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SESSÃO DE 30 DE JUNHO DE 1888
Presidencia do exmo. sr. Francisco de Barros Coelho e Campos (vice-presidente)
Secretarios os exmos. srs.
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral
Francisco José Machado
SUMMARIO
Leu se na mesa o decreto com data de 28, pelo qual Sua Magestade EI-Rei houve por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias da nação portugueza até ao dia 7 de julho inclusivamente. - Correspondencia: um officio da legação de Portugal em Hespanha, accusando a recepção dos Diarios das sessões das côrtes, relativos aos annos de 1875 a 1887, e a sua entrega ao congresso de deputados de Hespanha; um officio do ministerio do reino, acompanhando os documentos requeridos pelo sr. Moraes Carvalho ácerca da expropriação por zonas; um officio do mesmo ministerio, acompanhando alguns documentos requeridos pelo sr. Arroyo. - O sr. Franco Castello Branco pede que se suspenda a sessão, visto que não estava presente nenhum membro do gabinete, como já n'outras occasiões se tem feito. O sr. presidenta diz que entre os srs. deputados que têem pedido a palavra, alguns haverá que não tenham necessidade da presença dos ministros para fallarem. - O sr. Abreu Castello Branco chama a attenção do governo para os prejuízos causados por uma ordem, dada a pedido do sr. governador civil da Horta, para que os vapores da empreza insulana que saiam de Lisboa, e que toquem na ilha Terceira, não recebam ali nem passageiros, nem carga, com destino ao Faial e mais ilhas de oeste, ou, no caso de a receberem, fazerem quarentena, isto com o pretexto de uma epidemia de bexigas que estava extincta. - O sr. João Arroyo refere-se ao incremento que tem tido a companhia de Jesus e aos meios secretos de que está lançando mão para se impor. Diz que na cidade do Porto se realisára ultimamente um comicio para oppor uma certa resistencia a esta incremento, comicio em que fôra nomeada uma commissão de vigilancia. Esta commissão solicitou da camara municipal uma das suas salas para realisar as suas sessões, e a commissão executiva da camara resolveu negar a licença para que nas suas salas se realisassem as reuniões da commissão de vigilancia. O sr. deputado faz largas considerações a este respeito, e chama para estes factos a attenção do governo. Responde-lhe o sr. presidente do conselho. - O sr. Arroyo volta á questão, e reforça os seus argumentos, esperando que o governo não duvidará cumprir as leis em assumpto tão melindroso. - O sr. Consiglieri Pedroso chama a attenção do sr. presidente do conselho para o facto de alguns regedores da capital annullarem pelos seus despachos as garantias concedidas aos cidadãos pela ultima lei eleitoral. O sr. deputado lê uma certidão em prova do que referiu, e como esta diz que podia apresentar centos. Refere-se tambem aos acontecimentos de Almada, que produziram a morte do sr. Silveira Junior. Responde-lhe o sr. presidente do conselho. - O sr. João Arroyo observa que ha alguns mezes os habitantes da freguezia de Ganfey fizeram uma queixa ao administrador do concelho de Valença, o qual a tem na sua gaveta, sem proceder como era seu dever. Esta queixa versava sobre varias mortes causadas pela entrada em algumas casas d'aquella freguezia de um certo curandeiro, sob pretexto de que eram milagrosas as curas por elle operadas. Estes factos dão-se em outras terras do reino, e pede ao sr. presidente do conselho que mande pedir informações ao sr. governador civil com respeito aos factos da freguezia de Ganfey e á queixa que se fez. Responde-lhe o sr. presidente do Conselho. - O sr. Fernandes Vaz apresenta uma representação dos escrivães das varas civeis e criminaes da cidade do Porto. - O sr. Bandeira Coelho, por parte da commissão de guerra, requereu que seja enviado ao governo, para informar, o requerimento de Antonio Fallé da Silveira Barreto. Mandou-se expedir. - Justificaram as suas faltas a algumas sessões os srs. Rodrigues de Carvalho, Freitas Branco. Antonio Maria Jalles, Francisco de Medeiros, Henrique de Sant'Anna e Vasconcellos, Ignacio do Casal Ribeiro, João Augusto Pina, Cardoso Valente, Dias Gallas, Santiago Gouveia, Menezes Parreira, Alfredo Ribeiro, Correia Leal, Oliveira Valle, Oliveira Martins, Jorge O'Neill, Guerra Junqueiro, Antonio Centeno. Antonio Ennas, Gomes Neto, Moraes Sarmento, Fontes Ganhado, Victor dos Santos, conde de Castello de Paiva, conde de Fonte Bella, Eduardo Abreu, Bandeira Coelho, Augusto Ribeiro e Oliveira Matos.
Na ordem do dia continua a discussão do projecto n.° 71, relativo á expropriação por zonas. - Usam da palavra os srs. Ruivo Godinho e Barbosa de Magalhães, relator. - O sr. ministro da fazenda apresenta o relatorio dos actos do seu ministerio, acerca das auctorisações que lhe foram concedidas e de que fizera uso no intervallo das sessões.
Abertura da sessão - Ás tres horas e dez minutos da tarde.
Presentes á chamada 44 srs. deputados. São os seguintes: - Serpa Pinto, Alfredo Brandão, Simões dos Reis, Hintze Ribeiro, Augusto Fuschini, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Lobo d'Avila, Elizeu Serpa, Feliciano Teixeira, Francisco de Barros, Fernandes Vaz, Francisco Machado, Francisco Ravasco, Lucena e Faro, Sá Nogueira, Pires Villar, Franco de Castello Branco, João Arroyo, Rodrigues dos Santos, Sousa Machado, Simões Ferreira, Ferreira Galvão, Barbosa Colen, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Ruivo Godinho, Abreu Castello Branco, Figueiredo Mascarenhas, Vasconcellos Gusmão, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Santos Moreira, Julio Graça, Julio Pires, Julio de Vilhena, Vieira Lisboa, Manuel Espregueira, Brito Fernandes, Marianno Presado, Martinho Tenreiro, Miguel da Silveira, Pedro de Lencastre (D.) e Pedro Victor.
Entraram durante a sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Anselmo de Andrade, Antonio Castello Branco, Baptista de Sousa, Antonio Villaça, Ribeiro Ferreira, Gomes Neto, Pereira Borges, Guimarães Pedrosa, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Fontes Ganhado, Jalles, Pereira Carrilho, Augusto Pimentel, Santos Crespo, Barão de Combarjua, Conde de Villa Real, Eduardo José Coelho, Madeira Pinto, Estevão de Oliveira, Mattozo Santos, Freitas Branco, Firmino Lopes, Almeida e Brito, Severino de Avellar, Gabriel Ramires, Guilherme de Abreu, Candido da Silva, Santiago Gouveia, Menezes Parreira, Vieira de Castro, Joaquim da Veiga, Jorge de Mello (D.), Avellar Machado, Dias Ferreira, Elias Garcia, Alpoim, José Maria dos Santos, Simões Dias, Abreu e Sousa, Bandeira Coelho, Manuel d'Assumpção, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Pinheiro Chagas, Marcai Pacheco, Marianno de Carvalho, Miguel Dantas, Estrella Braga e Consiglieri Pedroso.
Não compareceram á sessão os srs.: - Guerra Junqueiro, Albano de Mello, Alves da Fonseca, Sousa e Silva, Campos Valdez, Antonio Candido, Oliveira Pacheco, Antonio Centeno, Antonio Ennes, Moraes Sarmento, Mazziotti, Barros e Sá, Victor dos Santos, Bernardo Machado, Conde de Castello de Paiva, Conde de Fonte Bella, Eduardo Abreu, Elvino de Brito, Emygdio Julio Navarro, Goes Pinto, Fernando Coutinho (D.), Francisco Beirão, Castro Monteiro, Francisco Mattoso, Francisco de Medeiros, Soares de Moura, Frederico Arouca, Guilhermino de Barros, Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Baima de Bastos. João Pina, Cardoso Valente, Izidro dos Reis, Souto Rodrigues, Dias Gallas, Teixeira de Vasconcellos, Alfredo Ribeiro, Correia Leal, Alves Matheus, Silva Cordeiro, Oliveira Valle, Joaquim Maria Leite, Oliveira Martins, Jorge O'Neill, Amorim Novaes, Alves de Moura, José Castello Branco, Pereira de Matos, Laranjo, Pereira dos Santos, Guilherme Pacheco, José de Napoles, Ferreira Freire, Oliveira Matos, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Pinto Mascarenhas, Santos Reis, Lopo Vaz, Mancellos Ferraz, Poças Falcão, Luiz José Dias, Matheus de Azevedo, Pedro Monteiro, Sebastião Nobrega, Dantas Baracho, Vicente Monteiro, Visconde de Monsaraz, Visconde de Silves, Visconde da Torre e Wenceslau de Lima.
Acta - Approvada.
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EXPEDIENTE
Officios
Do ministerio do reino, acompanhando o seguinte
Decreto
Usando da faculdade que me confere a carta constitucional da monarchia no artigo 74.º § 4.° e a carta de lei 24 de julho do 1885 no artigo 7.° § 2.°, depois de ter ou vido o conselho d'estado, nos termos do artigo 110.° da mesma carta: hei por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias da nação portugueza até ao dia 7 do proximo mez de julho inclusivamente. O presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza assim o tenha entendido para os effeitos convenientes.
Paço de Ajuda, em 28 de junho de 1888.= Rei. = José Luciano de Castro.
Para a secretaria.
Do mesmo ministerio remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Moraes Carvalho.
Para a secretaria.
Do mesmo ministerio remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Arroyo.
Para a secretaria.
Da legação de Portugal em Hespanha, accusando a recepção do officio que acompanhava os Diarios das sessões das côrtes relativos aos annos de 1875 a 1887.
Para a secretaria.
REPRESENTAÇÃO
Dos escrivães das varas eiveis e criminaes da cidade e comarca do Porto, pedindo para ser equiparados em maioria tributaria aos demais empregados publicos.
Apresentada pelo sr. deputado Fernandes Vaz e enviada á commissão da fazenda.
REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO
Por parte da commissão de guerra requeiro que seja enviado ao governo para informar o requerimento (livro a fl. 29 verso do livro 13.°), de Antonio Fallé da Silveira Barreto.
Sala da commissão de guerra, em 30 de julho de 1888.= O secretario, Luiz Bandeira Coelho.
Mandou-se expedir
JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS
Participo a v. exa. e á camara que por motivos justificados faltaram a algumas sessões os srs. deputados Abilio Guerra Junqueiro, Antonio Centeno, Antonio Ennes, Antonio José Gomes Neto, Antonio Luiz G. B. de Moraes Sarmento, Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello Ganhado, Augusto Victor dos Santos, Conde de Castello de Paiva, Conde de Fonte Bella, Eduardo Abreu, Fidelio de Freitas Branco. = O deputado, Julio Graça.
Declaro que por motivos justificados deixaram de comparecer a algumas sessões os srs. deputados Francisco José de Medeiros, Henrique de Sant'Anna e Vasconcellos, Ignacio Casal Ribeiro, João Augusto de Pina, João Cardoso Valente, João José Dias Gallas, João Lobo Santiago Gouveia, João de Menezes Parreira, Joaquim Alfredo da Silva Ribeiro, Joaquim de Almeida Correia Leal, Joaquim J. M. de Oliveira Valle, J. Pedro de Oliveira Martins, Jorge O'Neill. =O deputado, Alfredo Cesar Brandão.
Participo á camara que o ex.mo sr. presidente José Maria Rodrigues de Carvalho não tem podido nem poderá comparecer ás sessões por motivo justificado.- Francisco de Barros Coelho e Campos.
Declaro que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Augusto Ribeiro, deputado por Loanda.
Declaro que faltei ás ultimas sessões por motivo justificado. = Luiz Bandeira Coelho.
Participo a v. exa. que o nosso collega o sr. Oliveira Matos tem faltado a algumas sessões por motivo justificado. =F. J. Machado.
Tenho a honra do participar a v. exa. e á camara que por motivo justificado não tenho podido comparecer a algumas sessões do mez que termina hoje. =Antonio Maria Jalles.
Participo a v. exa. e á camara que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Fidelio de Freitas Branco.
Para a secretaria.
O sr. Presidente: - Vae dar se conta de um officio que está sobre a mesa.
Leu se na mesa o decreto com data de 28, pelo qual Sua Magestade El-Rei honre por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias da nação portugueza até ao dia 7 de julho inclusivamente.
O sr. Franco Castello Branco (para um requerimento): - Sr. presidente, não está presente nenhum membro do governo, por isso peço a v. exa. que se suspenda a sessão, a exemplo do que v. exa. tem praticado em outras occasiões, e me parece que ainda na ultima sessão se suspendeu até comparecer algum membro do gabinete. (Apoiados.}
O sr. Presidente: - Eu não tenho duvida alguma em suspender a sessão até comparecer algum sr. ministro, mas como estão inscriptos alguns srs. deputados que desejam expor as suas idéas sem a presença do governo, parece-me que não é preciso suspender a sessão. (Apoiados.)
O sr. Abreu Castello Branco: - Sr. presidente, ainda não ha muitos dias que eu fallei n'uma questão que se vae prolongando, não se tendo dado solução alguma, apesar de, por mais de uma vez, eu ter pedido ao governo que a resolva de qualquer modo. Portanto insto e instarei até que ella seja resolvida nos termos em que eu tinha indicado, pois que a falta de solução esta causando grandes prejuizos aos povos do districto que tenho a honra de representar n'esta casa.
Eu lembro a v. exa. e á camara e lembro ao governo que nato vejo representado, mas que verá pelo extracto da sessão que eu chamei a sua attenção para e te ponto, que no dia 5 do mez que vem parte o paquete Açor pura as ilhas dos Açores, e como ou tive occasião de dizer n'esta camara determinou se que os paquetes procedentes de Lisboa não recebam passageiros nem carga na ilha Terceira em viagem para o Faial.
Foi a pedido do sr. governador civil d'aquelle districto que se determinou pelo ministerio do reino ao ministerio da marinha que a empreza insulana de navegação não recebesse carga nem passageiros para ilha Terceira; isto é um disparate. O termo não é parlamentar, mas realmente, visto que acabo de o empregar, não o retirarei; não será parlamentar, não mas é um termo verdadeiro. Ha, porém, mais alguma cousa para se fazer esta indicação do ministerio do reino ao da marinha e da marinha á empreza insulana de navegação, haviam de ser ouvidas as estações competentes.
