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SESSÃO NOCTURNA DE 2 DE JULHO DE 1885 2819

Todos sabem que effectivamente o porto de Leixões foi votado n'aquella sessão; ignorando eu, porém, como ignoram todos, os motivos por que o illustre ministro desistiu do seu proposito, fazendo apenas nomear uma commissão extra-parlamentar, para estudar os melhoramentos do porto de Lisboa.
D'esta commissão tive a honra de fazer parte até certo tempo, e d'ahi datam alguns estudos por mim feitos sobre o importante assumpto, que actualmente preoccupa a attenção da camara e do paiz.
Foi sempre opinião minha que o problema devia ser estudado sob um ponto de vista geral, independentemente de qualquer opinião preconcebida e. principalmente, de quaesquer preoccupações technicas.
D'este principio parti sempre, e purgue me pareceu não ser rigorosamente seguido pela maioria da commissão de 1883, me affastei dos seus trabalhos.
Se a camara m'o permitte dir-lhe-hei em poucas palavras como formulei a questão no meu espirito, e quaes têem sido as vacillações da minha opinião, firmada actualmente.
É evidente que todas as obras de um porto commercial devem ter em vista: a facilidade do accesso, a segurança dos navios e a rapidez e economia de todas as operações, que a mercadoria soffre, taes como: carga, descarga, transporte, armazenagem, etc., etc.
D'estes requesitos, manifestamente o mais importante, é o terceiro, principalmente, n'um porto de mar, de facillimo accesso e de óptima segurança, como o de Lisboa.
Emquanto á rapidez e economia das operações, a que a mercadoria está sujeita, todos sabem que ha varios processos para as conseguir; assim a carga e descarga póde obter-se:
1.º Por fragatas ou grandes barcos.
2.º Por cães acostáveis.
3.º Por docas de fluctuação ou docas abertas.
4.º Por pontes.
Sendo evidente que muitas vezes, como aliás acontece a meu ver em Lisboa, num porto não póde empregar-se um systema exclusivo, mas as suas condições commerciaes exigem a combinação de alguns ou até mesmo de todos.
No meu espirito, pois, o problema formulou-se no seguinte e facil enunciado: tendo em vista a simplificação, a economia e o desenvolvimento das operações mercantis, qual é o systema de obras mais adequado á natureza commercial do porto de Lisboa?
Como v. exa. comprehende perfeitamente, o problema tomou para mim um caracter essencialmente económico, porque a sua resolução dependia do perfeito estudo e rigoroso conhecimento da naturesa commercial do porto de Lisboa.
E apesar de tudo, sr. presidente, o estudo cios projectos, elaborados era epochas differentes por diversos engenheiros, arraigaram no meu espirito a primeira convicção. Effectivamente o projecto de 1861, assignado pelos condes de Farrobo e de Sobral, o projecto de 1865, de João Evangelista de Abreu, que apenas se refere á construcção de uma doca de concerto, dique como nós lhe chamâmos, mas que incidentemente se occupava das grandes fibras do porto, o projecto de 1870 do engenheiro francez Gramond, o de 1878 da commissão composta pelos engenheiros portuguezes Batalha, Rolla, Sanches de Castro, Miceno, Almeida d'Eça, e finalmente o mais recente, devido ao engenheiro hydraulico inglez Cood, todos, sem excepção, reconheciam a conveniência de adoptar no porto de Lisboa o systema de docas de fluctuação.
A pouco e pouco tornei-me um apologista d'este systema, tal é o effeito da auctoridade, tal é, principalmente, a tendencia do nosso espirito para acceitar opiniões, que parecem corroboradas pelo estudo e pela critica d'aquelles que, muito rasoavelmente, devemos suppor competentes.
Apesar de tudo encontrei adversarios convictos do systema de docas de fluctuação applicadas ao nosso porto, e para não citar senão alguns nomes, mencionarei os do sr. Pires Sousa Gomes, Cabral Couceiro e o do nosso collega n'esta camara Augusto Poppe, que está presente, e para quem appelarei, se necessario for.
Por este tempo começou a funccionar a commissão de 1833, da qual, como disse, fiz parte como secretario. Devendo, qualquer que fosse a minha opinião particular, encarar o problema por um modo geral e positivo principiei, com o poderoso auxilio do sr. Emauz Gonçalves, digno e intelligentissimo verificador da alfandega de Lisboa, a colligir todos os elementos estatisticos, que directa ou indirectamente, mediata ou immediatamente, podiam interessar á questão. Nunca admitti que a commissão de 1883 fosse composta de engenheiros para estudarem o problema technico dos melhoramentos do porto de Lisboa; pelo contrario, julguei sempre que lhe cumpria apenas designar em traços geraes o conjuncto dos melhoramentos e o systema mais adequado para o regimen commercial do porto de Lisboa. Os trabalhos technicos propriamente ditos, que mais tarde deviam ser feitos em harmonia, com as decisões da commissão, e traduzindo as tanto quanto o permittissem as condições naturaes do rio, esses trabalhos technicos deviam ser realisados pelas estações competentes, por engenheiros ou commissão de engenheiros para este fim especial nomeados pelo governo. Tal era a minha opinião.
Uma grande parte dos elementos estatisticos colligidos constitue os mappas e documentos, annexos ao parecer da commissão de 1883; outros reuni ainda depois de me haver exonerado de membro d'esta commissão, porque julguei que a maioria d'ella não acceitava o meu parecer, manifestando-se no seu seio uma pronunciada tendencia para ser chancellado um projecto qualquer.
Foi o estudo detido d'estes dados estatisticos, que radicalmente alterou a minha primeira convicção, e de defensor das docas de fluctuação me transformou em seu adversario intransigente. São exactamente os argumentos, que operaram esta transformação, que vou ter a honra de expor á camara.
Sei que é quasi inutil fazel-o, mas, sr. presidente, é em nome do meu dever e da minha responsabilidade que vou fallar; cumpro, pois, o primeiro e salvo completamente a segunda. Eis o que me basta.
Não querem estudar a questão, não a estudem. Não querem ouvir nada, não ouçam. Por ambos estes motivos temos nós commettido graves erros nas nossas grandes obras de fomento nacional.
O caminho de ferro de leste, sangrado até Santarém pelo rio Tejo, quando aliás o seu traçado devia ter sido proximamente o da linha de Lisboa a Torres e Soure, obriga-nos agora a construir esta, continuando a fazer-se perniciosa concorrencia uma via ferrea e uma excellente via navegavel, como o Tejo; a teimosia de um militar, que obrigou a linha de leste a passar por baixo dos fogos de Elvas, motivou a construcção do ramal de Caceres, quando aliás a poderia ter evitado e até mesmo talvez a da linha da Beira Baixa: a influencia de um grande politico desviou a linha do norte do coração da Beira Alta, fazendo-a atravessar em grande extensão as dunas da costa, beijada pelas ondas do Oceano; quando, aliás, poderiamos ter dispensado a via ferrea da Beira Alta, pelo menos em grande parte. O caminho de ferro do Douro marginando um rio, que conviria antes tornar navegavel; esses tristes ramaes de Vizeu e de Coimbra, o primeiro dos quaes devia, a meu ver, ser de via larga e constituir uma secção da linha ferrea, que no futuro ha de ligar os caminhos de ferro da Beira Alta com o da Beira Baixa e o do Sul; o segundo, um ramal tem nome; todos estes factos constituem, segundo penso, graves erros, que provéem ou da precipitação com que tudo se faz entre nós, ou da acção de funestas influencias e importancias que o paiz paga mui caras.