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SESSÃO NOCTURNA DE 6 DE JULHO DE 1885 2939

elementos para vir a ser no futuro uma sociedade colonial da mais alta importancia. Não lhe falta a riqueza, nem a extensão. E tem importantes nucleos de colonisação europêa, cuja influencia sobre o destino da provincia se accentua todos os dias.
Como v. exa. sabe, sr. presidente, Loanda é hoje a cidade mais importante de toda a costa occidental de Africa. A attracção civilisadora exercida por este populoso centro urbano, que ao mesmo tempo é um poderoso foco de actividade, económica e commercial, imprime necessariamente ao paiz, cuja area influenceia, o caracter de meia cultura, que o distingue das zonas mais afastadas do norte, e que é o prologo de ulteriores progressos.
Alem d'isso, toda a parte sul de Angola, especialmente Mossamedes, e os salubres territorios que nesta latitude ficam para o interior, são mais ou menos susceptíveis de assimilarem a civilisação europêa, por meio da colonisação que ali já hoje prospera, e que melhor prosperará quando o conhecimento mais intimo dos recursos d'aquella região e os preceitos de uma hygiene colonial, até á actualidade quasi desconhecida entre nós, o permittirem!
Depois, a população da metade sul da nossa Africa occidental, como diremos em breve, é relativamente muito mais civilisada do que a das margens do Zaire.
De modo que a antiga provincia de Angola, attentas as suas condições especiaes, exige uma organisação administrativa muito mais exemplar, e um certo numero de garantias de governo, digamol-o assim, indispensáveis ao espirito da civilisação europêa, que começa a insufflar nova vida nos seus sertões!
Porventura os territorios do Loge até ao Zaire estão em condições identicas ou pelo menos analogas? Não estão, de certo.
Os viajantes, que têem percorrido aquellas paragens, Johnston, por exemplo, que é o ultimo, mostram-nos os povos que demoram entre o Loge, o Zaire e o Cuango como quasi absolutamente selvagens.
Na parte inferior desta extensa região habitam os mussurongos, tribus bravias, cuja occupação unica é o roubo e a pirateria.
Pela parte superior deparam-se-nos os muchicongos, e outros povos com elles apparentados, mas igualmente rudes e indomitos! Isto é, estamos, ao entrar nas terras no sul do Zaire, em presença de uma civilisação rudimentar, póde dizer-se mesmo primitiva!
É necessario reparar bem n'esta circumstancia, sr. presidente, para bem se comprehender o ponto de vista em que me colloco.
A raça que fórma o nucleo da população da nossa provincia de Angola, do Dande ou do Bengo para baixo, não é a mesma que povoa os territórios de que vamos agora tomar posse. A raça, que habita o grupo importante dos nossos concelhos angolenses, propriamente ditos, é a bunda ou ambunda, a qual constituo uma verdadeira aristocracia relativamente às populações africanas que lhe ficam ao norte, nas nossas possessões. A raça ambunda tem aptidões civilisadoras muito superiores á dos mussurongos ou muchicongos, povos que physiologica, anatomica e psycologicamente estão, conforme a sciencia nos ensina, num dos mais baixos legares da escala ethnica!
Achando-se, pois, completamente distanciadas pelo caracter, pelo regimen economico e pelo grau de civilisação as populações ao norte e ao sul do Dande, (porque este rio melhor que o Loge determina a divisão) como é que nós vamos exactamente estabelecer a mesma organisação administrativa para uma e outra região?!
Ainda que mais rasões não houvesse para condemnar este projecto, eu diria desde logo e sem hesitar á illustre commissão do ultramar, que ella commettera um gravíssimo erro em ter pautado pelas necessidades de Angola as necessidades administrativamente muito mais rudimentares dos territorios, que vamos adquirir. E note a camara que este erro é antigo no governo das nossas províncias ultramarinas, sendo em grande parte responsavel pelo cahotico regimen, que em todas ellas, sem excepção, vigora!
Similhante vicio reflecte-se com desoladora insistência, ainda hoje, na organisação colonial de todo o nosso variado mundo de alem mar! (Apoiados.)
V. exa., sr. presidente, admirar-se-ha, com effeito, se estudar, por pouco que seja, o nosso regimen ultramarino, da identidade, quasi igualdade perfeita, de organisação que se nota em todas as colonias portuguezas, quaesquer que sejam as condições em que se encontrem, desde Cabo Verde, que, conforme eu já disse, devia na opinião do marquez de Sá ser incorporado, como um districto administrativo, no continente (tão adiantada em civilisação se lhe affigurava essa colonia) até Timor, vasto areal perdido nos confins do mar das Molucas, e cuja população se reduz a alguns bandos de scheagens malaios vagueando pelos seus adustos palmares desde Mossamedes, quasi europeu, até Macau, povoado quasi que só por chinezes, isto é, por uma população absolutamente repugnante e hostil aos usos, costumes e instituições da civilisação occiental! (Apoiados.)
Póde justificar-se tal anomalia?!
Confronte se este nosso procedimento, que eu mesmo não me atrevo a classificar com o procedimento da Inglaterra, nação que caminha na vanguarda dos povos contemporaneos, que têem possessões, nação que póde ser chamada a metropole de cem colonias!
Que profunda differença nos processos de administração ultramarina dos dois paizes! Que perspicaz senso pratico com que o gabinete de Londres adapta a cada colonia, feitoria ou estabelecimento, a organisação que mais lhe convém!
Assim, ao passo que a Inglaterra tem colonias como o Canadá e a Australia, onde o regimen do self-governement é completo, possue simples feitorias como a Serra Leoa, como Singapura, ou como Aden cujo governo não offerece nenhum dos caractericos da liberdade constitucional ingleza!
Ao passo que tem possessões como a Jamaica, verdadeira fazenda á moda de Cuba, Porto Rico, ou S. Thomé, possue estabelecimentos de uma organisação tão rudimentar, que quasi se governam por simples regulamentos de bordo, taes como a ilha de Malta, Gibraltar ou Helligoland!
O exemplo da Inglaterra devia fazer cair em si os ministros da marinha de Portugal, que a uma artificial symetria burocrática sacrificam os mais importantes interesses das nossas colonias!
Houve tempo em que as questões, que diziam respeito ao ultramar, nasciam, só é que nasciam, e morriam dentro desta sala, sem despertar o mais pequeno echo no paiz; a vida ephemera que o poeta francez dá ás rosas, e se logravam sobreviver á duração de uma manhã, nunca chegavam a occupar tempo apreciavel nas nossas discussões!
Hoje, porém, que a Europa em nome dos interesses da política colonial nos chamou, pela primeira vez depois do congresso de Vienna aos seus conselhos; hoje que, aluados com essa mesma Europa, que encontrámos em Berlim, vamos collaborar mais decididamente na civilisação do continente africano; é necessario que tudo quanto façamos relativamente às colónias seja digno da grande causa e da illustre camaradagem a que acabâmos de nos associar!
Vae n'isso o nosso brio nacional, o nosso bom nome de potencia culta e até o futuro do nosso domínio ultramarino! Chegou o momento, com effeito, ou de confundirmos os nossos detractores ou de lhes darmos rasão perante o mundo!
Infelizmente, receio bastante, sr. presidente, que o projecto que discutimos, a estas horas bem conhecido já e bem