Foi ouvida a junta de saude, mas eu não sei que junta
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é essa, e de que saude publica se occupa? O que me parece é que não tem conhecimento da posição geographica das ilhas dos Açores porque, se o tivesse, certamente attenderia a isso.
Lembrarei que na ilha Terceira havia uma epidemia de variola e fez algumas victimas, felizmente está debellada; apesar d'isso o governador civil do Faial entendeu que se devia acautelar e seria conveniente acautelar a saude dos habitantes do Faial e Flores, mas, deter minando-se que os paquetes procedentes de Lisboa não tocassem na ilha Terceira, nem recebessem carga nem passageiros para as ilhas de oeste, devia então determinar se igualmente que não recebessem carga nem passageiros para S. Miguel, Santa Maria e Madeira, porquanto sendo muito apreciavel a saude dos cidadãos do districto do Faial, não é menos apreciavel a dos cidadãos de Ponta Delgada e do Funchal.
Portanto, parece-me que deixou do se attender não só á posição geographica, mas aos inconvenientes que resultam de tal determinação.
O que é certo é que a epidemia na ilha Terceira está quasi completamente extincta, e quando ella ali grassava com mais intensidade não se lembrou o governador civil do Faiar, nem os cidadãos d'aquelle districto, de pedir que os paquetes não tocassem na ilha Terceira.
Alguma rasão haverá para isso, o que é certo é que se eu fosse governador civil do districto do Angra, podiam ir quantas ordena quizessem, que os vapores haviam necessariamente tocar ali, e receber carga e passageiros para a Graciosa e S. Jorge, porquanto não ha rasão alguma para que o paquete que sáe d'aqui e tem de ir á Graciosa, S. Jorge e Faial deixe de tomar carga e passageiros para a Graciosa e S. Jorge por causa do Faial, e emfim eu não quero fazer supposições ou juizos mais ou menos temerarios a respeito das rasões ou dos motivos que houve par se fazer aquella exigencia, e para se pretender obstar a que os paquetes tomem carga e passageiros na ilha Terceira, prejudicando assim altamente o commercio que faz a Terceira com as ilhas das Flores, Faial e Pico, mas especialmente com a Graciosa e S. Jorge.
É possivel e muito possivel, que no districto do Faial não tenham agora grande necessidade das mercadorias que para ali se exportam da Terceira, é possivel que barcos americanos as forneçam do que necessitarem, já se vê, não defraudando o estado nos direitos aduaneiros.
Eu já disse n'esta casa ha tempo que a respeito de contrabando para as ilhas de oeste, ainda hei de fallar e dizer algumas cousas que classifiquei de bonitas.
Agora o que eu não posso admittir o que n'aquelle districto se esteja a perturbar o andamento dos negocios commerciaes da ilha Terceira e obstar a que esta ilha faça commercio com as outras ilhas da Graciosa e S. Jorge exigindo que os paquetes não toquem ali.
Limito aqui por hoje as minhas considerações. Quiz só chamar a attenção do governo e em particular do sr. ministro do reino para este facto, a fim de que s. exa. ponha cobro a este estado anormal.
Já no dia 5 do mez que vem vae partir o paquete Açor para aquellas ilhas e se por acaso não foi já determinado que elle possa tocar na Terceira, nós continuaremos a soffrer os prejuizos que temos soffrido até agora sem culpa nenhuma e só por uma veleidade do sr. governador civil do Faial ou dos cidadãos que habitam n'aquelle districto.
É preciso que isto acabe, e por isso peço ao sr. presidente do conselho e ministro do reino que tome na devida consideração as observações que acabo de fazer.
O sr. Arroyo: - Vendo presente o sr. presidente do conselho, a quem, como chefe do gabinete compete a direcção geral da politica do paiz, e a quem cabe mais do que a ninguem a responsabilidade pela manutenção das leis patrias, chama a attenção de s. exa. para um facto ultimamente occorrido na cidade do Porto.
Recrudescêra ha muito em Portugal um movimento religioso importante. Referia-se aos meios indirectos e até certo ponto mysteriosos e secretos de que está lançando mão a companhia de Jesus, para se impor.
Não pretende alargar-se em considerações, nem levantar a questão religiosa, mas julga sempre opportuno o momento para chamar a attenção do governo para este assumpto, provocando da sua parte, não só a iniciativa de qualquer medida de repressão, mas tambem declarações categoricas a este respeito.
Na cidade do Porto realisára-se ultimamente um comicio com o fim de oppor uma certa resistencia a este movimento relihioso, comicio em que fôra nomeada uma commissão de vigilancia.
Esta commissão dirigira-se ao vice-presidente da camara municipal d'aquella cidade, pedindo lhe auctorisação para, á similhança do que se fizera em Lisboa, realisar as suas sessões n'uma das salas d'aquelle edificio.
O sr. vice presidente d'aquella camara municipal respondêra que lhe parecia que difficuldade alguma haveria n'isto e que na proxima reunião da commissão executiva chamaria a sua atenção para o assumpto.
Era notavel e estranho que depois d'isto a commissão executiva da camara municipal resolvera negar a licença para que nas suas salas se realisassem aquellas reuniões.
Parece-me que esta resposta não devia ser dada pelos vereadores que estão á testa do municipio do Porto, que tem sempre tomado a vanguarda no movimento anti-jesuitico.
Era perfeitamente legal o pedido dos commissionados, porque a expulsão da companhia de Jesus era um facto legal, e porque o emprego de todos os meios licitos de combate são até uma obrigação dos depositarios do poder executivo.
Não censura o sr. presidente do conselho por qualquer falta. As suas palavras referem-se a todas as situações politicas, porque tem havido da parte de todas ellas um pouco de esquecimento no cumprimento das leis que são um dos melhores titulos de gloria do marquez de Pombal.
Repete que só deseja provocar explicações categoricas da parte do sr. presidente do conselho, para fazer desapparecer o receio que hoje existe em todos os espiritos portuguezes, principalmente depois que se sabe que um distinctissimo cavalheiro já disse do alto de uma das primeiras tribunas do paiz, que o jesuita estava em Portugal e que desafiava um governo qualquer a expulsal-o.
Deseja que o sr. presidente do conselho faça constar á camara municipal do Porto a incorrecção do seu procedimento, visto que, pelas leis, está s. exa. impossibilitado de fazer reformar aquella deliberação, e ao mesmo tempo deseja que, pelas suas palavras, s. exa. mostre que é verdadeiro cultor dos principios liberaes, e que está resolvido por todas as fórmas ao seu alcance a lançar-se no caminho de suscitar uma serie de medidas para uma guerra perfeitamente legal e legitima contra uma instituição que foi, é, e será sempre obnoxia aos interesses liberaes do paiz.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Ás perguntas que me dirigiu o illustre deputado o sr. Arroyo vou responder com a franqueza e desassombro que uso nas respostas que dou aos illustres membros da opposição.
Quanto á reunião que houve no Porto e em que se approvaram as conclusões que foram apresentadas ao sr. governador civil relativamente á reacção jesuitica, devo dizer ao illustre deputado que recebi effectivamente uma representação do comicio que se realisou n'aquella cidade e que foi entregue ao governador civil para me ser enviada.
Tenciono responder a essa representação por uma ma-
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neira publica, por um acto official, que será publicado no Diario do governo, e então terá s. exa. occasião de ver que o governo actual mantem as doutrinas que sempre tem mantido; isto é, fazer cumprir rigorosamente as leis do reino, sem comtudo atacar os direitos individuaes dos cidadãos que estão garantidos pelas leis do paiz.
Este é o pensamento do governo; é fazer observar as leia do reino em toda a sua plenitude, sem atacar por qualquer maneira os direitos individuaes dos cidadãos que estejam garantidos pelas leis.
Peço portanto ao illustre deputado que me dispense de entrar n’este momento em mais largas considerações, porque a sessão está muito adiantada, e eu não quero, nem de certo o quererá o illustre deputado, levantar agora uma questão a esse respeito, questão que podia dar logar a um largo debate.
Limito-me por conseguinte a dar esta resposta ao illustre deputado, que espero ficará satisfeito com ella, porque dentro de breves dias será publicada na folha official a resposta á representação que me foi dirigida.
Quanto ás observações de s. exa. a respeito da recusa que a camara municipal fez de uma parte do edifício que lhe foi pedido para celebrar as reuniões da commissão que foi nomeada na reunião a que acabo de alludir, devo dizer a s. exa. que esse assumpto é absolutamente estranho á acção do governo. (Apoiados.) Respeitei o procedimento e a opinião da camara municipal de Lisboa, quando ella se prestou a dar casa, segundo o illustre deputado se referiu, para as reuniões da commissão que foi nomeada em Lisboa com o mesmo intuito, assim como estou resolvido a respeitar a opinião da camara municipal do Porto recusando a sua casa á commissão que lh'a pediu no pleno uso da sua liberdade.
Não me foi ainda apresentada nenhuma reclamação contra o acto da camara municipal; se for apresentada qualquer reclamação, é evidente que hei de examinal-a, tomar conhecimento d’ella e responder com a devida deferencia, mas essa deferencia não póde ser elevada até ao ponto de tolher o direito que a camara municipal do Porto tem de dispor do seu edificio da maneira e fórma que julgar mais conveniente. Não quer s. exa., nem podia querer que emittisse a minha opinião a respeito do procedimento da camara municipal do Porto. A minha opinião, qualquer que fosse, podia ser interpretada como acto de louvor ou de censura a respeito do procedimento da camara. Não quero louvar, nem censurar, acho apenas que ella usa do seu direito, o quem usa do seu direito não offende ninguem.
Não posso dar ao illustre deputado outras explicações.
Vozes: — Muito bem.
O sr. Arroyo: — Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se me mermitte que eu responda ao sr. ministro do reino.
Vozes: — Falle, falle.
O sr. Arroyo: — Comprehende o melindre da questão, e não tratará senão de medidas que constituissem uma arma completa para combater o jesuitismo.
Fizera brevissimas considerações, porque logo declarára que não queria, levantar a questão religiosa, e portanto não tem duvida em acceitar o convite que, lhe fizera o sr. presidente do conselho para não alargar o debate.
Não discutira todos os meios que podem diminuir o valor da ínfluencia jesuitica; apenas fallára nos factos occoridos no Porto e pedira algumas providencias.
Fôra o primeiro a dizer que o sr. presidente do conselho não tinha attribuições para reformar a deliberação da camara municipal do Porto, e só pedira, que s. exa. affirmasse categoricamente áquella camara municipal que o poder executivo ao conservava na mesma attitude e no mesmo ponto de vista em que estava quando o marquez de Pombal promulgou as leis que são um dos seus maiores titulos de gloria.
O orador fez ainda algumas considerações para mostrar que o sr. presidente do conselho, em face do codigo administrativo e em face do seu proprio procedimento e do procedimento de alguns dos seus collegas, podia, por intermédio do seu delegado de confiança, manifestar o seu espirito liberal á camara municipal do Porto.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)
O sr. Montenegro: — Sr. presidente, ha quinze dias que mandei para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio da guerra, a remessa a esta camara do parecer da procuradoria geral da corôa, a respeito de uma consulta que foi dirigida pelo mesmo ministerio sobre o modo por que devia ser interpretada a lei de 31 de julho de 1881. Eu peço a v. exa., sr. presidente, a fineza de me dizer se já foi satisfeito o meu pedido.
(Pausa.)
O sr. Primeiro secretario: — Ainda não.
O Orador: — Sinto que ainda não tenha sido satisfeito o meu requerimento, porque o que n'elle se pede é, não só muito importante, mas muito necessario para o meu estudo; e mesmo é necessario que a camara tenha conhecimento do assumpto, por isso que está annunciada uma interpellação que só realisará qualquer dia, e é bom que a camara conheça as circumstancias sobre que tem de versar a interpellação.
Eu sei que o sr. ministro da guerra deu ordem para serem remettidos os documentos a que me refiro; tambem sei que da parte da secretaria da guerra tem havido sempre a maior solicitude em satisfazer este pedido. Portanto, a demora na remessa é devida certamente, ou a algum esquecimento, ou a alguma circumstancia estranha á vontade da mesma secretaria.
Podendo essa demora ser talvez rapidamente attenuada com uma nova solicitação, eu insisto no meu pedido, e peço a v. exa. que3 se digne solicitar de novo para que sejam mandados estes documentos, que eu reputo muito importantes.
O sr. Consiglieri Pedroso: — Já n'uma das sessões anteriores chamára a attenção do sr. presidente do conselho para o facto de alguns administradores de bairros annullarem, por meio da exigencia de emolumentos exagerados, as garantias concedidas aos cidadãos pela lei do registo civil.
Agora chama a attenção de s. exa. para a circumstancia de alguns regedores annullarem, pelos seus despachos, as garantias concedidas aos cidadãos pela ultima lei eleitoral.
A lei exige alguns requisitos para se ser eleitor, e alguns d'estes requisitos provam-se por meio de certidões passadas pelos regedores.
Um dos requisitos é o de um cidadão ser chefe de familia e prover ao sustento d'ella, o que o regedor respectivo tem de certificar.
N'estes casos os regedores passam muitas vezes certidões que annullam os direitos dos cidadãos.
O orador lê uma das certidões a que se referira, e declara que poderia apresentar muitas dezenas d'ellas.
Pede ao sr. presidente do conselho que tome algumas providencias para que estes abusos se não repitam.
Quanto aos acontecimentos de Almada, a que já por mais de uma vez se tem referido e em que foi victima o sr. Silveira Junior, pergunta ao sr. presidente do conselho se lhe pôde dizer em que altura está o processo e se se póde ter a esperança de que será punido quem for culpado.
Pede a s. exa. que empregue todos os esforços para que a verdade se apure.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Com relação aos abusos que s. exa. diz serem praticados pelos regedores das freguesias de
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Lisboa, relativamente ao recenseamento, não tenho duvida em assegurar ao illustre deputado que vou dar as ordens necessarias ao sr. governador civil para que elle providenceie para que os regedores cumpram as obrigações que a lei lhes impõe.
Como o illustre deputado me concedeu o documento a que se referiu, eu vou mandal-o ao sr. governador civil, para que elle tome as providencias necessarias para se evitar a repetição de qualquer abuso.
Com relação aos acontecimentos de Almada eu devo dizer ao illustre deputado que já dei ordem ao sr. governador civil para que instasse com o sr. administrador do concelho de Almada, para que elle concluisse o processo preparatorio, que se devia intentar, e o remettesse ao poder judicial, para se descobrir, não só o auctor ou auctores dos acontecimentos, mas para que possa recair sobre o criminoso a inexoravel acção da justiça.
