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SESSÃO DE 10 DE JULHO DE 1885 3055

por agradecer á camara a deferencia que acaba de ter commigo, permittindo que se alterasse a inscripção, para que eu podesse retomar a palavra sobre o incidente interrompido com a resposta do sr. ministro da fazenda. Como tinha pronunciado algumas palavras quando o sr. ministro do reino não estava presente, e como não desejo ser accusado de atacar qualquer membro do governo ou d'esta casa do parlamento, na sua ausencia, é um dever de lealdade da minha parte repetir as palavras que acabo de proferir.
Como tivesse tomado a palavra para instar que s. exa. fosse convidado a comparecer n'esta camara na sessão de ámanhã, direi que não prosegui nas minhas considerações sem ter a certeza que s. exa. não se achava no ediiicio das côrtes.
Então lamentei que o ministro do reino, que era o chefe do serviço da saude publica, mostrasse um desprezo tão profundo pelo importante serviço a seu cargo, a ponto de se recusar durante tres dias a responder a algumas perguntas que um deputado por Lisboa desejava fazer-lhe, exactamente sobre assumpto estreitamente relacionado com a hygiene publica.
O sr. ministro da fazenda respondêra, por parte do governo, dizendo que a minha accusação era injusta, porque ninguem podia mostrar maior solicitude com relação ao serviço a que se alludíra, do que o sr. ministro do reino. Eis resumidamente, mas com toda a fidelidade repetido o que até este momento se havia passado.
Antes, porém, de entrar no assumpto, e respondendo ao sr. ministro da fazenda, eu direi que se s. exa. não queria que a ausencia do sr. ministro do reino significasse desprezo pela saude publica, podia significar então desprezo pelo parlamento, e estou prompto, no que me diz respeito, a substituir pela segunda a primeira accusação, se s. exa. assim o deseja.
Em todo o caso, como o sr. ministro do reino já está presente, é inutil perder tempo n'esta ordem de considerações, e por isso vou brevemente referir-me aos dois pontos sobre que desejo chamar a attenção de s. exa.
O primeiro, é para a fórma por que se está fazendo o serviço do cordão sanitario na fronteira.
Sr. presidente, não desconheço eu as gravissimas difficuldades que ha, n'um paiz como o nosso, pelas suas condições topographicas e orographicas, em estabelecer por larga fronteira um cordão absolutamente fechado.
Mas, uma cousa é a impossibilidade do conseguir praticamente um cordão sanitario, tão perfeito quanto seria para desejar, e n'isso estamos todos de accordo, outra cousa é manter um cordão, que quasi apenas existe nominalmente, (que pouco ou nenhum embaraço põe a quem quer atravessar a raia, furtando-se á observação dos lazaretos.
Se o sr. ministro do reino, e faço-lhe a justiça de acredar que o ignora, assistisse diariamente ao espectaculo que se dá á chegada dos comboios da fronteira, s. exa. já teria ordenado as providencias indispensaveis para que não se repetissem os factos lamentaveis que com grave perigo da nossa capital se estão passando.
Os chefes e os guardas da policia á chegada dos comboios andam absolutamente ás cegas e ao acaso interrogai o os passageiros, buscando sem especie alguma de indicações por um lado e por outro os que julgam terem-se escoado ao cordão sanitario, prendendo-os se os encontrar e levando-os n'uma romaria que toda a cidade pode presencear, para serem encerrados n'uma barraca que existe mesmo no coração da capital, na avenida da Liberdade!
Suas providencias sanitarias na fronteira estão tomadas por fórma que diariamente chegam a Lisboa passageiros que assam impunemente o cordão, e que vem em liberdade com os demais passageiros nas carruagens dos caminhos de ferro; que confiança nos podem merecer as medidas do governo? E não é evidente que a cidade de Lisboa e o paiz estão em perigo de serem de um momento para o outro adidos?
O segundo ponto a que eu quero referir-me está estreitamente relacionado com este. É o que diz respeito ao hospital barraca da Avenida.
Permitta-me o illustre ministro que eu, emquanto não tiver a declaração official de que o hospital barraca da Avenida foi aconselhado pelas estações competentes para servir de lazareto, continue a dizer que similhante determinação é pelo menos o resultado de uma grande leviandade, por isso que a barraca de que se trata não tem nenhuma das condições que se exigem para os estabelecimentos d'esta especie.
É absurdo, alem disso, ir estabelecer um lazareto insufficiente no coração da cidade quando nós temos do outro lado do rio um lazareto apropriado, onde se podiam no caso sujeito isolar os individuos suspeitos.
Espero que o sr. ministro do reino esclareça a camara ácerca d'estes dois pontos e desde já peço a v. exa., sr. presidente, que de novo me inscreva para eu replicar ao sr. ministro, se a sua resposta me não contentar, ou para lhe agradecer se ella me deixar satisfeito.
O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas): - Começo por agradecer ao illustre deputado a lealdade com que repetiu as phrases que tinha pronunciado na minha ausencia, e se posso agradecer a sua lealdade, porque estamos em tempo em que tudo se agradece, o que não posso agradecer-lhe é a injustiça que me fez. Mas estou já habituado a essas injustiças e portanto não as estranho, nem me impedem de continuar no cumprimento do meu dever.
Devo dizer ao illustre deputado, que quando s. exa. me accusava de desprezar a questão de saude, estava eu exactamente no ministerio do reino tratando cuidadosamente, com os inspectores dos lazaretos, com os differentes empregados da secretaria e com a junta consultiva de saude, de preservar o paiz, tanto quanto caiba nas minhas forças, da invasão da epidemia do cholera que está assolando a Hespanha, que já hoje está convertida n'um hospital e parece tender a converter-se n'um cemiterio. Portanto não me parece que este meu modo de proceder signifique pouca interesse pelo estado da saude publica! (Apoiados.)
Mas o illustre deputado depois mudava a fórma da sua argumentação e dizia: similhante desprezo pelo parlamento!
Ora toda a gente sabe que vim para o parlamento ha muitos annos; tenho aqui vivido quasi constantemente, e se alguma cousa sou devo-o ao parlamento, e por consequencia nunca podia ter desprezo por elle; mas permitta-me a camara e o illustre deputado que diga, que se em qualquer occasião os interesses da saude publica me chamarem a outra parte, onde as deliberações podem ser efficazes, eu não devo preferir estar n'esse logar a vir a que responder a perguntas.
Virei mais tarde responder a essas perguntas, em tempo opportuno, mas primeiramente hei de cumprir com o meu dever; porque, por mais eloquentes que sejam as phrases que se pronunciem aqui, ellas valem muito menos, do que uns certos factos praticados em beneficio da saude publica, por mais obscuros que sejam. Eu prefiro essa obscuridade do trabalho no socego do meu gabinete, trabalho que ninguem vê, que ninguem me agradece, mas a que preside a consciencia do cumprimento de um dever. (Vozes: - Muito bem.)
Dada esta explicação ao illustre deputado; e a fallar a verdade, quasi que chego a achar graça áquelles que me accusam de fugir do parlamento; quando eu tenho passado a minha vida toda a discutir; discuti na universidade, como lente, n'esta casa, como deputado, na outra casa do parlamento como par do reino, e n'uma e n'outra como ministro, realmente não sou muito habituado a fugir á discussão!
(Interrupção de um sr. deputado.)
Diz-me aqui um illustre deputado, n'um áparte, «que isso já lá vae». Pois fiquemos n'isto, mas sempre é bom