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N. 5. Sessão de 25 de dezembro. 1853.

PRESIDÊNCIA DO SR. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presentes 57 srs. deputados.

Abertura: — Pouco depois do meio dia.

Acta: — Approvada.

O sr. Presidente: — A meza, em virtude da resolução da camara, nomea para a commissão, que ha de propôr os meios do melhorar a publicação das sessões, segundo a proposta approvada nesse sentido, os srs. D. Rodrigo do Menezes, Santos Monteiro o Avila.

correspondencia.

1.º — Uma declaração do sr. Faria de Carvalho, participando que o sr. Antonio Feio não comparece por legitimo impedimento. — Inteirada.

2.º — Um officio do sr. Rodrigues Sampaio, datado de hontem, participando que não podia assistir n. sessão de hontem, por ter de assistir ás exequias pela Alma da Rainha, que se celebram na sua freguezia de Santa Catharina. — Inteirada.

3.º — Um officio do sr. Archer, datado do hontem, que por incommodo do saude faltou á sessão do hontem, e faltará a mais algumas. — Inteirada.

4.º — Um officio do sr. Aristides participando que não tem comparecido ainda na camara em consequencia do motivos urgentissimos de serviço publico, mas em breves dias emprehenderá jornada para vir tomar parte nos trabalhos parlamentares. — Inteirada.

5.º — Uma declaração do sr. Cunha Pessoa participando que não assistiu á sessão do hontem por motivos justificados. — Inteirada.

6.º — Uma participação do sr. Francisco Damazio, participando que o sr. Roussado Gorjão não comparece á sessão de hoje por incommodo de saude. — Inteirada.

7.º — Uma declaração do sr. Lourenço Cabral, participando que o sr. J. M. do Andrade faltou á sessão de hontem, falta á de hoje, e talvez a mais algumas, por incommodo de saude, e que elle participante fallou á sessão de hontem por este impedimento. — Inteirada.

8.º — Uma declaração do sr. Corrêa Caldeira participando que faltou á. sessão de hontem por incommodo de saude. — inteirada.

9.º — Um officio do Ministerio da Guerra, acompanhando a conta tanto da producção e importancia de toda a polvora feita na fabrica do Estado, como da do seu consumo e valor, assim pelo Estado, como pelo commercio, satisfazendo assim ao que lhe foi podido pela camara. — Á commissão de fazenda.

Foi enviado á commissão de verificação de poderes o diploma do sr. Manoel Maria Coutinho de Albergaria Freire, deputado eleito pelo circulo de Lagos.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho). — Disse que como está nomeada uma commissão encarregada de melhorar as publicações das sessões, ia dar conta de um officio que lhe havia sido remettido.

Leu um officio do ministerio do reino acompanhando, para ser tomado pela camara na consideração que merecer, um officio do conselheiro administrador geral da imprensa nacional, em que se queixa de pertenderem os officiaes da secretaria da mesma camara rescindir sem accordo delle administrador o contracto (junto por copia) feito em 1843 para naquelle estabelecimento, nacional se imprimir o Diario da Camara Electiva, o encarregar dessa tarefa uma officina particular. — A commissão encarreqada de propôr os meios para o melhoramento da publicação das sessões.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — Deu ainda conta de uma proposta da junta administrativa sobre o melhoramento para a publicação do Diario da Camara, e nova organisação da tachigrafia. — Foi enviada á mesma commissão.

Expediente a que o mesmo sr. secretario deu destino:

1.º — Um requerimento do sr. Cunha Sotto-Maior: «Peço que pelo ministerio respectivo seja satisfeito, quanto antes, o requerimento da commissão de fazenda, da abril do corrente anno, ácerca dos esclarecimentos reclamados sobre o requerimento affecto a esta camara, em que D. Umbelina Anastácia Loupe pede que no orçamento seja inserida uma verba para satisfação do credito que lhe foi reconhecido em despacho de 26 de novembro de 1845, piara com esses esclarecimentos á vista a dicta commissão dar definitivamente o seu parecer ácerca da pertenção da supplicante» — Foi remettido ao governo.

2.º — Um requerimento do sr. Arrobas: — «Requeiro que se peça ao governo pelo ministerio de marinha, -envio a esta camara uma synopse das consultas pedidas pelo governo e o conselho ultramarino e das enviadas ao governo pelo mesmo tribunal, designando as datas. — Foi enviado ao governo.

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O sr. Honorato Ferreira: — Mando para a mesa as contas da commissão administrativa durante a sessão até 13 de agosto. Parece-me que a pratica tem sido o mandar-se estas contas á commissão do fazenda para as examinar.