Não posso dar mais informações, porque ainda não as recebi; mandei, e vou dar novas ordens para que se abrevie o processo investigatorio a que se procedeu por parte da auctoridade administrativa, para que o processo seja remettido ao poder judicial o mais breve possivel.
Logo que tenha quaesquer informações a esse respeito, apressar-me-hei a communical as á camara, o mesmo particularmente ao illustre deputado.
Tenho a certeza de que se ha de descobrir toda a verdade a este respeito, e de que ha de ser inexoravelmente punido o auctor do crime, que não só contrista ao illustre deputado, mas contrista a mira e a toda a gente.
Creio que foi uma sentinella pouco conscienciosa dos seus deveres e que se julgou desacatada pela pessoa que foi morta, e que no uso ou abuso do seu direito entendeu que devia dar um tiro, d'onde resultou ser victima o sr. Silveira.
Este facto carece de sor averiguado, e, se for criminoso, carece de ser punido.
Pôde o illustre deputado estar certo de que, não só por parte do meu ministerio mas tambem por parte dos ministerios da guerra e da justiça, se tem dado e se darão as instrucções necessarias para se averiguar a verdade do acontecido e para se punir quem tiver delinquido.
O sr. Arroyo: — Chama a attenção do sr. presidente do conselho para factos importantes que se estão passando em Valença.
Não sabe se estes factos são do conhecimento de s. exa. Se o não são, pede a s. exa. que se informe e que dê as providencias necessarias.
Observa que ha já alguns mezes os habitantes da freguezia de Ganfey fizeram uma queixa ao administrador do concelho de Valença, o qual a tem na sua gaveta, sem proceder como era seu dever.
Esta queixa versava sobre varias mortes causadas pela entrada em algumas casas d'aquella freguezia de um certo curandeiro sob pretexto de que eram milagrosas as curas por elle operadas.
Este facto não era peculiar do concelho de Valença Dá se elle por outras terras do reino, e já o sr. presidente do conselho promettêra uma vez na camara que havia de tomar providencias que obviassem á propaganda d'estes charlatães, que apparecem nas povoações ruraes para abusarem da boa fé e da ignorancia dos povos das serras e das aldeias em proveito do seu bolso particular.
Pede ao sr. presidente do conselho que mande pedir informações ao sr. governador civil respectivo ácerca da queixa que deve estar entregue ao administrador de Valença, tomando em seguida providencias para que estes factos se não repitam e para que aquelles povos não tenham que tornar a queixar-se da fórma abusiva como está procedendo aquella auctoridade.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): — Não tenho conhecimento dos factos a que s. exa. se referiu. Vou pedir informações, e em vista d'ellas tomarei as providencias necessarias para se evitar a repetição d'estes factos.
O sr. Fernandes Vaz: — Mando para a mesa uma representação de escrivães das varas civeis e criminaes da cidade do Porto, pedindo serem equiparados em materia tributaria aos demais empregados publicos.
Foi enviada á commissão de fazenda.
O sr. Bandeira Coelho: — Por parte da commissão de guerra, requeiro que seja enviado ao governo, para informar o requerimento de Antonio Fallé da Silveira Barreto.
O sr. Presidente: — Vae passar-se á ordem do dia.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do projecto de lei n.º 71, relativo á expropriação por zonas
O sr. Ruivo Godinho: — Sr. presidente, tinha começado na sessão passada a mostrar a inconstitucionalidade do projecto que está em discussão, na parte em que propõe que a expropriação vá alem dos terrenos indispensaveis para as obras que a camara municipal de Lisboa vae emprehender.
Podia hoje repetir os argumentos que hontem apresentei, porque durante o pouco tempo em que fallei na sessão passada não se dignou dar-me attenção o sr. ministro do reino, a quem principalmente me dirigia, e que mais desejava me ouvisse, por ter tido a iniciativa do projecto.
Registo o facto não porque queira impor ao sr. Luciano de Castro a obrigação de me ouvir e dar attenção ao que eu digo, mas porque entendo que se qualquer deputado de tão pequeno valor como eu não tem direito a esperar a attenção do sr. José Luciano de Castro, nem póde ter a pretensão de o convencer, tem direito a que o sr. ministro do reino lhe ouça as duvidas que tem sobre os assumptos que se discutem e sobre os projectos que se querem converter em lei, senão para o convencer ao menos para ser convencido ou esclarecido, porque esse deputado por mais humilde que seja representa o paiz, e o sr. ministro do reino ou qualquer ministro da corôa tem obrigação de prestar ao paiz todos os esclarecimentos que elle precisar para conhecer como é administrado.
Portanto, parece-me que não é de estranhar que eu faça este reparo; e espero que se não repetirá o caso que o motiva, se não pela consideração que eu não sou capaz de impor, ao menos pela que o sr. ministro do reino deve ao alto cargo que exerce.
Todavia ainda que repita uma ou outra cousa que já dissesse na sessão passada para melhor ligar o que tenho ainda a dizer sobre o assumpto, não repetirei todos os argumentos que já tive a honra de apresentar, e hei de apenas continuar a apresentar outras rasões que tenho, para me convencer da inconstitucionalidade do projecto, na parte de que o trato.
Quanto mais penso no assumpto mais me convenço que o projecto n'esta parte ataca directa e abertamente a carta constitucional.
Já disse na sessão passada, e repito agora, que nenhum interesse particular ou politico me liga a este projecto; não sei quem mais propriamente lucra ou perde com elle; o desejo de que o projecto não seja convertido em lei provém-me unicamente da convicção que tenho de que elle é contra a carta, e esta convicção nasce-me apenas da reflexão e estudo sobre o projecto; não tenho nada que podesse mais ou menos influir no meu animo para pensar d'esta ou de outra maneira.
Muitas vezes a disposição com que vemos uma cousa, levamos a vel-a, sem nós o percebermos, de um modo differente d’quelle por que a veriamos sem tal disposição;
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aqui nem isso se dá commigo. Tanta vontade tenho eu que tenha rasão a camara municipal de Lisboa como os proprietarios, que podem ser prejudicados com a pretensão da camara; sou por elles unicamente porque julgo a rasão e a justiça do seu lado.
Posso estar em erro, mas é sincero, e tenho muito boa gente n'este ponto a errar commigo.
Já depois de estar n'esta casa eu vi que tenho tambem por mim ou da minha parte a opinião auctorisada do eminente jurisconsulto José Luciano de Castro, que hoje é ministro do reino.
E permitta-me v. exa., sr. presidente, que eu diga aqui de passagem e á boa paz, que dou mais pela opinião do jurisconsulto do que pela do ministro.
Vi hoje uma consulta apresentada em 1870 no jornal o Direito, de que é proprietario e redactor o sr. José Luciano de Castro e o sr. Alves da Fonseca, sobre a especie que agora se discute, á qual se responde no sentido preciso da moção que eu tive a honra de mandar para a mesa.
Por isso hoje, sr. presidente, eu não posso deixar de começar por perguntar a s. exa. quaes foram as rasões que ponderaram no seu animo e o levaram a mudar da opinião que sobre o assumpto tinha em 1870 para a que manifesta agora o que é exactamente a contraria.
V. exa., sr. presidente e a camara, vê que o argumento do jornal o Direito é exactamente o mesmo que ou apresento como principal. A carta constitucional no artigo 145.° e § 21.° garanto o direito de propriedade em toda a sua plenitude, e admitte uma unica excepção, que vem a ser, quando o bem publico exigir o uso e emprego da propriedade do cidadão.
O Direito sustentou em 1870, como eu sustento agora, que a propriedade só pôde ser tirada ao cidadão contra sua vontade para passar para o dominio e uso publico.
E note-se que em 1870 não se apresentava a questão no parlamento tão amplamente e tão aberta como hoje: então queriam-se terrenos para edificações tentava-se estudar a disposição da carta e hoje pedem-se abertamente terrenos, não para serem empregados em edificações, mas para serem vendidos depois de expropriados em beneficio exclusivo da camara municipal de Lisboa; e todavia o sr. José Luciano de Castro não teve duvida em levantar a questão e pol-a como ella é, e pronunciar-se contra a expropriação alem do indispensavel para ser occupado pelas obras, que se pretendam fazer, e agora apresenta este projecto de lei, que contém doutrina diametralmente opposta á que o sr. José Luciano sustentava em 1870.
As circunstancias são as mesmas; a lei é a mesma, por isso nós temos rasão da estranhar que s. exa. mudasse assim de opinião, e o paiz tem direito de saber, quaes foram as rasões qae levaram o ministro a seguir opinião opposta á do jurisconsulto: se são rasões politicas ou se são rasões juridicas; de qualquer ordem que sejam não podem deixar de ser muito fortes, e eu pela minha parte tambem desejo muito sabel-as, porque, se ellas me fizerem mudar de opinião, não terei duvida nenhuma em o confessar.
Penso que o sr. ministro do reino não deixará de dar explicações categoricas a este respeito, porque s. exa. não deixará de comprehender, que esta mudança pôde ter feito uma certa impressão, e pôde ter feito suspeitar que a opinião, que o sr. José Luciano agora apresenta como ministro não é tão segura e sincera como a que s. exa. apresentou como jurisconsulto.
E por mim tenho a franqueza de dizer, que me é muito suspeita a que agora apresenta, não só pela influencia, que a politica podia ter n'ella, mas tambem e ainda mais pelas circumstancias que trouxeram este projecto ao parlamento, e que me deixam ver, que foram unicamente as conveniencias politicas do governo, que o produziram e trouxeram aqui.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): — Peço licença para interromper s. exa. Eu presto a maxima attenção ás considerações do illustre deputado, e se na ultima sessão não ouvi tudo que s. exa. disse, foi pelo estado de inquietação em que estava a camara.
Tenho por s. exa. o respeito devido á seriedade com que costuma entrar em todos os debates.
Quanto ao artigo a que o illustre deputado se referiu, direi a s. exa. que eu podia ter mudado de opinião, como tem succedido muitas vezes, como acontece a todos que estudam e trabalham, modificarem as suas opiniões em pontos e doutrinas, o que não é desairoso para ninguem. (Apoiados.)
Só quem não estuda e não medita sobre os diversos pontos de scincia juridica é que não modifica as suas opiniões. Se tivesse escripto aquelle artigo, não me envergonharia de vir expôr á camara singelamente quaes tinham sido as rasões que me haviam levado a modificar a minha opinião, mas o artigo não é meu, é do fallecido escriptor e distincto funccionario o sr. Coelho de Campos. Os srs. Coelho de Campos e Luiz Antonio Nogueira é que redigiam, na secção de direito administrativo, todos os artigos que appareciam sem assignatura.
N'aquelle anno, o terceiro, os artigos são todos do sr. Coelho de Campos. O sr. Luiz Antonio Nogueira teve sempre por costume assignar os seus artigos; mas desde que entrou para o ministerio do reino, de certo ponto em diante, entendeu não dever assignar. O artigo está muito bem escripto, como tudo que saía da penna do sr. Coelho de Campos, e eu não quero enfeitar-me com as galas alheias, nem tambem tomar a responsabilidade de doutrinas que não me pertencem.
Devo dizer mais, no programma do jornal estava estabelecido que os redactores e collaboradores usariam da maxima liberdade de opinião. A redacção tinha a sua opinião e os collaboradores defendiam tambem a sua, que valia pela auctoridade de rasões que cada um sustentava.
Portanto, não tenho nenhuma responsabilidade no artigo a que o illustre deputado se referiu.
Peço desculpa ao illustre deputado de o ter interrompido para lhe dar esta explicação.
O Orador: - Agradeço as explicações que o sr. presidente do conselho de ministros e ministro do reino se dignou dar, mas permitta-me s. exa. que eu observe, que, estando a opinião, a que me referi contida na resposta a uma consulta feita á redacção do jornal, parece que representa a opinião da redacção, e por isso a de s. exa., que era da redacção, e não fez declaração nenhuma em sentido contrario; no em tanto s. exa. diz, que o artigo não é seu e eu devo acredital-o, mas penso que a sua opinião em 1870 era a do artigo, e vem s. exa. disse que era outra.
Não estranho, que o sr. ministro do reino mudasse de opinião, o que eu queria saber era se o ministro é que tinha levado o jurisconsulto a mudar, e tanto que me limitei a perguntar quaes tinham sido as rasões que o tinham feito mudar, porque julgo que devem ter sido ponderosas, e se ellas fossem simplesmente juridicas podiam ser taes que me convencessem tambem, porque, como já disse, não tenho interesse nenhum ligado ao projecto; combato-o simplesmente por o julgar contra lei e injusto, por isso não tenho difficuldade em passar-me a opinião contraria, se rasões juridicas me convencerem, do que a minha é errada.
Por ora estou convencido de que o projecto é inconstitucional e no seu fundo injusto, e confesso, que por ora não vi nada que abalasse ao menos a minha convicção, que antes vejo corroborada com a auctoridade não contestada do Direito, que é insuspeito, principalmente para o sr. ministro do reino.
Feita esta pequena digressão continuo a expor á camara as considerações que na sessão passada tinha começado a expor.
Tinha já dito que a expropriação é uma excepção, por
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isso não pôde ter senão uma interpretação restricta, tanto mais que a propria lei, referindo-se ao caso do bem publico legalmente reconhecido exigir o uso e emprego da propriedade do cidadão, diz que esta é a unica excepção que terá logar.
Se a lei quizesse admittir a expropriação por zonas como é apresentada no projecto, não poderia deixar de limitar essas zonas, que o legislador nunca poderia deixar ao arbitrio do executor da lei, e tanto mais quanto tinha mostrado um grande respeito pelo direito da propriedade, que tinha começado por garantir em toda a sua plenitude.
É uma boa plenitude esta que o projecto deixa ao direito de propriedade!
Sempre a carta tem tido a interpretação que eu lhe dou agora de limitar a expropriação ao caso de ter de passar a propriedade do dominio particular para o dominio publico; interpretal-a agora de outra maneira é estabelecer uma desigualdade em que não póde condescender uma constituição que estabeleceu que a lei seria igual para todos.
Com que direito querem ir agora tirar aos proprietarios dos terrenos, onde se hão de fazer o parque e a nova avenida, mais do que o necessario para esse parque e avenida, quando ainda ha pouco aos proprietarios, em cujos terrenos se abriu a avenida da Liberdade, não tiraram se não os terrenos indispensaveis para aquella grandiosa obra?
Como é que ha cincoenta annos estão interpretando assim a lei e hão de agora vir interpretal-a de outra fórma?
