O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 39

N.º 3. SESSÃO DE 3 DE AGOSTO. 1853

PRESIDENCIA DO SR. SILVA SANCHES

Chamada-Presentes 56 sr. deputados

Abertura: — As onze horas e meia..dela. — Approvada.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho) — Em conformidade com a resolução da camara fui desannojar o sr. deputado Nazareth, que se mostrou agradecido pela attenção que a camara teve com elle.

CORRESPONDENCIA.

Uma Declaração — Do sr. Paredes, participando que o sr. Menezes o Vasconcellos não póde, por motivo do molestia, comparecer á sessão de hoje, e a mais algumas. — Inteirada.

Um officio — Da camara dos dignos pares, participando que não teve o seu assentimento a proposição de lei, que por esta lhe foi enviada, alterando a fórma do pagamento da pensão do conde de Penafiel. — Inteirada.

Mandaram-se imprimir os seguintes pareceres, que concluem por projectos de lei.

1.º Da commissão de guerra, ampliando o decreto de 29 de dezembro de 1834, mandando contar a antiguidade do primeiro posto de official áquelles dos officiaes, que se acharem nas circumstancias mencionadas no mesmo projecto.

2.º Da commissão de fazenda, concedendo á camara municipal de Villa do Conde a cêrca do antigo hospicio, do Carmo.

3.º Da mesma commissão, auctorisando o governo a estabelecei um vencimento annual correspondente a 5:000 francos, moeda franceza, a um desenhador, e gravador topógrafo, que venha em Lisboa executar os trabalhos de desenho e gravura topográfica, que lhe forem commettidos pelo governo.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho). — Seguia-se agora dar conta de um projecto de lei, apresentado hontem pelo sr. Cunha Sotto-Maior; mas como o sr. deputado não está presente, pareceu-me mais conveniente que fique reservado para quando estiver presente o seu auctor.

O sr. Avila: — Eu, sr. presidente, não sei se commetto alguma indiscrição, no que vou dizer á camara; mas tenho idéa de que o illustre auctor do projecto tinha tenção de pedir licença para o retirar; por isso parecia-me mais conveniente que a segunda leitura deste projecto ficasse reservada, para quando estiver presente o seu auctor.

Assim se resolveu.

O sr. Cezar de Vasconcellos: — Sr. presidente, o sr. Ayres de Sá Nogueira, sempre incansavel e zeloso pela prosperidade da lavoura, convidou a uma reunião muitos proprietarios, para tractar o que melhor conviesse sobre o mal que ultimamente tem atacado as vinhas; e verificada esta reunião, resolveu-se nella que o mesmo cidadão, o sr. Ayres de Sá Nogueita, fosse auctorisado para requerer tudo que julgasse conveniente. Nesta qualidade honrou-me com uma caria, em que me remettia uma representação, para eu apresentar a esta camara, na qual pede: — 1.º a isenção de impostos em geral, sobre as vinhas, em quanto dinar o mal que as tem atacado — 2.º a concessão de uma moratoria aos devedores de tributos geraes «.especiaes sobre a propriedade vinicula, ou quanto elle se achar naquellas circumstancias, e ainda por um espaço rasoavel — 3.º que estas provisões sejam cora urgencia convertidas em lei — 4.º que a camara dote com urgencia o paiz com o estabelecimentos de bancos do credito agricola.

Sr. presidente, escuso de accrescentar mais observações, porque todos os srs. deputados são conhecedores do que se tem passado no paiz, e do estado em que estão os proprietarios de vinhas, que, possuindo este anno boas fortunas, estão nas circumstancias talvez de pedir esmola: por tanto o pedido da representação é muito rasoavel; porque, não produzindo as vinhas, para a sua sustentação, e por consequencia, nem tiram para as despezas que fizeram no cultivo, não e justo que elles sejam collectados como se ellas produzissem regularmente, como em outros annos.

Peço, pois, a v. ex.ª, que consulte a camara sobre se julga ingente esta representação, para ser remettida ás competentes commissões, a fim de darem o seu parecer, a vêr se o possivel tomar-se alguma resolução antes do encerramento da sessão.

Sendo declarada urgente, foi enviada as commissões de agricultura e de fazenda.

O sr. Tavares de Macedo — Ha já bastantes semanas, tive a honra de apresentar nesta camara uma proposta, para se nomear uma commissão de inquerito, para estudar a pena de degredo no seu estado actual, e nos seus effeitos, o os melhoramentos que podesse receber da nossa legislação; e juntamente o systema de colonisação africana. Eu mesmo pedi, que a discussão deste objecto, que repillo de grande interesse publico, ficasse reservada, para quando estivesse, presente o sr. ministro da justiça; mas, não tendo até agora acontecido que o sr. ministro aqui tenha apparecido á hora do expediente, e como o objecto perde a sua maior utilidade, se não fôr tractado agora, eu quisera, que, ou a camara conviesse

Página 40

— 40 —

em que elle fosse tractado mesmo na ausencia do sr. ministro, ou então, o que me parece mais conveniente, que elle se tractasse em qualquer occasião, que s. ex.ª estivesse presente.

O sr. Presidente; — Como o sr. deputado deu preferencia ao segundo meio que indicou, consultarei a camara sobre elle.

Resolveu-se que se discutisse esta proposta em qualquer occasião, em que o sr. ministro da justiça esteja na camara.

O sr. Julio Pimentel: — Sr. presidente, com quanto não fosse eleito deputado por Moncorvo, com tudo julgo-me deputado de toda a nação, e muito principalmente da terra da minha naturalidade, a qual foi invadida, no principio do mez passado, por uma força de. um denominado batalhão de Villa Nova de Foscôa, terra sempre inquieta ha muitos annos, e espalhando o terror nos concelhos visinhos. (Apoiados)

Esta força, assimilhando-se mais a uma guerrilha, que a uma força regular, era commandada pelo juiz ordinario de Villa Nova de Foscôa, e foi alli a titulo de capturar os individuos culpados na morte do celebre Marçal: e como soube particularmente do sr. ministro do reino, que as auctoridades não lhe participaram esta invasão, provavelmente com receio de lhes succeder peior, por isso mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação: — Desejo interpellar o sr. ministro do reino acêrca da invasão, que teve logar em Moncorvo no dia 8 do passado, por uma força do chamado batalhão nacional de Villa Nova de foz côa, commandada pelo juiz ordinario da mesma villa, com o pretexto de procurar os individuos culpados na morte do celebre Marçal, cunhado do mesmo juiz ordinario (Almeida). — Julio Pimentel.

Mandou-se fazer a communicação respectiva.

O sr. Maia (Francisco) — Mando para a mesa o seguinte requerimento. (Leu)

Ficou sobre a mesa para ter amanhã o competente destino.

O sr. Palmeirim: — Mando para a mesa dois pareceres da commissão de fazenda.

Ficaram tambem sobre a mesa para terem o de vido seguimento.

O sr. Presidente: — Entrou o sr. Cunha, vai ter segunda leitura o seu projecto.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu não tenho duvida nenhuma em que v. ex.ª mande ler o meu projecto; mas pensando melhor, e tendo hontem observado que a camara o recebeu com muito desagrado, e não querendo eu incorrer no desagrado da camara, pedia licença para retirar o projecto, mas não infira a camara (pae este meu pedido significa ou importa a confissão da injustiça do projecto. Eu retiro o meu projecto por um acto de deferencia e de attenção para com a camara, porque vi a camara estomagada, e, por assim dizer, agoniada com a sua apresentação: por consequencia eu retiro o projecto com a condição da camara não inferir dessa retirada, que eu o julgo de menos justiça.

Eu deveria deixar a camara rejeitar o projecto in limine, porque podia tirar dahi uma consequencia favoravel para mim, e vem a ser, que sendo o projecto, por assim dizer, a cópia fiel da ordem do exercito nella consignada, a camara rejeitando o projecto, vinha por esse facto a rejeitar a ordem do exercito, e por consequencia moralmente linha alcançado o meu fim; mas eu não quero continuar a desgostai a camara; bastantes desgostos lhe tenho já dado (Riso) e peço licença para retirar o meu projecto, e substitui-lo por uma interpellação, que vou mandar para a mesa, dirigida ao sr. ministro da guerra, ou áquem suas vezes fizer, para que s. ex.ª venha responder á camara, sem demora, sobre a legalidade da ordem do exercito.

O sr. Presidente; — Como o projecto ainda não tinha tido segunda leitura, o sr. deputado está no seu direito de o retirar, e considera-se retirado. Póde mandar a sua nota de interpellação para a mesa.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sim senhor, eu a mando; e a seguinte:

Nota de interpellação: — Requeiro que seja avisado o sr. ministro dá guerra, ou quem suas vezes fizer, para responder a uma interpellação que lhe devo dirigir ácerca da ordem do exercito n.º 24, de 7 de julho. — Cunha Sotto-Maior.

Mandou-se fazer a communicação respectiva.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do projecto n.º 96.

O sr. Pegado: — Hontem disse-se alguma cousa relativamente a direitos que deviam pagar as fazendas estrangeiras vindas das nossas possessões. Se se tractasse deste objecto na sua generalidade, eu diria á camara, que não me parece bem intendido o principio de regular a mesma pauta para todas as nossas possessões. Eu intendo, e neste sentido representei ao governo ha um anno, que cada uma das nossas possessões deve ter a sua pauta especial, e cada um dos generos de que a pauta fizer menção, o seu direito igualmente especial, e o mesmo genero póde e deve pagar nas alfandegas de Portugal direito diverso, segundo a possessão de que vem. Ha um anno que ou apresentei ao governo uma pauta, sobre a qual o governo mandou ouvir o conselho ultramarino, em que estão todos os generos que são exportados de Macáo, e a cada um delles está assignado o seu direito, e este direito estava de tal fórma calculado, que as fazendas estrangeiras, vindas de Macáo para Lisboa, podiam concorrer com as outras fazendas apresentadas em Lisboa, vindas de portos que não são nossos, Assim é que me parece que se devem calcular os direitos, e foi por não se ter attendido a isto, que se prejudicou o commercio para Macáo donde a exportação principal é o chá. Não se attendeu a um direito differencial, que devia haver, de fórma que o governo não ficando prejudicado, não prejudicasse tambem a navegação.

É claro que em virtude destes direitos differenciaes o thesouro deixaria de receber alguma cousa, mas essa pequena quantia que o thesouro deixava de receber, era compensada por muitos modos, e não era só compensada indirectamente, era compensada directamente. O governo inglez, por exemplo, dá um subsidio de muitos centos de libras esterlinas ás emprezas particulares, que navegam por vapôr no alto mar. para ajudar essas emprezas, e o governo inglez recebe directamente muitos rendimentos que provem dessa navegação. Mas ocaso presente é outro; o caso presente é fazer justiça aos emprehendedores que navegam de Goa, Macáo, etc, que emprehenderam o commercio antes da publicação da ultima pauta. Os na-

Página 41

— 41 —

vios tinham saído coutando com os direitos que então pagavam, no momento da sua saída, as mercadorias e generos que haviam de trazer; foram para possessões bastante remotas, onde não podiam ter conhecimento da mudança da nossa legislação a este respeito; portanto o que pede a justiça e que a estes navios, voltando, se lhes applique a legislação que havia d'antes.

Eu vou lêr a camara o projecto originario da commissão, e o mais é que eu estava na impressão de julgar que o projecto que se discute, era exactamente o mesmo que o projecto originario. (Leu)

Esta impressão fez com que eu á primeira vista não distinguisse o projecto da commissão do projecto do governo, porque esse projecto chamou legislação a duas portarias; por consequencia, se o projecto da commissão passasse como está, com toda a certeza não se executavam as portarias, porque as portarias não formam leis. Portanto no artigo 1.º do projecto da commissão em logar da palavra legislação dever-se-ha dizer as portarias de tantos de agosto mas não se querendo fazer esta alteração, então adopto a substituição do sr. Santos Monteiro, que é o projecto inicial do governo.

O projecto da commissão apresenta o praso de 1 anno; porém o governo ver-se ha embaraçado em executar esta disposição se ella passar em lei; porque o termo medio da viagem de um navio ao ponto mais remoto das nossas possessões, que é na China, são 4 mezes e meio de ida, 4 mezes e meio de volta, e a estada 3 mezes. Todos os navios que saíram nesta ultima quadra de Macáo tiveram bastante demora, assim como todos os navios que dobraram o Cabo. Por conseguinte se o projecto do sr. Monteiro excede esta restricção, votarei por elle; senão instarei pela seguinte emenda, que mando para a mesa:

Emenda: — Que o praso de 1 anno seja substituido pelo de anno e 3 mezes. — Pegado.

(Continuando): — Tambem tenho um additamento a offerecer a este projecto. A doutrina do paragrapho em discussão, que é tambem, na sua essencia, a mesma doutrina do projecto do governo, deve-se applicar aos navios que chegaram depois da publicação da pauta de 1836. Nessa época tinham saido alguns navios, antes da publicação da primeira pauta; e quando voltaram, acharam-se com direitos novos e nova pauta, e tanto que os donos dessas mercadorias ficaram muito prejudicados, e ainda lá estão na alfandega as mercadorias que importaram, porque preferiram deixa-las lá estar do que pagar os direitos, que se lhes exigiam. Por isso eu proponho este

Additamento: — § unico: — A disposição deste artigo é igualmente applicavel ás mercadorias carregadas em navios portuguezes da mesma procedencia, saidos de Lisboa antes da publicação da pauta de 1837, que se acharem ainda por despachar na alfandega grande de Lisboa. — Pegado.

(Continuando) É applicar a mesma doutrina, fundada em justiça, a todos quantos estiverem nas mesmas circumstancias.

Tanto a emenda cama o additamento foram admittidos, e ficaram tambem em discussão.