O sr. Guerreiro: — Mando pari a mesa a seguinte representação da camara municipal o habitantes de Chaves. (Leu)

O sr. Silvestre Ribeiro: — Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação — «Pretendo chamar de novo a attenção do sr. ministro do reino, sobre a deploravel situação da ilha da Madeira, e sollicitar o desempenho da promessa que o governo fez de propôr adequadas providencias» — Silvestre Ribeiro.

Mandou-se fazer a communicação.

Continuando — Peço ser inscripto para apresentar um projecto de lei ácerca da emigração clandestina da ilha da Madeira.

Ficou inscripto.

O sr. Pegado: — Mando para a mesa o seguinte requerimento. (Leu)

Ficou para se lhe dar expediente.

ORDEM DO DIA.

O sr. Presidente: — Como hontem não houve sessão, não pude dar ordem do dia para hoje; entretanto havendo na ultima sessão ficado pendente o adiamento proposto pelo sr. Pegado ao projecto n.º 99, continua a discussão sobre elle.

O sr. Pegado: — Hontem reuniu-se a commissão de marinha, e a sua maioria conveio em que não tinha modificação alguma que fazer no seu parecer. E como eu já estou instruido do assumpto, peço licença para retirar a minha proposta de adiamento.

O sr. Presidente: — Visto que o sr. deputado desiste do adiamento, continua a discussão na generalidade do projecto n.º 99.

(Veja-se a sessão de 22 deste mez.)

O sr. Pegado: — Sr. presidente, esta questão póde á primeira vista, parecer de pouca importancia, mas eu não a considero assim; por quanto involve um principio. Eu sou escravo dos principios, e da rigorosa execução das leis; e aproveito a occasião para desde já declarar do modo mais formal, que nesta legislatura hei de ser mais exigente pelo exacto cumprimento das leis; porque é do respeito ás leis que nasce a maior respeitabilidade de um povo.

Os srs. ministros hão de achar em mim, que formo parte da maioria desta camara, um amigo, porque um dos primeiros deveres da maioria o ser amigo do ministerio; mas quero ser seu amigo sincero, não lhe occultando os seus erros e defeitos; eu hei de apoiar os srs. ministros em quanto se conservarem dentro da esfera das leis em saindo desta esfera, declaro que hei de ser seu inimigo; e nas promoções da marinha tem havido muita quebra das leis, como a seu tempo mostrarei. Mas vamos ao projecto em discussão.

Não sou eu que hei de desconsiderar, ou attenuar, de qualquer modo, o merecimento e serviços que o official de que se tracta, possa ler; nem mesmo desejarei que o governo deixe de premiar e remunerar os serviços desse official, bem como de qualquer outro que se ache em iguaes circumstancias. Já a camara vê que eu não desconsidero os serviços do official de que se tracta, nem lhe recuso os premios que lhe são devidos; pelo contrario, quero o peço cordialmente ao sr. ministro da marinha, que se esse official não está ainda bem recommendado, que lhe dêem mais recompensas; e que seja remunerado do melhor modo possivel, não só esse officia], senão todos aquelles que se acharem nas mesmas circumstancias. O poder executivo tem meios exuberantissimos de remunerar serviços, sem sair da esfera das suas attribuições; tem condecorações; e as condecorações para os bons serviços é que foram feitas, são para honrar o peito de quem as merece; tem pensões que até podem ser pagas pelo cofre da provincia aonde os officiaes servem; tem gratificações,, e mesmo accrescimo de vencimentos, que em certos caeos o governo pode auctorisar; por quanto os nossos officiaes de marinha em certos portos teem um augmento de soldos por causa tia differença de cambio, ou carestia dos objectos; e o mesmo se pratica na marinha de todos as nações; finalmente tem as recompensas nas proprias promoções, com tanto que estas sejam feitas com as devidas clausulas que as circumstantes justificam. O official do que se tracta, teve um posto para commandar um navio só uma estação, aonde não havia officiaes de marinha; o isto tom acontecido algumas vezes, sem que por isso o governo tenha abusado das leis; mais tardo este official teve o posto do 2.º tenente, mas com a clausula de não pertencer ao quadro effectivo da armada. Nisto sua ex.ª o sr. ministro da marinha fez muito bem, fez o que devia fazer; porque sem infringir a lei, fel-o segundo tenente pela lei da necessidade publica; até aqui corroboram os procedentes, porque elles são para o caso em que não ha lei; mas para os casos em que ha lai expressa, estou persuadido que os precedentes nada regulam. Por tanto o sr. ministro da marinha dando a este official o posto de 1.º tenente, fez o que estava nas suas attribuições; porém como este official não tinha diploma scientifico, o sr. ministro poz-lhe uma clausula no despacho; satisfazendo assim as necessidades do serviço, sem violar a lei. E isto o que tem succedido por varias vezes; foi isto o que aconteceu coro um patricio meu, que sendo paisano, o commandando uma frota de 10 velas, e havendo feito relevantes serviços, ficou depois com as honras de official de marinhe. Andou pois o sr. ministro da marinha muito bem dando ao official de que se tracta oposto de 2.º tenente da armada, o que pode considerar se como uma remuneração dos seus serviços, porque conferia-lhe um posto, e as honras inherentes a este posto são alguma cousa; e se ainda o não julgar bem recompensado, mais tarde pode fazel-o 1.º tenente, e eleval-o até ao posto de almirante, mas sempre com a clausula; porque deste modo não infringe a lei. (Apoiados.)

