convento dos Jeronymos, de certo presidia mais a idéa de conquista e a extensão da fé, do que a idéa fundamental, que foi a origem e a causa de todas as outras.
Pois, no espirito das construcções modernas, a que preside a simplicidade e a utilidade, não ha padrão mais apropriado para a glorificação d'aquella idéa tão grandiosa como as muralhas do porto de Lisboa!
Façam-se essas muralhas; essa obra espectaculosa, como lhe chamou o illustre parlamentar, se não servir para mais nada, basta que sirva para isso! (Muitos apoiados.)
Vamos agora ao orçamento das obras
Diz o illustre parlamentar:
«Appareceram projectos excessivamente mais caros, e foi preciso que chegássemos a um orçamento de 15.000:000$000 réis para se fazer passar a lei que auctorisasse as obras.»
Diz-nos mais s. exa., historiando a apresentação dos projectos:
«Veiu primeiro o projecto da commissão de 1871, que importava em 8.000:000$000 réis, appareceu em seguida o do engenheiro Coode, que importava em 5.500:000$000 réis; porque se não lançou logo mão deste que era mais barato? Deixou-se de lado e esperou-se que o orçamento chegasse a 15.000:000$000 réis para se fazerem as obras!»
Esta é a summula da discussão sobre orçamentos do illustre parlamentar.
Como é que s. exa. aprecia as obras para o porto de Lisboa? Pela verba final do orçamento.
Com a natureza das obras, com a sua importância e com o que podem produzir não se importa o illustre deputado.
S. exa. podia assim ir muito mais longe. Apresentava aqui um projecto de lei concebido nos seguintes termos:
«É o governo auctorisado a fazer as obras do melhoramento do porto de Lisboa a quem offerecer fazel-as por menor preço.»
Apparecia quem se propozesse fazel-as por 1:000$000 ou 2:000$000 réis; projectava uma pequena ponte, por exemplo; pois bem, estava o projecto preferido, e a obra feita por esse preço. (Apoiados.)
Isso não póde ser.
A importancia final do orçamento só por si não significa que uma obra é cara ou barata. Uma obra considera-se cara ou barata segundo o que ella produz. (Apoiados.)
O que é verdadeiramente caro é o que não dá um producto correspondente á despeza. (Apoiados.)
E, sobretudo, o que é indispensável é que, quando se comparam projectos se não attenda só á verba total do orçamento, mas que se veja tambem a natureza das obras projectadas.
Comparemos, por exemplo, o projecto da commissão de 1871 com o projecto de sir John Coode, que o illustre deputado queria que fosse acceite logo que appareceu, porque o reputava mais barato do que os que tinham sido apresentados anteriormente.
No projecto de 1871, os preços de todas as obras a realisar, que foram consideradas pela commissão, sommavam uma importancia total de 8.200:000$000 réis; no projecto do engenheiro John Coode era de 5.000:000$000 réis a importancia total das obras que projectava entre a Rocha do Conde do Obidos e Porto Franco.
A importancia total destes orçamentos póde porventura significar que o primeiro é mais caro que o segundo? Não basta ver a importância total é necessario tambem attender á natureza das obras que estão projectadas.
Ora vejamos:
No projecto da commissão de 1871 incluiam-se obras que não eram melhoramentos marítimos do porto; por exemplo: uma alfândega, orçada em 2.000:000$000 réis, um túnel, projectado entre o largo do Corpo Santo e o largo do Pelourinho, orçado em 70:000$000 réis, três fortificações, orçadas em 100:000$000 réis, uma transformação na actual alfândega de 50:000$000 réis.
Também as obras produziam logo uma conquista de terrenos, e a venda dos terrenos disponíveis, computada pela commissão ao preço diminuto de 2$25 réis por metro quadrado, produzia uma receita de 500:000$000 réis. No projecto Coode não ha venda de terrenos.
Ora, deduzindo estas verbas que se referem a obras independentes dos melhoramentos do porto, já importava em menos do que o projecto Coode o projecto da commissão de 1871.
Parece então que deveria ser este o preferido ao do engenheiro Coode.
O illustre deputado faz isto. Se o projecto tem em cima «projecto das obras de melhoramento do porto de Lisboa» e por baixo «dois ou 3.000:000$000 réis» prefere este a qual quer outro que em baixo apresente uma verba maior e não vae ver se essas obras são ou não convenientes e suficientes para o trafego mercantil do porto.
No projecto podem figurar mesmo obras que em nada, ou quasi nada, se refiram ao melhoramento marítimo ou commercial propriamente dito. (Apoiados.) Mas s. exa. não se importa com isso, escolhe sempre àquelle cuja importância final mencionada é menor.
É por isso que chegou mesmo a vir dizer nos que apenas se apresentou o projecto Coode, visto que elle (segundo o seu systema) era mais barato do que o da commissão de 1871, devíamos rasgar este immediatamente.
Em seguida a isto continua o illustre deputado e diz-nos:
«Depois de se terem apresentado todos estes projectos, apparece o de 15.000:000$000 réis; e como é o mais caro é exactamente àquelle que se vae acceitar.»
Peço licença a s. exa. para lhe dizer que antes de apparecerem todos os projectos que citou para os melhoramentos do porto de Lisboa já se tinha apresentado outro cujo orçamento era de 15.000:000$000 réis.
Esse projecto foi offerecido ao sr. duque de Saldanha em 1870 pelo engenheiro Thomé de Garnond.
Pois este projecto não foi acceite; e fica v. exa. e a camara sabendo que não é a elevação dos preços orçamentaes que determina os poderes públicos na escolha dos projectos que tem de acceitar. O projecto de Thomé de Gramond apesar de ter um orçamento de 15.000:000$000 réis não foi acceite.