O sr. Quelhas: — Sr. presidente, eu pedi a palavra, quando vi que o projecto que estava em discussão, deixava de ter paternidade; quero dizer, que o sr. Monteiro tendo assignado o projecto da commissão, que deferia em pontos essenciaes do projecto do governo, tinha depois adoptado o projecto primario do governo. Como membro da maioria, e como apoiador das medidas do governo, entrei em alguma suspeita, quando vi que o primeiro assignado no projecto em discussão era o sr. Passos (Manoel) porque cheguei a persuadir-me que se quizesse trazer á camara uma surpreza n'um voto de censura ao governo, quando se apresentava um projecto differente do governo, e que por consequencia poderia ler levado aquella circumstancia os seus collegas a adoptarem outra base; e mais ainda me confirmei nesta idéa, quando vi que o sr. Monteiro, homem pensador, voltaria, sem dar a rasão ao projecto do governo. Ora, em consequencia disto dei-me ao estudo desta materia, e combinando ambos os projectos, achei em ambos as mesmas ideas: — 1.ª em considerar todas as mercadorias, que saissem das nossas possessões: — 2.ª a producção como se fosse já, ou tivesse sido nacionalisada: — 3.ª circumstancia que viesse em navios portuguezes: — 4.ª que viesse directamente: — 5.ª que chegasse dentro de um anno: — 6.ª que o navio tivesse saido dos portos de Portugal para aquellas possessões antes do decreto de 31 de dezembro de 1852. A unica differença nesta sexta circumstancia é em dizer o projecto — antes da nova pauta — e o outro diz — antes do decreto de 31 de dezembro — mas isto vem a ser a mesma cousa.

Ora, o sr. Santos Monteiro, depois de eu ter pedido a palavra, teve a bondade de me explicar, e fazer vêr que a rasão da differença vinha a ser em se dizer no projecto da commissão — ficam sujeitos aos antigos direitos. — Esta differença faz com que eu subscreva ao projecto do governo, e a rasão é aquella que deu o illustre deputado, que se senta ao meu lado, porque no caso de prevalecer o principio de — ficarem sujeitos aos antigos direitos — vinham a ficar mais favorecidos os generos importados em navios estrangeiros.

Agora farei outra observação em relação á proposta do sr. Pegado. Parece-me que neste projecto está comprehendida a moção que s. ex.ª mandou para a mesa, por isso que dizendo o projecto (Leu).

Estas palavras dentro de um anno comprehendem todas as mercadorias. (O sr. Monteiro. — Não comprehendem) Parece-me que comprehendem.

Eu concluo notando — apesar do que se tem dicto, e apesar das illustrações que recebi de alguns membros da camara, principalmente do sr. Santos Monteiro — que alguma surpreza todavia me causou, porque lendo assignado o parecer sem declaração, adoptou depois o projecto do governo.

O sr. Santos Monteiro: — Eu não hei do demorar-me muito tempo, porque me parece que esta questão já esta sufficientemente illustrada.

Eu pedi a palavra desde que o meu amigo o sr. Pegado apresentou um additamento; esse additamento confesso que lhe não sei neste instante conhecer o alcance; e se eu sou empregado da alfandega, e não sei neste instante conhecer-lhe o alcance, ha de permittir-me a camara que lhe diga, que tambem poucos srs. deputados lho poderão conhecer.

A respeito do additamento do sr. Julio Pimentel eu desejava que fosse á commissão para o tomar em consideração; assim como tambem logo nas poucas palavras que hei dizer, concluirei pedindo que a ultima redacção deste projecto seja feita pela commissão de pauta, a fim de lhe dar uma redacção

Página 42

— 42 —

Conveniente, antes de ir á commissão propria de redacção.

Eu creio que nós não calamos aqui no momento actual com umas conclusões magnas acêrca do que convém, ou deixa de convir em relação ao nosso commercio entre a melropoli o as possessões; porque se estivessemos, eu ainda que não vim preparado para esta materia, havia de entrar tambem na questão; e desde já previno o meu amigo o sr. Pegado, que não concordo com muitos dos seus desejos. E Deos nos livre de que elles se realisem! Posso assegurar a s. ex.ª que não tem melhores desejos de proteger o commercio do que eu, e appello para o commercio. Tenho todas as provas disso em todas as occasiões que me tem sido possivel da-las; mas não quero nunca uma protecção tal, que se proteja um commercio em desvantagem de outro (é necessario muito cuidado nestas cousas), e que se proteja um commercio em desvantagem absoluta de uma industria. S. ex.ª sabe que eu já apresentei uma especie de projecto de lei, ou indicação para projecto de lei, com umas bases, fóra das quaes creio eu que se não póde ir, para chegarmos ao desejado fim de beneficiar o commercio entre a metropoli e as possessões, com vantagem commum da metropoli e das possessões, e sem uma desvantagem extraordinaria do; interesses do thesouro, porque eu declaro que ainda não ouvi theoria nenhuma, que me fizesse descon-vcncer do que eu tenho aprendido com a practica.

Em Portugal por muitos annos, por muitissimos annos ainda hão de ser abraçados sem nenhuma repugnancia os impostos indirectos (Apoiados) e é necessario não os abandonar, o não os fusilar contra os interesses communs da sociedade. (Apoiados) estas, são as minhas idéas, e o que asseguro é que são as idéas da maioria da nação portugueza; (Apoiados) e aqui nesta casa entrou neste momento uma illustração respeitavel, que é desta mesma opinião: é o sr. Manoel da Silva Passos. É necessario todo o cuidado em affectar os rendimentos publicos nos impostos indirectos, porque corremos o risco de serem suppridos pelos directos, para os quaes ha uma repugnancia invencivel. (Apoiados)

Vamos ao ponto preciso da questão. O meu nobre amigo o sr. Quelhas teve uma duvida, e fez muito bem em duvidar; mas essa duvida foi esclarecida por mim; porém eu ainda me quero explicar de modo a ser bem intendido pela camara. Desejo, porque intendo que é de justiça em consideração aos precedentes desta nossa leria, que os generos e mercadorias vindos em navios que saíram para as suas especulações, antes da publicação da pauta de 31 de dezembro de 1852, quando aqui chegarem, se considerem como se elles estivessem dentro da alfandega no momento em que foi publicada a pauta, e isto para todos os effeitos. Em se dizendo isto, faz-se justiça; basta que se reduza o projecto a estas palavras — que os generos e mercadorias que vierem nos navios, que tentaram as suas viagens antes da publicação da pauta, no momento da sua entrada sejam considerados, pari todos os effeitos, como se estivessem dentro da alfandega no momento em que a pauta foi promulgada: e isto e o que é justiça, e isto é que rasoavel, e isto é o que nós, tanto o governo, como a commissão queriamos o intendiamos. Mas não nos venham fazer observações, de que a commissão alterou o projecto do governo, e que isso seria para este ou para aquelle fim, o que eu o assignei: assignei, mas não assignei esse projecto que ahi apresentou o meu amigo o sr. Pegado, que nunca foi da commissão, foi uma idéa da commissão, mas nunca projecto da commissão, e nunca foi projecto da commissão, porque os membros da commissão concordaram comigo em nós por meio de um acto legislativo não sanctificarmos um abuso, que em outro tempo se practicava, e é conveniente que não se practique; isto é, darmos a qualidade de lei a um diploma, que não tem qualidade de lei, ainda que tenha os effeitos; fallo dessa portaria, a que já me referi hontem.

E muito simples a questão; a maneira de a enunciar, para chegar ao fim, é que póde ser differente. O que tanto a commissão, como o governo, como os srs. deputados do ultramar, o todos os membros da camara querem e desejam, é que os generos e mercadorias (repito ainda) que vierem nos navio, que tentaram a sua navegação antes de promulgada a pauta de 31 de dezembro de 1852, no momento em que aqui chegarem, sejam considerados como se já estivessem in alfandega no momento em que foi promulgada a pauta. Está assim acabada a questão; esta é a questão, e o modo de a enunciar é este, para não fugir de um cachopo, e ir dar em outro, fazendo-se referencia a direitos antigos.

Eu não apresentei o projecto do governo por parte da commissão, porque nem sou relator da commissão, nem fallei com os membros da commissão, senão n'um unico ponto, e é, que era necessario marcar o praso; e se mesmo marcarmos esse praso, que ahi apresenta o sr. Pegado, o praso de um anno, podemos daqui a dias ter reclamações. (Apoiados) Quem nos diz, que esse navio que falla para entrar, não tem uma arribada forçada, e em logar de tres mezes, vem em quatro? Não precisamos dar praso: elles são poucos os navios saídos para aquellas possessões.

Eu sempre que me engano, sempre que não acerto, digo-o em publico e em alia voz.

O sr. Julio Pimentel: — Eu pedi a palavra, quando ouvi, no exordio do discurso do sr. Quelhas, fazer-se uma allusão á commissão e ao digno presidente della. E na realidade muito deploravel este modo, porque se entra na maior parte das discussões nesta camara! Deploro que cousas que são independentes das pessoas, cousas que são sérias, venham embrulhar-se com questões... não sei que nome lhes possa dar; mesmo impertinentes até certo ponto. Pois póde alguem suspeitar do illustre caracter do digno presidente desta commissão, do sr. Passos (Manoel) e que elle quizesse levar a commissão por surpreza, para dar uma redacção a este projecto que podesse significar opposição ao governo, ou que podesse pôr a commissão na collisão com o governo? Isto ninguem podia suspeitar. (Apoiados)

Eu quando ouvi, estava muito longe de poder imaginar que alguem attribuiria, nem á commissão nem ao governo, uma similhante idéa, tão pequena, Ião mesquinha. (O sr. Cunha Sotto-Maior: — O sr. Passos (Manoel) póde errar) O sr. presidente da commissão e a commissão toda podem errar, porque aqui neste parecer não se distingue o presidente da commissão; é a commissão que vem assignada, e nenhum veiu assignado com declaração; quando um parecer vem assignado, como este, sem declaração de nenhum

Página 43

— 43 —

dos seus membros, todos elles suo solidarios; o parecer éde todos; póde durante a discussão algum modificar as suas ideas, como fez relativamente o sr. Monteiro, isto é muito admissivel; nem é necessario ir procurar explicações menos honrosas para um facto destes.

Disse o sr. Quelhas que tinha pedido a palavra por vêr este projecto abandonado de paternidade, e para ser curador delle: peço perdão para lhe dizer que não e verdade o que o illustre deputado disse; o sr. Monteiro fallou não em opposição ao projecto, mas simplesmente para modificar a sua redacção, para a tornar mais explicita, sem se affastar das idéas da commissão, porque as idéas da commissão são as mesmas delle; houve modificação simplesmente no modo de expressar; e questões desta natureza, que involvem interesses particulares, e geraes de fiscalisação, teem sempre tantas faces por onde se podem olhar, que todo o cuidado na redacção é muito necessario. Eu pedi a palavra e disse algumas poucas palavras em defeza do projecto defendendo a redacção delle em contraposição á redacção do sr. Monteiro, mas simplesmente defendendo a redacção, sem nos affastarmos nas idéas principaes, ou nos fundamentos do parecer; o sr. Manoel da Silva Passos tambem tinha pedido a palavra, e teem a da sessão passada. O que auctorisou pois o illustre deputado a dizer que este projecto estava abandonado da paternidade? E uma asserção graciosa, e peço perdão á camara de a ter occupado com uma insignificancia desta natureza.

Mas darei a explicação que o nobre deputado pede relativamente á differença das redacções. O nobre deputado acha que as doutrinas do projecto da commissão e da proposta do governo são até um certo ponto identicas, e só a redacção differe. A razão desta differença esta explicada pelo que se tem já dicto, principalmente o sr. Monteiro. Pela proposta do governo propunha-se que fossem considerados como oriundos das possessões portuguezas da Asia, para o pagamento dos respectivos direitos, os generos e mercadorias estrangeiros nacionalisados nas sobredictas possessões. Ora esta frase nacionalisados, que deu logar já a uma portaria, é susceptivel de abuso; póde-se abusar muito della, porque esta nacionalisação póde fazer-se de dois modos, ou sendo as mercadorias conduzidas por mar para esses portos, pagando ahi os direitos de consumo, e depois poderem ser transportadas para o paiz, como se fossem nacionaes, lendo assim uma melhoria ou um beneficio no pagamento dos direitos aqui, e podem ser tambem aquellas mercadorias que de terra pelas raias das nossas possessões entram dentro dellas, e é para estas que se pedia o favor particularmente, porque são estas as que principalmente nas possessões da Asia, em Gôa o merecem, e favor que é conveniente áquellas possessões, e não as mercadorias que veem por mar de portos estrangeiros, vindo ou podendo nacionalisar-se nellas. Na redacção do projecto do governo isto ficava confuso, duvidoso, e na da commissão isto ficava bastante claro, porque mandava reger este caso pela legislação anterior ao decreto de 31 de dezembro de 1852, e não pelas portarias especiaes, que tinham sido feitas para casos particulares, e que se podem considerar como lei do estado. Eis-aqui está a rasão porque a commissão adoptou uma redacção diversa da redacção do governo.

O sr. Cunha Sotto-Maior — Sr. presidente, nu tenho muita estima e muitissima consideração não só pelo presidente da commissão, como tambem por todos os cavalheiros que exararam no parecer os seus nomes; mas permitta-me a camara que eu lhe diga que, apesar desta consideração, não acredito na infallibilidade nem do sr. Passos (Manoel), nem de qualquer outro cavalheiro. A minha inteligencia, a minha independencia, o meu modo de encarar as cousas, leva-me a protestar alta e solemnemente contra esta inducção mais que temeraria e excessiva — lai nome está assignado no parecer, logo a camara deve votar por elle. — Mas o sr. Passos póde errar, (O sr. Passos (Manoel). (Apoiado) a camara póde errar; e tanto o sr. Passos póde errar e a commissão que apresentaram aqui um parecer para ser discutido. Por consequencia a invocação de um certo e determinado nome para dar a esta discussão um caracter odioso, é muito mal feita, e prova falla de outro argumento qualquer com que se possa bem ou mal fundamentar uma opinião.