E se ella deve ter a interpretação que agora se lhe quer dar, porque é que não confessam que têem errado até agora, e não apresentam uma lei de caracter generico? (Apoiados.)
Porque é que apresentam este projecto em fórma de privilegio para a camara municipal de Lisboa e não ampliam uma tal interpretação a todas as camaras do paiz?
A epocha dos privilegios já passou, e eucreio que a camara municipal de Lisboa não tem mais direitos do que as outras camaras do paiz!
O proprio governo limitando a nova interpretação da carta constitucional á camara municipal de Lisboa, reconhece que é um mero favor, e não justiça que faz, porque a justiça é devida a todos, e se se tratasse de justiça não seria ella negada a ninguem, e apparecêra uma lei generica reconhecendo em todas as camaras como direito o que o projecto dá em fórma do favor á camara municipal de Lisboa.
Uma interpretação assim era errada no meu modo de ver, mas ao menos tinha a seu favor a força moral da convicção com que era dada, a uniformidade que ainda dá mais força.
Mas ao contrario d'isto o governo mostra por todas as fórmas que não está convencido da opinião que manifesta no projecto que se discute.
Já outro dia fiz notar o cuidado com que o governo e a commissão trataram de occultar e esconder o verdadeiro estado da questão no canto de um paragrapho' collocado em toda a evidencia do artigo 1.° uma materia já comprehendida em lei, que é a de 11 de maio de 1872, que permitte a todas as camaras do paiz as expropriações necessarias para o alargamento e abertura de ruas, jardins, praças e parques; e agora noto mais a hesitação em que estão o governo e a commissão; a precipitação e leviandade que se nota em tudo isto, e que são sem duvida provenientes da falta de convicção e firmeza na opinião que se manifesta no projecto.
Apresenta-se o projecto com o fim manifesto, e manifestado no relatorio do governo, da camara municipal de Lisboa obter meios para fazer as obras mencionadas no mesmo projecto; não se apresenta sequer um orçamento do que podem custar essas obras e do que podem render as expropriações a mais para o parlamento poder avaliar o alcance do que vota e não exigir aos proprietarios em nome de um grande melhoramento mais do que for necessario para esse melhoramento.
Apresenta se o projecto e logo dois dias depois apresenta-se uma emenda, que lhe modifica completamente a indole.
Refiro-me á emenda ou substituição apresentada ultimamente, que reconhece aos proprietarios o direito a 20 por cento da valorisação dos terrenos expropriados, que o projecto primitivo lhes negava.
Não significará tudo isto, que o governo não está seguro na opinião que manifesta no projecto?
Eu estou persuadido, não só d'isto, mas até de que a opinião segura e firme do governo é exactamente a contraria á manifestada no projecto, e estou tão persuadido d'isto, que julgo que o governo não era capaz de apresentar este projecto e de o fazer discutir senão n'uma occasião d'estas, no fim da sessão, quando todos estão cansados e aborrecidos, e quando se fez um accordo para serem discutidos certos projectos, entre os quaes figura este, que talvez fosse a principal causa do accordo.
Isto mesmo já o Direito dizia da lei de l de setembro de 1869: este jornal, no artigo ou resposta á consulta, a que já me referi, diz que aquella lei não sairia assim do parlamento, se não fosse apresentada no fim de uma sessão, em que passam enxames de leis sem exame nem estudo algum.
O que diria o Direito d'este projecto, que não tem comparação com a lei de l de setembro de 1869, se o sr. José Luciano de Castro, que o apresentou, não fosse um dos seus proprietarios e redactores principaes?
A interpretação, que ha cincoenta annos tem sido dada á carta em sentido contrario á que agora se lhe quer dar no projecto, as circumstancias que têem acompanhado o projecto e mostram a hesitação e pouca firmeza do governo na sua opinião, ou antes na opinião do projecto, parece-me, que são garantia de que é verdadeira a opinião que sustento, de que o projecto tende a alterar uma disposição da carta, e por isso não pôde ser discutido em sess3o ordinaria das côrtes. (Apoiados.)
Pareceu-me que o sr. relator da commissão quiz outro dia negar, que se tenha sempre dado á carta a interpretação que eu lhe dou.
Vou mostrar a s. exa., com as proprias leis, que cita no seu parecer, que está enganado, e que essas mesmas leis, em que s. exa. quer ver precedentes a bem da opinião que agora sustenta, não destroem e antes corroboram a minha asserção, de que a carta não permitte a expropriação senão quando a propriedade expropriada passa do dominio particular para o dominio publico.
Apresenta-se logo a lei de l de setembro de 1869, que no artigo 11.° diz o seguinte: «São declaradas de utilidade publica e urgentes as expropriações, que forem necessarias para a abertura da rua, etc.»
Portanto esta lei auctorisa as expropriações necessarias para a abertura de uma rua, isto é faz passar as propriedades expropriadas do dominio particular para o dominio publico, como eu julgo que é necessario.
E note-se que a lei não se contenta com a circumstancia de que as expropriações sejam uteis, reconhece que é preciso que sejam urgentes, porque diz de utilidade publica e urgente.
Todas as leia e decretos, que auctorisam expropriações empregam estas expressões de utilidade publica e urgente para corresponder á disposição da carta, que não estabeleceu a expropriação quando se désse a mera utilidade do bem publico, mas unicamente quando fosse indispensavel, quando o bem publico o exigisse: esta expressão das leis de expropriação corresponde ao exija da carta.
A carta diz quando o bem publico o exija, as leis que executam a carta dizem que taes expropriações são urgentes, isto é, exige-as o bem publico.
Não me aponta, v. exa. já o artigo 12.° da lei, a que me
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tenho referido; eu hei de, fallar d'elle mais tarde, quando fallar dos precedentes, e não fallo já agora, porque, repito, eu entro n'esta questão levado unicamente pela minha convicção; por isso, em vez de confundir e embaraçar a discussão, quero seguir com ordem para que possam ser bem comprehendidos os meus argumentos e os possam refutar, se elles têem refutação, por isso guardo o artigo 12.° para quando fallar dos precedentes, e pena tenho eu não ter podido expor as minhas considerações em uma só sessão, para ser mais preciso na argumentação e não ter de repetir alguma cousa do que tivesse dito, como naturalmente já tem succedido, pela necessidade de ligar o que disse na sessão passada com o que tinha ainda a dizer.
Por isso continuo agora a mostrar, que as leis, que têem tratado de dar execução á carta constitucional a têem entendido como eu a entendo.
Depois da lei de l de setembro de 1869 temos a de 11 de maio de 1872, que diz assim no artigo 1.°: «Será reconhecida e decretada pelo governo para os effeitos do § 2.º do artigo 2.° da lei de 23 de julho de 1850, e da lei de 17 de junho de 1859, e nos termos da lei de 17 de setembro de 1857, a utilidade publica e a urgencia das expropriações, que forem necessarias para o melhoramento das ruas, praças, jardins, e edificações existentes nas cidades e villas do reino, e para a construcção nas mesmas villas e cidades de novas ruas, praças e jardins e para as edificações adjacentes».
Aqui temos reconhecida tambem a necessidade da urgencia da expropriação e não a sua simples utilidade; e aqui temos tambem a expropriação limitada aos terrenos e predios necessarios para o alargamento ou abertura de ruas, jardins e praças, isto é, a propriedade a passar do dominio particular para o dominio publico, como é indispensavel nos termos da carta.
N'esta lei tambem o illustre relator vê um precedente a favor da doutrina do projecto: trataremos d'elle logo quando tratarmos dos outros precedentes: agora continuemos a ver como outras leis dão igual interpretação á carta, e segue-se a lei de 15 de abril de 1874 tambem citada no parecer.
Esta lei diz no artigo 1.º o seguinte:
«São declaradas de utilidade publica e urgentes as expropriações que a camara municipal do Porto tiver de fazer para abertura da rua de Mousinho da Silveira e do Barredo, e alargamento da rua das Gongostas.»
Vê-se que esta lei tambem reconhece, que nas expropriações tem de passar a propriedade do dominio particular para o publico; mas o que é notavel é que tambem n'esta lei, apesar d'esta clareza, tambem o illustre relator vê um precedente, que tambem analisarei quando cuidar dos outros.
Aqui está como durante o longo periodo de mais de cincoenta annos tem sido interpretada a carta, e note-se que as leis de expropriação são ou contêem o regulamento do § 21.° do artigo 145.º
A lei de 23 de julho de 1850 estabeleceu o modo de se dar a indemnisação aos proprietarios que soffressem a expropriação; varias leis posteriores têem determinado os casos, em que ella pôde ter logar, visto que a carta exige o bem publico legalmente reconhecido, e na lei de 11 de maio de 1872 estabeleceram se os casos em que as camaras municipaes podem fazer expropriações.
A interpretação d'esta disposição da carta está já estabelecida e firmada por estas leis, que são o seu regulamento.
E que estas leis são o regulamento da carta n'esta parte reconheço-o o proprio parecer da commissão, quando diz:
«A fórma de verificar casa utilidade (refere-se á utilidade publica, que póde produzir a expropriação: é o bem publico da carta) e de liquidar e pagar a devida indemnisação está regulada pelas de 23 de julho de 1850, 17 de setembro de 1857 e 8 de junho de 1859.»
Logo, decretada ou admittida a expropriação pela carta, regulado o modo como se verificam os casos, em que tal expropriação tem logar, não ha mais nada a fazer, quando apparecer alguma pretensão a expropriação, se não verificar pelo modo estabelecido na lei se está no caso de ser attendida.
O poder legislativo ora circumstancias ordinarias já não tem que ver com a materia de expropriações, a não ser que queira derogar as leis que regulam a especie: já disse por estas leis a sua ultima palavra sobre o assumpto: o que o poder executivo não póde fazer, tambem e não pôde fazer o legislativo, a não ser, como já disse, derogar alguma das leis que tem feito.
O proprio parecer da commissão diz mais adiante. «Falta, porém, decretar e regular os casos em que o proprio interesse dos municipios e a melhor e mais larga execução dos melhoramentos publicos determinam e aconselham a expropriação no todo ou em parte de predios não comprehendidos no perimetro das mesmas obras».
Aqui reconhece a commissão que a expropriação de terreno ou predios alem dos comprehendidos nos perimetros das obras, não está comprehendida nas disposições da carta, porque, se o estivera, não diria que falta decretar esse caso.
E se não está comprehendido na carta constitucional, é claro, que é ir contra ella o querel-o estabelecer agora, e tudo o que tende a alterar a carta não se pôde fazer em côrtes ordinarias.
Logo mostrarei como o parecer da commissão está em contradicção ou cáe em contradicção no que diz a respeito ou quanto ao fundo da questão; agora vou examinar o que a commissão chama precedentes, e que invoca em auxilio da doutrina do projecto.
Onde a commissão vê o primeiro precedente é no artigo 12.° da lei de l de setembro de 1869, que diz assim: «se no traçado da rua for comprehendida parte de algum edificio ou predio, poderá a camara, se assim lhe convier, expropriar todo esse edificio ou predio».
Começo por observar que os precedentes não obrigam, e que apenas podem ter força elucidativa para indicarem como se deve fazer, mostrando como se fez em circumstancias identicas, por isso é preciso que as circumstancias sejam perfeitamente identicas, que o caso seja o mesmo, para que o modo de fazer hoje seja o mesmo de hontem, quando, ainda assim, nos não convençamos, que foi errado o modo de fazer de hontem.
Portanto, a primeira cousa que temos a fazer é ver se o caso que se dá agora é exactamente o que se deu em 1869.
Se for o mesmo, podemos dizer que temos um precedente, se não for, não ha tal precedente.
Em 1869 tratava-se apenas de abertura de uma rua no meio da cidade do Porto, que não podia encontrar senão edificios, quintas e jardins de pequena extensão, que ficariam em quasi toda a sua extensão apanhados pela rua; agora trata-se de um grande trato de terreno, onde se não dá aquella circumstancia.
Em 1869, para que a camara municipal do Porto podesse expropriar a parte de um edificio ou predio, que sobrasse da occupação da rua, era necessario que parte d'esse edificio ou predio ficasse comprehendida pela rua, agora pelo projecto quer se expropriar mais uma faxa de terreno de 50 metros para cada lado das obras, ainda que essa faxa de terreno vá cair em propriedade em que não toquem as obras que se projectam.
Portanto, não ha aqui precedente para o caso, de que se trata, que é muito differente do que se figura na lei de l de setembro de 1869, e não se pôde por isso vir aqui procurar argumento a favor do projecto.
Alem d'isto deve notar se que este direito, que a lei de 1 de setembro de 1869 deu á camara municipal do Porto, para expropriar todo um predio, quando só carecesse de uma parte d'elle, é a reciprocidade do direito, que já ti-
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nham os proprietarios de fazer expropriar todo um predio, quando parte d'elle lhes fosse expropriada; portanto o fim da lei foi mais estabelecer esta igualdade entre a camara e os proprietarios, do que firmar ou reconhecer, que a camara tinha direito a expropriar mais do que o necessario para ser occupado pelas obras.
E não é só isto: deve tambem notar-se, que uma similhante disposição era apenas doutrinaria, porque, costumando as expropriações pagar-se muito caras, não era provavel que a camara do Porto as quizesse alargar.
Podemos tambem ainda notar que na lei de l de setembro de 1869 não se diz que destino deve ter a parte do predio expropriada alem do necessario para as obras, por isso deve entender se, que deveria ser applicada em obras publicas, como eu julgo de lei, e aqui no projecto destina-se logo o terreno expropriado a mais para o unico fim da camara municipal de Lisboa o tornar a vender e fazer negocio com elle.
N'uma palavra, para haver precedente, era necessario que qualquer camara ou qualquer corporação ou mesmo estado fosse alguma vez auctorisado a fazer expropriações com o unico fim de tornar a vender, o terreno ou edificio expropriado e locupletar-se com o que o terreno ou edificio rendesse a mais.
Este é que seria o precedente, porque este é que é o caso, que se dá agora, mas um precedente assim ainda não appareceu; senão vejamos os que a commissão continua a apresentar como taes.
A commissão julga ver o segundo precedente na lei de 11 de maio de 1872, que permitte as expropriações para a abertura de ruas e praças, e para edificações adjacentes.
O sr. relator até julga ver na expressão edificações adjacentes a expropriação por zonas, porque entende que estas edificações tanto podem ser publicas como particulares.