Agora no que não posso convir de modo algum, é em fazer-se uma lei para conferir um diploma scientifico..Não me consta que parlamento algum do mundo passe diploma de habilitações por um ao legislativa: os diplomas scientificos obtem-se nas aulas e nos exames não se dão por um decreto; nenhum poder humano pode conferir a uma creatura o ser sabio; só Deus é que o pode fazer; basta-lhe dizer — sê sabio — o a creatura apparece sabio.

Espero que o parlamento portuguez que não é mr -nos esclarecido do que os outros parlamentos do mundo, não ha de fazer uma lei, cujo objecto é o conferimento de um diploma; porque a final é isto o que vem a ser o objecto do parecer em discussão.

Mas eu insisto, e torno a insistir, porque, não quero que nem de uma só das minhas palavras possa provir a menor idéa de desconceito a este official. Torno por tanto a repetir-faça-o sua ex.ª 1.º tenente da armada real de Portugal: se isso é pouco, se sua ex.ª não acha isto bastante, faça-o capitão-tenente; com clausula, se é pouco, dê-lho condecorações. O cofre das graças é para os serviços reaes e valiosos. Este official, sr. presidente, tem servido nos mares de Africa, tem soffrido as doenças do clima: é pois, digno de recompensa, eu sou o primeiro a confessal-o. Mas se tudo isto é pouco; se as promoções e uma clausula são pouco; se as condecorações são pouco; se o governo quer remunerar os serviços deste official de uma maneira mais condigna, dê-lhe uma pensão, e uma pensão, paga pelo cofre daquella provincia: nem é preciso que para essa pensão venha pedir depois a sancção da camara: o governo pode dar gratificações e augmentos do saldo, sem sair da esfera das suas attribuições. E sabido que os alferes de marinha franceza e ingleza tem augmento do soldo em certas circumstancias. Não ha muito tempo que os officiaes de marinha que se achavam no Rio de Janeiro, embarcados na náo Vasco da Gama, na corveta Íris, e na corveta D. João 1.º, tiveram augmento de saldo, e o governo não hesitou em lho conceder.

Ora o que é preciso mais? Pois não tem o poder exe-

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cutivo tantos e tão valiosos meios á sua disposição, para premiar generosamente os serviços deste official? É preciso que o poder executivo proponha uma lei para que se dispense a um individuo as habilitações que por lei lhe são exigidas, afim de poder passar ao posto de 2.º tenente?.. Eu o que não posso á deixar de combater o principio de conferir diplomas scientificos por meio de uma lei.

Quando esta lei passe, o que eu duvido muito; porque é impossivel que o parlamento promulgue uma lei para dar um diploma scientifico; mas digo, quando esta lei passe, em breve se verão todos os inconvenientes que dahi hão-de provir, porque fica aberto o precedente, e atraz deste official, vem muitos. Lá estão em Macáo officiaes que não pertencem ao quadro effectivo da marinha, assim como tambem os ha em Gôa, e elles de certo hão de querer que se lhos estenda igualmente o beneficio, que a este hoje se concede.

Nos primeiros mezes do ministerio da marinha do sr. Fontes de Mello, saiu um decreto que cortou, ou acabou com as promoções de clausula. E note n camara que tendo este mesmo official clausula, ainda que haja sido piloto abordo dos navios de guerra, o projecto diz — é o governo auctorisado a admittir na classe effectiva da armada, sem prejuizo dos 2.ºs tenentes graduados, e guardas marinhas habilitados fulano — Ora compare se o que fez o sr. ministro da marinha, com o que se vem propor agora á camara electiva.