Sr. presidente, eu intendo (e peço perdão ao meu nobre amigo o sr. Passos para dizer francamente o meu modo de pensar) que este artigo está mal redigido, e se acaso a camara o approvar, approva uma grande injustiça. Eu peço ao illustre relator da commissão, e se não é relator, é membro da commissão (eu não quero eleval-o em cathegoria) que note o seguinte — Supponhamos que uma embarcação veiu de uma das nossas possessões da Asia, e chegou a Lisboa no momento em que já se fallava em serem alterados certos artigos das pautas, o especulador, o dono ou consignatario da embarcação, ou o dono dos generos e mercadorias vindas da Asia nessa occasião, depositou estes generos na alfandega; não os quiz despachar; quiz, para o fazer, esperar pela publicação da reforma das pautas; e publicou-se a reforma das pautas, isto é o decreto de 31 de dezembro de 1852, o dono dos generos despachou immediatamente os seus generos, e despachou-os com o beneficio que lhe concedia o referido decreto de 31 de dezembro de 1852. Mas, agora, segundo a disposição do projecto da commissão, o especulador, cujo navio saíu de Lisboa, ignorando completamente que a reforma das pautas se fazia, que recebeu carregação na Asia, chega a Lisboa, é obrigado a pagar os direitos antigos, isto é, o dobro do que pagou aquelle que veiu da Asia, mas que esperou pela publicação da reforma das pautas, afim de gosar o do beneficio que ella lhe concedia. Não será isto o que se pertende pelo projecto? (O sr. Oliveira Pimentel. — Está laborando n'um equivoco) Se o illustre deputado quer condemnar a minha vi-la ao ponto de querer dar a conhecer que eu ou não vejo o que leio, ou que não sei ler, permitta-me que lhe diga que posso ser alcunhado de tudo, menos de que não vejo bem; nem de que não sei ler o portuguez; vejo bem, perfeitamente; sei ler o portuguez muito bem; mas confesso ao illustre deputado que tive uni trabalho penoso, penosissimo até, para vêr se podia intender o projecto da commissão; confesso que ainda não vi tão má grammatica, nem uma redacção tão ignara; (Riso) mas dentre este embroglio pude deprehender que o navio que pai lin de Lisboa antes da publicação do decreto de 31 de dezembro, que foi fazer o seu carregamento ás nossas possessões da Asia, e que voltou e chegou a Lisboa antes da publicação deste decreto que es-

Página 44

— 44 —

perou pela publicação delle, para serem despachados os generos que nesse navio vieram, gosaram, fazendo o despacho depois da publicação do decreto, dos beneficios concedidos no mesmo decreto, porem os emprehendedores que tambem sairam de Lisboa antes da publicação da reforma das pautas, mas que chegam a Lisboa depois da publicação dessa reforma, quer a commissão que não gosem dos beneficios que a certos generos da Asia são concedidos pelo decreto de 31 de dezembro de 11352, beneficios que já foram concedidos a outros emprehendedores! Ora é com isto que eu me não conformo. Eu quero que o beneficio seja igual; e em todo o caso adoptarei a proposta do governo em preferencia ao projecto da commissão, porque este contém a maior injustiça que se póde practicar.

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. presidente, eu observo que a camara geralmente concorda na concessão estabelecida no projecto; e apenas ha uma pequena divergencia ou duvida em quanto á boa fé das especulações; porque, verificando-se ella, não se impugna a concessão. Porém desta mesma condição tiro outra consequencia a favor dos meus patricios do ultramar, para que este mesmo beneficio seja concedido aos especuladores, que carregaram navios, por exemplo, em Moçambique, 2 ou 3 mezes depois da publicação do decreto de 31 de dezembro, e onde era impossivel que então se tivesse conhecimento desse decreto. Por consequencia mando para a mesa o seguinte

Additamento: — § unico: Este mesmo beneficio compele ás embarcações, que tiverem saído do ultramar depois do decreto de 31 de dezembro de 1852, porém, no tempo em que no respectivo porto era materialmente impossivel haver conhecimento do mesmo decreto. = Jeremias Mascarenhas.

Foi admittido é discussão.

O sr. Passos (Manoel): — A camara me desculpará de não poder fallar com a placidez necessaria, porque estou impressionado pela morte de um meu amigo particular, de um homem dos mais illustres deste paiz, e pelo qual, todos nós, não podemos deixar de ter um profundo sentimento; de um homem que practicou um grande exemplo de virtude, e deixou sua mulher e seu filho na ultima pobreza; elle! Que podia ter exercido os primeiros logares neste paiz, não só pelo seu merecimento, mas pela confiança dos homens que teem governado o estado! (Apoiados) Faço esta recordação á camara, para que ella um dia pague esta divida contraída para com um homem cheio de virtudes: (Apoiados) e se nós temos sempre sido generosos, para com os homens que teem combatido com as armas na mão, é necessario que nos tempos modernos, nós consideremos a pár das virtudes guerreiras, as virtudes civicas: e a vida do sr. Leonel Tavares Cabral, foi uma vida cheia de heroismo e de virtudes. (Apoiados) Por uma palavra que o sr. Leonel proferiu nesta casa, teve de passar por um continuado martirio, luctando sempre contra o infortunio. Quando elle defendia os seus principios na camara, n'uma época remota, disseram-lhe do lado direito u vós fazeis opposição, mas fazeis opposição aos empregos» A isto respondeu o sr. Leonel — que nunca havia de ser empregado publico. — Palavra fatal, que indica uma grande virtude, mas que não indica um homem de estado, porque o homem de estado tem obrigação de servir o seu paiz; (Apoiados) mas esta palavra, imprudentemente proferida, elle a cumpriu até ao fim da sua vida (Apoiados — Vozes: — É verdade) É admiravel o seu heroismo unico neste paiz! Portanto espero que a camara, para excitar as gerações futuras a seguirem o exemplo deste homem virtuoso, não abandonará sua mulher e seu filho. (Muitos apoiados)

Agora passando ao negocio de que se tracta, intendo que elle é de pouca importancia, porque no fim de tudo póde referir-se a maiores ou menores direitos, que hão de pagar os generos; mas o negocio é importante em si pelo exemplo e pelo precedente que se vai estabelecer.

Quando em 1837 se fez a reforma das pautas, alterando-se consideravelmente os direitos, concedeu-se o praso de 3 mezes para as especulações encetadas, e tomaram-se algumas medidas de equidade com relação ao ultramar, porque aquelle praso era bastante para uma parte do commercio do ultramar, mas não era bastante para outra parte. A razão porque em 1837 nós concedemos aquelle praso, foi porque a reforma tinha sido feita dictatorialmente, sem ser precedida do exame e auctorisação do parlamento, alias, se ella tivesse sido precedida pelo exame do parlamento, este seria sufficiente para prevenir os especuladores; que se aproveitariam dessa prevenção, para melhor dirigirem o seu commercio. O sr. ministro da fazenda, porém, na reforma das pautas que ultimamente se fez, não concedeu esse praso, mas adoptou um bom principio; ainda que para este principio ser justo, seria necessario que a reforma tivesse sido sujeita ao exame do parlamento; mas não tendo acontecido assim, e tendo sido adoptada dictatorialmente, como a reforma de 1837, ha por consequencia a mesma razão de analogia para se tomar agora uma providencia de equidade, similhante aquella que então se estabeleceu.

A commissão das pautas tem sido censurada por não conceder um favor tão amplo, como aquelle que agora se quer conceder, mas convém advertir que, depois que a commissão julgou modificar a opinião do sr. ministro, novas razões se poderiam ter apresentado, que fizessem com que se alterasse este principio, e por consequencia não se póde allegar que a commissão fosse injusta. A commissão intendeu que as especulações encetadas á sombra da pauta anterior, poderiam encontrar algum desfavor na pauta nova; mas a commissão reconhecendo a difficultado que havia em resolver este ponto, por isso que se desejava que uns objectos fossem despachados pela pauta nova, e outros pela pauta velha, a commissão intendeu ser um principio de justiça, que aos homens que fizeram as suas especulações antes do decreto de 31 de dezembro de 1852, lhes fosse applicavel a legislação anterior a esse decreto, estabelecendo-se assim uma medida de equidade. Poderá alguem queixar-se da decisão da commissão? Creio que não. O favor é grande, porque fica livre aos especuladores o poderem despachar os seus generos ou pela pauta nova ou pela pauta velha; mas despachar uniu parte dos generos pela pauta velha e outra parte pela pauta nova, isto é que pareceu inconveniente. Foram pois estas as razões, porque a commissão tomou esta resolução.

Entretanto o sr. Santos Monteiro apresentou agora algumas ponderações, em virtude das quaes se poderá estender este favor de equidade; eu não me opponho

Página 45

— 45 —

a isso, mas desejo que, neste caso, o negocio vá á commissão para ser por ella considerado, porque é um negocio muito serio, e mesmo porque é necessario avaliar o alcance do precedente que vamos estabelecei. Pela minha parte declaro, que não tenho duvida nenhuma em que sejam protegidas todas e quaesquer especulações feitas em boa fé; mas não desejo que vamos proteger aquellas que assim não forem feitas. Este negocio é realmente difficil; e mesmo não terei duvida em adoptar a emenda do sr. Santos Monteiro, mas peço que ella vá á commissão, a fim de ser por ella estudado e resolvido com audiencia do governo. A commissão sabe muito bem que este negocio de pautas é um dos mais difficeis de resolver; e como vê que ha muita difficuldade em se fixar o tempo, por isso concederia antes uma auctorisação ao governo, ouvido o conselho das obras publicas e a commissão das pautas.

Eu deploro que a reforma da pauta fosse feita integralmente e que fosse feita dictatoriamente; ainda quando essa reforma fosse a mais justa que podesse ser, o facto de ter sido feita integral e dictatoriamente já havia de produzir inconvenientes. O governo inglez desde 1825, que começou em larga escala a reforma da sua tarifa, mas tem marchado sempre de vagar; o governo inglez estuda 4, 6 e 8 artigos, estuda-os muito bem, e a reforma sempre muito bem estudada debaixo das relações economicas e fiscaes, tem sido verificada, sem grandes reclamações tanto da parte do commercio, como da industria. A reforma da nossa pauta, feita de repente em tão larga escala, tem lido glandes inconvenientes, mas se agora formos reformar a pauta com a mesma rapidez, teremos novos inconvenientes.

Ora eu não tenho difficuldade nenhuma em que seja protegida toda e qualquer especulação que foi feita em boa fé, mas acho difficuldade em se consignar um prazo, e eu pelo menos não posso tomar sobre mim a responsabilidade de o fixar, e antes concederia uma auctorisação ao governo para elle conceder esta isenção, quando visse que o carregador procedeu de boa fé, e que a especulação foi feita antes desta lei, e não depois della ou em consequencia della. Por consequencia não tenho duvida em admittir a emenda do sr. Santos Monteiro, porque nella não se marca prazo nenhum, e a minha opinião é que o projecto volte á commissão com as emendas, para que ella lhe dê uma redacção conveniente. Pela minha parte não quero sobre mim nem sobre a commissão a responsabilidade de qualquer especulação, que se faça de má fé. Eu quero que se faça todo o favor ao especulador de boa fé, mas não áquelles que quizessem especular com o projecto, e por isso e que eu prefiro antes auctorisar o governo para que elle applique a pauta velha ou a pauta nova conforme vir que a especulação foi ou não feita de boa fé. Portanto, repito, a minha opinião é que o projecto volte a commissão para lhe dar uma redacção conveniente; (Apoiados) e se a camara julgar que deve haver alguma equidade a respeito do especulador de boa fé, pela minha parte não me opponho.

O sr. Presidente — Este projecto tinha entrado nu discussão por não se achar presente o sr. ministro da fazenda; se elle cá estivesse hontem, ter-se-hia entrado em discussão do projecto n.º 108: agora que s. ex.ª está presente, deveria passar-se á discussão deste projecto; mas vejo a camara inclinada a convir em que o projecto n.º 93 volte á commissão, e nesse caso, senão houvesse impugnação, consulta-la-hia a este respeito e concluia-se assim a discussão. (Apoiados — Vozes — é melhor)

Decidiu-se que o projecto com as propostas a e/te offerecidas voltasse á commissão.

O sr. Cazal Ribeiro: — Mando para a mesa o parecer da commissão das obras publicas sobre as propostas que hontem foram enviadas á commissão ácerca do projecto das estradas do Minho. (Leu)

O sr. Presidente: — Como o projecto está pendente esperando a resolução destas propostas, talvez a camara queira desde já discutir o parecer. (Apoiados geraes) Então está em discussão o parecer.

É o seguinte:

Pareceu: — Foram presentes á commissão das obras publicas duas propostas do sr. deputado Macedo Pinto, offerecidas na discussão do projecto de lei n.º 107: a primeira, para que em todo ocaso seja garantido á companhia o minimo de amortisação annual de 2 por cento; e a segunda para que no artigo lá. se addicione um paragrafo, determinando que o estado, como accionista, se fallar ao pagamento das suas prestações, ficará sujeito a quaesquer disposições, que hajam de estabelecer-se para os outros accionistas nas mesmas circumstancias.

