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listas, por que cada contribuinte era obrigado a dar uma certa quantia: de maneira que o contribuinte logo no primeiro acto da operação preliminar para a contribuição de repartição, começava desde logo por pagar uma somma, que muitas vezes era bastante pesada. (Apoiados) O governo poiem espera que nos regulamentos que tem a adoptar, para levar a execução a repartição de (contribuição predial, as cousas se hão de fazer de modo que não se dêem nenhuns dos inconvenientes que tiveram logar em 1815.

Alguns illustres deputados e outros cavalheiros perguntaram-me — se, pelo facto da publicação da repartição da contribuição predial, ficam as demais contribuições abolidas — a isto respondi que não, nem era possivel fazer-se similhante cousa. Se não apresentei desde já uma medida, para que o systema de contribuição de repartição se estendesse ás outras materias collectaveis, é porque entre ellas ha algumas muito importantes e complicadas, que é preciso estudar maduramente, e mesmo porque convém mais, que, pouco a pouco se vá tomando extensivo este systema, á maneira que as conveniencias publicas o vão exigindo (Apoiados). Por todas estas razões concluo votando contra as differentes propostas que estão sobre a meza. E limito aqui as minhas considerações, as quaes a camara appreciará na sua sabedoria. (Apoiados)

O sr. Placido (Sobre a ordem): — Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra, approvando as alterações feitas na camara dos dignos pares, a proposição de lei, respectiva a alguns officiaes da concessão de Evora-Monte.

Ficou para ser discutido na sessão de ámanhã.

O sr. Justino de Freitas (Sobre a ardem): — Mando para a mesa um parecer da commissão de instrucção publica, approvando as alterações feitas na camara dos dignos pares á proposição de lei sobre as jubilações dos professores de instrucção superior e secundaria.

Ficou para se discutir na sessão seguinte.

O sr. José. Estevão (Sobre a ordem): — Mando para a mesa um parecer da commissão das pauta, propondo a nomeara de uma commissão de inquerito a respeito do objecto — pautas.

Ficou para opportunamente se tomar em conta.

Leu-se a ultima redacção dos projectos n.º 103 e 107, que não leve impugnação.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é, em primeiro logar, a eleição de um membro para a junta do credito publico; depois a eleição da commissão de inquerito, composta de 5 membros para examinar as contas da companhia das obras publicas de Portugal, e de outra de 7 membros para a secretaria e arsenal da marinha. A segunda parte da ordem do dia, será a continuação da de hoje, e os projectos n.º 74, 75, 70 e 117. Está levantada a sessão.

Eram 4 horas e meia da tarde.

O 1.º REDACTOR

J. B. Gastão

N.º 9. SESSÃO 10 de AGOSTO 1853

PRESIDENCIA DO SR. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presente 59 srs. deputados. Abertura: — As 11 horas e 3 quartos. Acta: — Approvada.

CORRESPONDENCIA.

Officios: — 1. Do sr. Visconde de Monção participando que não póde assistir á sessão de hoje, por incommodo de saude. — Inteirada.

2.º Do ministerio do reino, acompanhando a acta e mais papeis da eleição de um deputado ás córtes pela cidade de Macáo, que alli se verificou em 30 de setembro de 1852. — Á commissão de poderes.

3.º Da camara dos dignos pares, devolvendo com as emendas, que alli se fizeram, a proposição de lei que lhe foi enviada por esta camara, sobre a despeza gera] do estado. — Á commissão de fazenda.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — Hontem foi apresentada á mesa uma representarão assignada pelos officiaes da secretaria desta camara, e pelo sub-inspector e bibliothecario, expondo que tendo a camara dos dignos pares votado uma gratificação a todos os empregados della, pedem que se lhes applique o mesmo, visto que já se votaram aos outros empregados desta casa. Esta representação fica sobre a mesa, para ámanhã a camara deliberar sobre ella.

O sr. Rivara: — Parece-me que seria mais conveniente ir o requerimento á commissão administrativa, para sobre elle dar o seu parecer.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — Julgo desnecessario ir á commissão administrativa, porque, assim como a camara outro dia approvou, sem esta commissão ser ouvida, unia proposta concedendo gratificações a alguns empregados, não ha necessidade de ser agora ouvida sobre este requerimento.

O sr. Vellez Caldeira: — Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de informar, se ha precedente de se concederem gratificações aos empregados que as requerem.

O sr. Presidente: — Que eu saiba, não ha precedente, nem os signatarios do requerimento o allegam; só allegam a resolução da camara dos pares.

O sr. Vellez Caldeira — Como não ha precedente, e é uma cousa inteiramente nova, a minha opinião é, que este negocio deve ir a uma commissão.

O sr. Rivara — Parece-me que a razão allegada pelo sr. secretario, não tem tanta força, como á primeira vista parece. A camara quando tomou uma resolução ácerca de outros empregados, foi daquelles que estão debaixo rias suas vistas, e cujo serviço ella avalia; mas o que se faz na secretaria, não avaliamos nós propriamente, porque não ternos uma ingerencia immediata sobre a secretaria; portanto parece-me que o requerimento destes empregados está no caso de ir a commissão administrativa, porque o seu serviço só póde ser avaliado pela mesa; em quanto que

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et dos outros sobre que a camara decidiu, estavam bem patentes, e fóra de toda a duvida. Acho, pois, que não ha contradicção em que este requerimento vá á commissão administrativa.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — Ainda insisto em que este requerimento não deve ir á commissão administrativa, porque a camara noutro dia, sob proposta de um sr. deputado, resolveu que se concedessem gratificações a alguns empregados, que não linham sido contemplados em outras sessões; portanto não vejo inconveniente nenhum, se a camara julgar que é de justiça, que se estendam a estes empregados as gratificações, o votal-as independentemente da comissão administrativa dar parecer. Pela minha parte declaro que, se este negocio fôr á commissão administrativa de que tenho a honra de ser secretario, não assisto á sessão em que delle se tractar.

Assim como a camara tem resolvido negocios de empregados, sem ser ouvida uma commissão, não ha necessidade nenhuma de ser agora ouvida sobre um negocio que diz respeito só a 4 empregados de secretaria, podendo o seu requerimento ficar sobre a mesa, para os srs. deputados o poderem examinar, e discutir-se em outra sessão.

O sr. Cezar de Vasconcellos: — Pedi a palavra para reflectir ao meu amigo o sr. Rivara, que seria melhor que o requerimento ficasse sobre a mesa, visto que os requerentes não apresentam outra razão, senão o ter a camara dos dignos pares resolvido que se desse uma gratificação aos empregados daquella secretaria. Parece-me, pois, que o mais conveniente é, que senão tome hoje decisão alguma sobre o requerimento, nem que vá á commissão, e que fique sobre a mesa, para os srs. deputados o poderem examinar, sendo tambem informados dos vencimentos que teem esses empregados, que não foram contemplados na decisão que a camara tomou.

Assim se resolveu.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — A camara transacta resolveu que a mesa, em nome da mesma camara, communicasse ao sr. Geraldo José da Cunha, do Rio de Janeiro, o voto de agradecimento pelos serviços prestados á agricultura deste paiz; a mesa de então cumpriu esta determinação da camara, e hoje foi apresentada á mesa a resposta que o sr. Geraldo José da Cunha deu á missiva que se lhe enviou, a qual vou ler. (Leu)

O sr. Mello Soares: — Peço que se declare na acta, que esta resposta foi recebida pela camara com especial agrado.

Assim se resolveu.

Foi lido na mesa o seguinte

Parecer (n.º 113 00): — A commissão de instrucção publica foi presente o projecto sobre jubilações, e outras garantias do magisterio, que tivera a iniciativa nesta casa, vindo camara dos dignos pares.

Neste projecto não se encontram mudanças essenciaes, que alterem o pensamento, com que fóra elaborado, e approvado por esta camara; e só contém como materia nova um additamento comprehendido no artigo 2.º, para se applicar o mesmo principio do accrescimo do 3.º do ordenado aos juizes, que tiverem completado 30 annos de bom e effectivo serviço, < 00 de idade, que a commisão não póde deixar de approvar, coherente com os principios, que regularam o projecto para se remunerarem os trabalhos litterarios dos homens encanecidos no serviço do seu paiz com manifesto interesse publico.

A commissão é portanto de parecer que o projecto de lei deve ser approvado, como veiu da camara dos dignos pares para receber a sancção real.

Sala da commissão em 9 de agosto de 1853. — Bazilio Alberto de Sousa Pinto = Justino Antonio de Freitas — A. F. de Macedo Pinto — Francisco José Duarte Nazareth.

Alterações feitas na camara dos pares á proposição de lei de 30 de julho do corrente anno da camara dos sr», deputados sobre a jubilação e outras vantagens que devem gosar os lentes e professores de instrucção superior.

Artigo 1.º Os lentes e professores de instrucção superior que completarem 20 annos de bom e effectivo serviço, a contar do primeiro despacho para o magisterio, tem direito a ser jubilados com o ordenado das cadeiras em que se acharem providos; querendo, porem, continuar no magisterio, e verificando-se que estão em circumstancias de o exercer com proveito publico, vencerão mais um terço do ordenado, mas só depois de 30 annos de serviço poderão ser jubilados com mais este accrescimo de ordenado.

§ 1.º Estas disposições serão applicadas aos professores de instrucção secundaria, com a differença porém, que para o direito de serem jubilados com o ordenado por inteiro se requerem 25 annos de bom e effectivo serviço; e para serem jubilados com accrescimo da terça parte do ordenado se exigem 35 annos de igual serviço.

§ 2.º Approvado.

§ 3.º Approvado.

Art. 2.º As disposições do artigo antecedente são applicaveis aos magistrados de que tracta a lei de 9 de julho de 181-9, que estando nas circumstancias de poderem ser aposentados por haverem completado 60 annos de idade, e 30 de effectivo serviço, nos lermos estabelecidos na mesma lei, preferirem continuar no serviço.

§ 1.º Os magistrados a quem fôr applicada a disposição deste artigo só poderão ser aposentados com a totalidade do ordenado depois do augmento, havendo completado mais 5 annos de serviço effectivo.

§ 2.º A gratificação concedida aos lentes professores e magistrados de que tracta esta lei, que preferirem continuar no serviço depois de preenchidas as condições estabelecidas, é sujeita a todas as deducções e impostos que lhe forem applicaveis, porém não será considerada sobre os vencimentos de cada um destes funccionarios para nenhum outro effeito.

Art. 3.º O artigo 2.º do dicto — approvado.

Art. 4.9 O artigo 3.º do dicto — approvado.

Art. 5.º O artigo 4.º e seu paragrafo do dicto — approvado.

Art. 6.º Fica restabelecida, em quanto aos professores de instrucção superior e secundaria a disposição do artigo 21.º e § 1.º do decreto de 15 de novembro de 1836.

Art. 7.º O artigo 6.º do projecto — approvado.

Palacio das Cortes, 9 de agosto de 1853. — Marquez de Loulé, par do reino servindo de presidente — Visconde de Benagazil, par do reino secretario — Conde de Mello, par do reino, vice-secretario.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, fallaria ao meu caracter, senão impugnasse este parecer. Eu quero que haja economias, e é por isso que pedi, que o re-

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querimento que está sobre a mesa, e de que ha pouco se deu conta, fosse a uma commissão.

O additamento da camara dos dignos pares ao projecto sobre jubilações, quer dar tambem aos magistrados este beneficio da jubilação; mas perdoe-me a illustre commissão desta camara, que lhe diga, que não intendeu bem a emenda; porque a illustre commissão, no seu parecer, limitou-se só aos juizes; mas não são só os juizes, são os empregados de justiça, de que tracta a lei de 1849, são todos Os agente do ministerio publico; e, sr. presidente, se os professores, os juizes e os magistrados têem direito a jubilações, porque razão não hão-de te-lo tantos outros empregados, que estão nas mesmas circumstancias l Onde ha a mesma razão, deve haver a mesma disposição: e não quero dizer com isto, que se dê a todos o mesmo beneficio; mas que não deve haver lai beneficio.

Antigamente havia desembargadores com 80 annos e iam ao desembargo do paço, e v. ex. estará lembrado do respeitavel desembargador Negrão, que apesar da sua longa idade, não deixava de cumprir os seus deveres. Quando se discutiu a aposentação dos juizes dos tribunaes, oppuz-me, ainda que esse beneficio me podesse aproveitar, porque se nós tivessemos abundancia de dinheiro, podiamos votar á larga, mas se nós, depois de approvarmos o orçamento, temos votado mais despezas, como ha-de elle chegar?

O sr. Justino de Freitas: — Parece-me que o illustre deputado que quiz impugnar o additamento feito na camara dos dignos pares, está completamente enganado. Pela lei de 27 de julho de 1819, que estabeleceu a aposentação tanto do magisterio publico, como dos juizes, está expressamente determinado, que os juizes que teem 30 annos de bom serviço, assim como os agentes do ministerio publico podem ser aposentados com o ordenado por inteiro. Por consequencia esta materia está fóra da questão: isto está estabelecido por uma lei.