Ora, sr. presidente, se a commissão e o seu illustre relator estivessem certos e seguros d'esta opinião, ou pelo menos a tivessem sinceramente, julgariam prejudicada a doutrina do projecto e diriam á camara municipal de Lisboa, que podia fazer a expropriação que quizesse, porque a lei de 1872, nem lhe marca o limite de 50 metros, que o projecto estabelece, porque note v. exa., sr. presidente, e note a camara, que a citada lei não contém uma disposição especial e particular para esta ou para aquella obra, e para esta ou para aquella camara, como a de l de setembro de 1869; comprehende uma disposição generica e permanente, que está em vigor, que todos os dias está sendo applicada; mas a commissão e o sr. relator não fizeram assim, e vieram com o projecto á discussão: logo é porque não julgam que a referida lei de 11 de maio de 1872 auctorise realmente a expropriação por zonas.
E esta leve consideração basta, não só para mostrar, que esta lei não contém precedente algum de expropriação a mais do que a necessaria para uso e emprego do bem publico, mas até que a propria commissão não vê ali similhante precedente, porque, se o visse, não viria com este projecto á camara e limitar-se-ía a aconselhar a execução da referida lei.
O outro precedente apontado é o da lei de 15 de abril de 1874, que no artigo 3.° diz o seguinte: «se no traçado das ruas, a que se refere o artigo 1.°, for comprehendida parte de algum edificio ou predio poderá o proprietario obrigar a camara, bem como a camara (se isso lhe convier) ao proprietario, á expropriação de todo o edificio ou predio.
Aqui se vê claramente estabelecida a reciprocidade de direitos entre o expropriante e expropriado, como era de justiça.
Este exemplo está perfeitamente nas mesmas circumstancias em que está o da lei de l de setembro de 1869, e escuso de repetir á camara as considerações que já tive a honra de lhe apresentar, quando fallei d'esta ultima lei, e limito me a observar que esta lei de 1874, estabelecendo claramente a reciprocidade, não faz senão corroborar o que eu disse sobre a disposição da lei de 1869.
Repito, sr. presidente, não ha exemplo de um caso, como o que se quer estabelecer com este projecto, e Deus permitta que este seja o unico, porque o julgo injusto e contra todos os principios do direito.
Mas, sr. presidente, se os precedentes valem, eu tambem tenho precedentes em abono da minha opinião, e com a circumstancia importantissima de comprehenderem precisamente o caso que se discute.
Esta questão já não é nova no parlamento portuguez; appareceu claramente em 1870, em que provocou aquella consulta feita ao jornal o Direito, a que já me referi, e não passou: appareceu depois em 1877 quando se tratava de abrir a avenida da Liberdade, disfarçada na expropriação a mais para construcção de edificios municipaes.
O projecto discutido em 1877 tinha sido apresentado a esta camara em 1874; isto é, esteve tres annos á espera de vez: aqui passou quasi desapercebidamente, mas na camara dos dignos pares entendeu-se que no pedido de expropriação para edificações municipaes se encobria o fim que a camara municipal tinha de vender essas edificações, e se envolvia o que agora se chama expropriação por zonas; poz-se claramente a questão da inconstitucionalidade, que eu ponho agora, e o projecto não passou, porque a inconstitucionalidade foi reconhecida e votada unanimemente por aquella respeitavel assembléa legislativa.
Portanto, sr. presidente, aqui estão dois precedentes bem precisos e um bem moderno a favor da doutrina que eu sustento agora.
E não se diga que em 1877 foi approvado o projecto e reconhecida a expropriação por zonas n'esta casa do paramento, porque a verdade é que a questão foi aqui apresentada disfarçadamente, o que importa o reconhecimento de que, se a aprosentassem abertamente, não passaria, e que a camara dos senhores deputados se conformou com a deliberação, da dos dignos pares, porque, vindo para aqui a mensagem d'aquella camara, nem ao menos a discutiu. E a avenida da Liberdade fez-se sem expropriação por zonas, apesar das más circumstancias em que infelizmente já então se encontrava a camara municipal de Lisboa!
Portanto, repito, o parlamento portuguez já se pronunciou contra o principio consignado n'este projecto: as circumstancias são as mesmas e não hão de assembléas tão respeitaveis, como as que constituem o nosso parlamento ter duas opiniões sobre o mesmo principio, e contradizer hoje o que disseram hontem!
Sr. presidente, não ficam só nos precedentes de casa os propugnadores da doutrina do projecto, ou da expropriação por zonas, vão tambem buscar precedentes lá fóra, e adduzem o exemplo da Belgica, e ultimamente o da Hespanha e do Brazil; por isso tenho eu necessidade de ver tambem e de mostrar á camara o que são e o que valem esses exemplos.
Primeiramente, sr. presidente, comprehenderá v. exa. facilmente e a camara, que para que taes exemplos podessem ter algum valor n'esta questão da inconstitucionalidade, era essencial que quando os invoca, mostrasse logo que a constituição d'esses paizes contém a este respeito a mesma disposição que a nossa constituição estabelece, porque bem pôde não ser constitucional na Belgica o que o é em Portugal: isso depende das disposições das respectivas constituições.
A expropriação por zonas é constitucional entre nós, porque a nossa carta garante o direito de propriedade em toda a sua plenitude, e limita a expropriação ao unico caso do bem publico exigir o uso e emprego da propriedade do cidadão; se na Belgica se ampliar a expropriação a outros casos, bem pôde a expropriação por zonas não ser contra a constituição.
Portanto, sr. presidente, sem nos apresentarem as con-
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stituições dos paizes cujo exemplo invocam, iguaes á nossa, não tem tal exemplo valor algum para o caso de que se trata.
Alem d'isto os casos da Belgica e do Brazil apresentam-se em circumstancias muito especiaes e differentes d'aquellas em que nós nos achâmos agora.
No Brazil tratava-se de alargar uma rua, que conduzia ao pago real e que era indispensavel alargar e dava-se aos proprietarios o direito de entrarem na reconstrução na proporção do que lhes era expropriado, o que envolve o reconhecimento do respeito devido á propriedade: na Belgica tratava-se de extinguir uns pantanos, e para isso era necessario que a expropriação se alargasse um pouco mais para se conseguir o grande e indispensavel bem publico emprehendido na extincção dos pantanos.
Entre nós não se trata de uma obra indispensavel: as indispensaveis temol-as feito com a expropriação ordinaria; trata-se de uma obra, de luxo, de uma obra de mera utilidade como são em geral todas as obras de luxo: inventou-se uma obra não por necessidade publica, mas para acudir ás finanças da camara municipal de Lisboa: isto é que eu creio que nenhum outro paiz ainda fez, nem fará.
Na Hespanha é que se estabeleceu uma lei de caracter generico, mas não se exige aos proprietarios dos predios marginaes, que lucram com o melhoramento que se faz, mais do que a quinta parte do seu predio se não quizer concorrer para a obra por outra fórma estabelecida na lei; mas entre nós apresentou-se a principio este projecto, que obrigava os proprietarios a comprarem por alto preço aquillo mesmo que já os tinham obrigado a vender barato, e era seu; e por fim, com a emenda ultimamente apresentada deixam-lhes 20 por cento, que é exactamente a quinta parte que os hespanhoes têem de dar, isto é: em Hespanha contentam-se com a quinta parte dos predios marginaes ás obras, que se queiram fazer e em Portugal não se deixa aos proprietarios senão a quinta parte dos seus predios.
N'este caso é melhor ser hespanhol do que portuguez.
Vê se, portanto, que os exemplos das outras nações, que nos apresentam, são muito differentes do caso, que se apresenta no projecto que se discute; e que o não fossem, a esses exemplos podíamos nós oppor os das outras nações, que são em muito maior numero, que não seguem ou não têem adoptado o principio de expropriação por zonas, e que não estão menos adiantados em civilisação e não têem feito menos obras do que aquellas cujo exemplo nos apresentam.
Se os exemplos valem, devem prevalecer os de maior numero, e é maior o numero das nações civilisadas que não têem adoptado a expropriação por zonas.
E na verdade, sr. presidente, é tão mau o principio, que, entre tantas nações que ha no mundo, só tem sido adoptado por tres, e ainda assim em condições muito differentes do que o que agora se pretende introduzir entre nós.
Tenho demonstrado, examinando o texto da carta, examinando a pratica seguida até aqui e vendo os exemplos das nações cultas, que se não podo dar outra interpretação á carta, senão a de limitar a expropriação ao indispensavel para ser occupado pelas obras publicas, que se pretendem ou querem fazer; proponho me agora demonstrar, que nem se lhe pôde dar outra interpretação, porque seria suppor que a carta teria estabelecido um principio injusto e contra os principios de direito.
Encarada a questão debaixo d'este ponto de vista, que se pôde reduzir á seguinte these: a carta não pôde admittir a expropriação alem do terreno ou predios indispensaveis para ser occupado por obras publicas, podia eu considerar todos os argumentos com que os propugnadores do principio da expropriação por zonas sustentam a sua opinião; mas como eu quero ser franco na argumentação, limitar-se-hei a examinar os principaes argumentos apresentados pela camara municipal de Lisboa e pelo sr. ministro do reino, aguardando-me para examinar os outros, quando tiver a palavra sobre a generalidade do projecto, se eu não lograr convencer a camara de que carecemos de competencia para tratar da questão em côrtes ordinarias.
Julgo-me auctorisado a proceder assim, porque só eu mostrar que o principio é injusto, é facil concluir que se não deve suppor estabelecido na carta, e que se não deve interpretar esta de modo a dar logar a uma injustiça, como seria a de obrigar os proprietarios a soffrer uma expropriação alem do indispensavel para ser occupado pelas obras que ao pretendem fazer.
Isto está dentro da promessa que fiz de me cingir á questão, e se não o está, peço á camara me desculpe esta pequena liberdade, que eu me permitto unicamente com o fim de esclarecer a questão.
Sobre a inconstitucionalidade do projecto, tanto o relatorio do sr. ministro do reino, como o parecer da commissão não invocam outra rasão senão a dos precedentes, em que já fallei, mostrando que não procedem; sobre o fundo da questão, ou sobre, o principio do expropriação por zonas, não apresenta o parecer da commissão rasão alguma, e limita-se n'esta parte a remetter-nos para o relatorio do governo; por isso nada tenho aqui a considerar no ponto de vista em que vou encarar a questão.
A camara municipal de Lisboa dirigiu uma representação ao parlamento, pedindo a approvação do projecto, e, não satisfeita, ao que parece, com as rasões com que o sr. ministro do reino o sustenta no seu relatorio, adduziu outras, que eu examinarei, e que não procedem.
Penso que não será estranhavel que eu discuta a representação da camara municipal de Lisboa, porque desde que foi impressa e distribuida por todos nós e nos é dirigida, é um documento sujeito á nossa apreciação, e começarei até por este documento, porque, sendo apresentado pelo principal interessado, é de suppor que contenha o melhor reforço de rasões e argumentos a bem da doutrina que sustenta.
O argumento apresentado pela camara municipal é o seguinte, que eu vou ler á camara: «O proprietário largamente indemnisado a nada mais tem direito; o augmento de valor que o predio obtem depois do expropriado não provém de acto ou esforço seu; é, pelo contrario, obtido com os dinheiros da communidade; é justo que reverta em beneficio d'ella».
Aqui está o argumento nas proprias palavras da camara municipal.
Todos sabem que, para que a conclusão de um argumento seja verdadeira, é preciso que verdadeiras sejam as suas premissas.
As premissas do argumento apresentado são: 1.°, que o proprietario não tem direito a mais nada do que a ser largamente indemnisado; 2.°, que as obras que augmentam o valor ao predio depois de expropriado são feitas com os dinheiros da communidade.
Se eu demonstrar que estas premissas são falsas, tenho demonstrado que falsa é a conclusão a que chegou a camara municipal de Lisboa.
Ora, o proprietario não tem só o direito a ser indemnisado; tem outros direitos, e entre elles o de conservar o seu predio; logo esta premissa não é verdadeira e o argumento não procede. (Apoiados.)
E na verdade, sr. presidente, a indemnisação não é uma compensação do direito do propriedade; é apenas uma attenuação á violencia que se faz ao proprietario, de lhe tirar contra sua vontade aquillo que é seu.
E é uma attenuação pequena, porque, em boa philosophia, a violação de um direito está acima de todo o valor.
Por maior que ella seja, não compensa o proprietario que faz gosto em conservar o seu predio, e que prefere isso aos maiores lucros que lhe offereçam.
Quem for proprietario comprehende isto perfeitamente; e todos nós somos proprietarios, ainda que todos o não se-
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jamos de predios; todos temos ou possuimos alguma cousa que não dariamos por preço nenhum.
A outra premissa tambem não é verdadeira.
Pôde constituir só por si um argumento exposto nos seguintes termos: o argumento de valor, que o predio obtem depois de expropriado, é obtido com os dinheiros da communidade, logo deve reverter em beneficio d'ella.
D'onde se concluo que, se tal augmento de valor não for obtido com os dinheiros da communidade, não deve reverter em beneficio d'ella.
E é facil demonstrar que esse augmento não é obtido com os dinheiros da communidade; basta ver e reparar que a camara municipal pretende fazer as obras, não com os dinheiros da communidade, mas com o que renderem os predios expropriados; por isso tambem não procede este argumento, visto que não é verdadeira a base em que assenta.
E na verdade, sr. presidente, o que é justo e rasoavel é que, sendo a avenida, parque e ruas para todos, contribuam todos para ellas.
Mas supponhamos com effeito que estes melhoramentos augmentam o valor dos predios vizinhos, sem que os seus donos tenham concorrido exclusivamente para tal augmento!
Pensa-se n'isto e faz confusão!
Tambem a camara municipal, fazendo as obras pelo systema do projecto, á custa da valorisação dos terrenos vizinhos não concorre com cousa alguma para tal valorisação, para que a possa haver!
Tambem a accessão acresce á propriedade sem acto algum do proprietario, que concorra para isso, e é d'elle!
É uma especie de compensação aos muitos prejuizos, a que a propriedade está sujeita, por certo independentemente da vontade do proprietario, que tem de os soffrer sem direito a pedir indemnisação a ninguem.
O augmento de valor proveniente de obras publicas é uma compensação ou uma reciprocidade pelo prejuizo que essas obras muitas vezes causam.
Assim como a camara municipal de Lisboa se não julga obrigada a indemnisar os proprietarios pelos prejuizos que lhes causa com as suas obras, da mesma maneira se não pôde julgar com direito aos beneficios que as mesmas obras lhes possam produzir.
Se assim não fôra, ao mesmo tempo que a camara municipal de Lisboa pensa em chamar a si o beneficio, que vae causar com as obras projectadas aos vizinhos d'ellas, devia pensar tambem na indemnisação de prejuizo, que naturalmente as mesmas obras hão de ou podem causar aos outros proprietarios de predios, a quem naturalmente vão fazer concorrencia as novas edificações que se projectam, fazendo baixar a renda das casas.