A commissão, acceitando o pensamento da primeira proposta, pelo desejo que a anima de ver levado a effeito um melhoramento tão importante, propõe que no § 1.º do artigo 18.º, em vez das palavras — e sómente até á quantia que poder ser paga por esse producto — se diga — e quando esse producto não chegar, por outro qualquer rendimento.

Quanto á segunda proposta, parece á commissão que não sendo por agora conhecidas as disposições a que se refere; e tendo essas disposições de ser consignadas nos estatutos, cuja organisação pertence á companhia, e cuja approvação é da competencia do governo, não póde a dicta proposta ser convertida em artigo de lei.

Tambem foram presentes á commissão uma proposta do sr. Placido de Abreu, e outros srs. deputados; e outra do sr. J. J. da Silva Pereira, ambas tendentes a addicionar algumas estradas as quaes constam do mappa junto ao projecto. A commissão achou que, acceitas estas propostas, são attendiveis o de manifesta utilidade; desejando, porém, combinar as necessidades da viação na provincia do Minho, com a economia indispensavel nas nossas circumstancias, vista a escassez da dotação das estradas do reino; propõe:

1.º Que seja approvada a estrada de Ponte de Lima a Valença.

2.º Que, em vez da estrada de Arcos de Val de Vez a Valença, seja approvada a dos Arcos a Monção.

3.º Que a estrada, que deve unir Valença a Monção e Melgaço, não seja comprehendida rio mappa.

Sala da commissão, 3 de agosto de 1853. = A. Cezar de Vasconcellos = Antonio Ladislao da Costa Camarate — H. G. da Palma — J. M. do Cazal Ribeiro — A. J. D. de Vasconcellos e Sá = P. A. da Cunha e Abreu — José Estevão.

O sr. Corrêa Caldeira: — Sr. presidente, intendo dever significar á commissão das obras publicas, a. satisfação com que vejo attendida por ella, a proposta

Página 46

— 46 —

que foi apresentada na camara, e que eu assignei, para se corrigir, e rectificar o plano da direcção das estradas do Minho, que a commissão tinha primitivamente approvado. É de toda a conveniencia publica, que a estrada de Braga ao alio Minho, em logar de se dirigir dos Arcos a Valença, como primitivamente a commissão propunha, se dirija pelos Arcos e Braga a Monção, e do mesmo modo que a estrada de Braga a Ponte do Lima, se prolongue em continuação a Valença. Estas duas estradas cortam o coração da provincia do Minho, a sua parte mais productiva, o a segunda é uma estrada militar importante; e vendo, com muito gosto, que as razões ponderosas em que se fundava a proposta, foram attendidas pela commissão, não quero deixar passar esta occasião, sem dar a mesma commissão um voto do meu agradecimento; agradecimento que exprimo não só como representante da nação, mas tambem em nome da minha provincia; porque com quanto não seja nesta legislatura deputado por ella eleito, sou sempre seu filho, e tenho muita honra em confessa-lo, e como tal, o maior empenho em vêr prosperar aquelle solo excepcional; porque, posto que quasi todo o territorio continental portuguez se possa considerar muito productivo e muito abençoado pela providencia, nenhum ha, todavia, que proporcionalmente exceda a provincia do Minho em fertilidade e producção agricola e industrial, em povoação e actividade de trabalho.

Desejo, por tanto ardentemente, que as condições tão, favoraveis que a provincia do Minho recebeu da providencia, sejam auxiliadas pela protecção do governo, proporcionando-se-lhe, ao menos, estradas que auxiliem a facil exportação dos seus productos, e que por este modo darão um impulso poderosissimo á industria já muito consideravel daquella tão linda, tão fertil, e ião laboriosa provincia.

A proposta a que alludo, concorrerá efficazmente para este resultado, e eu, manifestando II illustre commissão o meu reconhecimento pela boa vontade com que a abraçou, dou assim um testimunho mais de que sou justo no modo de avaliar o seu procedimento.

O sr. Palmeirim: — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte proposta tambem assignada pelo sr. Pessanha.

Proposta.: — Propomos que o governo seja auctorisado a fazer partir de Braga, na direcção das Alturas, a estrada que deve ligar a provincia do Minho com a de Traz os Montes, se estudos ulteriores mostrarem preferivel a directriz da estrada por aquelle ponto. — Palmeirim = J. P. de Almeida Pessanha. Fui admittida; e ficou tambem em discussão. O sr. Placido de Abreu; — Agradeço ao sr. Corrêa Caldeira a maneira como tractou a commissão de obras publicas. A commissão consignou no projecto a primittiva direcção da estrada de Braga a Valença, por não fazer alteração alguma no mappa apresentado pelo governo; mas depois, quando se apresentou esta idéa, e se viu que a companhia combina tambem em fazer mais essas 5 legoas de estrada, a commissão adoptou com muito prazer essa mesma idéa, consignou-se no seu parecer, e deste modo fica a provincia do Minho cortada com duas estradas, cuja importancia a commissão não deixou de reconhecer desde logo; mas é necessario que a companhia e o governo concordassem, e foi esse o motivo porque a commissão não adoptou primitivamente essa idéa.

Agora em quanto á apresentada pelo sr. Palmeirim, a commissão não tem duvida em que se addite ao mappa, se o governo o julgar conveniente, por estudos que faça, que o ponto de pallida da estrada que deve ligar a provincia do Minho com a de Traz-os-Montes, seja antes por Braga, do que por Guimarães; se o governo o puder fazer, a commissão não tem duvida alguma nisso.

Acabada a inscripção, fui o parecer posto, por partes, á votação, e foi approvado, assim como a proposta apresentada pelo sr. Palmeirim, que foi considerada como additamento.

Foi lida na mesa a ultima redacção elo projecto n.º 77, que foi approvada sem reclamação.

O sr. Presidente: — Passamos á discussão do projecto n.º 108, que para esse fim se vai lêr.

É o seguinte

Projecto de lei (n.º 108). — Senhores: Foi enviada á commissão de fazenda a proposta do governo, em que pede ser auctorisado, para celebrar com o banco de Portugal um accôrdo, pelo qual se resolvam todas, ou algumas das questões, que se tem suscitado entre o governo e aquelle estabelecimento.

Convencida a commissão da importancia e urgencia do objecto, o de que é indispensavel a sua resolução dentro dos poucos dias, que restam da actual reunião da camara, apressa-se em apresentar o seu parecer a este respeito.

A commissão não podia deixar de reconhecer quanto imporia ao bem do paiz em geral, e particularmente dos muitos individuos e corporações, que lêem interesse no banco de Portugal, que cesse o actual estado de cousas, e se possa chegar a um accôrdo rasoavel entre o governo e aquelle estabelecimento; sem que por modo algum sejam desviados os rendimentos do extincto fundo especial de amortisação da proficua e utilissima applicação que lhes foi dada pelo decreto de 30 de agosto de 1852, já approvado pelas côrtes, e convertido em lei do estudo, nem Ião pouco se prejudiquem os legitimos direitos e interesses da fazenda publica.

A base principal do projectado accôrdo, é a troca das obrigações do thesouro por inscripções de 3 por cento ao par; e a differença do juro das obrigações para o das inscripções, é tambem o limite da auctorisação pedida, no que diz respeito a novos encargos para o thesouro.

Os juros daquellas obrigações foram votados no orçamento para o anno de 1853 a 1854 na importancia de reis 136:300$000; se estas obrigações foram trocadas ao par por inscripções de 3 por cento, será o juro correspondente 204:450$000 réis, e por consequencia o augmento de encargo 68:150$000 réis.

Deve, porém, observar-se que este augmento de encargo não é permanente, por isso que o decreto de 30 de agosto de 1852 ordenou que os obrigações venceriam o juro de 2 por cento nos 2 annos economicos de 1852 a 1853, e 1853 a 1851, devendo o juro ser augmentado com mais um quarto por cento em cada um dos annos seguintes, até perfazer a taxa definitiva e permanente de 3 por cento. Por esta disposição já no orçamento do anno immediato o juro das obrigações deveria subir acima da cifra do actual; viria, por tanto, a ser o encargo das obrigações do thesouro.

Página 47

— 47 —

[VER DIARIO ORIGINAL]

E desde o 1.º de julho de 1857 em diante, não haverá differença alguma de encargo. Tambem por esta inversão cessa o direito á amortisação eventual que o artigo 8.º do decreto de 30 de agosto de 1852, concedeu aos credores sobre o extincto fundo de amortisação.

Pelo que respeita ao decreto de 9 de outubro de 1852, as suas disposições são de sua natureza transitorias, este decreto só teve por fim fazer executar as disposições do decreto de 30 de agosto, na parte em que o banco as pretendia annullar pela sua resistencia. Cumprindo o banco, pela sua parte, como é obrigado a cumprir, este ultimo decreto, não ha razão alguma para que continue em vigor o de 9 de outubro. A auctorisação para sua revogação, nos termos em que é pedida, significa por parte do governo a manutenção das leis em vigor, e por parte do banco, a sua submissão a essas leis, cuja autoridade é incontestavel.

A commissão confia que o governo usará prudentemente desta auctorisação, estipulará condições vantajosas para o estado e para o publico, fazendo que o banco satisfaça mais cabalmente a sua missão, e se habilite para promover, na maior escala possivel, a mobilisação dos capitaes, como cumpre a um estabelecimento desta ordem, alargando as suas operações de desconto, influindo efficazmente na taxa do juro, e finalmente auxiliando, por todos os meios compativeis com a indole da sua instituição, as industrias, o commercio, o todas as emprezas reconhecidamente uteis e indispensaveis para a prosperidade da nação; e por todos estes motivos é de parecer que a proposta do governo seja convertida no seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º É o governo auctorisado a derogar o decreto de 9 de outubro de 1852, que manda entrar no 1 besouro a prestação correspondente aos juros e amortisação do emprestimo dos 4:000 contos, e contem outras disposições relativas, logo que a direcção do banco de Portugal tenha cumprido, em todas as suas partes, o decreto de 30 agosto do mesmo anno. Em lai caso, a companhia do tabaco só entregará mensalmente, no ministerio da fazenda, a parte correspondente á reducção de 40 por cento, que o decreto de 18 de dezembro de 1852 manda fazer nos juros do dicto emprestimo.

Art. 2.º E tambem auctorisado o governo a celebrar um accôrdo com o banco de Portugal, pelo qual se resolvam todas, ou algumas das questões que se têem suscitado entre o mesmo estabelecimento.

Art. 3.º O governo poderá conceder aos credores do fundo especial de amortisação a troca das obrigações do thesouro, a que têem direito, nos termos do decreto de 30 de agosto de 1852, por inscripções de 3 por cento ao par.

Art. 4.º Quaesquer que sejam as estipulações em que se concordar, não poderá o encargo, que dahi provier para o thesouro, exceder a importancia da differença de juro, de que tracta o artigo antecedente.

Art. 5.º No accôrdo a que se refere o artigo 2.º da presente lei, poderão estipular-se algumas alterações na carta organica do banco de Portugal, e designadamente as que forem necessarias para alargar as suas operações de credito, e poder auxiliar as emprezas de utilidade geral.

Art. 6.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, aos 27 de julho de 1853. — (Assigno com a declaração de me ficar salva a minha opinião já formada, a que vier a adquirir, e a ler de pronunciar na qualidade de membro da commissão de inquerito) João Damazio Roussado Gorjão, presidente interino = Francisco Joaquim Maia — Visconde da Junqueira = José Maria do Cazal Ribeiro = Justino Antonio de Freitas = Augusto Xavier Palmeirim — Antonio dos Santos Monteiro.

O sr. Santos Monteiro; — Requeiro que se dispense a discussão na generalidade, entrando = desde já na especialidade.

Assim se resolveu.

Entrou em discussão o artigo 1.º

O sr. Avila (Sobre a ordem). — Desejo suscitar algumas explicações da illustre commissão, ou do governo, porque de certo a camara não esperará que eu combata um projecto, que tende a estabelecer um accordo do governo com o banco de Portugal, quando, desde o principio desta sessão, eu tenho acconselhado o governo, a que empregue todos os meio para levantar os obstaculos, que se tem opposto a qualquer accôrdo com aquelle estabelecimento. Por consequencia a camara fazer-me-ha a justiça de acreditar no desejo que tenho, de que a situação anormal em que existe o banco, cesse; porque, da sua continuação não podem resultar senão os graves inconvenientes que toda a camara reconhece.

Mas é por isso mesmo, e no interesse de que se chegue a esse accôrdo, que desejo que o governo, ou a illustre commissão, diga se effectivamente ha esperança de que, votadas as bazes, que se contem neste projecto, essas bases sejam acceitas pelo banco, e sobre ellas se possa verificar um accôrdo entre o governo, e aquelle estabelecimento. Ou, mais claro, como o sr. ministro da fazenda, no relatorio que precede este projecto, declara que (em havido uma conferencia entre a direcção do banco de Portugal, e o governo, tendente a melhorar a situação daquelle estabelecimento, eu desejo saber, se a direcção do banco de Portugal, nesta conformidade, se mostrou auctorisada pela assembléa geral, para poder acceitar. em nome della, qualquer accôrdo a que o governo venha com a mesma direcção, e se nessa mesma conformidade a direcção annuiu ás bazes, que o governo veiu propôr á camara.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, respondendo precisamente ás observações do illustre deputado, e meu amigo, o sr. Avila, direi á camara, que o governo não póde ler certeza absoluta de que passado este projecto de lei, e convertido em lei do estado, possa resolver pois maneira que reputa vantajosa ao mesmo estado, as

Página 48

— 48 —

questões pendentes entre o governo, e o banco de Portugal; mas com quanto o governo não tenha essa certeza absoluta, o governo tem toda a probabilidade, de que passando esta auctorisação, ha de poder resolver de uma maneira vantajosa ás pendencias que tem existido entre o mesmo governo e o banco de Portugal.