Agora vamos a ver o que se fez de novo pelo additamento. Não se fez senão estabelecer o principio, que estava estabelecido para os professores, que vem a ser que os professores, que tiverem 30 anno de serviço e CO annos de idade se quizerem continuar a servir, lerão mais um terço dos seus vencimentos. Ora digo eu que esta medida, bem longe de ser prejudicial aos interesses do paiz, pelo contrario e uma economia, porque se esses empregados se quizessem prevalecer do principio da lei de 27 de julho de 1819, se se quizessem aposentar, o resultado era que tinha de preencher-se o seu logar com outro empregado, e por consequencia o estado linha de pagar o ordenado daquelle que aposentava, e um ordenado aquelle que o fosse substituir: mas agora não é assim, e se homem que tem os 30 annos de serviço, e 30 annos de idade, tem um incentivo para continuar no seu logar, e o estado não tem a dar mais que uni terço do vencimento, vindo a economisar dois terços do ordenado, que tinha de dar a outro. Por conseguinte a medida é proveitosa, porque além de economica é um estimulo de que resulta o trabalho na época, em que póde esse trabalho ser mais util ao estado, porque diga-se a verdade, em materia de instrucção publica e julgamento, eu intendo que os homens mais antigos, que mais tempo tiveram, para estudar e para julgar, são os mais habeis para prestar bons serviços ao estado, a quererem continuar nesse serviço. Por consequencia o estado lucra, porque é mais bem servido, porque é servido por um homem que, a par do seu estudo, tem a longa practica do magisterio. Foi tanto parece-me que tenho mostrado á camara que o projecto de lei é economico e ao mesmo tempo de vantagem para o estado.

O sr. Presidente — Sobre o que já foi vencido por esta e pela outra casa, não póde haver discussão. A discussão limita-se unicamente a saber, se se approva ou reprova o additamento feito na outra casa do parlamento, que contem certas disposições a respeito dos agentes do ministerio publico.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, eu não me enganei quando disse, que o illustre orador não tinha intendido, ou não reparou, como vinha a emenda da camara dos dignos pares. A camara dos dignos pares não estendeu medida só aos juizes, estendeu-a tambem aos agentes do ministerio publico, mas a commissão no seu parecer referiu-se só aos juizes, e não fallou nos outros magistrados.

Agora em quanto ao mais eu o que disse foi — que não havia razão para que aos juizes se desse esse beneficio, assim como não ha razão para se conceder a ninguem, por que os homens que querem servir o seu paiz, servem-no em quanto podem, e por isso trouxe o exemplo dos antigos dezembargadores do paço que em quanto linham vida, e podiam íam ao desembargo do paço, e não tinham augmento de ordenado. Por essa razão disse eu que não devia haver reforma para os membros do supremo Tribunal de justiça, assim como a não devia haver para os professores. Eu tenho 61 annos de idade, e 42 de serviço; estou em toda a plenitude para gozar do beneficio da lei, e ainda me não aproveitei delle e opponho-me, porque é um augmento de despeza. Lá estão no tribunal collegas meus da minha idade e mais velhos; e lá estão servindo, sem que tenham pedido a aposentadoria.

Por consequencia, como não lemos dinheiro para distribuir com mãos largas, voto contra essa alteração.

Não havendo ninguem mais inscripto julgou-se a materia discutida, e foi approvado o parecer da commissão.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho). — Agora vou lêr um parecer da commissão de guerra, tambem sobre alterações feilas na outra camara a um projecto de lei.

Leu-se na meza, e é o seguinte

Parecer (n.º 118 O.) — Senhores: — A commissão de guerra tendo examinado as alterações feitas na camara dos dignos pares do reino, á proposição de lei desta camara, de 3 de agosto corrente, sobre ser ostensivo o disposto nos artigos 2.º e 3. do decreto de 23 de outubro de 1851 a certos officiaes comprehendidos na concessão de Evora-Monte, é de parecer que devem ser approvadas, porque não alterando o pensamento da referida proposição de lei, dão á sua redacção uma fórma mais generosa.

Casa da commissão, 9 de agosto de 1853. — José de P. F. da Fonseca = A. Xavier Palmeirim = z A. J. Botelho de Vasconcellos e Sá = A. L da Custa Camarate = - Placido de Abreu = C. C. Machado.

Alteração feita na camara dos pares á proposição de lei de 3 de agosto do corrente anno da camara dos senhores deputados, sobre ser estensivo o disposto nos artigos 2. e o. do decreto de 23 de outubro de 1851, a certos officiaes comprehendidos na convenção de Evora-Monte.

Artigo 1.º O disposto nos artigos 2. e 3. do de

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creto de 23 de outubro de 1351, é estensivo a todo os officiaes comprehendidos na concessão de Evora-Monte; seja qual fôr a posição em que se achem.

unico. As disposições deste artigo são igualmente ostensivas aos officiaes que ainda não gosaram do beneficio da carta de lei de 21 de agosto de 1840.

Art. 2.º Approvado.

Art. 3.º São exceptuados de gosarem destes beneficios aquelles que depois da dicta concessão tiverem sido demittidos por sentença do conselho de guerra.

Art. 4.º O artigo 3.º do projecto — approvado.

Palacio das côrtes, 8 de agosto de 1853. = G. Cardeal Patriarcha, presidente = Visconde de Benegazil, par do reino secretario — Marquez de. Ponte de Lima, par do reino secretario.

Foi approvada sem discussão.

SEGUNDAS LEITURAS

O sr. Presidente: — Torna a ler-se a proposta do sr. Corrêa Caldeira, sobre que não houve hontem vencimento; e que leiu por fim que a commissão de infracções dê o seu parecer sobre a legalidade do procedimento do governo, mandando soltar um preso que estava cumprindo sentença, para ser empregado na policia.

Foi rejeitada por 45 votos contra 23.

O sr. Presidente; — Agora vai ler — o uma proposta que o sr. Cunha Sotto-Maior mandou hontem para a mesa.

E a seguinte

Proposta — Considerando que o numero e organisação das secretarias de estado, fixado por differentes leis anteriores e posteriores á promulgação da caria constitucional (artigo 101.) não e assumpto indifferente, antes interessa essencialmente ao desinvolvimento e desempenho regular do serviço publico, na vasta e complicada esfera, que elle comprehende;

Considerando, que ainda recentemente pelo decreto da dictadura de 30 de agosto de 1852, hoje convertido em lei, foi creado o novo ministerio das obras publicas e industria apela necessidade instante de confiar aos cuidados e attenção especial de um só ministro o grande impulso economico, devido á facilidade dos meios de transporte, como sendo a relação que liga entre si a producção e o consumo, e que por isso resume todo o lavor economico da sociedade. (Palavras formaes do relatorio do citado decreto).

Considerando que a necessidade da creação do novo ministerio nasceu sobre tudo da difficuldade, ou antes da impossibilidade reconhecida de se encontrar um homem que tivesse tempo, e conhecimentos Ião variados, que podesse desempenhar com vantagem publica as attribuições proprias do novo ministerio, quando emmaranhadas e tolhidas nas vastas e complicadas attribuições do ministerio elo reino. (Palavras formaes do citado relatorio).

Considerando que aos mesmos, senão maiores, razões obstam ao desempenho das importantes attribuições conferidas por lei ao ministerio das obras publicas, quando este serviço se accumule na mesma pessoa, com o complicado e difficil serviço do ministerio da fazenda.

Considerando que da falla do complemento do gabinete e da ausencia e impedimento do presidente do conselho e ministro da guerra, no decurso da actual sessão legislativa, têem provindo não pequenas difficuldades a embaraços ao andamento e regularidade das discussões parlamentares, ao aviamento dos negocios publicos e particulares, e á justa apreciação da responsabilidade ministerial em questões pendentes sobre pontos melindrosos de direito publico constitucional.

Considerando, finalmente, que seria insolito e de patente desconsideração para o poder legislativo verificar-se qualquer reorganisação na ausencia do parlamento;

Proponho que esta camara dirija a Sua Magestade uma mensagem, a fim de tomar na Sua alta consideração as providencias que a regularidade do serviço, o bem publico, o decoro e sinceridade do systema representativo instantemente sollicitam. = Antonio da Cunha Sotto-Maior.

Não foi admittida por 52 votos contra 20.

O sr. Presidente: — Vai ler-se a exposição ou relatorio da commissão das pautas — Não sei se a camara quererá já tomar conhecimento deste parecer e discutil-o? A commissão propõe a eleição de uma commissão de inquerito, e que esta commissão seja encarregada de examinar O estado de cada uma das mdustii.is, e que seja auctorisada a funccionar no intervallo das sessões; que possa vizitar ou por sí ou por delegados seus de cada um dos districtos do reino os diversos estabelecimentos industriaes; que possa nomear commissões filiaes nas povoações mais importantes.

Ha outro parecer da commissão de inquerito sobre o banco que tem identidade com este; e não sei se a camara quererá tomar uma resolução a respeito de ambos.

O sr. Alves Martins: — Sr. presidente, parece-me que a discussão que deve preferir a todas é a do projecto de Lei sobre a repartição da decima.

O sr. Justino de Freitas: — Sr. presidente, eu acho essa materia mui grave, e como está presente o sr. ministro da fazenda desejaria ouvir a opinião de s. ex. a este respeito. Por isso pedia a v. ex.ª convidasse o sr. ministro da fazenda a dizer alguma cousa sobre isto.

O sr. Presidente: — O sr. ministro da fazenda ouviu o que acaba de dizer o sr. deputado — dirá o que julgar conveniente.

O sr. Ministro ela Fazendo (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, creio que é de uma commissão de inquerito sobre as industrias, que se tracta: eu não tenho duvida nenhuma em que a camara nomeie qualquer commissão de inquerito sobre as industrias, ou sobre o que julgar mais conveniente, no sentido de tomar um voto mais esclarecido. Mas o que me parecia era na occasião em que estamos, que convinha, que se tractasse de algumas questões que são um pouco mais graves (Apoiados). Não sei, sí a camara está resolvida a decidir já esse negocio. Em todo o caso, se a camara julgar conveniente, estou prompto a entrar na materia, e darei todas as explicações necessarias. Agora se a camara intender que convem resolver já as questões pendentes da ordem elo dia e depois resolver os outros objectos, Talvez fosse isso mais conveniento. (Apoiados) Mas eu não me opponho a que a camara considere já este objecto.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, quanto a entrar-se na ordem do dia concordo com o sr. ministro da fazenda: agora em quanto a separmo-no

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sem decidir este assumpto não posso concordar. Os deveres inherentes á commissão de inquerito do banco são por tal modo importantes, que todas as pessoas que assignaram a proposta, o fizeram sem repugnancia nenhuma. Por consequencia quanto á inversão concordo, quanto á preterição não me parece conveniente.

O sr. Presidente: — Eu consulto a camara se ha de discutir-se já este assumpto.

Resolveu a camara não tractar desde já deste as-sumulo.

O sr. Santos Monteiro: — Por parte da commissão de fazenda mando para a mesa o seguinte parecer C Leu)

Parece-me que este objecto é daquelles que merece ser já discutido; não ha alteração nenhuma na verba da despeza.

Alando para a mesa mais 5 pareceres sobre requerimentos, e um delles conclue por projecto de lei que deverá ser impresso, ainda que não possa sr discutido nesta sessão.

O sr. Presidente: — A camara conhece a conveniencia de se resolver já o projecto, que acaba de ser mandado para a mesa; por isso vai ler-se, para entrar em discussão.

É o seguinte:

Pareceu (n.º 118 S.) — A commissão de fazenda considerando, que a emenda feita pela camara dos dignos pares não altera a somma votada por esta camara para a despeza no actual anno economico, é de parecer, que o projecto da despeza doestado deve submetter-se á sancção regia para poder ser convertido em lei.

Casa da commissão em 10 de agosto de 1853 — J. D. Roussado Gorjão, presidente = Francisco José Maia = J. Antonio de Freitas, vencido = Antonio dos Santos Monteiro — J. M. do Cazal Ribeiro, vencido.

Alteração feita na camara dos pares á proposição de lei de III de julho do corrente anno da cantara dos srs. deputados sobre a despeza geral do estado para o anno economico de 1853 — 1851,.

Ao ministerio dos negocios da fazenda:

Encargos geraes 1.71.3:707$914.

Esta verba fica reduzida a 1.736:987%914, pela deducção que nella se fez de 6:800$000 da pensão do conde de Penafiel, que passa ao ministerio das obus publicas, commercio e industria.

Ao ministerio das obras publicas.

Commercio e industria 1.172:200$660.

Esta verba deve ser augmentada com a quantia de 6:800$000, que passa dos encargos geraes, e que diz respeito á pensão do conde de Penafiel, para ser collocada nos encargos do correio geral.

Palacio das Côrtes em 9 de agosto de 1853. — Marquez de Loulé, Par do remo servindo de presidente = Visconde de Benagazil, par do reino servindo de secretario. =

Foi approvada sem discussão.

O sr. Arrobas: — Sr. presidente, sinto profundamente que a camara, ao annuncio que eu fiz de querer dirigir algumas perguntas ao sr. ministro da malinha sobre uma revolução que houve em Bissao, não me tivesse concedido immediatamente a palavra, manifestando assim que ligava pouca consideração ao objecto.

Em Bissao houve uma revolta da tropa preta portugueza de combinação com os gentios, para entregar a praça a estes, e saquear a povoação; e se não fosse a guarnição de um brigue francez, que soccorreu aquella nossa possessão, felizmente no momento em que segunda revolta se tramava, pois que a primeira linha sido suffocada, ter-se-ía verificado essa revolta, e a povoação tinha sido saqueada e assassinada. Houve um combate, em que morreu o immediato do brigue francez; os soldados negros fugiram para o gentio em numero de 100; e como não havia tropa para a guarnição, nem podia vir de Cabo-Verde, por falla de meios de communicação, os marinheiros francezes ficaram guarnecendo a possessão de Bissao; e, se como se me diz de Cabo-Verde, os soccorros dalli para Bissao não podem ser mandados em menos de 60 dias, ou até então uma possessão portugueza ha de estar guarnecida por um I força estrangeira, ou, se esta a abandonar, aquella povoação ficará sujeita ao saque e ao assassinio.