A isto acresce ainda a circumstancia de que, tendo a camara municipal de Lisboa feito muitas obras importantes, e ainda ha pouco a da avenida da Liberdade, e não tendo nunca chamado a si o augmento de valor, que taes obras deram aos predios vizinhos, seria uma grande desigualdade tirar agora aos vizinhos das novas obras o que se não tirou aos donos dos predios adjacentes ás que se têem feito até aqui.
Um tal procedimento seria, sobre injusto, muito desigual, e por isso é que se não pôde coadunar com as disposições da carta constitucional, que estabeleceu a igualdade da lei para todos.
Demonstrada a improcedencia dos argumentos da camara municipal, vejamos agora o argumento do sr. ministro do reino.
Diz o sr. ministro do reino no seu relatorio:
«A estas considerações acresce que, devendo a indemnisação aos donos dos predios expropriados representar exactamente o valor de que são privados pela expropriação, e o prejuizo que esta lhes causa, não parece justo que na hypothese de com ella augmentar consideravelmente o valor da parte não expropriada, lucrem mais este beneficio sem nenhuma vantagem para os municipios.»
Este é o argumento do sr. minstro do reino: até aqui e d'aqui por diante faz considerações tendentes a mostrar a vantagem das obras projectadas e que a camara municipal não pôde augmentar os impostos nem recorrer ao credito.
A estas considerações, que aliás não servem para demonstrar se a valorisação dos terrenos marginaes ás obras deve ser da camara municipal ou dos proprietarios, que é a questão que se debate, responderei se se discutir o projecto; agora examino o unico argumento que s. exa. adduziu com o fim de demonstrar que a valorisação dos terrenos marginaes ás obras pertence á camara municipal e não aos proprietarios
O argumento reduz-se quasi á seguinte affirmação: não é justo que os proprietarios lucrem o augmento do valor da parte não expropriada dos seus predios, porque a indemnisação deve representar o valor de que são privados; mas um valor de que os proprietarios são privados é examente o que resulta do augmento proveniente da obra, por isso devem ser indemnisados d'elles, ou devem deixar-se-lhes; e é exactamente esse valor que a camara municipal quer tirar de mão beijada aos proprietarios.
O problema põe-se assim: o augmento de valor ha de pertencer, ou aos municipios, ou aos donos dos predios marginaes das obras; a qual dos dois será justo que pertença?
Se se responder que pertence aos municipios que fazem as obras, que produzem esse augmento, nota-se logo que n'esse caso, que é a hypothese do projecto, não são os municipios que fazem as obras, fal-as o proprio augmento de valor, e os municipios viriam a lucrar um beneficio para que não concorreram senão com o plano, que lhes não custou nada.
Alem d'isto, os municipios não fazem as obras para beneficiar os vizinhos d'elles, por isso não é justo que esses as paguem; fazem-nas em beneficio de todos, por isso é justo que todos as paguem; se o beneficio é maior para os vizinhos, tambem elles concorrem a mais do que os outros com o sacrificio de venderem a sua propriedade contra sua vontade, que não é pequeno.
O proprio sr. ministro do reino reconhece que não resolveu o problema pelo modo mais justo, quando diz no seu relatorio, logo em seguida, que conviria mais adoptar o systema francez, que consiste em abater no preço da expropriação o valor do beneficio que da sua expropriação resulta para a parte do predio não expropriada.
Portanto, parece-me que não proceda o argumento do sr. ministro do reino, como s. exa. mesmo reconhece.
Ha quem sustente que os proprietarios dos predios marginaes ás obras é que as devem pagar, porque são os que lucram com ellas no augmento do valor que d'ahi resulta.
Quem assim pensa está em erro, e não repara que esse augmento de valor dá-se só na faxa de 50 metros que a camara municipal unicamente quer expropriar; por isso não ficam os proprietarios com elle, e cessa a rasão por que se entendia que taes proprietarios é que deviam pagar obras, que aliás não pedem.
Sr. presidente, queria aqui terminar as minhas considerações; mas prometti mostrar que o parecer da commissão está em contradicção comsigo mesmo, e não quero terminar sem cumprir a minha promessa; serei breve para não cansar a attenção da camara, de cuja bondade eu já terei abusado.
No fim do 4.° paragrapho diz o parecer que é preciso, para se attender á pretensão da camara municipal de Lisboa, uma medida legislativa que, garantindo os direitos e justos interesses dos proprietarios, corresponda ás reclamações do bem publico e ás necessidades da civilisação.
Note v. exa. e a camara que aqui reconhece o parecer, e por isso toda a commissão, que é preciso uma medida.
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que garanta os direitos e interesses dos proprietarios, e no ultimo paragrapho do parecer diz simplesmente que pelo projecto ficam garantidos os interesses dos proprietarios.
Esqueceu-se dos direitos, que são de mais valor que os interesses.
Depois de confessar que era preciso uma medida que garantisse os direitos e interesses dos proprietarios, não devia contentar se com uma que apenas garante os interesses, e por isso devia a commissão rejeitar o projecto, e, acceitando o, poz se em contradicção com os principios que ella mesma estabeleceu.
Sr. presidente, tentei demonstrar que a carta constitucional não permitte a expropriação senão do que for absolutamente indispensavel para ser occupado pelas obras publicas que se emprehendem, e que por isso o projecto que se discute tende a alterar uma das suas disposições, o quiz realisar o meu intento, mostrando que é esta a interpretação que se deve dar á letra e espirito da carta; que é esta a interpretação que sempre se lhe tem dado, e que se lhe não pôde dar outra, bem ir contra os principios do direito e da justiça.
Estou plenamente convencido da opinião que expuz; se não fiz valer esta opinião por deficiencia, de argumentação ou de exposição, digne-se a camara supprir esta deficiencia com a sua illustrada reflexão, que estou certo chegará á convicção em que eu estou.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Barbosa de Magalhães: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Apresentou o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, ácerca das auctorisações que lhe foram concedidas e do que fizera uso no intervallo das sessões legislativas.
É o seguinte:
N.° 95-B
Senhores. - Havendo já tido a honra de submetter ao vosso exame o meu relatorio sobre o estado da fazenda publica, com varias propostas tendentes a melhorar a sua administração, e havendo tambem cumprido o preceito constitucional e o da lei de 25 de junho de 1881, pela apresentação do orçamento animal e da conta geral do estado referida ao dia 30 de junho do anno findo, é dever meu ainda mostrar vos o uso feito pelo governo das auctorisações parlamentares, concedidas em materias de finanças, antes e depois de 6 de agosto de 1887, data do ultimo relatorio dos actos do ministerio a meu cargo, indicando-vos conjunctamente as providencias de ordem administrativa adoptadas no interregno parlamentar para mais perfeito andamento dos serviços do mesmo ministerio.
Conforme a pratica, vae este trabalho acompanhado de diversos documentos, organisados nas repartições superiores da administração da fazenda adiante designadas, para com mais clareza poder avaliar-se a marcha d'essa administração.
I
REPARTIÇÃO DO GABINETE DO MINISTRO
Contrastarias
Havendo sido reduzido a trinta dias o praso marcado no artigo 130.° do regulamento das contrastarias, de 10 de fevereiro de 1886, para se impor o puncção de reconhecimento nas obras de oiro e prata não marcadas (documento n.° 1), entendeu, comtudo, o governo dever prorogal-o em 25 de fevereiro de 1887 (documento n.° 2), depois do haver sido approvado o regulamento interno das repartições do serviço de contrastaria (documento n.° 3).
Em seguida a estas providencias modificou-se a disposição do artigo 117.º do citado regulamento de, 10 de fevereiro de 1886, reduzindo-se por decreto de 9 de março (documento n.° 4) a 600 réis o emolumento de ensaio e marca das barras de oiro que tiverem menos de 200 grammas de peso, e por decreto de 22 de abril (documento n.° 5) de 20 réis a 10 réis o emolumento pelo ensaio e marca dos artefactos de oiro denominados marcellas, cabeças lavradas e africanas.
Caixa economica portugueza
Attendendo a uma proposta da junta de credito publico foram approvadas em 14 de abril as instrucções necessarias para a execução dos artigos 3.° e 4.° do regulamento da caixa economica portugueza, em relação ás agencias e sub-agencias (documento n.° 6).
Loterias
Em l de setembro mandou-se abrir concurso entre as casas e estabelecimentos habilitados a emittir cautelas de loterias estrangeiras, para a adjudicação do privilegio de comprar na casa da moeda o papel sellado para a emissão das mesmas cautelas (documento n.º 7).
Padrões
Tendo sido dissolvida, por decreto de 29 de novembro (documento n.° 8), a commissão encarregada, pelo de 11 de dezembro de 1848, do exame, classificação e liquidação dos padrões da camara municipal de Lisboa, foi, por decreto de 2 de dezembro ultimo, nomeada uma outra commissão para tratar da reforma d'aquelles de taes titulos que foram consumidos no incendio dos paços do concelho, succedido em 19 de novembro de 1863 e do exame dos que estiverem nas condições de poderem ser convertidos; em inscripções (documento n.° 9).
Banco de Portugal
Em virtude da auctorisação concedida ao governo pela carta de lei de 29 de julho de 1887, celebrou-se em 10 de dezembro, com o banco de Portugal, o contrato para a sua constituição como banco emissor (documento n.° 10), determinando-se em 13 do mesmo mez que, a contar de l de janeiro de 1888, se regesse provisoriamente pelos seus estatutos então em vigor, com as modificações indispensaveis para os harmonizar com a citada lei de 29 de julho (documento n.° 11).
Reforma de serviços
Devendo o banco de Portugal ser o caixa geral do thesouro na metropole, regularam-se, pelo decreto n.° l de 15 de dezembro de 1887, os serviços do thesouraria de que ficou incumbido do 1.° de janeiro de 1888 em diante, determinando-se n'essa occasião que o thesoureiro pagador do ministerio da fazenda passasse a denominar se thesoureiro geral do mesmo ministerio (documento n.° 12).
Pelo decreto n.° 2 da mesma data foram reformados os serviços da divida publica, creando-se uma direcção geral para estes serviços; continuando, porém, em exercicio, mas só com funcções fiscaes e consultivas, a junta do credito publico (documento n.° 13).
Finalmente, em 29 do mesmo mez, e com fundamento na mencionada lei de 29 de julho, foi creada uma agencia financial no Rio de Janeiro para, entre outras attribuições, fiscalisar os cofres dos consulados de Portugal no Brazil e Rio da Prata, aproveitando com vantagem os fundos disponiveis d'esses cofres (documento n.° 14).
II
ADMINISTRAÇÃO GERAL DAS ALFANDEGAS
Imposto de tabacos
Em 15 de janeiro de 1887 determinou-se o modo de applicar o imposto sobre cada pasta de tabaco, cujo peso exceder qualquer dos marcados no § 3.° do artigo 2.° do decreto de 8 de outubro de 1885. Esta providencia foi tomada em virtude de um requerimento da fabrica de tabacos michaelense, estabelecida em Ponta Delgada (documento n.° 15).
Em 27 do mesmo mez decretaram-se varias disposições para não prejudicar as resoluções do poder legislativo em
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relação á proposta então apresentada para modificação do regimen de tabacos (documento n.° 16).
Tendo o parlamento convertido esta proposta na lei de 18 de agosto seguinte, decretou-se em 25 do mesmo mez o respectivo regulamento provisorio para a distribuição da contribuição sobre as fabricas de tabacos (documento n.° 17), e em l de setembro immediato o da cobrança, nas fabricas e alfandegas, do imposto de licença para a venda de tabacos (documento n.° 18).
Em 15 d'este ultimo mez foi prorogado por mais trinta dias o praso estabelecido no primeiro dos mencionados regulamentos para a distribuição da referida contribuição (documento n.° 19), mandando o governo, em 23, tomar posse das fabricas que declararam cessar o exercicio da sua industria, a fim de proceder-se á respectiva avaliação por meio de arbitros (documento n.° 20), e fixando, por portaria da mesma data (documento n.° 21), o direito a cobrar sobre todo o tabaco em folha ou em rama retirado das alfandegas para as fabricas do continente, quer administradas pelo governo quer não.
Em seguida a estes actos determinou-se em portaria de 11 de outubro como se havia de constituir o gremio das fabricas de tabacos administradas ou não pelo governo, para fazer-se a distribuição da contribuição de 4.250:000$000 réis fixada na lei de 18 de agosto anterior (documento n.° 22), e decretaram-se em 27 de dezembro varias providencias de caracter transitorio para facilitar a execução do regulamento da cobrança do imposto de licença para venda de tabacos (documento n.° 23).
Imposto no pescado
Em 24 de janeiro nomeou-se uma commissão para declarar ao governo se haveria vantagem em transformar o imposto do pescado, na provincia do Algarve, n'uma contribuição industrial directa par meio de licença (documento n.° 24).
Em 11 de junho seguinte (documento n.° 25) foi prorogado o praso para o pagamento da divida em conta de imposto do pescado, nos termos do artigo 2.° do decreto de 21 de outubro de 1886.
Em 22 de setembro foi mandado restabelecer para a cobrança d'este imposto, e ouvido o commando geral da guarda fiscal, o posto fiscal denominado Pedras Ruivas, supprimido por decreto de 20 de setembro de 1886, auctorisando-se na mesma data a creação de outros nas ilhas do Faial e Pico por proposta do director da alfandega da Horta (documentos n.ºs 26 e 27).
Por ultimo, em 13 de dezembro, foi nomeada outra commissão para declarar, á similhança do que se ordenára em 24 de janeiro anterior, se nos districtos do norte da Figueira conviria transformar o imposto de que be trata em contribuição industrial directo, cobrada por meio de licença (documento n.° 28).
Providencias fiscaes
Com o fim de evitar a apresentação de productos simuladamente attribuidos á industria nacional, foi determinado em 29 de janeiro de 1887 que todos os proprietarios de fabricas enviassem, dentro de trinta dias, as suas marcas e amostras á administração geral das alfandegas, para se apprehenderem, como descaminhadas aos direitos, todas as mercadorias declaradas nacionaes de que não se possa provar a nacionalidade por aquelle meio (documento n.° 29). O praso indicado n'esta portaria foi posteriormente prorogado até que, por decisão ulterior, se regulasse definitivamente o assumpto (documento n.° 30).