Effectivamente houve, como disse o illustre deputado, e como se lê do relatorio deste projecto, uma conferencia entre o governo e a direcção do banco de Portugal. Dessa conferencia inferiu o governo, que, vi-lo a boa disposição em que se achava a direcção do banco de Portugal para vir a um accôrdo com o governo; visto a boa disposição que o governo pela sua parte sabe que tem para resolver de uma maneira honrosa, mas conveniente para o estado, e sem prejuiso dos interesses legitimos daquelle estabelecimento, estas questões, que são sempre prejudiciaes a todos, visto isso, sr. presidente, intende o governo, que munido com esta auctorisação pelos corpos legislativos, fica habilitado a poder tractar da maneira conveniente com o banco de Portugal, e a resolver com vantagem para o thesouro, e sem prejuiso, como disse, dos legitimos interesses daquelle estabelecimento, aquellas questões que ainda existem pendentes entre o estado e o mesmo banco de Portugal. E esta a explicação que posso dar ao illustre deputado.

A assemblea geral extraordinaria do banco do Portugal auctorisou a direcção restrictamente, comtudo póde a camara estar certa, que não ha de ser o governo que ha de sujeitar por modo algum ás suas opiniões a decisão (ia assembléa extraordinaria do banco de Portugal. A direcção do banco de Portugal ha de habilitar se primeiramente com auctorisação legal daquella corporação, e quando estiver assim auctorisada legalmente, o governo e o banco hão de vir a um accôrdo de uma maneira decorosa para o governo, e que não seja lesiva aos interesses legitimos daquelle estabelecimento.

E pois nestes termos que apresentei a proposta á camara, e é nestes termos que peço seja approvada.

O sr. Avila: — Não quero demorar por fórma nenhuma a discussão deste projecto; mas desejo ao mesmo tempo constatar bem as minhas opiniões, para que a camara veja que sou coherente na minha maneira de pensar a este respeito. Já manifestei bem claramente a minha opinião em relação ao decreto de 30 de agosto de 1852, pelo qual o governo applicou o fundo especial de amortisação a um objecto de utilidade publica; mas que não me parece que essa circumstancia posa auctorisar o governo a desviar esse fundo da applicação que tinha, sem o accordo de todos os interessados. A camara tambem já sabe qual é a minha opinião relativamente ao emprestimo dos 4:000 contos, de cujas prestações o governo se assenhoreou reduzindo a 3 por cento o juro de 5 por cento, com que foi contractado o mesmo emprestimo. A camara não ignora igualmente a minha opinião relativamente á reducção a 3 por cento dos juros de 5 por cento, a que foram contractados os emprestimos de 1835 Se o sr. ministro da fazenda, em logar do projecto que apresentou, viesse propôr a entrega ao banco das prestações do emprestimo dos 4:100 contos, e o pagamento dos seus juros a 5 por cento, e igualmente o pagamento dos juros de 1845 a 5 por cento, bem como a troca por inscrições de 3 por cento das obrigações do thesouro, com que se pagou o fundo de amortização, não duvidaria votar por todas essas medidas, com cuja approvação ficavam desvanecidas todas as questões que se tem levantado entre o banco e o governo.

Não me parece que este resultado se posa obter pelo projecto apresentado pelo governo, porque este começa por estabelecer a reducção do juro do emprestimo dos 4:000 contos de 5 a 3 por cento, reducção que me parece impossivel que o banco acceite. O banco tem convocado repetidas vezes todos Os -cus accionistas, e as resoluções destas assembleas têem sido publicadas pois imprensa. E sahido que a assembléa geral do banco não admitte a menor modificação nas condições do emprestimo dos 4:000 contos, nem auctorisou para isso, nem para nenhum accordo, a sua direcção, antes pelo contrario declarou muito expressamente que qualquer projecto de conciliação que se offerecer, seja submettido a approvação da assembléa extraordinaria, composta de todos os seus accionistas.

Nestas circumstancias me parece que o governo teria procedido com mais regularidade, se tivesse exigido da direcção, que obtivesse auctorisação previu para vir a algum accordo com o governo, sollicitando este, depois disto, do corpo legislativo, as providencias necessarias para legalisar o mesmo acôrdo.

Sr. presidente, em relação ao emprestimo dos 4:000 contos, direi ainda que esse emprestimo foi contrahido com grande vantagem para o thesouro, e não ha razão nenhuma para justificar a falta por parte do governo, de uma das estipulações do mesmo contracto. Diz-se que tem havido grandes vantagens para os prestamistas, pelo praso que se lhes concedeu para a entrega das prestações; mas em primeiro logar, direi que essas vantagens se concedem em toda a parte nos emprestimos que se contractam; e em segundo logar, se se fizer bem a conta, achar-se-ha que o emprestimo, em logar do 5 por cento, teria saido a 5/5 por cento, o que ninguem dirá, nas circumstancias em que se contrahiu o mesmo emprestimo, não foi de grande vantagem para o thesouro. Alem disto, n'uma conta que aqui foi feita no anno passado a respeito desse emprestimo, houve um equivoco a que deu causa um documento vindo do thesouro. Nesse documento se encontrou n'um certo dia a entrada de uma somma consideravel excedente a 1:300 coutos, e sobre esse facto se baseou a mesma conta, em que se pretendiam demonstrar grandes beneficios a favor dos prestamistas, quando a verdade é que aquella entrada linha sido effectuada com lettras que tinham vencimentos muitos dias antes, o que deminuíu consideravelmente as mesmas vantagens.

A camara foi mal informada no anno passado a este respeito; mas a culpa não póde recaír sobre os capitalistas. O nobre deputado sabe que eu não tenho nada com o emprestimo dos 4:000 contos, nem foi feito com voto meu, nem sustentado nessa occasião, mas a minha obrigação é dizer a verdade. O emprestimo dos 4:000 contos foi estrictamente ao juro do 5 por cento; o governo comprometteu — se a pagar o juro de 5 por cento, e estabeleceu uma amortisação durante 23 annos. Por consequencia se o sr. ministro da fazenda tivesse vindo impôr á camara uma auctorisação para elevar a taxa do juro de 3 a 5 por cento, eu havia devotar essa auctorisação, por

Página 49

— 49 —

que intendo que essa reducção foi uma medida violenta, e não pouco contraria ao interesse publico; e o mesmo haveria de fazer relativamente á reducção dos juros dos emprestimos de 1835. Feito isto não conheço outra questão que esteja pendente entre o governo e o banco de Portugal, e feito isto não vejo que seja necessario o voto de confiança, que se pede neste projecto.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello) — Sr. presidente, se eu não tivesse a consciencia (sem modestia) de que era capaz, tanto eu como os meus collegas, por parte do governo de manter em toda a dignidade e pureza as attribuições e prerogativas proprias dos poderes do estado, de certo não vinha pedir á camara a auctorisação que peço neste projecto, para regular e decidir algumas das questões pendentes entre o governo e o banco de Portugal. E porque temos esta consciencia, é porque julgamos que temos dado disso provas exuberantes, que nos resolvemos a vir pedir á camara a auctorisação contida nos artigos do projecto, e pelo qual ficamos habilitados a resolver de uma maneira conveniente para o estado as questões pendentes que existem entre o banco e o governo.

Eu não sei officialmente o que se passou na assembléa extraordinaria do banco de Portugal. Eu não conheço o banco de Portugal, como governo, senão pela sua direcção; essa é que representa para o governo as opiniões do estabelecimento, e estou certo que ella procede dentro dos limites das suas attribuições, que lhe estão marcadas nos seus estatutos e regulamentos do banco de Portugal. O governo não o instou de maneira nenhuma a que viesse a nenhum accôrdo; o governo recebeu uma representação do banco de Portugal em que se lhe dizia que, em virtude de uma resolução da assembléa extraordinaria, estava auctorisado a pedir algumas modificações em pontos de lei, e que desejava submetter as suas representações ao governo, para elle as tomar na consideração que merecesse; o governo que deseja ser justo e imparcial, não só neste como em todos os objectos que possam ser commettidos ao seu cuidado, não pôde negar uma audiencia que se lhe pedia, para negocio de interesse geral, e o governo ouviu a direcção do banco de Portugal nessa occasião. E agora posso eu dizer alguma cousa, e mostrar pelos factos os desejos sinceros que temos lido sempre de que não exista esta desintelligencia, que eu reputei sempre prejudicial aos interesses publicos. (Apoiados) O governo até aqui tem procedido, ou bem ou mal, mas felizmente o parlamento reputou que tinha procedido bem, e que tinha procedido bem na intenção de attender a esses mesmos interesses; o governo desejava que não tivessem existido similhantes desintelligencias, mas depois de lerem existido, o governo não se havia de negar por todos os modos decentes e decorosos, e que não envergonhassem todos os que os empregassem, a dar todo o auxilio e toda a protecção que, na qualidade de poder do estado, e obrigado a dar a um estabelecimento publico, em quanto esse estabelecimento existe á sombra das leis do paiz. O governo intendeu-se, pois, nesta occasião com o banco de Portugal, e da conferencia que teve logar, infiro eu, que a direcção do mesmo banco, e a assemblea que ella representa, tinha desejos de terminar por uma vez este estado de cousas.

A direcção do banco, comtudo, não está auctorisada completamente, como eu já disse, e como a propria direcção o confessou, para resolver todas as questões que se propuzessem; e se o parlamento não estivesse proximo a encerrar-se, eu não vinha pedir este voto de confiança, de que se falla no projecto, e tractaria de resolver do modo melhor, e que me parecesse mais conveniente, as questões que existem entre o banco e o governo, e depois deter feito o meu juizo, e ter concordado com os meus collegas, havia de vir propôr á camara as modificações que julgasse convenientes, a fim de resolver esta questão. Mas como o parlamento está proximo a encerrar-se, e me parece que não é conveniente demorar este estado de cousas de que não provém vantagem nenhuma para a causa publica, eis-aqui a rasão porque o governo vem sollicitar esta auctorisação, a fim de poder neste intervallo, sem esperar pela resolução das côrtes, resolver esta questão da maneira que for mais conveniente e decorosa para o governo e para o parlamento.

Se acaso se encontram algumas restricções aos artigos deste projecto, ellas foram muito de proposito collocadas pelo governo, para que se visse, que não era sua intenção vir hoje, por um voto de confiança, annullar todas as disposições, que ha pouco passaram na camara, e que hoje são leis do estado.

E por isso, que no artigo 1.º se menciona expressamente, que — a companhia do tabaco se entregara mensalmente no ministerio do fazenda a parte correspondente á reducção de 10 por cento, que o decreto de 18 de dezembro de 1852, manda fazer aos juros do dito emprestimo.

Isto quer dizer, que o governo não faz accôrdo algum com o banco, de modo que tenda a revogar o decreto de 18 de dezembro, nesta parte.

O illustre deputado tem uma opinião contraria áquillo que, sobre este ponto, a camara resolveu, e por conseguinte está no seu terreno, mantendo essa opinião; mas eu, que estou de accôrdo com a maioria da camara, e com a resolução que ella tomou, parece-me que dou uma garantia, fazendo com que esta determinação legal não seja alterada.

Em quanto ao emprestimo de 1835, o governo não ha-de adoptar resolução alguma, que possa prejudicar qualquer decisão que a camara venha a tomar, em virtude das informações que possam ser ministradas pela commissão de inquerito, que a camara nomeou para o banco; por parte do governo comprometto-me a isso; não hei-de comprometter a resolução que a camara tem direito a tomar sobre um objecto tão importante.

Em quanto ao encargo que póde provir para o thesouro, está restricto no artigo 4.º do projecto quero dizer, o governo não reputa possivel, por sua dignidade propria, vir a um accôrdo, pelo qual se annullem as disposições do decreto de 18 de Dezembro. O encargo de que se falla, não póde ser outro senão a troca de obrigações do thesouro por inscripções de 3 por cento, e o illustre deputado ha-de estar bem certo, que eu declarei, durante a discussão dos actos da dictadura, que se a direcção se tivesse limitado a pedir inscripções de 3 por cento, em logar de obrigações do thesouro, o governo estava na intenção de lho fazer.

Portanto, já se vê que não ha alteração nenhuma das minhas opiniões antigas, e que o Governo se acha ainda no mesmo terreno em que estava. Mas o governo, que quer um documento de que não tem empenho nenhum em protellar por mais tempo esta des-

Página 50

— 50 —

Intelligencia, ha-de concorrer pela sua parte para dentro dos limites que lhe são marcados, e de accôrdo com os principios de decoro, resolver, de uma maneira conveniente para todos, esta questão

O governo não póde, nem ha-de ir sujeitar as suas resoluções á assemblea extraordinaria do banco; a direcção do banco ha-de de certo ser auctorisada pela assembléa extraordinaria, para tractar com o governo sobre este ponto; e se a assembléa lhe negar essa auctorisação, o que se segue, é que se não póde tractar de cousa nenhuma.

Se porém a assembléa extraordinaria pensar que é de utilidade publica vir a um accôrdo, como eu julgo; se o intender assim, estou persuadido que este negocio ha-de terminar de uma maneira vantajosa para o banco, e de uma maneira decorosa para o governo

As opiniões modificam-se, e uma certa opinião publica, modifica-se tambem. Em quanto o banco de Portugal, ou alguns accionistas, ou uma parte dos interessados neste estabelecimento, julgaram que, com uma opposição mais ou menos forte, mais ou menos violenta, mais ou menos legal, podiam conseguir o que desejavam (e não quero resuscitar nenhuma destas questões); mas em quanto julgaram que tinham bom ou máo direito, para fazer opposição ao governo sobre este ponto, convencidos de que daqui tirariam algum proveito; depois que os decretos da dictadura foram convertidos em leis do estado, não é nada para admirar que aquelle estabelecimento procure tirar todo o partido possivel da situação em que ficou, por um accôrdo com o governo: em tudo isto não ha nada que seja indecoroso para o banco, nem que se não possa explicar pelos sentimentos do coração humano.