Ha já muitos dias que tenho conhecimento deste facto, porque o li no Jornal dos Debates j mas, constando-me que o governo já delle leve participação official, peço ao sr. ministro que dê algumas explicações a este respeito, que me diga quaes as providencias que tem dado, e se é sua intenção remunerar os officiaes francezes que tão grande serviço nos prestaram, e conceder uma pensão a viuva daquelle, que infelizmente morreu no combate.

O sr. Presidente: — Como já deu a hora designada para se passar á ordem do dia, é necessario que a camara resolva sequer que este incidente continue.

Consultada a camara a este respeito, decidiu affirmativamente.

O sr. Ministro da Marinha (Visconde de Athoguia): — Sr. presidente, o illustre deputado ha de reconhecer, que não tem sido por culpa minha que a interpellação não tem tido logar; (O sr. Arrobas — Apoiado) porque muitas vezes me tenho apresentado na camara prompto para dizer o pouco que sahia a respeito do facto, do qual então apenas tinha conhecimento pelo que disse o Jornal dos Debates) e foi hontem, como o nobre deputado sube, que recebi communicação official do que alli aconteceu; e permitta-me o nobre deputado, por honra do nome portuguez, que desde já de algum modo rectifique a sua proposição absoluta, de que a guarnição de Bissao estava de accôrdo com o gentio para lhe entregar u fortaleza, porque o que me communicou o governador foi — que unicamente havia suspeitas. Effectivamente no dia 5 de junho a guarnição da fortaleza levantou-se contra os seus officiaes, os quaes, segundo a informação que tenho do governador de Cabo-Verde, fizeram quanto humanamente era possivel para acabar com a insurreição, e conseguindo-o então, reconheceu-se que a revolta linha ficado adiada para o dia 18. Mas o governador interino leve a feliz lembrança de mandar pedir a Goria, onde se achava parte da estação franceza, auxilio para poder fazer entrar nos seus deveres a guarnição insubordinada; reconheceu-se que no dia 18 tencionavam os revoltosos saquear a povoação, nesse mesmo dia saltaram em leria 60 homens da guarnição do brigue francez, dividiram-se em 3 secções, sendo uma commandada pelo cirurgião, que se distinguiu na acção, e outra pelo segundo commandante do brigue, cuja perda ha que lamentar.

Em quanto ao illustre deputado suspeitar sobre o

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ter sido u bandeira franceza arvorada na praça de Bissáo, quando aquelle ponto acabava de ser salvo pelo auxilio e esforços dos subditos francezes, d de certo uma injuria que se faz a nação franceza, o que por modo nenhum foi esta a intenção do illustre deputado, quando no calor do seu patriotismo deixou escapar esta expressão. Agora a respeito do auxilio que é necessario enviar áquella possessão, sou informado pelo governador interino de Cabo-Verde, que tem já uma força prompta a embarcar para aquelle destino, e que devia partir n'um navio que alli se apromptava acompanhada pela escuna Cabo-Verde j e o mesmo governador me diz, que aquella força é sufficiente para fazer conter em respeito agente que se sublevou. Accrescendo ainda outra circumstancia: — quando os sublevados foram atacados pelos francezes, a maior parte delles saíram da praça e fugiram para os gentios; e dizendo-se que elles queriam vir alacar a praça, os francezes tem alli feito serviço, e haviam de continuar a prestar auxilio até chegar o reforço de Cabo-Verde, contribuindo deste modo para a boa ordem e tranquillidade daquella colonia e de seus habitantes.

Em quanto a recompensar os serviços prestados pelos officiaes da guarnição do brigue francez, a esse respeito não posso senão significar a minha opinião singular; mas estou certo que todos os meus collegas estarão de accôrdo comigo (porque todos somos portuguezes, todos sabemos ser gratos quando recebemos favores desta ordem) e levarei uma respeitosa mensagem a Sua Magestade, afim de que estes benemeritos officiaes sejam considerados da fórma, porque é costume recompensar serviços de similhante natureza.

Relativamente a outra pergunta do illustre deputado, declaro que não tenho duvida em manifestar a minha opinião a esse respeito, sujeitando-a com tudo á opinião dos meus collegas; mas dependi tambem desta camara a pensão que deve ler a infeliz familia do official que morreu. (Muitos apoiados) E para mim summamente agradavel ouvir estes apoiados; a camara sabe que se esse official fosse portuguez, o governo, em virtude da lei, podia conceder uma pensão á sua viuva, sem necessidade da confirmação do corpo legislativo; mas considerando-se o governo desde já até certo ponto auctorisado pela manifestação que a camara acabou de prestar (Repelidos apoiados) o governo fará o seu dever decretando uma pensão para aquella familia, com o vencimento desde o dia da morte daquelle official, Trazendo-a depois á approvação desta camara. (Apoiados geraes)

Devo tambem declarar ao nobre deputado, que tendo recebido apenas antes de hontem as informações officiaes a este respeito, creio que s. s. ha de fazer a justiça de reconhecer que em ião curto intervallo de tempo pouca cousa poderia ler posto em practica; comtudo na primeira occasião que eu tenha a honra de me aproximar do throno, tenciono levar ao conhecimento da Soberana uma exposição, de accôrdo com os meus collegas, no sentido em que acabei de dizer, e conforme os sentimentos desta camara.

Não sei se o nobre deputado me dirigiu mais alguma pergunta; todavia parece-me que com estas explicações deve ficar satisfeito.

O sr. Presidente: — Como deu a hora designada para se passar á ordem do dia, é necessario que a camara resolva se quer que este incidente continue.

Resolveu-se affirmativamente.

O sr. Arrobas: — Em verdade o sr. ministro da marinha é um verdadeiro portuguez; é um homem de bem a todos os respeitos; e sempre que tenho de fallar sobre qualquer objecto que diz respeito a s. ex. e que não lhe seja favoravel, confesso que me custa bastante ter de o fazer, por conhecer as boas intenções que s. ex. tem. Prometto não tomar muito tempo á camara com o que tenho a dizer; e desde já declaro que depois das explicações que o nobre ministro acaba de dar, hei de mandar para a mesa II um moção que diz respeito aos serviços prestados na praça de Bissáo pela guarnição do brigue francez Palynure.

Sr. presidente, segundo as informações que tive, o facto passou-se exactamente como o sr. ministro o expoz, e não tenho duvida em declarar que estou satisfeito com as explicações dadas por s. ex.ª, menos em quanto aos soccorros que é necessario dar á praça de Bissáo; porque indo estes de Cabo-Verde, só no fim de setembro, como já disse, é que poderão de lá partir. Ora, como no Tejo ha uns poucos de navios armados, dizendo-se que são para qualquer caso repentino, parece-me que nenhum haverá mais urgente do que este; e por isso peço ao sr. ministro que faça sair immediatamente o vapor Mindello com alguma tropa para Bissáo, devendo este ficar alli ás ordens do governador de Cabo-Verde, até que a possessão de Bissáo esteja livre de perigo. Termino mandando para a mesa a seguinte proposta, e peço que seja declarada urgente.

Proposta: — A camara declara dignos da consideração nacional os serviços pi estados a Portugal na praça de Bissáo pela guarnição do brigue francez Le Palynure; sentindo profundamente a perda do 1.º tenente da marinha francesa, morto em combate no auxilio prestado á auctoridade portugueza. — Arrobas.

Foi declarada urgente e admittida á discussão.

O sr. Rivara: — Parece-me mais curial mandai a proposta a uma commissão, e nada se perde em se discutir, por exemplo, ámanhã.

O sr. Arrobas: — Eu concordo em que a proposta vá a uma commissão, mas unicamente para lhe dar uma melhor redacção; peço porém que lhe seja remettida com urgencia.

O sr. Cunha Solio Maior: — Como o sr. deputado auctor da proposta concorda em que ella vá a uma commissão, não me opponho; mas parece-me que, sendo o objecto ião simples, a camara póde discuti-lo desde já, embora depois se dê uma melhor redacção á proposta.

Resolveu-se que fosse com urgencia á commissão de redacção.

O sr. Presidente: — Já deu ha tempo a hora designada para se entrar na ordem do dia; por consequencia fica para amanhã a eleição do membro da junta do credito publico, e a das commissões que se tinham annunciado.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do projecto n.º 109 (Decima de repartição).

O sr. Arrobas: — Eu, como estou inteiramente persuadido de que seria inutil o que dissesse a favor do adiamento desta questão, porque ella está com

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pletamente resolvida pela camara, e esta tem pi essa de votar, cedo da palavra.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, eu approvo as tres propostas de adiamento que foram offerecidas; mas tendo de optar, n'um conflicto, por alguma, prefiro a do sr. Carlos Bento, porque ella resolve a questão; não é verdadeiramente um adiamento, e uma substituição ao projecto da commissão.

Nesta questão vejo que estou abandonado pelo sr. Avila, mas em substituição sou ajudado pelo sr. Passos (Manoel); e estimo muito em qualquer questão ter a meu lado o sr. Passos (Manoel) que é um caracter não só illustrado, mas muitissimo distincto, e verdadeiramente amante do seu paiz.

O paiz tem uma historia, e esta historia deve andar gravada na memoria dos homens, que na vida publica têem uma lai ou qual representação.

Durante a administração do sr. conde de Thomar, houve uma revolta no paiz, e o motto gravado na bandeira dessa revolta foi — abaixo o ministerio que promulgou a contribuição de repartição e a lei de saude. — A revolução triunfou; depois della foi presidente do conselho o sr. duque de Palmella, o qual, em documentos officiaes, disse que o povo se tinha insurgido contra as leis da contribuição de repartição e de saude, e que, derogadas essas leis, os motivos de revolta linham acabado; e o odio contra a contribuição de repartição foi lai, que a junta popular do Porto reprehendeu, em termos pouco brandos, a junta popular de Coimbra, porque não se tinha apressado em queimar os papeis que diziam respeito á contribuição de repartição. Mas, depois de se ter promettido, em documentos officiaes, que a contribuição de repartição tinha caído, e que a sua ressurreição era quasi um impossivel, naturalmente foi em consequencia de uma invocação que o sr. Avila fez ao lado esquerdo da camara, dizendo-lhe que era o unico que estava habilitado para propôr a contribuição de repartição, que aquelle lado adoptou a idéa da contribuição de repartição, e a foi dar ao sr. ministro da fazenda. Ora são taes os embaraços que se oppõem á execução deste systema, tão pouco está o paiz preparado para elle, que o sr. ministro da fazenda propoz o projecto, e a camara approvou-o, com a condição de ser um ensaio timido e acanhado, applicado sómente a Lisboa e ao Porto; quando se o systema da contribuição de repartição é uma necessidade publica, se é o que ha de bom no systema de impostos, era justo que o beneficio se estendesse a todo o paiz, e não fosse só privativo de Lisboa e Porto; mas foi abandonada esta primeira idéa; por que era extremamente absurda, e veiu então o systema de contribuição de repartição para todo o paiz.

Eu sei toda esta historia ião bem como o sr. ministro; não sou o pai da creança, mas assisti ao nascimento, sei a vida enfezada e rachitica que tem levado, e a morte que proximamente a póde arrebatar desta para melhor vida: e por via de regra, apezar de eu não dar muita attenção ás propostas que se fazem, e aos discursos que se pronunciarei aqui na camara, apezar do meu exterior que denota algum estouvamento, leio, estudo, habilito-me para poder dar sempre o meu voto com consciencia.

Entre os actos da dictadura, que a camara approvou, estava incluido o decreto para a contribuição de repartição; e aconselhado o governo pelo sr. Avila, por duas vezes, para que retirasse este projecto da discussão, porque não havia os elementos preparados, porque, além das cousas que fallavam como theoria, não havia tempo material para a execução, o sr. ministro da fazenda rebellou-se contra esta pi oposição inaudita do sr. Avila, jurou aos seus deoses que contribuição de repartição havia de ir por diante; comtudo vinte e quatro horas depois declarou na camara dos pares que retirava o projecto da discussão, e effectivamente o projecto foi retirado!... Mas se a camara não teve duvida nenhuma em approvar 360 decretos da dictadura, entre os quaes havia um, cuja execução se espaçava para daqui a 10 annos, porque não discutiu então o projecto de contribuição de repartição, se tencionava discutil-o nesta sessão? Discutil-o agora, quando apenas fallam 3 dias para se encerrar a sessão, quando não ha tempo para se discutir, manifesta que ha uma pressão sobre os deputados-; que está decidido nos conciliábulos ministeriaes, na sua synagoga, que depois de lalar um certo numero de deputados, a discussão seja abafada. Notai, senhores, que o conde de Thomar leve uma revolução contra a lei de repartição é verdade, mas foi discutida aqui nesta camara, e na outra larga e pausadamente, e a imprensa da qual faziam parte alguns dos srs. deputados que apoiam o governo, tambem discutiu larga, pausada, e até scientificamente a questão; e vós approvae, mas não discutis; uma cousa é approvar e outra cousa é discutir; approvar é o acto da brutalidade; para isso basta o numero; mas discutir é o acto da intelligencia, do talento, e do esclarecimento; se vos contentais com approvar, tendes razão; mas não discutistes, e u minha missão aqui é differente da vossa, é discutir, é ler a minha opinião, não é ser escravo da gleba, não é ser cega e estupidamente ministerial.

