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fazer, e que na minha opinião nunca se deve delegar, e muito menos sem se terem estabelecido bazes e condições, que sirvam como de regulador ao arbitrio do governo.
Sr. presidente, faz-me viva impressão a consideração de que o governo, que linha legislado entre tantos e variados objectos pelo espaço de 15 ou 13 mezes, nunca occupasse a sua attenção com o importante assumpto da divisão judicial, administrativa e ecclesiastica, que hoje todavia se pertende declarar urgente! Isto prova que a urgencia agora invocada não existe; isto prova que não ha necessidade imperiosa de saír das regras ordinarias, para se discutir e resolver este negocio; isto prova que, é não só impolitica, mas inutil a auctorisação concedida pelo artigo. Note-se a circumstancia de que o governo tanto não está habilitado para fazer uso desta auctorisação, que nenhum uso fez da que julgara ter nas leis ciladas de 1810 o de 1813. Eu discordo do governo em pontos capitaes de politica e do administração; por isto, e por coherencia da minha posição, recuso ao governo o voto de confiança que pelo projecto se lhe concede; e quando estas razões não bastassem, tenho uma razão decisiva para assim proceder na declaração feita pelo sr. ministro do reino, de que acceitava esta auctorisação quasi contra sua vontade, e que este projecto ou a sua idéa fundamental nascera mais da iniciativa da camara, do que do proprio governo. E máo dar votos de confiança ao governo, quando elle os pede, mas muito peior que o parlamento abdique as suas funcções, fazendo quasi doação dellas ao governo contra vontade do proprio governo.
Sr. presidente, não sei explicar, nem comprehendo como o sr. Maia, que muitas vezes tem levantado a sua voz energica contra a concessão de votos de confiança, porque os reputa anti-constitucionaes, mandasse agora uma proposta que concedo ao gabinete um amplissimo voto de confiança ácerca do objecto em questão. O illustre deputado fazia bem, se explicasse sactisfactoriamente este seu procedimento, que parece incoherente e contradictorio com as sessões tão enfaticamente repetidas nesta mesma sessão.
Segundo o que ouvi a um dos illustres membros da commissão, e a muitos dos srs. que votam pela auctorisação, intendo que esperam uns e outros, que o governo procederá á reforma da divisão territorial, ate ao principio da sessão legislativa do proximo anno de 1851; isto é, que este importantissimo trabalho seja feito desde o encerramento da sessão deste anno, até á abertura do que vem. Julgam o negocio urgente, e pertendem que o governo proceda a elle som demora, de modo que daqui a 6 mezes possa dar conta á camara do uso que fez da auctorisação concedida!! Isto suppõe a existencia de trabalhos muito adiantados; mas ainda, existindo elles, do que duvido, só ao abrir da sessão immediata poderá começar a publicação e decretamento das medidas que o governo tomar em virtude desta auctorisação, e sendo assim, e precisando o governo em todo ocaso de que a camara confirme o que elle tiver feito, será muito menos perigoso, muito mais combine com os principios e com as conveniencias publicas, mais em harmonia com as regias e preceitos constitucionaes, que o governo prepare todos esses trabalhos, que recolha todas essas informações e devidos esclarecimentos, e traga na proxima futura sessão uma proposta de lei devidamente elaborada, e que abranja a divisão territorial em todas as suas relações principaes, e que seja ião momentoso assumpto discutido, e votado pelo parlamento. Pois não será isto muito melhor do que saltar por cima de todas as regras, e abdicar o direito de legislar para conceder ao governo uma auctorisação tão ampla, no uso da qual podem commetter-se erros e abusos do muito consideravel damno, e perigosas consequencias? Se até hoje não houve a necessidade urgente desta reforma, porque nasceu ella hoje, e precisa já já de remedio? Não vejo em tudo isto clareza sufficiente.
A divisão judicial, administrativa o ecclesiastica é um objecto Ião importante o complexo, que involve nada menos, que a mais ou menos prompta, mais ou menos barata administração de justiça, a perda ou a conservação de interesses, e commodidades muito consideraveis, e emfim a questão do imposto. Na divisão judicial por exemplo, não ha só a attender á commodidade dos povos na fixação da maior ou menor area do terreno, que constitua comarca, ha tambem a considerar, que da menor area de cada um, e por tanto do augmento do numero lotai surgirá uma nova e não pequena despeza, porque o numero dos juizes de direito, e de todos os escrivães, e officiaes publicos, que servem perante elle, crescerá na mesma proporção, e se nem todos estes empregados vivem a custa do thesouro, é certo que todos vivem á custa do povo, ou da massa geral dos contribuintes.
Quanto á divisão ecclesiastica o nobre deputado, que fallou ultimamente, reconheceu que ella era melindrosa, e que o governo não podia levar a effeito esta reforma até á abertura da proxima sessão; de maneira que foi o mesmo illustre deputado que reconheceu que a auctorisação é inutil. Pois se a auctorisação é inutil, para que o que os illustres deputados a julgam necessaria e urgente? Perguntarei qual é a verdadeira razão de conveniencia publica que se apresenta, para se dar esta auctorisação ao governo? Pois o governo devendo já ler alguns trabalhos a este respeito, não pode durante o intervallo que a camara estiver fechada, coordenar este trabalho de modo que possa ser presente na primeira sessão ordinaria, afim de ser convenientemente apreciado e resolvido?... Sabe v. ex.ª as apprehensões o os receios que tenho, é que este voto de confiança, ou auctorisação dada ao governo, para proceder á reforma das divisões judicial, administrativa, e ecclesiastica, seja mais uma arma poderosissima de influencia eleitoral, deixada nas mãos do governo; porque tendo de se proceder no intervallo da sessão á eleição para o preenchimento de 19 vagas, que ha na camara, é querer-se que desde já fique pesando sobre o animo das auctoridades e dos povos o grande emprego que póde ter nas mãos do governo, usando a seu bel-prazer da grande alavanca de tal auctorisação, sobre objectos que locam tanto de perto nos interesses, nas commodidades, nos habitos, e até nos caprichos das povoações. Desde que esta auctorisação passar, ficam os povos e os magistrados na espectativa de qual será o seu futuro particular; o por consequencia dependentes da influencia do governo. Se e isto que os illustres deputados que iam, então digam-no e confessei no francamente!.. O que nao se póde negar é, que o governo fica por este projecto com um grande meio de influencia ácerca das posições dos individuos empregados e a empregar.
Não ha justiça, dizia o celebre de L'Hopilal, se não quando ella é prompta e barata.«Se isto e