De mais disso, o publico monetario tem visto e sentido que, desde o momento em que se tracta de um accôrdo entre o banco e o governo, os fundos sobem. Pois então se a assembléa extraordinaria vê isto, é impossivel que ella negue á sua direcção a auctoridade necessaria, para contratar com o governo sobre termos, que não sejam desvantajos e indignos para ella, porque o governo para manter o seu decoro, não precisa, nem quer faze-lo á custa de ninguem.

Parece-me que a opinião da assembléa extraordinaria se modifica todos os dias; e estou persuadido, que a direcção do banco se ha-de habilitar convenientemente para tractar de vir a um accôrdo com o governo, a fim de se acabarem as desintelligencias que até agora têem tido logar, e de que não tem vindo bem nenhum á causa publica. (Apoiados)

E pois nestes termos, e por isso mesmo que a questão se acha bastante adiantada, que não podia trazer ao seio do parlamento todas as estipulações que por ventura possam estabelecer-se entre o governo e o banco, e por isso pedi auctorisação para tractar com o banco nos termos restrictos do projecto. (Fozes. — Muito bem)

O sr. José Estevão — Não quero prolongar nem acalorar o debate, por isso limito-me simplesmente a dizer ao illustre deputado o sr. Avila, que considero o emprestimo dos 4:000 contos debaixo de outro ponto de vista do que o illustre deputado o considera; parece-me que a maior parte das considerações que s. ex.ª lhe applicou, são completamente destituidas de fundamento.

O sr. Avila — Não respondo agora ao nobre deputado o sr. José Estevão, porque parece-me que isto me levaria para um campo alheio ao debate de que actualmente nos occupamos, agora pouco importa saber, se o sr. José Estevão teve razão, ou se sou eu que tenho razão, ácerca do emprestimo dos 4:000 contos. Acha-se nomeada uma commissão de inquerito ao banco, e quando ella apresentar o seu relatorio, então examinaremos mais circumstanciadamente esta questão.

Eu tenho constam emente fallado sobre a necessidade de se por termo ás desintelligencias que tem havido entre o banco e o governo, e tenho mostrado o proveito que vira se se der um accôrdo entre as duas partes. Declaro que não quero tambem, nem arredar nem protellar o debate, sympathiso com todo o projecto, que tenda a restabelecer relações de amizade e boa paz entre o governo e o banco; até seria incoherente comigo mesmo, se contrariasse, nesta occasião, os desejos manifestados pelo governo; pe o contrario, hei de dar-lhe todas as auctorisações que intender necessarias, para se chegar e conseguir este resultado. Ainda que a minha situação, e a situação do nobre ministro da fazenda, sejam bem definidas, o meu primeiro interesse, e a primeira necessidade de nós todos, é que os poderes publicos não sejam desacatados, e com muita mais razão aquelles de que fazemos parte.

Parece-me que se por ventura, o nobre ministro da fazenda ou o governo fôr tractar com a direcção do banco, e esta lhe disser — que está auctorisada para tractar com o governo, mas com a condição de não poder resolver nada, -em que a sua assemblea geral dê inteiro assentimento ao que entre o governo e a direcção se concordar — parece-me digo, que o sr. ministro não póde, nem deve querer que a sua ultima palavra esteja sujeita ao beneplacito da assembléa geral do banco, entretanto, o sobre ministro já declarou que não ha de tractar com a direcção cousa alguma definitivamente, sem que esta se ache para isso auctorisada pela assembléa extraordinaria de todos os accionistas. Acredito que, s. ex.ª a cumprira esta sua promessa, e neste caso, será talvez escusado accrescentar mais alguma cousa a este respeito, porque o melindre que eu achava neste negocio, acabou.

Tenho para mim, que seria muito melhor e muito mais conveniente, que a assembléa extraordinaria do banco tivesse dado auctorisação completa á sua direcção para poder tractar com o governo; e permitta-me a camara que, por esta occasião lhe lembre, que, com a mesma franqueza com que eu censurei o procedimento do governo com relação ao banco, censurei tambem o procedimento do banco. A camara sabe que eu me pronunciei sempre contra as assembléas monstros. (Apoiados)

Ora se eu fosse accionista, o meu voto havia de ser, ou para que se désse á direcção um voto de confiança, e para que ella fosse investida das mais largas attribuições, ou então, se a assembléa dos accionistas não estivesse contente com a gerencia da direcção, nomear outra que merecesse a confiança da assembléa, mas nunca dizer á direcção — vá tractar com o governo, não conclua nada, e venha trazer ao nosso beneplacito aquillo em que se quizer concordar — mas torno a dizer, uma vez que o nobre ministro está na firme intenção de não tractar nada definitivamente senão quando a direcção do banco estiver legalmente auctorisada para isso, o meu escrupulo caiu.

Eu sei avaliar bem motivo porque se estabelece-

Página 51

— 51 —

ram no projecto certas restricções, que é um motivo de delicadeza para com a camara que votou estas medidas; mas parece-me. que estas restricções tornam inuteis os desejos de s. ex.ª para tractar.com o banco, porque me parece impossivel, que o banco as acceite depois do que alli se tem passado, e que é hoje do dominio do publico. — Estou bem longe de querer inutilisar esse accôrdo, mas não posso deixar de dizer que não sympathiso com taes limites, porque receio que o accôrdo com taes limites ou restricções, senão faça.

Quanto ao mais, eu acabo applaudindo-me com o governo pela situação mais favoravel que s. ex.ª vê.

O illustre ministro tambem apresentou uma consideração a que eu dou muito pêso. Disse s. ex.ª — tracta-se de conciliação entre o governo e o banco, sobem os fundos — isto é natural, e oxalá que este facto sirva de lição para no futuro se evitar a repetição de medidas que possam comprometter o credito publico. Desejo que as difficuldades que ainda antevejo, caiam, para que este accôrdo seja real, e sentirei muito se na sessão seguinte o sr. ministro nos vier dizer que este accôrdo senão póde fazer.

Espero que tanto o illustre ministro como a camara me hão de fazer a justiça de acreditar, que, não tenho empenho em contrariar o accôrdo a que o governo espera vir com o banco; antes pelo contrario, faço votos para que elle se realise o mais depressa possivel. (Vozes: — Muito bem)

O sr. Roussado Gorjão: — Sr. presidente, ha uma rasão de melindre da minha parte a que v. ex.ª e a camara não póde deixar de fazer justiça. Eu tinha-me imposto o dever de não entrar n'esta discussão pela circumstancia especialissima de pertencer á commissão de inquerito ao banco. Coherente com esta situação melindrosa, prometto a v. ex. e á camara que não me hei-de servir de uma unica idéa que se possa dizer, ter sido adquirida na commissão de inquerito, hei-de regular-me neste assumpto pelas instrucções que tem tido qualquer homem do meu paiz que tem ido a par com os acontecimentos, e que tem visto o que o mesmo banco tem escripto e mandado a esta camara.

V. ex.ª e a camara repararão que eu assignei o projecto com a declaração de ficar salva a minha opinião já formada, a que vier a adquirir, e a que tiver de pronunciar na qualidade de membro da commissão de inquerito.

Torno outra vez a rectificar aquillo a que já me comprometti, e é — que não me servirei de uma unica palavra que possa ter adquirido como membro da commissão. Mas na representação que o banco mandou a esta camara, vejo eu a paginas 32 o seguinte — (Leu)

Já se vê que foi este o assumpto que fez com que se reunissem os dous estabelecimentos, companhia confiança nacional e banco de Lisboa; e vê-se que esta somma tomada em globo, foi o valor em que se estabeleceu o seu credito, e vê-se tambem segundo o que tenho lido no Diario do Governo, quando se apresentam as contas do banco de Portugal, que os 4:000 contos são involvidos nos 13:000 contos.

Não farei mais nenhuma observação a este respeito, e passarei a uma especialidade em que estou conforme com a opinião do illustre deputado, o meu collega e respeitavel vizinho, o sr. Avila, em quanto á dignidade e decóro que o governo deve sustentar; e tive muita satisfação em ouvir ao illustre ministro da fazenda, — que effectivamente não ha-de dar um passo sem que haja n certeza de que a direcção do banco esta auctorisada para tractar definitivamente com o governo.

Passarei agora a tractar de um assumpto em que tocou o sr. Avila e vem a ser com relação ao emprestimo dos 4.000 contos.

A respeito deste emprestimo referiu-se o illustre deputado a alguma cousa que aqui se passou n'uma das sessões da legislatura que foi dissolvida, e recorreu o meu illustre collega ao que tinha dicto um deputado daquella época, o qual se referiu a escriptos meus.

Esse illustre deputado que tractou desse assumpto, é uma pessoa a quem respeito, mas a quem não tenho a honra de conhecer, e a quem nunca fallei; visto porem, que esse illustre deputado disse que as informações que possuia, tinham sido extrahidas dos meus escriptos, e como o illustre deputado o sr. Avila ainda ha pouco se referiu ao que disse esse illustre deputado da legislatura passada, não posso deixar de dizer ao meu illustre collega o sr. Ávila, que se ha equivocação a respeito do emprestimo dos 4:000 contos, o que eu escrevi diz respeito a peças officiaes.

A commissão externa de fazenda tinha pedido se lhe désse uma conta desinvolvida da entrada das prestações realisadas pelo emprestimo dos 4:000 contos, que começa logo assim — 1815 = mez de janeiro = 1.ª verba: 1:399:938$000 rs. — 2.ª verba em 30 do dito mez: 170:517$000 rs.

O sr. Avila: — O illustre deputado dá licença que eu o interrompa?

O Orador: — Pois não!

O sr. Avila: — Eu quero só dizer ao illustre deputado, que esses calculos a que se refere, são exactos, quanto ao documento que veiu do thesouro; mas neste documento marcou-se a época em relação ao dia em que se fizeram as entregas das letras, mas não, em que se venciam as mesmas letras.

O Orador: — Mas eu não podia deixar de acreditar na exactidão deste documento; por isso que elle deve merecer toda a fé, visto que é um documento official. Por tanto, se ha inexactidão, ella não provem dos meus escriptos, mas sim da peça official a que me referi.

Feitas estas declarações, termino dizendo que, de tudo quanto disse, em nada me referi á commissão de inquerito de que faço parte; mas sim áquillo que todos sabem; e estimei muito ouvir dizer que nesta peça official houve equivocação, para que se saiba que, se houve inexactidão ou equivocação, não foi minha, mas sim de quem escreveu essa mesma peça official.

Intendi dever dar estas explicações, e voto pelo artigo, ficando salva a opinião que tiver de pronunciar na qualidade de membro da commissão de inquerito ao banco de Portugal.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Por uma coincidencia notavel, estou hoje de accordo com o sr. Avila e com o sr. José Estevão. Não combato os desejos de um accôrdo entre o banco e o governo, nem desejo tambem prolongar a acalorar o debate. Apezar, porem, destas minhas intenções benevolas, declaro a v. ex.ª e á camara, que entro nesta questão

Página 52

— 52-

afflicto e envergonhado, porque nunca na minha vida receei que o governo e o primeiro estabelecimento monetario do paiz, depois das affrontas, injurias e ultrajes reciprocos que disseram um ao outro; depois de um ministro dizer que tinha na pasta negra os documentos que provavam a agiotagem, o roubo, o escandalo, e a uzura desgrenhada; depois de todas estas considerações feitas e dietas aqui, e lá fóra, não esperava que este mesmo governo, este mesmo banco, e esta mesma camara no curto espaço de trez mezes, viesse, depois de desprezar tudo quanto se lhe havia dicto, obrigar o parlamento a cobrir-se de lama e de lôdo, e a fazel-o revogar as medidas que approvou, e que tanto mal teem feito ao Banco, a ponto do illustre ministro vir pedir a sua revogação.

Eu approvo e desejo o accôrdo entre o banco e o governo, mas não o approvo da maneira que vem exarado nas bazes apresentadas pelo sr. ministro da fazenda; e não o approvo, porque a direcção do banco não tem poder bastante para dispor a seu talante dos bens dos accionistas do banco de Portugal.

Sr. presidente, em uma das ultimas assembléas do banco de Portugal foi determinado que nenhuma transigencia e nenhum accôrdo se fizesse com o governo, do qual resultasse o mais pequeno desvio do emprestimo dos 4:000 contos. Se a direcção do banco não cumpriu as resoluções da assembléa; se os accionistas esquecem o que decidiram, ainda assim estas fallas todas juntas, não são bastantes para se condemnar uma medida, que provo com documentos, que não foi combatida, nem pelo governo, nem pela maioria da camara.

Quando se discutiram os actos da dictadura,.disse eu = O banco perde pela capitalisação determinada no decreto de 3 de dezembro de 1851 — para

cima de......................... 48:000$000

Pela reducção dos juros, determinada no decreto do 26 de julho

de 1852; para cima de......... 19:000$000

E pela reducção a 5/2 dos juros primitivos, determinada no decreto de 18 de dezembro de 1852 — para cima de................. 523:000$000

Total....... 590:000$000

Será possivel que os directores do banco que são os fiscaes dos dinheiros dos accionistas, consintam em um accôrdo, que esbulha a este estabelecimento 590 contos? Será possivel que o banco consinta neste accôrdo, quando é defraudado? Será possivel que o banco depois de accusado de tantos crimes, depois de ser victima de tantas imputações, de tantos assaques, e de tantos improperios, venha hoje pedir humildemente uma conferencia com o illustre ministro, para consentir em ser esbulhado em mais de 500 contos. Se isto é possivel, declaro que tenho a cara roxa de vergonha, e sinto o sangue esbraseado, por ler aqui pugnado a favor do banco.