Eu não venho aqui fazer politica, mas antes fazer politica que ser servil. O meu codigo de civilidade na camara é a caria constitucional; lá fóra posso preferir a cartilha do padre Ignacio a outro qualquer livro; mas aqui, como deputado, a minha é aquella que deriva das obrigações designadas na carta constitucional; lá fóra sou um homem civil, segundo o codigo da civilidade: mas eu admiro que certos homens se estejam a elogiar uns aos outros. Eu detesto todos os elogios, não os approvo, nem os faço. Riso)

Tenha in paciencia, meus senhores, eu não estou disposto a ler commiseração alguma com os meus inimigos; estou disposto a não perder de vista um proverbio portuguez que diz — para inimigo facada; quem o seu inimigo poupa, nas mãos lhe morre; — e eu não estou disposto a poupar o meu inimigo, não lhe faço mal, porque não posso, tomára eu poder!...

Sr. presidente, eu sou decididamente pelo imposto indirecto; sou a favor deste systema de impostos, sou partidario inflexivel e intractavel da escola ingleza, que me merece muitissima preferencia á escola franceza.

Sr. presidente, o systema de repartição está hoje em completo descredito na Hespanha e França, que são as duas unicas nações que usam deste systema. Não fallarei na Lombardia, ou fallarei logo, se tanto julgar necessario. É triste sina nossa andar sempre ao rabisco do que ha de máo nas outras nações! Quando qualquer nação deita abaixo uma instituição, nós corremos logo a apanha-la no seu lixo! O systema da repartição está em completo descredito em Fiança e em Hespanha. Nestes dois paizes o resultado do

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systema da contribuição de repartição, é augmentar de dia para dia o clamor e a indignação publica! Em França os escriptores publicos de maior nomeada, que tem escripto e publicado algum folheto ou livro sobre este assumpto, são decididamente contra a contribuição de repartição.

Mas eu não posso, além disso, approvar o systema da contribuição de repartição, como se propõe, porque o systema da contribuição de repartição, que se propõe, tem os mesmos defeitos, as mesmas desigualdades, as mesmas monstruosidades, e os mesmos inconvenientes que o actual systema de lançamento da decima. Pois será crivel que se vá lançar mão deste systema de repartição, com todos os defeitos, com todos os erros, com todas as desigualdades, e com todos os inconvenientes do systema de lançamento, só pelo gosto de se fazer unia innovação? Pois se o imposto é o mesmo, se o systema de lançamento é vexatorio, como é que se vai buscar para base do systema da-contribuição de repartição, o systema do lançamento da decima? Pois não será isto um absurdo e um contrasenso?

Não se diz no projecto que a contribuição de repartição predial será de 1:200 contos, isto é, igual ao termo medio da receita que se cobrava, nos differentes districtos do reino, pelo systema de lançamento de decima? Não se diz que o systema de repartição é melhor porque dá logar a que cada um dos districtos do reino pague segundo os seus leres e haveres, segundo a sua riqueza e população? Mas que acontece? Acontece que tudo fica na mesma; cada districto continua a pagar pela decima de repartição o mesmo que pagava pela decima de quota!

O districto de Coimbra paga, por exemplo, actualmente 50 contos pelo systema de lançamento, pelo systema de quota, e agora continua a pagar os mesmos 50 contos pelo systema de repartição? Logo, se isto é assim, se os resultados são os mesmos; se o povo não lucra nada com isto, se fica como estava, porque é querer fazer uma mudança no systema?

Em maio de 181.6 houve uma revolução no paiz por causa do estabelecimento deste systema da contribuição de repartição; então eram grandes e graves os seus inconvenientes; mas hoje já se acha o systema bom! Hoje já o conde de Thomar tem menos um deleito! Daqui a pouco tambem se porá em execução a lei de saude! Os defeitos do conde de Thomar vão diminuindo, elle vai ganhando terreno. Nós, opposição cartista, tambem já não temos esses grandes defeitos que se nos attribuiam; já lemos algumas das virtudes do sr. ministro da fazenda, ou o sr. ministro da fazenda tem algumas das nossas; porque u nos apontamentos sobre os oradores parlamentares de 1853, escriptos por um deputado da maioria» ahi, querendo-se engrandecer os talentos, attributos e dotes do sr. ministro da fazenda, talentos, attributos e dotes que eu lhe reconheço, disse-se — A sua eloquencia participa de varios generos; tem um pouco do positivo e escholastico do sr. Avila, do sarcástico do sr. Cunha, e até do nebuloso do sr. Carlos Bento. Sabe retorquir ao sr. Cunha com dictos picantes, ao sr. Carlos Bento com algumas frases túmidas e bombásticas, e ao sr. Avila com algarismos, etc.

Ora eu não quero fallar em algarismos, porque em vendo um algarismo, já me parece que vejo um soldado de espingarda engatilhada para me matar; (Riso) não quero nada com algarismos nem com contas, porque me tenho dado muito mal com ellas.

(Riso)

Mas voltando á questão direi, que a provincia do Minho, que é a provincia mais rica e popular que nós temos, fica pagando o mesmo que até aqui; a provincia do Alemtejo, que é mais pobre, fica tambem pagando o mesmo que até aqui. Então, senhores, em que é que beneficiais os povos com a alteraração do systema de quota para o de repartição? Para ficar tudo como estava, é escusado fazer uma innovação no systema de impostos.

Já se vê portanto, que com o systema que se quer adoptar, não se remedeia nenhum dos inconvenientes do systema de lançamento; a nação não lucra nada, absolutamente nada com esta mudança de systema.

Eu intendo que a escola economica ingleza é aquella que devemos realmente seguir. Tenho em apoio desta minha opinião, a opinião do illustre deputado o sr. Passos (Manoel); estou auctorisado por essa opinião, e quando esta me faltasse, tenho a opinião de muitos economistas, que tem escripto sobre este assumpto, que adoptam com preferencia ás opiniões da escola franceza, as opiniões da escola ingleza, o além disto tenho os factos que fallam bem alto.

Quanto é que rende a propriedade territorial em França? Nada menos do que o seguinte: Rendimento bruto da propriedade territorial........................ 1,600,000,000

Mas quanto é que esta propriedade paga de impostos? Nada menos que 305,000,000

Alas o systema é tão máo; a propriedade está tão gravada, que o juro das propriedades hypothecadas (11 a 12 milhares) é, de............ 550,000,000

Paga mais — Despeza com os advogados, tabelliães, tribunaes, e officiaes de justiça................. 100,000,000

Paga com direitos de sello, registo, emolumentos de justiça, e varias

outras despezas................. 107,000,000

1,062,000,000

Fica pois liquido aos proprietarios... 538,000,000

Ora aqui tem a camara os bellos resultados da contribuição de repartição! Sobre um milhar e seiscentos milhões, arranca-se ao proprietario e ao contribuinte, um milhar e sessenta e dois milhões!!

Mas isto acontece assim, porque na França, em Portugal, e em toda a parte, crassamente, ignorantemente e perfidamente, se chama proprietario a um homem que apenas tem uma geira de terra, que a muito custo lhe dá para não morrer de fome; e tanto isto é assim, que em França, intendendo-se que devia haver equidade na lei, determinou-se que, quando o proprietario não podesse pagar o imposto, elle entregasse a propriedade ao estado.

Em França ha quatro milhões de proprietarios ricos ou abastados, e ha tambem quatro milhões, pouco mais ou menos, de pequenos proprietarios; tomando eu os melhores calculos estatisticos, os calculos dos auctores de mais nomeada, que dão por cada chefe de familia cinco pessoas, ve-se que, a França tem 20 milhões de pessoas pobres que não, pódem pagar o imposto.

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Eu, sr. presidente, queria que se me respondesse a esta doutrina, embora ella não parecesse muito do dominio do direito publico constitucional! Eu que na que houvesse neste paiz um homem arrojado, que,, colhendo as opiniões passadas de um certo partido, e chamando tambem a si as opiniões do actual presidente do conselho, pegasse numa espingarda e fosse sublevar o paiz. dizendo — eu venho sublevar este paiz, em virtude de um systema que já provocou uma revolta, que foi reconhecida e abraçada pela corôa, e que a Europa abraçou; — e quando digo, a Europa, quero dizer a Inglaterra que é a protectora desta nação; porque, ainda que se grita e clama muito contra a Inglaterra, o que é um facto, é que nós devemos muito a esta nação. Mas dizia eu, supponhamos que havia um homem arrojado, que se lhe mettia na cabeça ler uma certa reputação no paiz, e pegava na proclamação de 6 de outubro, no manifesto do duque de Palmella, e numa quantidade immensa de artigos de jornaes; se, tomando o facto da revolta de 186, como uma cousa incontestavel, porque não é possivel dizei ao passado — tu não exististe — se tomasse a ordem do exercito em que o duque de Saldanha diz que ha momentos solemnes em que é necessario recorrer ao coração do soldado, e fosse por esse paiz sublevar o exercito, com que direito, e porque motivo se havia de criminar este homem? Pois como é que de repente se mudou de opinião? Em 1846 era sancta e justa uma revolta contra a lei da contribuição de repartição; hoje já é boa esta lei!

Ha mais ainda. Não é passado ainda muito tempo, que o actual sr. ministro da fazenda propôz nesta camara, o adiamento desta questão, e é o mesmo sr. ministro que vem propol-o novamente á discussão. Desejo ser esclarecido: augmentaram por ventura os trabalhos cadastraes? Consultou-se o paiz? Não! Então como é que se muda de opinião sem mais nem mais? Qual foi o motivo que deu logar a esta transformação de opiniões? Que circumstancias novas se deram? Sobre que bases se operou similhante mudança? Que necessidades a aconselharam? Nenhumas!

Mas tanto isto é assim, tanto as ponderações que acabo de fazer, teem exactidão, que ainda hoje ouvi dizer, que, indo reunir-se proximamente em Bruxellas um congresso de sabios para discutir os dados estatisticos relativos ás diversas nações da Europa, o governo nomeára um collega nosso, para ir assistir a este congresso de sabios. O governo reconhece a necessidade de dar uma commissão subsidiada a um deputado para ir estudar assumptos estatisticos, e acha ao mesmo tempo que os deputados sem nenhuns dados, sem nenhumas cifras, inteiramente cegos, e immensamente ignorantes sobre o objecto, devem approvar o projecto em discussão! Não póde ser; ou por outra, póde ser, porque a experiencia tem mostrado que as questões se decidem quasi sempre, pelo espirito de partido (O sr. Arrobas: — Apoiado) mais pela brutalidade do numero, do que pela razão e pela justiça.

Nós julgámo-nos bastante auctorisados, e vimos ao parlamento de cabeça alta contrariar a experiencia de 60 annos, e os homens mais intelligentes, mais practicos e theoricos do que nós! Temos o arrojo de julgar que a nossa humilde opinião, hade prevalecer sobre os homens que governam e dirigem a questão economica da Europa!

Que dizia Dupin, embora fosse um homem reaccionario? Dupin dizia: — o imposto territorial esmaga o povo e sobrecarrega a agricultura como uma precisa hydraulica a, e é ião estupido este imposto, que cuidando que apanha o grande proprietario, só apanha o pequeno.

Em Portugal ninguem paga a decima, como a deve pagar, porque se toda a gente entrasse com a sua quota para o thesouro, nós nadavamos em ouro.

E preciso notar mais que o povo paga para muitas verbas importantes de despeza que não vem no orçamento. Estará por ventura no orçamento a contribuição para as camaras municipaes? E quanto se paga de contribuição municipal? Nada menos do que 360 contos. Estarão no orçamento as congruas dos parochos, e a despeza com a sustentação dos expostos? Não; logo o povo paga muito mais do que o que vem no orçamento.

E que diz Blanqui? Blanqui diz — quantos proprietarios não ha em França, que teem precisão de tudo, e que até não teem vestidos para se cobrir, nem alimentos para se sustentar? Quantos proprietarios não ha em França, que pagam uma contribuição para o thesouro, e que não tem se quer dinheiro para evitarem que as paredes da sua cabana não caiam por teria?

Sr. presidente, eu não estudei a questão; porque, ainda que o quizesse fazer, nem tempo tinha para isso; mas estes argumentos são unicamente para fundamentar e meu voto, e para mostrar que, tendo combalido no tempo do conde de Thomar a lei de contribuição de repartição, sou coherente comigo, não a approvando hoje. Agora, se todos os illustres deputados, que então combateram a lei da contribuição, ou na qualidade de deputados, ou na de escriptores, não querem ser coherentes comsigo, não o sejam, muito embora; mas eu que me pronunciei contra essa lei, não posso hoje, sem mais nem mais, vir approvar o que então combali.

