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SESSÃO DE 4 DE JULHO DE 1885 2891

Eu não sei como procederão de futuro os governos com esta lei, a respeito dos corpos administrativos. Sei apenas o que têem feito, que têem sido os protectores mais decididos e mais benevolos para com a actual vereação do municipio de Lisboa.
Achava-me eu no exercicio de vereador quando o partido progressista, á frente da governação publica, mandou á camara uma syndicancia, que não sei se lhe possa dar tal nome, porque nada se syndicou; pelo menos eu não fui interrogado, e n'esse tempo confesso que desejava tel-o sido.
No Brazil, ha proximamente dois annos, o governo d'aquelle imperio, por motivos de ordem superior, teve a coragem de dissolver a camara municipal da cidade do Rio de Janeiro, mandando em acto continuo proceder a uma syndicancia, fazendo que a mesma camara fosse substituida pelos vereadores das camaras transactas.
Em Madrid ainda ultimamente se deu facto similhante, que podia ter dado ao governo melhor resultado, se não procede tão tardiamente.
Porque é, pois, que entre nós os governos procedem de modo differente?
Pois a faculdade que existe para dissolver um parlamento, só porque n'elle impera a politica partidaria, não póde exercer-se nos corpos administrativos, onde existem rasões mais poderosas e onde ha o direito de saber-se como e administrado o dinheiro dos municipes?
Pois não tem o governo leis que lhe facultam esse direito?
Não diz o actual codigo administrativo nos artigos 16.°, 17.° e 18.° a fórma de proceder em casos d'esta ordem?
Isto são cousas tão sabidas e tão conhecidas, que não havia necessidade de apontal-as, porque o governo conhece melhor do que eu tudo o que se está passando na administração municipal de Lisboa, ignorando eu comtudo os motivos que têem dado causa para deixar de proceder.
Eu já não creio nem nas multas, nem nos muitos e variados artigos de guerra que se possam introduzir nas leis, determinando as epochas para a apresentação das contas dos corpos administrativos no respectivo tribunal.
Creio antes na boa vontade e no interesse de bem administar; e temos visto muitas vezes uma boa administração tornar-se superior a quantas leis possam existir, ainda com todas as suas bellezas theoricas.
Isto, porém, não significa que deixe de ter muito respeito por todas as disposições legaes, quando tenham por fim proporcionar a maior regularidade no que toca á remessa das contas da gerencia municipal.
E tive sempre isto tanto em vista, e eram taes os meus cuidados, que no meu espirito existia o constante receio de que mais tarde ou mais cedo, pela negligencia ou falta no cumprimento da lei, da parte de quaesquer vereadores, tivessem os mais zelosos de responder tambem perante o tribunal, por não serem dadas as contas na epocha em que a lei a isso obriga.
E não se diga que eu estou apreciando as cousas a meu modo, pelo contrario aprecio-as á luz da rasão e da justiça.
E, com effeito, se eu lesse á camara algumas das actas das sessões municipaes, que tenho junto do mim, mostraria o quanto eu era considerado de impertinente por parte de alguns collegas da vereação, quando requeria e exigia o cumprimento do artigo 142.° do codigo administrativo em vigor.
Tambem já depois de abandonar as cadeiras de vereação por me constar terem-se mandado para o tribunal as contas de 1878 sem a minha assignatura, requeri em 28 de dezembro de 1883, que logo que novas contas que digam respeito á minha gerencia estejam prestes a serem enviadas ao referido tribunal, eu fosse avisado, para as poder assignar, tomando n'ellas a responsabilidade que me competisse.
Em virtude d'esta minha reclamação fui no anno passado prevenido de que iam ser remettidas as contas relativas ao anno de 1879, conseguindo assignal-as em conformidade com as declarações que nas respectivas sessões em tempo havia feito.
É evidente, pois, que para este e outros casos analogos nunca é de mais tornar os artigos da lei bem claros, para que não se alleguem duvidas no modo da execução.
Eu sei bem que os governos têem, quando querem, todos os meios á sua disposição, para obrigar os corpos administrativos a cumprirem o seu dever; mas o que é certo, e que esses meios não se põem em pratica, e d'ahi segue-se continuar a fazer-se o que é contrario á lei.
Ora, eu queria que os governos procedessem contra as camaras, quando para isso haja rasão; mas que não o fizessem unicamente animados pela politica partidaria, porque n'esse caso as camaras ficam com mais força do que tinham até ali.
Os governos devem ser severos para com todos, mas de o exemplo começando pelos seus.
Seria um passo que lhe dava auctoridade e não lha tirava.
Disse ha pouco, que em tempos o governo progressista, convencido de que era irregular a administração municipal de Lisboa, mandou áquella corporação uma syndicancia, cujos resultados nunca foram conhecidos do publico; e comquanto lhe reconheça o direito de o ter feito, sinto que esse partido que tão prompto estava sempre para censurar os actos da vereação quer aqui quer na imprensa, não tivesse a coragem e forças precisas para levar a cabo essa syndicancia, fazendo ouvir todos os vereadores, e tornando depois bem publicos os resultados dos seus inqueritos.
Mas se essas syndicancias nada produziram, nem por isso o mesmo partido progressista na sua imprensa tem deixado constantemente de fazer á camara municipal accusações acerbas e graves, embora ultimamente tenha conservado aqui o mais profundo silencio em assumptos que têem relação muito immediata com ella.
Ignoro o que significa isto; mas quero acreditar que não seja este um dos fructos do accordo.
Não faço com isto provocações, nem tão pouco pretendo azedar o debate; mas em abono da verdade lastimo a situação a que vae chegando a politica, que com o seu indifferentismo tanto prejudica os interesses mais caros do paiz.
Com respeito á inspecção da fazenda municipal, é creado no artigo 159.° um logar denominado, inspector geral da fazenda municipal, que será sempre escolhido pelo tribunal de contas com a gratificação annual de 600$000 réis, tendo as attribuições de fiscalisar, evitar dolos, reconhecer dos orçamentos, contas, fazer observações para evitar abusos, etc.
Folgo de ver crear para a nova lei a entidade fiscal, porque vem confirmar a rasão que tive, quando na discussão do codigo administrativo de 1878 eu propunha a conservação de similhante entidade.
Mas se reconheço a necessidade da maior fiscalisação, reconheço tambem que não deve haver retribuição para tal cargo, a exemplo do que a commissão já praticou, e por isso a louvo, não approvando o projecto primitivo na parte em que aos seis membros da commissão executiva, secretario e presidente da camara, se concedia de ordenado annual 5:406$000 réis.
Ora, estando nós a legislar para grangear meios de com que o municipio se possa, sustentar de futuro, sendo grandes os encargos que lhe deixam e muito problematica a receita que lhe ha de vir, é justo que não vamos aggravar mais com despezas superfluas uma camara pobrissima, justificando o que já se diz publicamente, que o fim d'esta lei, como de muitas, é augmentar ordenados e crear empregos novos, alguns talvez já talhados para individuos determinados.