Sr. presidente, eu estou coherente comigo mesmo: o governo é que não está coherente com os seus actos, por que tendo defendido nesta camara com toda a firmeza e energia, o mandado proceder com a mesma firmeza e energia na camara dos pares, em todas as questões relativas á sua supposta organisação de fazenda, e levando as maiorias das duas casas do

parlamento a approvar todos os decretos da dictadura, que continham a mais flagrante violação de contractos solemnes, em manifesto desprezo de todas as leis, que esbulhavam os cidadãos da sua propriedade e dos seus direitos, tremem agora diante da pensão do conde do Penafiel, na camara dos pares; e intendeu que não devia fazer disso questão ministerial!

Hoje já o governo reconhece os interesses legitimos do banco! Até agora o banco era a usura desgrenhada; o banco não satisfazia a nenhuma das condições de estabelecimentos daquella ordem; o banco espoliava o paiz; era um defraudador da fazenda nacional; fazia emprestimos a 17 ½ por cento; o banco tendo emprestado quantias em notas, quando essas notas estavam a 50 por 0/0 exigia depois o pagamento dessas sommas em metal sonante. Agora já não ha nada disto: já os directores do banco são chamados honrados e capazes; e tudo isto para entrar em um accôrdo com o governo, para dessa maneira dar mais importancia ao caminho de ferro. Mas se acaso me não engano; se 2 e 2 são 4; se se póde acreditar na palavra dos homens; se o que diz a imprensa, é verdade; se o que ouvi com os meus ouvidos, foi bem ouvido, parece-me que a assembléa extraordinaria do banco declarou muito expressamente, não em segredo, mas com as porias abei tas, que se tractasse com o governo, não se consentindo em deducção nenhuma do imposto dos 4:000 contos. Eu tenho a mesma opinião que os 5 ou 6:000 accionistas do banco de Portugal; e em quanto eu puder, hei-de oppôr a minha palavra e o meu voto as delapidações que se tem feito. Sei que isto não póde valer nada; mas sei que tambem póde ler algum resultado.

Sr. presidente, o que tem acontecido com uma immensidade de projectos, que passaram nesta camara e na dos pares, com tanta vehemencia defendidos pelo sr. ministro da fazenda, e que estavam comprehendidos nos actos da dictadura! Tem acontecido o serem revogados, como o da exportação do trapo, o da prata etc. etc. no entanto a camara sujeitou-se a tudo, apesar das admoestações da opposição, e qual foi o resultado? O que eu acabei de dizer; e ainda, ha muitos outros que vão ser revogados.

Disse-se, sr. presidente, como v. ex.ª ha de estar lembrado, o que se podia dizer contra o banco; mas hoje a commissão e o governo já são de outra opinião. Peço licença á camara para ter o seguinte periodo do relatorio, que precede este projecto, porque é frisante e define bem uma situação, e porque apezar de saber, que a discussão é só na especialidade, não posso deixar de fazer breves considerações geraes sobre o assumpto. V. ex.ª ha de estar lembrado do que se tem dicto contra o banco, e que o sr. ministro nos fazia fosquinhas com a pasta, era uma pasta negra com papeis negros! Mas hoje, sr. presidente, já a commissão não é dessa opinião, já imporia ao bem do paiz a conservação do banco! Então dizia-se — abaixo o rei do Pelourinho: — Agora já o banco é mil ao bem do paiz em geral!!.

Ora se eu não estivesse Ião conscio das minhas faculdades intellectuaes, eu dizia que estava no hospital de Rilhafoles (Riso).

Aqui está o que diz a commissão: II A commissão não podia deixar de reconhecer

Página 53

53

quanto importa ao bem do paiz em geral, e particularmente dos muitos individuos o corporações, «que teem interesse no banco de Portugal, que cesse a o actual estado do cousas, e se possa chegar a um estado rasoavel entre o governo e aquelle estabelecimento.?

Ora, sr. presidente, eu queria agora que o sr. ministro da fazenda tivesse a bondade de me dizer, como s. ex.ª mudou tão depressa a respeito do banco, como é que já se não falla nos emprestimos de 1835? Como é que o sr. Cazal Ribeiro já não falla naquelles celebres calculos que davam em resultado fazer o banco emprestimos ao juro de 17 por cento? Como é que de repente desappareceram todos os crimes, todas as illegalidades, todos os extravios, e todos os roubos, de que era accusado o banco? Como é que em tão pouco tempo se metamorfoseou isto? Como acabaram todas estas fúrias contra o banco, não sei; mas eu espero, para honra dos individuos que compõem a direcção do banco, que elles não se prostituirão ao ponto vil e infame, depois de lerem escripto em nome da assembléa geral, cartas de congratulação aos deputados, que tomaram aqui a sua defeza, de, por uma maneira que não quero qualificar, desdizerem-se de todos os seus enunciados, que allegaram a seu favor, e que venham por esta parte dar razão ao sr. ministro da fazenda, esquecendo-se das injurias e ultrages que vomitaram contra o banco, tanto o sr. ministro da fazenda, como os deputados que tractaram tão mal o banco. Parece incrivel, que se esqueçam de tudo isto, e que queiram contractar com um estabelecimento, que é a ruina do paiz. Póde ser que os directores queiram ser pares do reino, assim como os do contracto do tabaco; porque entre nós qualquer tractado que se faça, rende no primeiro caso ser commendador, no segundo conselheiro, no terceiro par do reino! Isto é, o que se tem passado!

Sr. presidente, este debate, na minha opinião, era um debate importante, e o governo, não sei, se com receio, fez quanto pôde para se nos dar para o fim este debate, quando a camara está cançada e vazia, não podendo tomar quasi que o folgo; e até porque lhe falla o auditorio; não ha vontade para fallar. Eu era capaz de fazer um artigo muito mais bonito contra este projecto, do que vir aqui fallar, o que nunca me acontece, porque eu escrevo mal e fallo mal.

Mas, sr. presidente, tornando á questão, eu desejo que me digam, se acaso estas injurias contra o banco, se podem perdoar, e se estes crimes se podem esquecer? Se póde haver benevolencia e clemencia para esquecer crimes desta ordem?

Sr. presidente, em conclusão digo que desejo que o governo se accorde com o banco; mas em bases justas e rasoaveis para este estabelecimento, porque foi elle prejudicado; foi elle o atacado em seus direitos, esbulhado na sua propriedade. Por consequencia accordo de que resulte mais mais prejuizo para o banco, não o posso approvar, sem saber se os accionistas querem ou não auctorisar a direcção para esse accordo; e por isso declaro que rejeito este projecto.

Não havendo quem mais tivesse a palavra, julgou-se a materia discutida, e foi approvado o artigo 1.º — Seguidamente foram approvados sem discussão os artigos 2.º e 3.º

Entrou em discussão o artigo 4.º

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu desejava que o sr. ministro da fazenda tivesse a bondade do declarar — se a troca das obrigações do thesouro, por inscripções de 3 por cento ao par, comprehende as acções com juro, e as acções sem juro?

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, a redacção do artigo 3.º do projecto responde ao illustre deputado, porque nesse artigo não se diz que, na hypothese do accordo, se poderá conceder ao banco de Portugal, mas aos credores do fundo especial de amortisação. Já se vê que nesta expressão de credores do fundo especial de amortisação se comprehendem uns e outros.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Muito bem.

O sr. Corrêa Caldeira: — Eu desejo que o sr. ministro da fazenda declare, se esta troca das acções, que pertencem ao fundo especial de amortisação, por inscripções de 3 por cento ao par, se é feita nos termos do decreto de 30 de agosto, ou se é feita nominal por nominal?

Parece-me ser de razão e de justiça, que emquanto se admitte que as acções com juro, sobre o fundo especial de amortisação, sejam trocadas, nominal por nominal, por inscripções de 3 por cento, se fizesse aos credores originarios, possuidores de acções sem juro sobre o mesmo fundo, o abatimento que resulta de lhes tomar as suas acções a 40, dando-se-lhes inscripções, que representem só esse valor de 40.

O sr. Ministro da fazenda: — Sr. presidente, tambem o artigo 3.º responde ás observações do illustre deputado; porque nelle diz-se — que a troca se fará das obrigações a que tiverem direito nos termos do decreto de 30 de agosto de 1852.

Já vê por tanto o illustre deputado, que esta troca, no caso de se verificar o accordo, ha-de ser feita em conformidade do decreto de 30 de agosto; quero dizer — hão-de dar-se Subscrições do 3 por cento ao par, por aquella somma das obrigações do thesouro a que tem direito os credores do fundo especial de amortisação, segundo o decreto de 30 de agosto.

O governo mantem a disposição do decreto de 30 de agosto; e é nos termos daquelle decreto, que eu pertendo, no caso de se verificar o accordo, trocar as inscripções pelas obrigações: esta é a disposição do decreto de 30 de agosto; não pertendo altera-lo nesta parte, senão na hypothese de se verificar o accordo.

O sr. Corrêa Caldeira: — Sr. presidente, eu não entro nesta discussão, porque as circumstancias, que a tem acompanhado, me convencem de que é absolutamente inutil entrar nella. As opiniões deste lado da camara (o direito) são sabidas. O sr. deputado Cunha fez considerações de muito peso; e com tudo a camara ouviu-as com muita placidez, e sangue frio, e não se dignou tomar nenhuma dellas em consideração, para lhe responder. Seriam por consequencia inuteis todas as considerações que se fizessem a este respeito.

Por tanto, resumindo as minhas opiniões, direi que nesta troca das acções sem juro sobre o fundo especial de amortisação pelas inscripções do valor nominal, segundo as regras do decreto de 30 de agosto, ha uma injustiça flagrante. Eu intendo que as acções sobre o fundo especial de amortisação devem ser trocadas pelo valor de 40, em relação ás que estiverem na mão de terceiro possuidor, porque é sahido que este as negociou por um valor muito inferior ao nominal; mas parece-me que os credores destas acções, que são credores originarios, que as não nego-

Página 54

54

ciaram na praça, mas que as receberam em troca de vencimentos que lhe foram capitalisados, tem direito a não soffrer mais esta espoliação.

Não havendo quem mais tivesse a palavra, julgou-se a materia discutida; e foi approvado o artigo 4.º

Entrou em discussão o artigo 5,º

O sr. Maia (Francisco): — Sr. presidente, eu vejo neste artigo uma auctorisação illimitada, que não desejo votar sem alguma declaração do sr. ministro da fazenda.

As tendencias de todos os estabelecimentos desta natureza são sempre para lerem exclusivos, e grandes privilegios; e é sabido que os exclusivos favorecem uns, e prejudicam muitos.

É igualmente sabido que pelo decreto de 19 de novembro de 1846, de que nasceu o banco de Portugal, se estabeleceu uma caria organica tão insolita e tão pouco digna de approvação, que não pôde ser approvada com as leis da dictadura de 1816, e tanto assim que, só em abril de 1851 é que passou uma lei que auctorisava essa carta organica, mas de uma maneira menos ampla que aquella que se tinha adoptado em 1846. É preciso prevenirmo-nos contra as exigencias, vistas, e poder dessas potencias monetarias, e por isso eu, não duvidando das intenções do governo, peço ao sr. ministro da fazenda — que declare á camara, se nas alterações que houverem de se fazer na carta organica do banco de Portugal, se se concederá ao mesmo banco de Portugal algum privilegio ou exclusivo além daquelles que actualmente gosa, e estão consignados na lei da sua creação; se lhe não forem concedidos mais, estimarei muito, porque só assim é que poderei dar o meu voto a favor. (Apoiados)

O sr. Louzada: — Sr. presidente, eu pedi a palavra para fazer ligeiras observações ácerca do artigo 5.º, que se acha em discussão; mas desde já declaro, que por ellas não pertendo comprometter a palavra do sr. ministro da fazenda em cousa que s. ex. tenha por melhor.

Ficando s. ex.ª auctorisado, pelo artigo 5.º deste projecto, a fazer algumas alterações na carta organica do banco de Portugal, parecia-me ser occasião propria para poder ser alterada a disposição relativa ao privilegio que o banco tem de, sómente nelle ou nas caixas ou agencias, se poderem fazer quaesquer depositos, tanto administrativos como judiciaes, que tiverem de ter logar por accordo das partes, ou por disposição da lei. Eu servi em uma junta de deposito publico, e vi, por experiencias, que não só por muitas vezes os agentes do banco não desejam, nem procuram haver para os seus cofies os dinheiros provenientes de taes depositos, mas nem mesmo ha interesse para a causa publica, em se conservar o systema actual.

No meu pensar intendo que, creando-se nas diversas repartições de fazenda uma caixa sufficientemente dotada, muito bem se poderiam para ella recolher todos quantos depositos se houverem de fazer, sem o perigo, já por differentes vezes acontecido, de serem os seus dinheiros dados tomo distraídos para applicações differentes. Uma similhante caixa, tendo uma dotação proveniente dos proprios dinheiros depositados, para acudir de prompto a quaesquer precatorios de levantamento, como se usa em alguns paiz e, daria por um lado aos depositantes maior garantia; e evitaria pelo outro que alguem se locupletasse com os dinheiros, que lhe não pertencem. O governo, recebendo sob sua responsabilidade, os dinheiros depositados, fica na obrigação, como quaesquer outros depositarios, de os entregar logo que lhe sejam pedidos, sem poder, em nenhum tempo, allegar que elles lho foram extorquidos; quando pelo contrario sendo taes dinheiros entregues ou guardados em outras partes, teem muitas vezes os seus recebedores allegado, que lhes foram levados á força, ou querido mesmo pagar em especies differentes daquellas em que foram recebidos.

