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2816 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

camara, se deprehende que não sou adverso às obras do porto do Lisboa; era quasi inutil dizer isto, porque todos sabem que, na minha pequena esphera politica e com a maxima iniciativa particular de que disponho, tenho procurado por todos os meios contribuir para a realisação d'estas obras, que reputo das mais importantes para o desenvolvimento da nossa primeira praça commercial e portanto para a riqueza do paiz. Mas, sr. presidente, exactamente porque entendo que o projecto de lei em discussão é dos mais importantes, de entre os que se tem trazido e se podem trazer ao parlamento; exactamente porque tenho plena certeza de que ha de contribuir consideravelmente para a riqueza publica, sendo ao mesmo tempo uma obra, que obrigará a despender milhares de contos, julgo-me no dever impreterivel, como deputado da nação, qualidade com que muito me honro e que a todas anteponho, de dizer francamente ao paiz as rasões e os motivos, por que divirjo d'este projecto de lei, as opiniões e as idéas que tenho ácerca dos melhoramentos do porto de Lisboa, que a meu ver constituem um delicado e serio problema de administração publica, digno do mais profundo estudo.
Sr. presidente, antes de entrar no assumpto, devo declarar a v. exa., que procurarei ser tão rapido na minha exposição, quanto o permitia o desenvolvimento de doutrinas, que entendo necessárias para o esclarecer sob o ponto de vista especial em que vou apresental-o, e principalmente julgo sufficientes para vincular a elle o meu nome e a minha responsabilidade.
Sacrificando, pois, tudo que seja secundario, deixando á camara o trabalho de preencher as defficiencias da minha exposição, pelo desejo de ser breve não deixarei, todavia, de expor o que me parecer indispensavel, embora para isso tenha de cansar a attenção sempre benevola dos que me escutam.
Sr. presidente, a primeira questão, que desenvolverei, é por assim dizer uma questão previa; parecerá talvez esta deslocada pela altura da discussão; mas para ruim não o é, em caso algum, porque entendo ser a primeira que se deve considerar, antes de se discutir o projecto dos melhoramentos do porto de Lisboa.
De resto, sr. presidente, a materia desta questão previa é importantissima, como a camara vae apreciar brevemente, e não constitue opinião minha nova ou recente, visto que v. exa., como nosso dignissimo presidente, mais de uma vez me tem ouvido referir a ella.
Nomeadamente em 1882, quando n'esta casa se discutiu o caminho de ferro de Torres, de que fui relator, no final de uma das minhas exposições, pronunciei as seguintes phrases:
«É preciso, porém, que se conheça claramente esta questão da segunda via. Pelo contrato de 14 de setembro de 1859, approvado por lei de 5 de maio de 1860, concedeu-se a construcção e a exploração, por noventa e nove annos das linhas do norte e leste, obrigando-se o concessionário a assentar a segunda via quando o rendimento bruto kilometrico da linha do norte ascendesse a 5:400$000 réis e do leste a 4:500$000 réis. Estes rendimentos actualmente estão proximos de attingir a media fixada, principalmente na linha de leste, que em 1880 rendeu réis 1.195:000$000, ou seja 4:330$000 réis por kilometro; em breve, portanto, a companhia do norte e leste será legalmente obrigada a assentar a segunda via, em que despenderá, segundo os calculos mais seguros, 15:000$000 réis por kilometro, ou 7.000:000$000 réis em toda a sua rede.
«Será conveniente para o paiz a immobilisação de tão grande capital em similhante obra? Eu hei de ter a audácia de o dizer, declarando expressamente que a opinião é só minha; não, não o é.
«O sr. Mariano de Carvalho: - E igualmente a minha.
«O Orador: - Tanto melhor, seremos dois, pelo menos, a protestar energicamente contra o longo adormecimento de um capital, que podia reproduzir-se com grande utilidade para o paiz, que tanto careço d'elle barato para obras instantes de profundo alcance economico.
«Collocar uma secunda via, e para quê? Quando a experiencia tem demonstrado que uma só via satisfaz as condições de um movimento, que se traduz em rendimento kilometrico de 10:000$000 réis e 12:000$000 réis? Pelo prazer de ver um grande capital morto representado em dois carris parallelos inuteis?
«Haverá receio, porventura, de que o estado, quando entrar na posse das linhas, ao cabo ainda de setenta e sete annos, não encontre este capital realisado? Vãs chimeras!
«Dentro d'aquelle praso longo as linhas do norte e leste, uma das boas redes europêas, terão triplicado o seu rendimento e attingido aquella cifra, em que uma segunda via será não uma obrigação imposta por uma condição legal, mas uma necessidade impreterivel dictada pela exploração crescente, uma mádida de economia para a companhia; e a segunda via será collocada então e o estado recebel-a-ha mais tarde. Eis a verdade.
«No entretanto, e desde já, negociemos esse grande capital, que perfeitamente gratuito se póde applicar em beneficio da paiz; excluam, se quizerem, a extensão entro Lisboa e o entroncamento, que póde considerar-se troço commum das duas linhas, ficarão ainda 6.000:000$000 réis! Appliquemos esta enorme cifra á construcção de outras linhas; se quizerem, ao porto de Lisboa, principalmente, onde tudo nos falta, louvado seja Deus. menos o que a natureza prodiga nos concedeu; tal tem sido a nossa incuria ou a nossa pobreza! (Apoiados.)
«Da nossa costa, mal illuminada foge a navegação, do nosso porto mal fornecido foge o commercio, pois outro porto commercial como o nosso não o ha na Europa, pois o vasto estuario do Tejo ha de ser um dia o grande emporio do occidente, a forçada escala da collossal navegação que sulca o oceano em busca das costas americanas! (Apoiados.)
«Façamos convergir para o nosso porto a força d'esse capital, que vamos matar, transformando-a em grande aterros marginaes, que substituam essas negras lamas, que lentamente envenenam e atrophiam a população de Lisboa, em docas de carga e de descarga, de abrigo e de concerto, em pontes e em armazéns de um excellente porto commercial. (Apoiados.)
«Eis o que é patriotico, eis o que é sensato, eis o que chamará sobre o paiz um manancial de riqueza e de prosperidade, e sobre o ministro enérgico, que realisar esta medida, a gloria de uma obra grandiosa e de arrojado emprehendimento.»
Como v. exa. e a camara vêem, a minha opinião, já assentada em marco de 1882, foi corroborada explicitamente pela valiosissima opinião do meu particular amigo, um da mais distinctos financeiros deste paiz, o sr. Mariano de Carvalho.
Sr. presidente, as rasões apresentadas em 1882 têem hoje a mesma força, que possuíam n'aquella epocha, senão maior; e as previsões, em que assentei os meus raciocinios, dão-se presentemente.
No contrato de 1859, approvado pela lei de 1860, lei que, se não foi referendada pelo sr. presidente do conselho, que me escuta, o foi por outro ministro da situação, a que s. exa. pertencia como ministro do reino, supponho eu, existe no n.° 4.° do § 1.° do artigo 1.° a seguinte clausula, para a qual chamo a attenção da camara:
«4.° A empreza terá a faculdade de adiar a execução dos movimentos de terra para a segunda via, no caminho de leste, para a epocha em que o producto bruto annual for de 4:500$000 réis por kilometro, e no caminho de ferro do norte para quando o mesmo producto for de réis 5:400$000. Se a empreza, quando chegarem as epochas acima mencionadas, não executar esta condição, poderá o