Sr. presidente, voto pois contra o systema da contribuição de repartição, porque não quero lançar no paiz um facho de discordia, nem contribuir directa ou indirectamente para accender outra vez a guerra civil; porque, seno paiz houvesse minoria e houvesse gente, a guerra civil era imminente. O que havia em 1846, é o mesmo que existe hoje. Não é possivel uma pessoa acordar todos os dias ao som de um escandalo e de uma torpeza, e ficar-se neste estado. Quando me levanto e vejo nos jornaes o modo como o ministerio é tractado; quando vejo que se lhe fazem imputações tão graves, como as que se lhe dirigem, digo logo comigo que é impossivel que estas imputações, e estes insultos não vão pouco a pouco calcando na opinião publica. Não ha camaras, não ha parlamentos, não ha fornadas de pares, não ha reis nem roques, que possam sustentar uma situação, que se vai tornando todos os dias em escandalo. A opposição segue hoje o mesmo caminho que seguiu no tempo do conde de Thomar; e ainda que a maioria e os srs. ministros se considerem de pedra e cal, estejam convencidos de que, quando um ministro é accusado; (e não sei se com fundamento: quero crer que não) mas quando elle é accusado de delator, de espião e de desertor, isto ainda que não seja verdade, caia na opinião publica, que nem sempre propende para o bem, e ha de fazer com que o governo, mais tarde ou mais cedo, não posa continuar na governação do

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estado. Voto pois, como não posso deixar de o fazer, contra o projecto.

O sr. Cazal Ribeiro: — Sr. presidente, o illustre deputado que me precedeu, respondeu por si mesmo a todo o seu discurso, em uma fraze sincera, que lhe escapou —..Deos fel e assim, e assim ha de continuar.» — Deos fez de s. ex.ª um improvisador, e o nobre deputado improvisa não só a fraze, mas os factos, a historia, os algarismos, e até uma logica para seu proprio uso. (Apoiados)....

O illustre deputado contou a historia deste projecto; mas uma historia que ninguem conhece, e que é contraria á que todos presenciaram. Asseverou s. ex. que o decreto da contribuição de repartição foi retirado da discussão pelo sr. ministro da fazenda, quando se tractou dos actos da dictadura; mas eu não posso achar nas minhas recordações, similhante facto, e nenhum dos meus collegas o encontrará tambem. Pelo contrario discutiu-se e votou-se a contribuição de repartição, com a declaração de que começaria a executar-se no anno de 1854, e não no de 1853; (Apoiados) e não só se votou em globo com os outros decretos, mas votou-se este, especialmente, com a declaração que referi. (Apoiados) Mais tarde, por occasião da discussão do orçamento, votou-se um artigo auctorisando o governo a fazer as despezas necessarias para a repartição deste imposto.

Sr. presidente, eu respeito todos os direitos dos srs. deputados, até mesmo o da inconsequencia e contradicção; e nesta parte não me refiro aos que votaram contra os actos da dictadura; mas não posso deixar de me admirar, ouvindo assegurar com tal intimativa que não foi discutida a contribuição de repartição; quando foi o proprio sr. Antonio da Cunha um dos que entraram largamente neste debate, e illustraram a camara com as suas reflexões. (O sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu não fui. Seria outro Antonio da Cunha).

O Orador: — Talvez fosse outro, porque conheço diversos srs. Antonios da Cunha, quanto ás opiniões que sustentam; mas é de certo um illustre deputado que se senta no lado direito, que se chama Antonio da Cunha Sotto-Maior, e que então como agora, illustrou a camara com as suas observações. (O sr. Cunha Sotto-Maior: — Mas não aproveitaram).

O Orador: — Estimo que o illustre deputado se recorde agora do que parecia ler esquecido; e se a camara então não seguiu as opiniões do illustre deputado, como espera que as não seguirá agora, foi porque intendeu que o seu talento se tinha posto ao serviço de uma má causa. Quando todos os argumentos do illustre deputado se baseam em factos desfigurados, e na negação do que todos viram e sabem, nada ha a oppor seriamente a taes argumentos.

O illustre deputado concluiu profetisando a morte da situação actual; mas o illustre deputado está summamente enganado, pensando que os deputados, que apoiam a situação actual, a julgam eterna. É da essencia do systema constitucional não haver governos eternos; as novas épocas trazem novas necessidades, e as novas necessidades precisam muitas vezes de ser representadas no poder por novos homens.

A maioria sustenta este governo, porque intende, que elle representa melhor os interesses do paiz que outro qualquer que hoje o podesse substituir. (Muitos apoiados) A opinião politica a que pertenço, não ambiciona o poder; não o quer para si; mas sustenta o governo, porque intende que nisso vai o interesse do systema constitucional, e a satisfação das necessidades administrativas. (Vozes: — Muito bem)

Sr. presidente, muito folguei de ouvir o nobre deputado e meu amigo, o sr. Passos (Manoel) que hontem encetou este debate, porque vejo que não ha uma dissidencia profunda entre as suas opiniões e as minhas. Em toda a parte as questões de impostos são das que mais caracterisam as diversas opiniões politicas; e seria muito desagradavel para mim, que milito como soldado obscuro nas fileiras do partido progressista, se tal divergencia existisse entre as minhas opiniões e as de um dos mais distinctos campeões desse partido.

O illustre deputado disse que o imposto, considerado em si, é sempre um mal, mas que esse mal póde converter-se em bem pela sua util e proficua applicação. Que seria sempre largo em votar a despeza da instrucção publica, dos melhoramentos da viação, e de tudo quanto podesse tender a desinvolver os interesses moraes e materiaes do paiz. Que o principio a que se dava o nome de fomento, não se oppunha ao da economia, antes se completavam um pelo outro.

Estou perfeitamente de accôrdo em todas estas verdades. Tambem não acredito exclusivamente na economia como principio salvador, mas julgo-a indispensavel, não só pelo effeito moral, mas porque todos os recursos que possa prestar ao paiz, devem ser dirigidos ao desinvolvimento da sua riqueza e da sua prosperidade. Tambem intendo que o imposto, considerado em si é sempre um mal, porque ou vai cercear a subsistencia das classes populares, ou impedir até certo ponto a formação de novos capitaes que, deixados á sua acção natural, iriam fecundar a agricultura e a industria.

Nem por isso é indifferente a questão da escolha dos impostos, mas essa questão é só de comparação e de preferencia: é facil, principalmente a quem possue a intelligencia e os conhecimentos do nobre deputado, combater em detalhe cada um dos impostos, o quasi todos elles, particularmente o imposto de consumo e o imposto directo de quota, foram derrotados pela analyse vigorosa de s. ex.ª

Na questão da fórma do imposto não póde oppor-se a escola economista á escola socialista: é esta uma das questões mais debatidas entre os economistas, e de certo a sciencia não achou ainda a solução completa do problema; nem é artigo de fé qualquer opinião a este respeito; (O sr. Passos (Manoel): —. Apoiado) mas é verdade que a maior parte dos economistas modernos preferem o imposto directo ao indirecto, e a questão versa mais sobre o modo de o estabelecer. Neste ponto tambem são geralmente concordes as opiniões socialistas.

O illustre deputado o sr. Cunha disse que, á excepção de Mr. Thiers, todos os escriptores de boa nota são oppostos á contribuição de repartição: de certo o illustre deputado não se deu ao incommodo de os lêr, porque encontraria, em muitos desmentida a sua asserção e bastará citar, para não cançar a camara com a ostentação de citações faceis, a opinião de Mr. de Audiffret, e Du Puynote no seu excellente livro sobre o imposto, que combate a opinião contraria de Mr. Passy.

Se o illustre deputado pede aos seus adversarios que lhe citem auctoridades, de certo não encontraria muitas em que firme a sua proposição, de que é par-

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tidista intractavel do imposto indirecto. S. ex.ª, com o apoia da sua opinião, leu uma pagina de um escripto de Mr. Perreymond. Esse illustre escriptor, que os infortunios da sua patria fizeram emigrar para Portugal, e hoje vive entre nós, o, como s. ex.ª saberia se lesse o livro, todo partidario da escola socialista. Se elle combate o imposto do repartição, como se acha estabelecido em França, combate mais ainda o imposto indirecto. Eu, que conheço Mr. Perreymond, e aprecio a sua intelligencia, vejo-me obrigado a protestar em seu nome contra idéas que se lhe pertendem attribuir, posto que não partilhe todas as suas idéas, nem pertença á mesma escola. Mr. Perreymond, fazendo a critica de todos os impostos actuaes, conclue propondo o imposto progressivo sobre o capital. Veja o illustre deputado como as auctoridades que esta, se voltam contra elle. A doutrina daquelle distincto escriptor levar-nos-hia a um campo inteiramente» opposto ao que o illustre deputado escolheu para si.

Sr. presidente, tambem não é exacto apresentar-se a Inglaterra como o paiz onde existe quasi exclusivamente o imposto indirecto. Em dos escriptores, a que se referiu o illustre deputado o sr. Passos (Manoel) Mac Culloch, observa que além do land-tax, a Inglaterra paga pelo imposto directo o subsidio dos pobres, o imposto para sustentação do clero, e a maior parte dos impostos locaes, de maneira que, apesar de serem os impostos geraes indirectos na sua maxima parte, aquelle escriptor reputa a propriedade ingleza onerada no dobro cio que o está a propriedade em França, onde o imposto geral directo está n'uma proporção maior. Mr. Du-Puynode calcula em 430 milhões de francos a somma que paga a propriedade ingleza por impostos directos, e mesmo em relação aos impostos geraes é sabida a tendencia que se tem manifestado nos ultimos tempos para substituir gradual e progressivamente o imposto directo ao indirecto; em um dos seus recentes trabalhos diz Mr. Leon Faucher, que no anno de 1831 entravam em uma receita total de 44. milhões de libras, 4 milhões de impostos directos; e hoje em uma receita de 48 milhões, entram 10 milhões destes impostos. Esta tendencia preconisada por 2 homens illustres, aos quaes o nobre deputado se referiu, Hurkisson e Parnell, foi levada a effeito por sir Robert Peei, que, se não foi como o illustre deputado disse um free lrador, foi sem duvida uma elevada intelligencia, e um estadista dotado de um eminente bom senso, que dis.so deu a maior prova, acceitando a reforma indicada pela opinião, á frente da qual se collocára Cobden, esse homem notavel, cujo nome encherá por certo alguma das paginas mais brilhantes da historia do nosso seculo.

O illustre deputado, po-lo que não se pronunciasse abertamente contra o octroi, appellou para as suas opiniões emittidas na camara passada, quando se tractou da reforma da alfandega das sete casas: estas opiniões não são, nem podem ser favoraveis a tal imposto, e estou certo que s. ex. só o admmitte como um meio transitorio de receita, mas que o reputa como o mais vexatorio de todos os impostos. O imposto do consumo tende inevitavelmente a elevar o preço das subsistencias, e as subsistencias caras significam a miseria do maior numero, quando a população é densa; e quando o não é, significam um estorvo a toda a producção pela elevação do salario.

O meu illustre amigo á quem me refiro disse tambem que, se o octroi é condemnavel, não lhe parecia que o podesse ser o imposto da alfandega; nesta parte sinto não poder estar de accordo com a opinião de s. ex.ª Os direitos de alfandega, considerados como protectores, não são imposto, porque o seu objecto é evitar a entrada dos generos estrangeiros para o affastar da concorrencia com os nacionaes; mas considerado o imposto da alfandega pelo lado fiscal, tem em grande parte os mesmos defeitos que o octroi, porque a experiencia tem demonstrado em toda a parte que, para as alfandegas renderem, é preciso lançar direitos nos generos, cujo consumo se estende a todas as classes da sociedade. Os generos que tem um consumo restricto ás classes ricas, produzem sem-pie pouco, ainda que o direito seja forte. O imposto sobre o algodão, a lã, o linho, o ferro, tende a tornar cara e difficil a vida do operario e do trabalhador, da mesma maneira que o imposto sobre as materias.

Tambem não posso concordar que o imposto directo sobre a agricultura dê os mesmos resultados que o octroi. O meu nobre amigo, o sr. Passos (Manoel) observou com muita razão que, para se saber quem paga definitivamente o imposto lançado á agricultura, era necessaria uma analyse severa do thema da renda. Sem entrar nessa analyse, porque não o permittem os meus poucos recursos, nem se tracta aqui de uma discussão academica, direi que a doutrina de Ricardo é hoje reputada mais como um esforço de intelligencia vigorosa, do que como uma verdade reconhecida e demonstrada.

Hoje muitos economistas, e entre elles mr. Du Puynode, sustentam, a meu ver, com muito boas razões, que o imposto sobre aleira, ou sobre a agricultura, não é na maior parte dos casos pago pelo consumidor; mas, ainda quando se julgue verdadeira a doutrina opposta, não é indifferente á incidencia do imposto. Tomando, por exemplo, o vinho, será porventura indifferente que o fisco tome para si uma parte da renda do proprietario da vinha, ou que faça pagar um certo imposto ao genero na sua entrada para o logar do consumo! Bastará notar que no primeiro caso se attende ao valor venal do producto, e no segundo, no octroi, attende-se só á quantidade; aqui, o imposto, em vez de ser proporcional, e tanto mais forte em relação ao valor do vinho, quanto mais inferior é a sua qualidade; aqui, o genero inferior, que se destina ao consumo das classes desvalidas, é de 100 por 100, ou mais; o do genero de melhor qualidade paga menos em relação ao seu valor; o genero superior paga um imposto insignificante; de maneira que se póde dizer com razão, que este imposto é progressivo, mas na razão inversa da fortuna dos que o pagam.