Sr. presidente, o governo é uma entidade moral que permanece, em todo o caso, na rigorosa obrigação de restituir aquillo que recebeu, e na mesma especie recebida; e o tracto successivo do recebimento e pagamento dos dinheiros depositados dá-lhe margem sufficiente para nunca poder ser affrontado com as depreendas, que se lhe apresentem.

Portanto, sr. presidente, o fazer-se o que acabo de indicar, traz grande utilidade e vantagem para o thesouro, não sómente pela facilidade de poder girar com um fundo, que algumas vezes o poderá forrar a operações gravosas, a que se póde vêr obrigado, como o sobretudo, porque desse modo recolhe em si, cómodo direito lhe pertencem, muitos desses dinheiros depositados que não são procurados, e ficam de todo abandonados e sem dono.

Sr. presidente, concluo dizendo, que agora que se tracta de compôr e ajustar todas as contas com o banco, não me parece de justiça, que elle fique com um privilegio, do qual lhe podem provir tamanhos beneficios, como os que acabam de ser demonstrados, e apresentando eu estas idéas nada mais quero do que entregal-as á consideração de s. ex.ª o sr. ministro da fazenda, para dellas fazer o uso que melhor intender, a bem da transacção, em que vai empenhar-se.

O sr. Carlos Bento: — Eu não levarei muito tempo a camara, mas julgo indispensavel dizer alguma cousa a este respeito. O artigo 5.º diz o seguinte: (Leu) eu proponho que se accrescente — ficando estas alterações dependentes da approvação das côrtes.

Eu intendo que a carta organica de um banco é um assumpto muito grave; e com as melhores intenções podem muitas vezes adoptar-se medidas que não correspondem á importancia do assumpto, para que se dá auctorisação; e por consequencia intendo que não podem deixar de tornar-se dependentes da approvação das côrtes quaesquer medidas que sejam adoptadas; e por tanto maneio para a mesa o additamento que acabei de indicar, concebido nos termos seguintes:

Additamento: — Ficando estas alterações dependentes da approvação das côrtes. — Carlos Bento.

Foi admittido, e ficou conjunctamente em discussão.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, eu approvo o additamento mandado para a mesa pelo sr. Carlos Bento, porque me parece que a alteração que houver de se fazer n'uma caria organica que foi approvada pela camara, não póde nem deve ter execução sem ser previamente ouvida a camara, e esta dar á alteração a sua approvação definitiva.

Eu não quero continuar mais, porque vejo a camara inclinada a acabar com este projecto (Apoiados) e mesmo porque sei que esta minha opinião não influe nada na camara; entretanto póde rejeital-a.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, eu levanto-me para declarar que voto pelo artigo 5.º, como esta redigido, e declaro mais que negaria o meu voto

Página 55

55

a esta lei, se ella não contivesse o artigo 5.º, artigo, de que tem resultado vantagens para as emprezas de utilidade publica, por isso negava o meu voto, se ella não contivesse este artigo, e digo pelo que. Eu acho que as questões pendentes entre o banco e o governo são realmente ponderosas, e não quero mesmo entrar nem avaliar as suas ponderações; voto pelo projecto, mesmo para resolver essas questões, com quanto me seja mais indifferente este ponto, porque julgo que o governo do estado póde continuar do mesmo modo, como tem continuado até aqui, apesar dessas divergencias. A minha principal questão é, que se adoptem medidas em ordem, a que o banco possa alargar as suas operações de credito publico, a fim de auxiliar as emprezas de utilidade publica; e realmente para obter este resultado vale a pena dar uma auctorisação ao governo: (Apoiados) é escusado dizer, que toda a mudança que se fizer no banco, fica sujeita á approvação das cortes.

Eu sei que muitas vezes o banco se prestaria a muitas cousas, como por exemplo, aos emprestimos sobre hypothecas; mas dizem os seus directores, nós faziamos tudo isso, e estamos promptos a fazel-o, mas a nossa carta organica prohibe-nos: ora o que se deve lazer é tirar todos os estorvos, a fim de que o banco possa entrar em operações mais largas.

Em quanto ao additamento reputo-o desnecessario, porque as alterações que se fizerem, ficam sujeitas sempre á approvação do parlamento, pelos principios geraes de direito.

O sr. Maia (Francisco): — Sr. presidente, eu pedi a palavra para declarar que insisto novamente no meu pedido ao sr. ministro da fazenda, para que s. ex.ª declare se nas alterações que por ventura hajam de fazer-se na carta organica do banco de Portugal, se darão ao mesmo banco mais privilegios e exclusivos do que aquelles que actualmente já tem, no sentido de centralisar toda a acção monetaria no banco de Portugal.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Satisfazendo ao pedido do sr. Maia, direi que nas alterações da carta organica do banco de Portugal, o governo não concederá privilegio ou exclusivo algum ao banco de Portugal, além daquelles que actualmente tem. (O sr. Maia: — Estou satisfeito) e respondendo ao sr. Louzada direi, que tomarei em consideração as observações feitas pelo illustre deputado, para em tempo competente resolver ácerca do objecto dellas, aquillo que reputar mais conveniente á causa publica, e sendo um objecto importante, não póde de certo ser attendido e decidido na occasião em que se tractasse de levar á execução as disposições da lei que se discute. (Apoiados) Por ultimo direi, em quanto ao additamento offerecido pelo sr. Carlos Bento, que não julgo que se deva adoptar, com relação á disposição do artigo 5.º, quando já teem passado disposições mais importantes, como aquellas que se contém, por exemplo, no artigo 5.º, sem essa restricçào.

A restricção que o illustre deputado propõe ao artigo 5.º, pode de algum modo embaraçar o chegar-me a um accordo util para o banco e para o estado; portanto intendo que a camara o que tem a fazer, é approvar o artigo 5.º tal como está redigido. (Apoiados)

O sr. Cotios Dento: — Sr. presidente, é para admirai que o illustre deputado que primeiro impugnou o meu additamento, dissesse que queria que se resolvessem as questões que entre o banco e o governo se tem levantado; que queria que o banco alargasse a esfera das suas operações de credito, para poder auxiliar as emprezas uteis, e ao mesmo tempo declarasse que lhe era indifferente que continuassem estas questões!!! Pois é cousa indifferente que continuem ou não questões da natureza daquellas que se levantaram entre um estabelecimento monetario e o governo, quando temos tão pouco credito, quando O nosso paiz não abunda em capitaes, quando é o banco o unico estabelecimento de credito que temos?

Eu, sr. presidente, tambem quero que o banco alargue as suas operações de credito; mas isto não póde ter logar sem que se augmente o seu fundo, e que as suas acções tenham credito, e tenham um certo valor no mercado. Voto pelo meu additamento, porque não encontro nelle os inconvenientes que se lhe teem attribuido.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, pedi a palavra mais para consignar o meu voto sobre a decisão deste projecto, do que para outro fim. Eu, sr. presidente, voto contra todas as auctorisações que não são definidas, e por isso votei contra o artigo 2.º O artigo 5.º não foi trazido no projecto para acabar as dissenções que existem enlre o banco e o governo, como foram trazidos os demais artigos: o artigo 5.º é unicamente para adoptar algumas alterações na carta organica do banco de Portugal, em ordem a que este possa alargar as suas operações de credito, e nestes termos não ha inconveniente algum em adoptar-se o additamento proposto pelo sr. deputado Carlos Bento, additamento pelo qual voto.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, quaesquer que sejam as observações apresentadas pelos illustres deputados, para pugnarem que o artigo 5.º não passe como está, e sim como additamento a elle offerecido, essas observações não estão conformes com as rasões que a maioria tem para votar o artigo tal como está redigido. (Apoiados) Pondo de parte o que se tem dicto a respeito do que é, ou deixa de ser o credito, o que foram, ou deixam de ser as questões que tem tido logar entre o banco e o governo, o que é certo é, que o que a maioria quer é, que o governo fique auctorisado a fazer com que o banco possa ser util ao paiz. (Apoiados)

Eu intendo que a bulla de composição, a que os srs. deputados querem reduzir esta lei, póde até certo ponto ser de utilidade; mas isto não é bastante para fazer com que me occupe agora desta questão. Os srs. deputados que intendem os mysterios do credito, elles é que podem ler cuidado em que o credito respire sempre um ar conveniente aos seus pulmões, e proporcionar-lhe todos os regalos e confortos de uma vida sadia e asiática; mas eu como não entro nesse numero, nem sou creado particular do credito, não me importa que elle soffra mal de nervos, nem tenha constipações. O que desejo, é que o governo fique auctorisado por esta lei, para fazer com que é banco seja util ao paiz. E declaro que não me importa que o banco entre na empreza do caminho do ferro. Estou persuadido que o caminho de ferro se ha de fazer som o concurso do banco; nem no projecto se diz que o banco entra em empreza nenhuma, nem eu quero que o banco seja emprezario; mas quero que elle auxilie todas as emprezas de utili-

Página 56

— 156 —

dade publica. Já se vê que ha uma differença muito grande entre uma e outra cousa.

Não entrarei pois em mais considerações a esre respeito, e não estou disposto a seguir o illustre deputado no caminho demasiadamente metafizico que elle costuma dar ás questões, o que faz com que muitas vezes caia em trivialidade; porque é uma cousa subida, que o banco não póde alargar as suas transacções, som ter um maior fundo; em quanto as acções do banco não tiverem maior valor, é claro que elle não póde alargar as suas transacções. Ora, se fallei no systema hypothecario, não foi no sentido que pensam os srs. deputados; trouxe isto como uma falta que ha para a lei organica do banco; mas não accuso o banco, nem digo que isto era preciso para estabelecer o credito rural. Sei que se póde fazer uma lei neste sentido, sei que é facil faze-la, e estou certo que o governo no intervallo desta sessão não deixará de se occupar de uma lei do systema hypothecario, porque ninguem póde emprestar, no estado em que estão as leis hypothecarias, e o banco a este respeito não tem pequenos privilegios; porque quem empresta dinheiro, promove o registo das suas hypothecas, para que elle não seja enganado, mas as hypothecas das mutilações do banco, essas é que não tem registo; o que equivale a que o banco não quer ser enganado, mas quer enganar os outros.

Por consequencia voto pelo artigo tal qual se acha, e voto por elle com a confiança de que dou um voto util ao meu paiz.

O sr. Justino de Freitas; — Peço a v. ex.ª que consulte a camara, se a materia está sufficientemente discutida.

A camara resolveu affirmativamente; e foi logo approvado o artigo 5.º, sendo depois rejeitado o additamento do sr. Carlos Bento. — O artigo 6.º foi approvado sem discussão.

O sr. Santos Monteiro (Sobre a ordem): — Pedi a palavra sobre a ordem, para declarar em meu nome, e em nome dos meus collegas da commissão de fazenda, que não fizemos no projecto que acaba de se votar, a mesma declaração que fez o sr. João Damazio Roussado Gorjão, não porque não estejamos de accôrdo com o illustre deputado, mas porque intendemos que, tendo votado pela commissão de inquerito para o banco de Portugal, e creio mesmo que tendo alguns de nós assignado a proposta para a nomeação dessa commissão, não podiamos deixar de ressalvar qualquer resolução que a camara houvesse de tomar, ácerca dos trabalhos commettidos a essa commissão de inquerito; e tanto mais, quanto e certo (e o illustre deputado póde dar o testimunho) que a este respeito, os membros da commissão de fazenda pro

Votaram na mesma commissão uma explicação da parte do sr. ministro da fazenda (O sr. Roussado Gorjão: — Apoiado, e verdade.) e alli concordou s. ex.ª com isto.

Quero tambem fazer uma outra declaração, por parte da commissão de fazenda, quanto ao que na sessão de hoje disse o sr. deputado Cunha Sotto-Maior, com relação á proposta relativa á pensão do conde de Penafiel — que a proposta toda ella foi da maioria da commissão de fazenda, e não foi nada do ministerio; a iniciativa partiu da maioria da commissão de fazenda, tanto que s. ex.ª o sr. ministro da fazenda, declarou na occasião que este objecto se discutiu na camara — que não havia iniciativa da parte do ministerio — e é a verdade. Logo se a iniciativa partiu da maioria da commissão de fazenda, e não da parte do ministerio, é fóra de duvida que não houve motivo para as observações que o sr. Cunha foz a respeito deste negocio. (Apoiados)

O sr. Presidente: — Agora seguia-se a discussão do projecto sobre legados pios; mas não está presente o sr. ministro do reino, e além disto a hora está bastantemente adiantada; por isso não sei se a camara quer entrar nesta discussão.

O sr. Ministro da fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Não sei se a camara quer continuar a sessão estando a hora já tão adiantada; se não quer, e v. ex. tem de dar a ordem do dia para ámanhã, peço licença á camara para, por parte do governo, pedir que se discuta com preferencia a qualquer outro objecto, o parecer n.º 111 da commissão de infracções, a respeito da busca dada na casa em que reside o sr. deputado Calheiros; e o projecto n.º 109 sobre a contribuição predial. Depois que a camara votou a contribuição de repartição, é necessario saber o quantum, que deve ser repartido pelos districto. Portanto peço que estes objectos entrem na primeira parte da ordem dia, se a camara se não oppuser a estes meus pedidos.

O sr. Presidente: — Como não vejo opposição nenhuma da parte da camara, darei estes objectos para ordem do dia de ámanhã, sendo portanto a primeira parte da ordem do dia o parecer n.º 111 da commissão de infracções, e em seguida o parecer n.º 109 sobre a contribuição predial, que ha de receber-se no anno 1854-1855; sendo estes objectos discutidos com preferencia aos outros projectos já anteriormente designados para ordem do dia. Está levantada a sessão. — Eram 4 horas e meia da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×