Em 31 do mesmo mez expediram-se instrucções (documento n.° 31) para que as disposições regulamentares sobre a fiscalisação e cobrança do imposto do consumo na nova area de Lisboa não entrem em execução antes de concluida a estrada fiscal que circumda, pelo lado de terra, todo o municipio.
Em 3 de março seguinte foram mandadas recolher aos seus regimentos as duas companhias de infanteria do exercito que se achavam destacadas na alfandega do consumo, passando o serviço a ser feito por praças da guarda fiscal (documento n.° 32).
Em 4 de junho foi auctorisada a junta fiscal da Bandeira, em Villa Nova de Gaia, a despachar vinho com destino a exportação, conforme o regimen da portaria de 14 de novembro de 1880 (documento n.° 33).
Era l de dezembro seguinte foi determinado, por decreto expedido com fundamento na lei de 18 de julho de 1885, que a acção fiscal da alfandega do consumo se estendesse a uma parte da nova arca do municipio de Lisboa, fixando-se o modo de effectuar os despachos e o praso de seis mezes para pagamento dos respectivos direitos ou para a saida das mercadorias da nova area (documento n.° 34).
Em 16 do mesmo mez, e tambem em virtude da alteração na linha da circumvallação da cidade do Porto, foram estabelecidos os postos habilitados a despacho e os de vigia e de registo (documento n.° 35).
Pauta geral
Durante o anno de 1887 foram expedidos os seguintes diplomas, modificando varias disposições da pauta geral das alfandegas (documentos n.ºs 36 a 41):
Em 3 de fevereiro, portaria elevando de 6 a 7 por cento a percentagem da taxa estabelecida para os gigos de assucar não refinado;
Em 22 de março, decreto prohibindo a importação das moedas estrangeiras de prata nos districtos de Angra, Horta e Ponta Delgada;
Em 3 de maio, portaria mandando cobrar sobre as mercadorias importadas o imposto de 2 por cento ad valorem, para occorrer ao pagamento das despezas com as obras do porto de Lisboa;
Em l de dezembro, decreto prohibindo a importação nos districtos do continente do reina e ilhas adjacentes de moeda de cobre introduzida nas provindas ultramarinas;
Em 9 do mesmo mez, decreto elevando de 10 a 12 por cento a percentagem da tara para o assucar era barricas;
Em 22, portaria resolvendo duvidas ácerca da cobrança do addicional de 6 por cento sobre as mercadorias sujeitas ao imposto de 2 por cento para portos e barras.
Diversos serviços
Em 4 de maio de 1887 foi nomeada uma commissão para estudar as modificações a introduzir no decreto regulamentar de 4 de junho de 1886 (documento n.° 42).
Em 2 de junho seguinte regulou-se (documento n.° 43) o modo de distribuir os premios que competem aos individuos que apprehendam ou arrestem generos ou mercadorias subtrahidas ao pagamento de direitos, substituindo-se para esse fim varios artigos do decreto de 29 de julho de 1886.
Em 7 de setembro nomeou-se uma commissão para estudar a fórma de tornar mais simples e rapido o despacho nas alfandegas (documento n.° 44).
Em 5 de dezembro fixou-se o destino que deviam ter os funccionarios aduaneiros, cujos logares haviam sido extinctos por decretos de 29 de julho e de 9 de setembro anteriores (documento n.° 45).
Finalmente, em 29 do mesmo mez, procedeu-se a uma nova reforma das alfandegas e do serviço maritimo da esquadrilha fiscal, havendo-se determinado em 27 que todos os emprgados do quadro interno das alfandegas usem, no acto do serviço, um uniforme para serem reconhecidos no exercicio das suas funcções com distincção da graduação que tiverem (documentos n.ºs 46 e 47).
III
COMMANDO GERAL DA GUARDA FISCAL
Achando-se publicados o distribuidos os onze boletins
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da guarda, fiscal, organisados durante o anno de 1887, nos termos do decreto de 24 de dezembro de 1885, tenho a honra de chamar para elles a vossa attenção, porque assim melhor conhecereis as providencias administrativas e disciplinares emanadas do cominando geral d'esta guarda para aperfeiçoar o serviço do fiscalisação que lhe está incumbido por lei.
IV
DIRECÇÃO GERAL DA CONTABILIDADE PUBLICA
Arrecadação de receita e pagamento de despeza
Em 28 do janeiro de 1888 fixou-se o praso em que deve ser satisfeito o pagamento de emolumentos e sellos por mercês lucrativas, regulando-se em 28 de maio seguinte a fórma por que devem ser liquidados estes impostos (documentos n.ºs 48 e 49).
Em 5 de fevereiro respondeu-se ás duvidas apresentadas pelos directores das repartições de fazenda na execução da circular de 28 de dezembro de 1886, declarando-se-lhes que todos os documentos de despeza paga em virtude de ordens expedidas pelos diversos ministerios não devem ter data posterior á do dia em que se realisar o respectivo pagamento (documento n.° 50).
Km 30 de maio determinou-se que se mio faça pagamento algum, por insignificante que seja, bem previa expedição do devido ordenamento, visto haver-se reconhecido, pelo exame das contas d'este ministerio, que foram excedidas em diversos corres algumas das ordens expedidas para pagamento das respectivas despezas (documento n.° 51).
Em 7 de junho recommendou-se que sejam processadas em duplicado as relações que acompanham os documentos de despeza, e designem o exercicio competente e artigo a que as mesmas despezas respeitam; ordenando-se em 10 de novembro seguinte, em additamento a esta circular, que as mesmas relações accusem tambem o numero das ordens (documentos n.ºs 52 e 53).
Em 9 do mesmo mez (documento n.° 54) foram mandados annullar todos os conhecimentos de divida por impostos relativos ao anno de 1846, exercicio de 1846-1847, pelo fundamento exposto no officio-circular de 18 de dezembro de 1886, transcripto no ultimo relatorio dos actos d'este ministerio.
Caixa de aposentação
Tendo o governo resolvido, em 13 de janeiro de 1887, que sobre todas as gratificações extraordinarias abonadas a empregados com ou sem direito a aposentação deve fazer se a respectiva deducção para a caixa de aposentação, foi esta resolução communicada a todas as repartições de fazenda em officio-circular d'aquella data (documentos n.ºs 55 e 56), fixando-se, em 19 do mesmo mez, a verdadeira intelligencia que deve dar-se á disposição do artigo 14.° do decreto com força de lei n.° l de 17 de julho de 1886 (documentos n.ºs 57 e 58).
Em 30 de março (documento n.° 59) expediu-se circular sobre o modo de escripturar os vencimentos dos empregados que, nos termos do artigo 20.º do citado decreto, tenham do reverter para a caixa de aposentação na sua totalidade; e em 22 de novembro (documento n.° 60) discriminaram-se os casos em que a deducção para a citada caixa tem de ser de 4 por cento e aquelles em que deve ser de 5 por cento.
Classes inactivas
Em 10 de maio foi resolvido que os titulos de renda vitalicia continuassem a ser os diplomas legaes para pagamento dos funccionarios aposentados a quem tivessem sido passados (documento n.° 61).
Em l5 de outubro mandou-se abrir uma conta especial para pagamento dos vencimentos dos empregados aposentados em 30 de junho anterior, conforme as disposições do decreto de 31 de agosto; preceituando-se, em 25 de outubro, o modo de fiscalisar o pagamento dos referidos vencimentos (documentos n.ºs 62 a 64).
Receitas districtaes e municipaes
Em 3 de março regulou-se por decreto (documento n.° 65) a execução dos artigos 73.º e 147.° do codigo administrativo, relativamente ás funcções dos thesoureiros das juntas geraes e dos thesoureiros das camaras municipaes, expedindo-se em 18 de junho seguinte as instrucções necessarias para a transição das responsabilidades e cobrança das receitas das referidas corporações (documento n.° 66), instrucções que foram ampliadas e esclarecidas por officio-circular de 22 de outubro (documento n.° 67).
Diversos serviços
Por portaria de 2 de janeiro foram mandadas observar provisoriamente diversas disposições relativas ás recebedorias e repartições de fazenda dos bairros de Lisboa, em vista da nova circumscripção do municipio (documento n.° 68).
Em 26 de julho expediram-se instrucções para a execução do artigo 2.° da carta de lei de 30 de junho sobre a conversão do fundo consolidado interno de 3 por cento em pensões vitalicias (documento n.° 69), operação cujo estado em 31 de dezembro ultimo vae indicado no orçamento do estado para o exercicio de 1888-1889.
Em 13 de setembro regulou-se por decreto a concessão de adiantamentos a funccionarios, nos termos da lei do orçamento, determinando-se em 23 de novembro seguinte que tal concessão não é extensiva aos aposentados e reformados em 30 de junho de 1887 (documentos n.ºs 70 e 70-A).
Finalmente em 19 de dezembro foram expedidas as instrucções annunciadas no decreto n.° l, de 15 do mesmo mez, com respeito á transição dos fundos do thesouro para o banco de Portugal, como caixa geral do thesouro (documento n.° 71).
V
DIRECÇÃO GERAL DAS CONTRIBUIÇÕES DIRECTAS
Contribuição predial
O contingente da contribuição predial fixado para cada districto no anno de 1887 foi decretado em 7 de julho do mesmo anno, nos termos do documento n.° 72.
Em 30 de setembro seguinte (documento n.° 73), officiou-se ao inspector de fazenda no districto de Villa Real, ordenando-lhe, em presença de uma representação da camara municipal de Sabrosa, que não fossem relacionadas as collectas de contribuição predial a respeito dos contribuintes com direito a annullações por sinistros causados pela phylloxera, emquanto se não passassem os respectivos titulos.
Contribuição industrial, sumptuaria e de renda de casas
Em 22 de abril deu-se conhecimento ao inspector de fazenda do districto de Lisboa do despacho ministerial do dia anterior, pelo qual foram auctorisadas as juntas fiscaes dos quatro bairros da capital a averbar ex officio os conhecimentos da contribuição de renda de casas do segundo semestre de 1887 para os nomes dos novos inquilinos, e bem assim a annullar as collectas da mesma contribuição e da industrial, que reconhecidamente forem duplicadas (documento n.° 74).
Em 28 de junho officiou-se ao mesmo inspector, communicando o despacho que estabeleceu a percentagem para o calculo da gratificação incerta pelo serviço das contribuições industrial, de renda de casas e sumptuaria, no anno de 1886 e seguintes, no quarto bairro da capital (documento n.° 75).
Em 20 de agosto declarou-se em portaria (documento n.° 76), que as leis promulgadas com data de 15 de julho anterior, com respeito ás contribuições industrial, de renda de casas e sumptuaria deviam ter immediata execução.
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SESSÃO DE 30 DE JUNHO DE 1888 2341
Em 8 de setembro communicou-se ao inspector de fazenda de Lisboa (documento n.° 77) o despacho ministerial de 5 de julho anterior, em virtude do qual a classe dos bacalhoeiros da cidade de Lisboa passou provisoriamente da 2.ª para a 4.ª classe da tabella dos industriaes.
Na mesma data foram decretados os regulamentos relativos ás contribuições industrial, renda de casas e sumptuaria (documentos n.ºs 78 e 79).
Em 30 de novembro seguinte declarou-se obrigatorio o pagamento da contribuição industrial por meio de licença para o exercicio das industrias, profissões, artes ou officios, constantes de algumas verbas designadas na tabella geral das industrias junta ao decreto de 3 de junho de 1880, e para o exercicio da penultima da tabella A, junto á lei de l5 de julho de 1887 (documento n.° 80).
Em 24 de dezembro (documento n.° 81) expediu se portaria resolvendo duvidas suscitadas sobre a execução do regulamento da contribuição industrial por meio de licença, e em 30 do mesmo mez foram dadas instrucções aos directores das repartições de fazenda districtaes para concessão de licença sobre a citada contribuição aos contribuintes que as solicitarem, não devendo autuar os que deixassem de cumprir esse preceito (documento n.° 82).
Decima de juros
Depois de se haver declarado na portaria de 20 de agosto de 1887 que a lei de 18 do mesmo mez, relativa á decima de juros, devia ter immediata execução (documento supra n.° 76), decretou-se em 8 de setembro o respectivo regulamento (documento n.° 83), determinando-se comtudo em 12 de outubro seguinte (documento n.° 84) que o lançamento d'esta contribuição, em relação ao anno de 1887, se organisasse nos termos da legislação anterior, para todos os effeitos, inclusive a epocha da cobrança, exceptuando o que respeitasse a letras, cuja contribuição entra nos cofres.
Falhas
Em 21 de março de 1887 foi mandado saber o estado dos trabalhos das commissões instauradas para o julgamento de falhas por impostos incobraveis, a que se mandára proceder por decreto de 17 de junho de 1886 (documento n.° 80), exigindo-se em telegramma de 19 de agosto seguinte que se remettessem as relações das collectas dos impostos annullados (documento n.° 86). Depois d'esta providencia foram mandados organisar mappas da importancia das annullações, conforme o disposto no officio circular de 13 de setembro seguinte (documento n.° 87).
Execuções fiscaes
Em 26 de abril pediram-se providencias pelo ministerio da justiça para que o delegado do procurador regio na comarca de Ourique requeresse a distribuição dos processos de execução fiscal, a que terminantemente se tinha recusado (documento n.° 88).
Em 2 de setembro officiou-se ao mesmo ministerio para promover o andamento do referido processo nas comarcas do districto de Lema, principalmente na das Caldas da Rainha (documento n.° 89). Em seguida a esta providencia expediu-se circular ordenando a remessa mensal de um mappa do movimento dos processos, conforme o officio circular de 18 de novembro seguinte (documento n.° 90).
Diversos serviços
Em 20 de agosto expediu-se circular ás repartições de fazenda districtaes sobre os addicionaes lançados pelas camaras municipaes e sobre a importancia das derramas pagas pelas mesmas camaras ás juntas geraes no ultimo anno de vigencia do codigo administrativo de 1878 (documento n.° 91).
Em 23 de setembro de 1887 foi sanccionada a proposta feita pela conferencia havida entre o governador civil do districto de Lisboa e os presidentes das camaras municipaes de Lisboa e Loures, ácerca do modo de proceder ao lançamento e cobrança do imposto municipal directo sobre os predios, em que ha duvida a qual dos dois concelhos pertencem (documento n.° 92).
Alem dos diplomas que ficam mencionados, ficou tambem declarado em portaria de 31 de dezembro, que começariam a decorrer do 1.° de janeiro de 1888 os prasos de tres e cinco annos, a que se referem os artigos 7.°, 23.° e 28.° do decreto de 23 de julho de 1886 para todos os funccionarios das repartições de fazenda districtaes e concelhias (documento n.° 93).