Tambem não posso admittir, que ao imposto indirecto se dê o nome de voluntario: essa denominação, que lhe dão os seus partidarios, não é exacta. Em um paiz onde é collectado o pão, o vinho o azeite, a carne, todos os objectos de vestuario, póde, por ventura, dizer-se que é livre ao contribuinte deixar de pagar o imposto? Quando as primeiras necessidades da vida não podem satisfazer-se, sem que intervenha o fico, o dilema para o contribuinte está estabelecido entre o pagamento do imposto, ou a privação da vida... Antes poderá dizer-se que é voluntario o imposto directo, quando se fixa um numero de renda para seu pagamento.

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Ninguem é obrigado a ser proprietario ou capitalista, e quem o não quer ser, tem um meio muito commodo de consumir o capital; mas eu não receio que ninguem queira tornar-se pobre, para se eximir ao pagamento do imposto, (nem que ninguem deixe, sendo pobre, de querer ser rico, para não pagar.

Passando II comparação do imposto directo da quota com o de repartição, o illustre deputado observou que Sir. Robert Peei, lendo de preencher o deficit, causado pela reforma dos cereaes, recorreu ao income-tax imposto de quota, e não ao land-tax, imposto de repartição. S. ex.ª sabe melhor que eu o que é o land-tax; s. ex. sabe perfeitamente que o land-lax, imposto de repartição na sim origem, foi fixado definitiva e permanentemente em 1798, em unia certa somma de pello de 2 milhões esterlinos. Pitt, fixando o imposto, facultou aos contribuintes o resgate delle, por uma certa somma de prestações, applicando o producto desse resvale á amortisação da divida consolidada; esta medida de Pitt foi uma das consequencias das enormes despezas da guerra com a França; deste modo o imposto converteu-se em uma especie de censo ou fôro; é mesmo por este lado que o land-tax é fortemente censurado, porque ha nelle, por assim dizer, uma especie de alienação, em favor do estado, de uma parte do dominio predial.

Ao mesmo tempo que Pitt permittiu o resgate do land-lax, estabeleceu o income-tax, e isto prova a exactidão com que o nobre deputado asseverou a habilidade dos financeiros para darem novas fórmas nos impostos, quando se veem apertados de necessidades verdadeiras ou ficticias. O resgate do land-tax em Inglaterra subia approximadamente a da totalidade; ainda hoje é permittido, postoque tenha caido em desuso, porque as condições já não convidam.

Sendo assim, como podia Sir Robert Peei recorrer ao land-tax, convertido n'uma especie de censo permanente com faculdade de remissão? Não houve por tanto na adopção do income-tax preferencia de systema, houve a adopção do unico meio possivel, em quanto os vestigios do antigo land tax não tivessem de todo desapparecido.

Além disso a censura do income-tax foi feita pelo illustre deputado a quem me refiro, com toda a lucidez da sua alia intelligencia, quando s. ex.ª demonstrou a impossibilidade de se sujeitar ás mesmas regras, e a mesma quota proporcional, o capital movel e o capital immovel, em cada um dos quaes se dão circumstancias inteiramente diversas.

De tudo quanto se disse, não vimais que um só argumento, que especialmente se empregasse contra o imposto de repartição: é a elasticidade deste imposto; a este argumento deu-se-lhe fórmas diversas, ora comparando-se o imposto a uma grande prensa hydraulica, applicada á fortuna publica, ora manifestando-se o receio de que um máo governo, ajudado por um máo parlamento, abusasse desta arma poderosa.

A isto já se respondeu, que quando taes casos se derem, o mal ha de manifestar-se sempre, seja qual fôr o systema.

Quando os governos ou os parlamentos futuros poderem preterir, não só as regras da justiça e da equidade, mas as do simples bom senso, e as que lhe dictar o interesse da sua propria conservação, querendo fazer pagar ao paiz mais do que elle póde e deve pagar, e pertendendo estancar a origem das receitas publicas pela avidez fiscal; quando uma tal situação existir, não será por certo o systema de quota que evitará taes desacertos. A elevação da percentagem ou os addicionaes dariam o mesmo resultado. (Apoiados) Isto parece-me tão claro e evidente, que não sei como se insiste em attribuir ao systema um perigo, que é commum a todos; mas se fossem precisos factos, bastaria reproduzir os dois, que citou o meu nobre amigo o sr. Passos (Manoel): o primeiro é — a resposta dada por Napoleão, quando lhe observaram a pequena receita que deviam produzir os chamados direitos reunidos, dando a intender que se tractava apenas de montar a machina, que mais tarde havia de funccionar em maior escala, como os factos demonstraram depois — ahi tem os nobres deputados a elasticidade reconhecida e practicada no octroi: o segundo facto é — o dos 45 centesimos addicionaes, lançados em 1848 por mr. Garnier Pages: — não se recorreu então a augmento na somma da contribuição a repartir, recorreu-se a um imposto addicional, isto é, a um meio commum a ambos os systemas. Não discuto agora se o illustrado ministro da republica franceza acertou no melhor meio de saír das difficuldades em que se encontrou; o que pertendo mostrar é, que os 45 centesimos addicionaes, tanto leriam sido lançados no systema de quotas, como no de repartição. Não foi neste systema que ellas tiveram origem, mas sim nas circumstancias extraordinarias e difficeis em que se viram as administrações que se se seguiram á proclamação da republica.

Se se pertende que no systema do repartição é maior a elasticidade, e se ella a Fiança como typo desse systema, será conveniente examinar -a marcha que tem seguido este imposto naquelle paiz, mas essa marcha demonstra exactamente o contrario daquillo que i» illustres deputados que impugnam o projecto, pertendem demonstrar.

Todos sabem que o imposto de repartição foi estabelecido em França em 1791 pela assembléa constituinte; nessa época não havia em França nem cadastro, nem melhores bases para ser calculado o imposto, do que as que ha actualmente entre nós.

O illustre deputado a quem respondo, notou com muita rasão, que o estabelecimento deste imposto foi um grande progresso, porque supprimiu os privilegios escandalosos de que abusava o clero e a nobreza. Nessa época foi calculada a renda predial em 1:200 milhões de francos, e de certo para este calculo não houve bases muito seguras; o imposto foi lançado na somma de 240 milhões de bancos; mas pouco depois em 1797, em 1799, e em outros annos seguintes, foi successivamente reduzida a somma do imposto, e novas reducções se deram depois da organisação do cadastro; de maneira que em 1830 a contribuição foi de 154 milhões, isto é, menos de da somma primitiva. Estes fados li-os no livro de mr. Du Puynode, que já ci lei: não duvido declara-lo, porque os factos, a não se improvisarem, estudam-se nos livros ou nos jornaes.

O mesmo escriptor reproduziu algumas comparações feilas no corpo legislativo pelo relator do orçamento das receitas para 1851, e destas comparações resulta, que tendo sido votada a contribuição principal em 1832, na somma de 154.794:000 francos,

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subiu em 1850ª 159.639:000 francos, havendo apenas a differença para mais de 4.845:000 francos; mas tomando a contribuição em os addicionaes, foi em 1832 de 244.873:000 francos, e em 1850 de francos 281.198:000; deste modo veiu a ser o augmento proveniente dos addicionaes 34.479:000 francos.

Destes factos resulta claramente, que mesmo em França, onde o systema de repartição está ha muito tempo estabelecido, tem se procurado o augmento da receita, principalmente pelo meio que é commum a ambos os systemas, isto d, pelos addicionaes, e não pela elevação da somma a repartir.

Parece-me, portanto, não só pela rasão, mas pelos factos, que d pouco fundada a supposição de haver neste imposto maior elasticidade, que no imposto de quota.

Resta-me responder a uma observação apresentada pelo illustre deputado, isto é, que a contribuição de repartição, como se acha estabelecida no decreto de 31 de dezembro, assenta sobre uma base monstruosa, qual e a dos lançamentos actuaes. Se o systema actual tem produzido e continua a produzir essa desigualdade monstruosa entre os districtos, entre os concelho =, e entre os contribuintes, não vejo rasão para que seja sustentado (Apoiados) antes me parecia mais rasoavel que se adoptasse um novo systema, que tem em si mesmo o principio que tende a corrigir essas monstruosidades, isto e, a solidariedade dos contribuintes, e o interesse de todos, e de cada uni, na justa repartição do imposto, o que por certo se não dá no systema actual. Assim, embora se tome por ponto de partida o actual estado de cousas, a desigualdade póde successivamente corrigir-se, e este resultado não se obtem conservando o estado actual.

Eu tambem desejo, como o illustre deputado, maior ingerencia do elemento popular na organisação das juntas geraes de districto, mas tambem nisto não vejo rasão para se preferir o systema actual de lançamento, no qual não ha nem sombras de ingerencia do elemento popular ao systema de repartição, no qual intervém os corpos electivos

Reconheço os inconvenientes da demasiada mobilidade do imposto predial, mas julgo maiores ainda os da sua fixação permanente, porque essa fixação, longe de destruir a proporcionalidade do imposto, álem de o converter n'uma especie de censo, como o land-tax, produz em muitos casos graves injustiças.

Se a permanencia do imposto é até certo ponto um estimulo a maior producção, é certo que muitas vezes o augmento da riqueza predial provém de causas alheias á actividade do proprietario ou do agricultor; fazendo-se, por exemplo, um caminho de ferro entre Lisboa e Santarem, como eu creio que ha de fazer-se, de certo provirá dahi um augmento de riqueza para os proprietarios de terrenos proximos ao caminho de ferro; mas sendo o caminho pago pelos impostos que paga todo o paiz, seria uma injustiça se esses proprietarios nada pagassem para o estado em rasão da sua maior fortuna. No imposto de repartição vejo eu maior facilidade de se estabelecer um meio termo rasoavel entre a demasiada estabilidade, e a demasiada mobilidade do imposto predial.

Sr. presidente, vou terminar; mas não o posso fazer, sem alludir ao que se disse dos precedentes do partido progressista: se esses precedentes só tivessem sido allegados por quem abertamente se declarou partidario das ideias reaccionarias, divorciando-se completamente dos principios democraticos, que em outro tempo abraçou, não daria resposta alguma; porque não intendo que os partidos devam satisfação do seu procedimento a quem abandona as suas bandeiras; mas, tendo-se referido a esses precedentes, um dos caracteres mais distinctos da opinião progressista, um dos seus mais respeitaveis chefes, o illustre deputado o sr. Passos (Manoel) a cuja intelligencia e virtude tributo a maior consideração, julgo do meu restricto dever não passar em silencio por esses precedentes.

Eu não posso talvez isentar a minha responsabilidade pessoal declarando, firme na minha consciencia, que os motivos que me levaram a tomar parte no movimento de maio de 1816, nesse movimento, no qual não me envergonho, antes me ufano de ler tomado parte; nesse movimento verdadeiramente grande e nacional, como foi declarado pela corôa na proclamação de 6 de outubro, que esses motivos não foram a lei da contribuição de repartição: poderia apresentar os documentos officiaes da junta de Coimbra, de que fiz parte, nos quaes constantemente se deram áquelle movimento outras causas, e delle se derivaram outras reclamações, como ainda hoje aqui se allegou. Não o faço, porque nunca duvidei acceitar para mim a parte de responsabilidade que me couber em actos politicos do partido a que me honro de pertencer: mas, se a contribuição de repartição, ou antes a fórma demasiadamente complicada e vexatoria, pela qual foi estabelecida em 1815, e as circumstancias que então a acompanharam, foram na mão do partido progressista uma arma poderosa para debellar um governo ominoso, convencido eu, como estou, de que o principio é bom, e conforme com as doutrinas mais liberaes, intendo que devo, e devem os meus correligionarios, que pensam da mesma fórma, concorrer com o seu voto para o estabelecimento desse principio; e acredito que só com o apoio do partido progressista será possivel desde já substituir este systema ao systema viciosissimo do lançamento. Intendo que practicando assim os que intendem que este systema é melhor, não se desairam, como não se desabaram os torys reformistas que acompanharam Sir Robert Peei na reforma de 1846. Então houve tambem quem declarasse renegado o illustre estadista, mas esses mesmos, quando depois foram poder, acataram a reforma.

Eu respeito sinceramente a opinião do meu illustre amigo, o sr. Passos (Manoel) que, duvidando da utilidade do principio, ou da sua opportunidade, propoz o adiamento; mas espero que s. ex.ª, quando vier sentar-se naquellas cadeiras (Indicando os logares dos srs ministros) terá dissipado as suas duvidas, e virá declarar ao parlamento, que não restabelecera o imposto de quota, como Lord d'Israel declarou no parlamento inglez que sustentava o bill dos cereaes, a cuja votação se tinha opposto. Taes factos, longe de deslustrarem os homens publicos, são a manifestação solemne do progresso.

Concluo, votando pelo projecto, e rejeitando todos os adiamentos. Negar a votação do imposto é a ultima razão dos parlamentos; não julgo que seja esse o sentido com que foram propostos os adiamentos; mas vejo nelles, debaixo de diversas fórmas; a rejeição do principio da repartição, e tenho a convicção de que adiar agora, significaria rejeitar. Voto pelo

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principio, e approvo o projecto. (Muitos apoiados) O sr.. — in tonto Feio: — Peço a v. ex.ª queira consultar a camara sobre se julga a materia do adiamento sufficientemente discutida.

Assim se decidiu.. O sr. Presidente: — Deu conta das differentes propostas que havia sobre a mesa.

O sr. Passos (Manoel): — Peço licença para retirar a proposta que mandei para a mesa, e para ajuntar a minha assignatura á proposta do sr. Carlos Bento.

A camara concedeu que fosse retirada) e successivamente foram rejeitadas as propostas de adiamento dos srs. Pinto de Almeida, e Carlos Bento.

O sr. Presidente: — Continua por tanto a discussão do projecto.

O sr. Carlos Bento: — Sr. presidente, começo por declarar que voto contra o projecto. É tão importante esta questão, que não póde deixar de ressentir-se de ser tractada no estado de adiantamento em que se acha a sessão, e por consequencia não é insolito o propôr o seu adiamento, o qual não e outra cousa mais do que a revalidação do adiamento já proposto pelo nobre ministro da fazenda, depois de decretada a medida, com o fundamento de não estarem preparados os trabalhos para a sua execução. E tambem não é insolito que venha propôr-se o adiamento deste projecto, depois que foi adiada uma questão de um imposto, que rende para o estado 1:300 e tantos contos.

Ha tambem outro motivo que concorre para que este projecto se deva adiar, e é que as circumstancias do paiz hoje não são as mesmas de quando foi publicado o decreto de 3] de dezembro, que reformou a pauta das alfandegas, quando não se sabia que essa reforma havia de produzir de menos a receita que produziu; e então se esta contribuição na sua fixação é movel, mais um fundamento para se dever saber se ha de ser votada na occasião em que o governo perde centenares de contos de réis na diminuição dos direitos das alfandegas.

A cifra da contribuição de repartição não é, como se diz, a mesma da decima, porque a excede em mais 240, contos de réis, dos 2 por cento para falhas. (O sr. ministro da fazenda: — Então 2 por cento de 1:200 contos são 24-0 contos?.. f Não sabia isso).

Sr. presidente, não havia exactidão quando se diz — que as tendencias em toda a parte são de renunciar ao imposto sobre o consumo — porque effectivamente não é assim.

Eu tambem leio o que se passa em Inglaterra, e vejo que alli, por exemplo, o imposto sobre a cerveja rende 5 milhões de libras esterlinas; quer dizer, dá um rendimento tão forte como todo o rendimento do imposto da propriedade em Inglaterra.

Mr. D'Israel propoz a diminuição do imposto sobre a cerveja, e Cobden combateu esta proposta, e combateu-a vivamente; e atraz delle foi a camara toda.

Mr. Gladstone dizia, que a contribuição directa da propriedade era considerada como uma cousa que tinha o caracter de extraordinaria, e marcou elle já o prazo em que essa contribuição deve parar..

Bem sei, que as promessas dos ministros da fazenda, a respeito do prazo em que Ira de acabar um tal ou tal imposto, não são promessas de uma seriedade tal, que todos devam acreditar; mas já é alguma cousa para o systema a declaração do ministro da fazenda, de que um certo imposto directo ha de acabar dentro de um certo prazo; por consequencia, na Inglaterra ainda hoje se reconhece, que o imposto directo, que está pesando sobre a propriedade, é um imposto este que só deve servir para os casos de guerra.

O que é o projecto em discussão senão um adiamento? Pois o que faz esta lei, que ora se discute í Esta lei, como a propriedade é a mais attingivel, a mais facil de trazer para o fisco, foi de que tractou; as mais questões sobre as materias que fazem objecto de contribuições directas, adiou-as.

Quanto á decima industrial ficou para mais tarde; adiou o imposto ácerca do qual haviam tantas e tão repetidas reclamações, pela enorme e monstruosa desigualdade com que é lançado; este adiou-se; está adiada a decima industrial e o maneio; o sr. ministro da fazenda tambem adiou a este respeito, porque a resolução da questão, relativa a estes impostos, ficou adiada.

Está pois adiada a decima industrial e o maneio.

Sr. presidente, poucas palavras direi, por que sei que ellas não serão attendidas; sei perfeitamente que nada servirão para resolver a questão, sei mesmo que só serviriam para augmentar a impaciencia da camara, que quer approvar a medida em discussão. — Entretanto, não posso deixar de dizer em abono da minha proposta, que quem propunha o adiamento da questão que se tracta, não propõe o adiamento de um systema que se suppunha desde já excellente sem contestação nenhuma; por isso, para o suppôr tal, era preciso ignorar completamente tudo quanto se escreveu a respeito deste objecto, mesmo em França.

Podia ha 8 annos esperar-se que este systema desse grandes vantagens; mas hoje estão de todo perdidas taes esperanças, hoje conhece-se positiva e claramente que tal systema não póde subsistir; os inconvenientes que apresenta, são palpaveis e grandes.

Eu ha pouco tempo ouvi, com muito prazer, na outra camara collegislativa a um distincto caracter, um illustre ministro da época em que entre nós foi mandado pôr em execução o systema da contribuição directa de repartição, o sr. visconde de Castro, cuja capacidade nestes negocios não póde contestar-se; (Apoiados') a este illustre cavalheiro ouvi eu declarar, que estava profundamente arrependido do passo que linha dado naquella época; por consequencia,) ara mim é de bastante importancia uma tal declaração de um homem que foi membro de uma administração que publicou aquella mudança de systema; mais um motivo para pensar sobre similhante objecto. — Podia-se estar enthusiasmado ha 8 ou 10 annos acêrca deste systema, mas hoje, não. — Peço licença para citar uma auctoridade, visto que se tracta, segundo se diz, do systema mais brilhante. — Mr. Lamartine dizia, que o melhor de todos os impostos era o mais antigo; e de certo ninguem póde negar que o imposto estabelecido ha mais tempo, é o que tem mais facilidade de recepção, é o que offerece menos repugnancias da parte dos povos, porque já tem delle uma longa practica, e estão a elle habituados.

O imposto que vai agora lançar-se, traz augmento de despeza? Peço ao sr. ministro da fazenda que declare, se sim ou não traz augmento de despeza o lançamento do novo imposto? Traz, ninguem o póde contestar; e traz augmento de despeza, depois de votado o orçamento. E o equilibrio do orçamento entre

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a receita e despeza é equivoco: estamos augmentando todos os dias a despeza publica de pé no estribo: temos votado já augmentos de despeza consideraveis — o deficit tem augmentado; faço votos para que não nos demoremos muito — senão, quanto mais nos demorarmos, mais se augmenta o deficit, porque mais augmentos de despeza votaremos; tenho dó do sr. ministro da fazenda; apezar de que s. ex.ª tem grande culpa, porque s. ex. tem proposto alterações de impostos, uns que vão fazer diminuir a receita publica, e outros que vão augmentar a despeza publica; no imposto de que se tracta, vai augmentar-se uma nova despeza de 2 por cento; por consequencia s. ex.ª, pela sua parte, tambem contribuiu para uma peor situação.

Mas o imposto directo, lançado por esta fórma, é preferivel a todos os outros impostos? Tem-se dicto que é, porque o imposto, lançado por esta fórma, admitte a solidariedade dos contribuintes; que as denuncias darão logar a que ninguem pague menos, do que deve pagar. Pois este systema de imposto fundou-se em França, ou em parte alguma, na esperança de que se ha de denunciar mais? Pois a contribuição de repartição assentou, por ventura, nesta base? Em França disse-se que a base para a contribuição de repartição devia ser o cadastro. Fez-se o cadastro, gastou-se nisto 150 milhões, mas a mesma França viu que esta base não prestava. Mas ninguem fallou na solidariedade dos contribuintes; ninguem esperou que os contribuintes se encarregassem de fazer o cadastro das propriedades dos seus visinhos. Nós porém, espetamos tirar resultados desta repartição, pela fiscalisação de um visinho para com outro! Isto é admiravel.

E, sr. presidente, não será este systema de contribuição um elemento de desordem no paiz? E note-se que não me refiro a movimentos politicos. E precisa o paiz ler mais este elemento de desordem com relação á segurança? Desde que se determina a somma por cada concelho, e nestes o que pertence a cada morador, é uma occazião de contestações, rixas, processos, e animosidades. Isto será fatal entre nós, quando com uma facilidade entre nós, de traz de um valado se assassina um individuo: é necessario ter muito em vista as circumstancias actuaes, em que nos achamos a respeito da segurança publica.

Ora, sr. presidente, citar a França a respeito de impostos directos, é lealmente não citar bem; tenho muito amor e sympathia por aquella nação, mas neste ponto, e a respeito deste objecto, não póde ser cilada com vantagem. É notavel que quando nós vamos para a França, adoptando o systema de repartição, vem a França vindo para cá, adoptando o systema de quota A contribuição de repartição é muito caprichosa e desigual; e por consequencia todas as circumstancias nos levam a não adoptar este systema.

Sr. presidente, será occasião opportuna de fazer ensaios, quando s. ex.ª o sr. ministro da fazenda está encarregado de duas pastas?

Por ventura s. ex. pode prestar toda a attenção que demanda este objecto? Digo isto não para fazer politica; mas por bem da administração.

Sr. presidente, concluo por declarar que a minha opinião é cada vez mais firme em considerar grande temeridade adoptar-se uma nova forma de contribuição directa, tanto mais, quanto que por algumas reformas estão compromettidos no impostos indirectos na sua importancia; e é uma temeridade da parte da camara votar este imposto, quando está pendente a questão que diz respeito á abolição do monopolio do contracto do tabaco e sabão, cuja base é o imposto indirecto; quando se vê que contra o imposto indirecto ha uma cruzada ião auctorisada, que deve fazer ler graves apprehensões a respeito de que serão os impostos indirectos, os que devem occorrer a todos os desfalques, provenientes da alteração nos mesmos impostos: ha de ser o imposto indirecto que ha de pagar as custas de todos estes nossos romances, e de todos os inconvenientes resultantes destes nossos ensaios.

Sr. presidente, não é na agonia das ultimas horas da sessão da camara, que deve resolver-se uma questão tão complicada, que pode trazer inconvenientes e consequencias, que eu desejo que se não realisem. Por consequencia voto contra o projecto.

O sr. Antonio Feio: — Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de consultar a camara, se quer prorogar a sessão até se votar este projecto.

Assim se resolveu.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu não impugno o requerimento do sr. deputado; mas peço a v. ex.ª que tenha a bondade de fixar o praso da hora da prorogação.

O sr. Presidente: — Eu não tenho que fixar praso: a camara decidiu, que a sessão se prorogasse até se ultimar a discussão e votação deste projecto. (Apoiados)

O sr. ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, eu não vou de certo cançar a attenção da camara; mas parecia-me, que é necessario responder, ainda que brevemente a algumas observações feilas pelo illustre deputado, e meu amigo o sr. Carlos Bento; e foi essa a razão porque eu pedi a palavra a v. ex.

O illustre deputado propôz um adiamento: intendo que a sua proposta de adiamento, considerada debaixo do ponto de vista de franqueza e lealdade com que foi apresentada, e de que eu dou testemunho, deve ser considerada como meio de evadir a questão, para mais tarde ser rejeitada.

E certo que, collocando as cousas no seu verdadeiro campo, e no terreno em que as vejo, porque não sou obrigado a vêr as questões debaixo do ponto de vista em que as encaram todos os illustres deputados, e os quaes, estou persuadido procuram acertar, eu declarei na camara que o adiamento do projecto, nestes lermos, nestas circumstancias e nesta sessão, era a rejeição completa do mesmo projecto. Esta opinião, sr. presidente, é ainda a minha neste momento: faço justiça ás intenções do illustre deputado, nem quero dizer com isto, que quem propõe o adiamento, quer illudir a questão, ainda que esse meio empregado nos debates publicos é sempre licito a todos Sem envergonhar ninguem. Mas eu que tenho por base do meu proceder neste parlamento — a franqueza e a verdade —; eu que desejo sempre tractar todas as questões como ellas na realidade são, intendi, e intendo ainda, que approvar neste momento o adiamento desta questão, isso imporia nada menos do que a sua rejeição, e não é só a sua rejeição por agora, é a sua rejeição por muitos annos. (Apoiados) Quando se vota uma moção qualquer, é necessario ler em consideração não só o modo porque essa moção está formada, mas tambem muitas outras circumstancias que com ella tem relação. (Apoiados)

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Ora, quaes são as razões com que se tem sustentado o adiamento? As razões, ou que se tem parecido apresentar como razões, são a — inefficacia do projecto, e que se por ventura elle chegar a ser lei do estado, isso póde comprometter summamente as rendas publicas. Mas os illustres deputados, levados do seu grande enthusiasmo pela contribuição de quota, enthusiasmo que eu tenho o sentimento de não poder partilhar, fizeram censuras ao systema propriamente dicto, de contribuição de repartição. E pergunto eu, se se votasse a proposta do illustre deputado, qual era a intenção da camara? A intenção da camara era rejeitar este systema. Torno a dizer, não faço injuria a ninguem, nem está no meu caracter fazel-a, sobre tudo, quando me dirigo, ou quando estou respondendo a cavalheiros que estimo e de quem me preso de ser amigo.

Mas o illustre deputado, sem questão nenhuma, quando propoz a revogação da lei da contribuição de repartição, não meditou bem nas consequencias que poderiam provir da adopção da sua proposta: parece-me que s. ex.ª propoz a revogação da lei da contribuição de repartição, sem meditar um pouco nos inconvenientes que actualmente dahi se poderiam seguir. Póde ser que eu me engane: póde ser que a proposta do illustre deputado seja muito boa, e não tenha o menor inconveniente na sua adopção, mas como ninguem póde vêr as cousas, se não com os olhos da sua intelligencia, eu fazendo-o assim, não sou a mais obrigado.