VI
DIRECÇÃO GERAL DOS PROPRIOS NACIONAES
Loterias
Em resultado do concurso mandado abrir nos termos do documento n.° 7, já citado, para a compra de papel sellado destinado á emissão de cautelas das loterias estrangeiras, foi a adjudicação feita a Antonio Ignacio da Fonseca, conforme o termo (documento n.° 94) lavrado em 23 de setembro de 1887.
VII
DIRECÇÃO GERAL DA THESOURARIA
Divida fluctuante
Constando do documento n.° 2 do meu relatorio financeiro o movimento que a divida fluctuante teve durante o anno de 1887 e as condições em que se realisaram as adjudicações de bilhetes do thesouro, nos termos do decreto de 12 de agosto de 1886, resta-me chamar a vossa attenção para o contrato de maior vulto sobre transferencias de fundos effectuadas com o fim de occorrer a encargos no estrangeiro (documento n.° 95), para a relação dos interessados na divida de que se trata em 31 de dezembro de 1887 (documento n.° 96), para o movimento da mesma divida no paiz e no estrangeiro (documentos n.° 97 e 98), e, finalmente para o movimento da conta com o Comptoir d'escompte, em virtude do contrato de 9 de maio de 1879, da qual se fez o menor uso possivel, attendendo ao preço barato do dinheiro em Portugal e ás condições favoraveis das operações cambiaes (documentos n.ºs 99 a 102).
Os documentos n.ºs 103 e 104 mostram o movimento dos depositos feitos pela companhia real dos caminhos de ferro portuguezes e pela companhia nacional dos caminhos de ferro, que se acham comprehendidos, como sabeis, na divida fluctuante, em virtude das disposições das leis de 26 de maio de 1884 e de 30 de junho de 1885.
Emprestimo para a construcção do edificio da escola polytechnica de Lisboa
Não se havendo effectuado amortisação alguma em conta d'este emprestimo durante o segundo semestre de 1887, o saldo em divida ao banco de Portugal é igual ao que vem accusado na ultima conta geral do estado, como podereis ver pelo documento n.° 105, organisado em virtude da lei de 10 de junho de 1881 e das auctorisações concedidas anteriormente para a referida construcção.
Amoedação de oiro, prata e bronze
Oiro
O oiro amoedado, conforme os preceitos da lei de 29 de julho de 1854, elevava-se em 31 de dezembro de 1887 a 7.232:002$000 réis (documento n.° 106), a saber:
Em moedas de 10$000 réis, 1.688:030$000 réis;
Em moedas de 5$000 réis, 4.315:515$000 réis;
Em moedas de 2$000 réis, 1.160:400$000 réis;
Em moedas de l$000 réis, 68:057$000 réis.
Prata
A prata amoedada nos termos da referida lei e em virtude de diversas auctorisações concedidas ao governo, incluindo a que se refere á troca da moeda estrangeira nos Açores, votada na ultima sessão legislativa, e tendo em
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2342 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
conta a amoedação decretada em l de julho de 1886 para regular a situarão monetaria de Cabo Verde, elevava-se em 31 de dezembro de 1887 a 10.141:436$400 (documento n.° 107), a saber:
Em moedas de 500 réis, 8.102:595$000 réis;
Em moedas de 200 réis, l.494:049$000 réis;
Em moedas de 100 réis, 450:270$200 réis;
Em moedas de 50 réis, 94:522$200 réis.
Bronze
Sendo ainda bastante avultado o stock da moeda de bronze existente na casa da moeda, amoedação alguma se effectuou d'este metal durante o anno de 1887, em conta da auctorisação concedida por lei de 31 de maio de 1882, apesar de se haver transferido para Loanda a cifra de 114:666$670 réis, em virtude do disposto no contrato de 12 de dezembro de 1885 sobre o abastecimento das aguas para a mesma, cidade, approvado por decreto da mesma data.
Devendo o governo vender o bronze proveniente dos patacos retirados do Funchal e dos Açores, que não são necessarios para completar a amoedação auctorisada pela citada carta de lei de 31 de maio de 1882, não pôde organisar-se ainda a conta geral da operação, subsistindo comtudo as considerações expostas nos relatorios anteriores ácerca doo resultados geraes da mesma operação.
Operações com diversos bancos para pagamento das classes inactivas
O debito do thesouro em conta dos contratos celebrados com fundamento nas cartas de lei de l de julho de 1867, 22 de março de 1872 e 10 de abril de 1876 para pagamento das classes inactivas elevava-se em 31 de dezembro de 1887 a 4.818:482$695 réis (documentos n.ºs 108 e 109), a saber:
2.577:933$58O réis ao banco de Portugal em conta do contrato de 27 de junho de 1876 com penhor em inscripções na importancia total de 5.000:000$000 réis.
2.240:541$115 réis aos bancos do Porto em conta do contrato de 22 de junho de 1872, com a garantia de réis 5.138:000$000 na mesma especie de titulos.
Ê occasião de dizer-vos que, em consequencia da constituição do banco de Portugal como banco emissor, nos termos da lei de 29 de julho de 1887, foi celebrado novo contrato com o mesmo banco em 9 de março do corrente anno para pagamento dos vencimentos das classes inactivas existentes em 30 de junho de 1887, devendo as contas e documentos d'esta nova operação ser publicados opportunamente.
Emprestimos para o caminho de ferro do Minho e Douro
O debito do thesouro em conta d'este emprestimo, auctorisado pela carta de lei de 2 de julho de 1867 e outras posteriores, elevava-se em 31 de dezembro de 1887 areis ll:520$000, correspondente a 128 obrigações de 90$000 réis, que têem de ser pagas pelo producto da emissão do fundo de 5 por cento de 1881 (documento n.° 110).
Emprestimo para a construcção da escola medico-cirurgica do Porto
O emprestimo de 30:000$000 réis contratado com conde de Margarida em 21 de fevereiro de 1876, nos termos da lei de 14 de abril de 1875, para a construcção da referida escola e cujo saldo em 30 de junho de 1887 era de 14:415$050 réis, conforme a conta geral do estado ultimamente publicada, achava-se reduzido em 31 de dezembro seguinte a 13:461$465 réis, havendo-se pago de juro durante o anno de 1887 a quantia de 818$350 réis (documento n.° 111).
Construcção da penitenciaria e obras no hospital Estephania
O emprestimo de 320:000$000 réis contratado com banco de Portugal em 6 do março de 1875 para a construcção da penitenciaria central e obras no hospital Estephania, com fundamento nas cartas de lei de 24 do abril de 1873 e 13 de abril de 1874, e cuja conta em 30 de junho demonstrava o saldo devedor do thesouro de 236:070$230 réis, achava-se reduzido em 31 de dezembro seguinte a
231:047$425 réis, importando os juros pagos durante o anno de 1887 em 14:906$595 réis (documento n.° 112).
Couta do thesouro com a extincta junta do deposito publico
As sommas desembolsadas pelo thesouro em conta do seu debito á extincta junta do deposito publico, conforme o disposto no artigo 2.° da carta de lei de l de abril de 1880, elevavam-se em 31 de dezembro de 1886 a réis 320:193$977, sendo 301:380$122 réis em conta do capital e 18:8134$855 réis de juros (documento n.° 113).
Emprestimos de 5 por cento
Vendo-se na ultima conta geral da administração financeira do estado, que em 30 de junho de 1887 a importancia nominal de 44.409:150$000 réis representada por obrigações de 5 por cento emittidas em 1876, 1879 e 1886 se achava reduzida a 44.194:230$000 réis, resta indicar-vos que, em consequencia do sorteio effectuado em outubro seguinte, o estado da referida emissão em 31 de dezembro de 1887 era de 44.166$330$000 réis, sendo comtudo a divida effectiva do thesouro de 44.198:820$000 réis, por não terem sido apresentados a pagamento todos os titulos extrahidos em sorteio para serem, amortisados (documentos n.ºs 114 a 125).
É occasião do dizer-vos que a emissão da l.ª serie de obrigações de 5 por cento para a conversão da divida externa de 3 por cento, auctorisada pela carta de lei de 30 de junho de 1887, foi effectuada durante o anno findo nos termos dos decretos de 28 de julho e 25 de agosto do mesmo anno (documentos n.ºs 126 e 127), podendo vós, pelos documentos n.ºs 128 e 129 ver que em conta da importancia nominal de 9.000:000$000 réis se achava amortisada em 31 de dezembro ultimo a quantia de 5:400$000 réis.
Auxilio ás praças de Lisboa e Porto em 1876
Ainda não chegou ao conhecimento do ministerio a meu cargo o resultado da venda do penhor relativo á quantia de 18:000$000 réis, saldo dos creditos do banco de Portugal sobre o banco nacional do Porto com aval do governo, não podendo por isso estar encerradas as contas d'esta operação approvada pela carta de lei de 7 de abril de 1877.
Accordo com a companhia dos canaes da Azambuja
Sabendo vós pelo relatorio anterior que este accordo, auctorisado pela carta de lei de 22 de março de 1886, se tornou effectivo em 27 de outubro seguinte (documento n.° 27 do citado relatorio), resta-me declarar-vos que, em resultado da liquidação das acções que o governo possuia na importancia total de 23:850$000 réis, recebeu pelo rateio a quantia de 7:186$800 réis (documento n.º 130).
Moeda dos Açores
Achando-se em execução a lei de 3 de agosto de 1887, pela qual o parlamento foi obviar aos males que pesavam sobre o povo açoriano, com a introducção em larga escala das moedas estrangeiras de prata que ali têem tido circulação legal, devo declarar-vos que antes de tomar-se aquella resolução havia o governo determinado o seguinte:
1.° Fixar-se em 27 por cento o cambio para emissão dos vales de correio por meio dos quaes se sacára dos cofres do continente a importancia correspondente á moeda estrangeira introduzida nos Açores;
2.° Elevar o mesmo cambio a 33 por cento;
3.° Prohibir a importação da referida moeda, nos termos do documento n.° 38 já citado;
4.° Carimbar toda a moeda existente em circulação n'aquellas ilhas, conforme os documentos n.ºs 131 e 132, dando as ordens mais terminantes para se obstar á introducção clandestina da moeda de igual cunho.
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Após estas providencias foi mandado baixar successivamente até 26 por cento o cambio para a emissão dos vales do correio, e havendo sido ordenada a cunhagem da nova moeda por portaria de 18 de agosto de 1887, precedendo a devida correspondencia, foi fixado em 20 por cento, isto é, ao par, o cambio para a referida emissão, sendo provavel que haja ainda de tomar-se uma medida para evitar a saída do metal, visto a possibilidade que o commercio tem de transferir para o continente a nova moeda pelo unico encargo de 1/2 por cento (documentos n.ºs 133 a 136).
Vales do correio
Alem das providencias já indicadas, com respeito á emissão de vales do correio nos Açores, recommendou-se tambem em officio circular de 25 de janeiro de 1887, que haja o maior cuidado na organisação das guias relativas á entrega do producto da emissão d'estes valores (documento n.° 137;, e em 30 de agosto seguinte chamou-se a attenção dos directores das repartições de fazenda para o facto de haverem sido derogadas pelo artigo 3.º das instrucções de 17 de novembro de 1836 as disposições do artigo 23.° do regulamento de 23 de dezembro de 1880 sobre o maximo da importancia permittida para a emissão de vales do correio (documento n.° 138).
Fundos municipaes
Em conformidade do disposto no decreto de 3 de março de 1887 foram expedidas as ordens necessarias para a escripturação da saída dos cofres do estado dos fundos pertencentes aos municipios (documento n.° 139), mandando-se em 8 de julho seguinte organisar a nota dos thesoureiros das camaras que, não estando encartados, ainda não houvessem feito a transição para as respectivas recebedorias. Em tempo opportuno ser-vos-ha apresentado o resultado d'esta providencia (documento n.° 140).
Fundos de conta de diversos
Para regular o movimento dos fundos pertencentes a diversas contas foram expedidos no anno de 1887 os seguintes officios circulares:
Em 2 de maio, 3 e 4 de agosto ácerca das receitas pertencentes á caixa de auxilio telegrapho-postal (documentos n.ºs 141 a 143).
Em 18 do mesmo mez (documento n.° 144) sobre as encommendas postaes pelos depositos recebidos de conta das alfandegas.
Caixa geral do thesouro
Depois de publicado o contrato com o banco de Portugal para a sua constituição como estabelecimento emissor, fizeram-se com o mesmo estabelecimento no mez de dezembro de 1887 tres convenções por seis annos sobre os seguintes serviços (documentos n.ºs 145 a 147).
Convenção n.º l, de 14 de dezembro, sobre o abono dos vencimentos dos pagadores dos ministerios da guerra, marinha e obras publicas, dispensando-se o banco de pagal-os vales de correio e o pessoal e mais despezas das alfandegas.
Convenção n.° 2, da mesma data, sobre a conta corrente e credito de 2.000:000$000 réis a que se refere o artigo 25.° da lei de 29 de julho de 1887.
Convenção n.° 3, de 29 do citado mez, sobre o movimento dos valores postaes, impressos sellados e da caixa geral de depositos.
Alem d'estas convenções poz-se termo, por officio circular de, 21 do citado mez, ás operações de transferencias de fundos por conta de diversos, que era pratica effectuar para decorrer com a devida regularidade aos encargos do estado nos diversos cofres dos districtos, e determinou-se por portaria da mesma data, que emquanto o banco não tivesse installadas as suas caixas filiaes os governadores civis continuassem a fiscalisar como clavicularios os fundos existentes; nas agencias provisorias do banco de Portugal, conjunctamente com os directores das repartições de fazenda districtaes (documentos n.ºs 148 e 149).
Diversos serviços
Alem dos diplomas de que se tem feito menção, ha ainda a notar a ordem circular expedida em 20 de julho de 1887 sobre os pagamentos de despezas do ministerio das obras publicas feitos pelos cofres centraes dos districtos, anteriormente ao estabelecimento da caixa geral do thesouro (documentos n.ºs 150 e l5l) e a portaria de 19 de agosto seguinte, já publicada na folha official com referencia ao contrato pelo qual, com fundamento no decreto de 20 de dezembro de 1864, foi garantido um subsidio temporario á escola industrial de ceramica estabelecida nas Caldas da Rainha.
Ministerio dos negocios da fazenda, 30 de junho de 1888. - Marianno Cyrillo de Carvalho.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que estava dada, e mais os projectos n.ºs 73 e 74-A.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarda.
Redactor = Rodrigues Cordeiro.