Mas diz-se — o governo já propoz ò adiamento; vós, governo, é que viestes propôr aqui o adiamento desta questão, e por tanto, sois hoje contradictorio, pedindo agora a sua discussão. A fallar a verdade não posso comprehender bem a força deste agrumelo. Pois porque eu propuz um adiamento, quer isto dizer que as questões se devem adiar ad aectrnum? Se eu por parte do governo propuz n'outra occasião o adiamento da execução do decreto de 31 de dezembro, é porque a força das circumstancias a isso me obrigou: é porque uma necessidade imperiosa assim o reclamava.

O illustre deputado e meu amigo o sr. Avila fez durante a discussão da resposta ao discurso da corôa, uma pergunta ao governo: s. ex. mostrou as apprehensões que tinha de que a lei da contribuição senão podesse pôr em vigor este anno, em consequencia da falla de tempo para os trabalhos preparatorios, e o facto é que, as apprehensões do illustre deputado verificaram-se. A camara discutiu mais largamente do que eu esperava a resposta ao discurso da corôa e os actos da dictadura, e o que veiu a acontecer, é que, só muito tarde, só depois deterem passado as épocas, dentro das quaes se deviam começar os Trabalhos preparatorios, é que o governo estava habilitado a poder por pui vigor o systema da contribuição de repartição. O governo viu-se dentro de um circulo, do qual lhe era impossivel saír: não era licito a ninguem transpor essa barreira que inhabilitava o governo a levar por diante este decreto nessa occasião, e por tanto, que remedio tinha o governo, senão adiar a execução desta medida até que houvesse tempo, para que ella se podesse pôr em execução?

Mas agora apresenta-se um adiamento até 1855! Não sei para que seja um adiamento tão longo. O governo não precisa tanto espaço de tempo para fazer os regulamentos necessarios, a fim de estabelecer o systema da contribuição de repartição. Se o projecto fôr approvado como espero, tal qual se apresenta, estou persuadido e póde a camara ler a certeza de que hei-de empregar todos os meios ao meu alcance, com a firmeza de que tenho dado muitos documentos á camara, para que o projecto se possa levar á execução no tempo prefixo, a fim de poder surtir todos os seus effeitos.

Já se vê que não posso aceitar o adiamento proposto pelo illustre deputado, e se eu, torno a dizer, propuz o adiamento da execução deste projecto para outra occasião, é porque o estado das cousas era diverso, e as razões são outras: então não havia tempo, e hoje ha tempo sufficiente para a lei se poder pôr em execução.

Mas o illustre deputado está tão possuido de um tal enthusiasmo pelo systema da quota, que até em um periodo do seu discurso, exaggerou demasiado os encargos da contribuição de repartição: embora eu lhe pedisse para rectificar o calculo; embora lhe dissesse que havia engano, o illustre deputado foi a tudo inflexivel e disse — acabou o equilibrio da receita, lá apparece o deficit: são mais 210 contos que accumulam á nossa despeza — e no fim de contas, são 2 por cento para falhas. O illustre deputado insistiu em que eram 240 contos, quando é certo que 2 por cento sobre uma verba de 1:200 contos, dá apenas 24 contos, e não 240 contos como s. ex. assegurou.

Mas esta mesma verba de 24 contos póde não ser necessario dispender: não é uma despeza certa, nem segura; o illustre deputado sabe isto muito bem. Ora

O illustre deputado pensa tambem que esta somma não está votada, mas engana-se muito: votou-se no orçamento; já se auctorisou-o governo no orçamento a fazer as despezas necessarias para pôr em execução este systema. A camara discutiu os actos da dictadura, se me não engano, até não haver mais ninguem inscripto: no orçamento não me lembra que se apagassem as discussões. E preciso por tanto confessar um facto: não se póde dizer com verdade que se não discutisse o decreto de 31 de dezembro, porque eu mesmo parece-me que me occupei desse objecto, assim como se occuparam alguns outros illustres deputados, que vejo presentes, e a quem a camara ouviu os seus discursos. A camara alta discutiu tambem largamente o mesmo assumpto. Alas se apesar destas duas discussões, algum sr. deputado intendia dever ventilar de novo esta questão, teve muitas occasiões para o fazer durante a discussão do orçamento; porém não o fizeram; até guardaram completo silencio, talvez por julgarem isto objecto concluido.

O governo ha muito tempo que declarou que traria esta proposta á camara antes de se fechar a sessão; effectivamente a proposta está na camara ha muito tempo, e o parecer da commissão tambem ha muito que está distribuido; por tanto, não póde dizer, que neste negocio se anda de salto, ou com menos boa fé. (Apoiados.) f Quando, sr. presidente, me occupei dá reforma

das pautas, não andei de leve; foi uma materia que! me mereceu muita attenção, e que foi discutida muito pausadamente por mim conjunctamente com a commissão que nomeei para tractar della. O meu pensamento, sr. presidente, nesta reforma, foi o de não diminuir a receita pública, e estou persuadido que a receita das alfandegas em relação ao que vem calculada no orçamento, não ha-de diminuir, salvo algum.!

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circumstancia extraordinaria, que a ninguem é dado prever. É verdade que a alteração de dois artigos da pauta, darão por algum tempo, uma diminuição de de receita; fallo do linho e feiro; mas esta diminuição será completamente compensada pelas vantagens que tirarão as nossas industrias de terem estas duas materias primas mais baratas; (Apoiados) mas além disso outros artigos ha que reformaram, no sentido de diminuir os direitos, e que tem produzido augmento de receita; e não de diminuição; (Apoiados) por exemplo, os direitos dos pianos foram reduzidos a menos de 1 terço, e o resultado foi, que deu um augmento de receita; por isso mesmo que renderam em 6 mezes, antes da reforma, 1 conto e lautos mil réis; e depois da reforma, em 6 mezes, renderam 2 contos e tantos mil réis. Os direitos de seda foram diminuidos, e o que aconteceu, foi que, por exemplo, os lenços de seda, que era raro entrarem na alfandega, hoje tem entrado, e este artigo tem produzido augmento de receita. Por tanto, ha muitos artigos que, tendo sido diminuidos, teem trazido augmento de receita. Assim, direi, que não tenho receio da diminuição de receita das alfandegas em relação ao orçamento; não me dá isto cuidado algum, porque tal diminuição não haverá — estou persuadido disto.

Termino dizendo que voto pelo projecto em discussão, porque elle é a consequencia inevitavel do voto que a camara já deu a respeito do estabelecimento do systema de contribuição de repartição (Apoiados)

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, se a camara quer votar, eu não falo. (Vozes: — Fale, fale) Este objecto é muito importante, e não deve discutir-se na altura em que está a sessão. E indispensavel adiar este negocio por este anno, visto os inales porque está passando a agricultura. As vinhas estão soffrendo a molestia que as tem atacado; a colheita dos cereaes não tem sido muito fertil; não ha esperanças de que haja azeite; e neste estado de cousas quando os proprietarios não lêem rendimentos, não deve ir lançar-se a contribuição de repartição. Os que propõem, e defendem o adiamento da discussão deste projecto, não querem com isso significar que se deve rejeitar o systema, nem que é um adiamento indefinido que propõem; não, senhores; propõem que se adie para tempo conveniente. Não ha exactidão, quando se diz, que já na camara houve uma discussão muito larga ácerca deste objecto, por occasião da discussão dos actos da dictadura; quando é certo que tal discussão e votação dos actos da dictadura foi toda em globo, não se deixando até falar os deputados que tinham a palavra pela segunda vez, por quanto a discussão foi abafada, agora mesmo não ha discussão; ha uma obrigação, ha uma pressão empregada para com os deputados, não para discutir, mas sim para votar! E póde dizer-se que a discussão deste objecto tem sido livre? Que tem sido ampla? De certo não.

Não desejo affastar-me da materia em discussão; mas já que o sr. ministro falou nas alfandegas, observarei que não sei a razão porque se diminuiram os direitos nos pianos, no vinho de Champanhe, e nos espelhos, que, sendo tudo objectos de luxo, não havia motivo para essa diminuição; e a prova disso está na opposição que lhe fez a representação da associação industrial do Porto.

Sr. presidente, cingindo-me á materia, começarei por lamentar que progressistas votam hoje por este projecto, quando em 1816 o fundamento principal com que o partido foi chamado á uma, foi para se combater a contribuição de repartição. E como é possivel caír agora em contradicção tão manifesta? Diz-se que o lançamento da decima é máo, por ser feito arbitrariamente; mas perguntarei, como ha-de ser feita a repartição? Quaes são as bazes para ella se fazer? Não ha nada feito, e o que se ha-de seguir é que os que tiverem propriedades longe da sua residencia, não podendo fiscalisar a repartição, hão de ser victimas da desigualdade, o que senão dá pelo lançamento da decima, porque os lançadores tem de se guiar pelo rendimento liquido. Tambem se reconhece que em quanto aos districtos póde haver desigualdade; mas diz-se que em quanto aos concelhos não a póde haver, porque os visinhos do concelho conhecendo esta desigualdade, hão de fazel-a emendar; mas isto é o mesmo que se póde agora fazer. Pois como é que se faziam os lançamentos 1 Como é que um homem que vive lá no interior de um concelho, póde saber como lhe é lançada a decima? Só depois que vem á villa, é que o póde saber. E depois não é só isso, os desgraçados, que não residirem no concelho, esses hão de ser sacrificados como têem sido sempre em todas as leis que tem havido, e que regulam o imposto directo.

Sr. presidente, diz-se que o lançamento da decima é máo pela influencia que exerce o executivo sobre os escrivães de fazenda; mas ha uma differença que para o lançamento da decima ha-de haver uma base, e para a contribuição de repartição não ha base nenhuma. Qual é a base para fazer o lançamento da repartição? Nenhuma. Além de que não se póde dizer que na contribuição de repartição não possa haver a mesma influencia. Se o governo tem influencia bastante sobre os escrivães de fazenda para o lançamento da decima, ha-de tambem tel-a para com os que fizerem a repartição de contribuição. De maneira que não ha razão nenhuma contra o lançamento da decima, que não possa dar-se contra a contribuição de repartição. Desgraçadamente todos sabem quantas vezes até os proprios parlamentos são influenciados pelo executivo.

Dizem tambem que a contribuição de repartição tem um bem, que é o de elevar-se o imposto na razão da força do contribuinte. Ora supponhamos que póde augmentar-se a contribuição de repartição, igualmente podem augmentar-se os tantos por cento da decima, com a differença que os tantos por cento da decima fazem mais bulha do que o augmentar a contribuição, porque é uma cousa que não é passada em particular, porque tem o povo logo conhecimento do augmento que se faz nas contribuições, porque o feita por uma lei na camara; quando a contribuição de repartição é votada em globo, e os contribuintes não podem conhecer, se são ou não prejudicados uns pelos outros, porque só conhecem o augmento quando se paga, e ignoram porque o imposto diminue ou augmenta.

Disseram mais que o lançamento da decima era vexatorio; mas se o lançamento da decima é vexatorio, porque não o emenda o governo? Porque deixa o governo que se esteja executando com esses vexames contra a lei? Ora, sr. presidente, se havendo lei que regula o lançamento da decima, tem havido esses

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Vexames, como não ha-de haver vexames na contribuição de repartição?

Disse-se mais que a contribuição de repartição era uma contribuição democratica: bem democratico era o systema do lançamento da decima, e perdeu esse caracter pela influencia das auctoridades administrativas, e pela influencia do governo.

Tambem disse o sr. ministro da fazenda que estava votada já no orçamento a contribuição de repartição. É verdade que se approvou a contribuição directa em globo para todo o reino, mas agora nesta lei faz-se uma excepção, porque se exclue a Madeira, quando a Madeira sempre foi comprehendida no continente. Qual a razão porque foi exceptuada a Madeira desta medida? Será pelo mal das vinhas? Então porque não havemos nós de ser exceptuados tambem? Não temos o mal das vinhas, do azeite..... (O Orador fez uma pausa em consequencia do susurro que havia na sala.)

O sr. Presidente: — Eu não posso deixar de dizer á camara que vale mais não prorogar a sessão, do que prorogal-a para não se ouvir. (Apoiados)

O Orador: — Se não querem ouvir, não direi mais nada. (Senta-se)

O sr. Pereira de Menezes: — Sr. presidente, rogo a v. ex.ª queira consultar a camara para vêr se a materia se acha sufficientemente discutida.

Consultada a camara decidiu affirmativamente.

O sr. Justino de Freitas: — Pedia a v. ex.ª que consultasse a camara sobre se queria votar sobre a generalidade e especialidade do projecto, porque generalidade e especialidade é a mesma cousa.

O sr. Arrobas: — Peço a v. ex. que consulte a camara sobre se quer votação nominal.

O sr. Presidente: — Ha dois artigos e um mappa que pôr á votação; pergunto ao sr. deputado se requer a votação normal sobre todos os pontos.

O sr. Arrobas: — A votação nominal é sobre todos os pontos. (Susurro)

A camara rejeitou que houvesse votação nominal) e seguidamente foram approvados os artigos 1. e 2. do projecto.

O sr. Presidente: — Agora vai votar-se sobre o mappa; pergunto á camara se quer votar sobre cada uma das verbas, ou o mappa em globo.

Decidiu-se que a votação fosse em globo) e foi approvado. — O artigo 3.º tambem foi approvado.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã e a continuação da que vinha para hoje, e o projecto n.º 117 tambem sobre pensões. Está levantada a sessão. — Eram quasi 5 horas da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo.

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