Não ha muitos dias que saiu um decreto promovendo o segundo tenente Silva Carvalho, a tenente effectivo. Tambem elogio s. ex.ª, mas permitta-me lho diga, que se eu fosse ministro da marinha, promovia sim aquelle official, e comtudo não o fazia effectivo. A censura que faço agora a s. ex.ª, não é gravo: ha uma differença immensa entre este caso, e o caso de que se tracta no projecto: s. ex.ª pelo menos, para mim, está completamente absolvido. Aquelle officia! não tem menos do dois diplomas scientificos: tam a carta da escóla polytechnica que encerra duas faculdades, o tem a carta da escóla do exercito, de official engenheiro. E note mais a camara, que este official tem a navegação da costa de Africa; o finalmente que fez um acto dos bem singulares, e combatem ao lado dos officiaes da marinha ingleza: e a elle é que é devido o resultado do combate, porque o nosso barco entrou nos portos e nos rios onde não podiam entrar os navios de guerra inglezes. S. ex.ª promoveu-o a tenente -effectivo, com a condição de completar os estudos, para poder passar adiante: nem era do esperar outra cousa do ministro que foi lente da academia de marinha.

Agora a camara vai fazer official de marinha sem clausula nenhuma a um individuo que não obstante ter grandes serviços, está numa desigualdade immensa relativamente ao tenente Silva Carvalho, porque é muito difficil haver um official de marinha que esteja nas mesmas circumstancias deste official. Antes desse combale, eu no parlamento e na imprensa rendi-lhe muitos elogios; o digo agora que se fosse ministro da marinha, dava-lhe mais outro posto, mas não o collocava no quadro da armada.

Sr. presidente, nunca tal aconteceu no exercito. Quando no exercito se faz alguma promoção de um só official, menos regular, todo o exercito com uma só bocca reclama, e representa. Na marinha porém fazem-se muitas promoções de um modo bem irregular, e nunca vi taes pronunciamentos: o que não póde deixar de ser, ou por a nossa marinha estar tão abatida, ou porque os homens do mar são generosos e soffredores.

Eu ainda não vi despachar official engenheiro, a quem não tenha diploma scientifico de official engenheiro ainda não vi despachar official do estado maior, a quem não esteja competentemente habilitado para isso. Não queira mos pois, ser o unico parlamento, o parlamento singular, que vá fazer uma lei, cujo objecto é conferir um diploma scientifico: um diploma scientifico não se confere por uma lei; tem-no aquelle que o obtem nas aulas e nos exames.

Muitas vezes no Ultramar faz o serviço de juiz de direito um individuo qualquer sem ser letrado; pergunto eu quando elle deixa essa vida, quando volta para o reino, entra acaso no quadro da magistratura? De forma nenhuma. Nas relações não entram senão aquelles que teem o diploma de bacharel formado. Nos doutoraes não se senta senão quem tem diploma de doutor. Não é uma lei a que dá uma carta scientifica. Qual é pois a rasão porque, não entrando em quadro nenhum, para que se exigem habilitações scientificas, senão os que possuem o diploma de essas habilitações qual é digo, a rasão porque se ha de querer agora, que no quadro da marinha entre esse individuo, que não tem esse diploma? Será porque a fatalidade pese e pese sempre sobre a nossa marinha?

Sr. presidente, eu tono muito calor nellas discussões, não sei porque o meu temperamento é este (e procuro corrigil-o) senão porque quando se tracta da defender principios, é pelo amor dos mesmos principios, pela execução rigorosa da lei, e muito principalmente quanto se trata de objectos scientificos, que eu tomo este calor.

Sr. presidente, eu penso, que este objecto pode terminar mui brevemente: ou penso que a camara poderá deixar de fazer esta lei, porquanto acabei de mostrar, o repito, que não é uma lei a que confere um diploma. Se o sr. ministro da marinha quizer dizer a camara, que elle dará mais recompensas a esse official, promovendo-o a 1.º tenente, e assim por diante, se o sr. ministro da marinha, avaliando esses serviços lhe quer dar mais alguma recompensa, sem cometido o fazer entrar no quadro da marinha, assim como não entra nos outros ninguem, que não tenha diploma, eu penso que a questão acabará mui brevemente; isto está nas mãos do sr. ministro da marinha.

Eu termino, sr. presidente, declarando que sou o primeiro a reconhecer os serviços deste official; e que tenho ardente desejo, de que o sr. ministro da marinha os premeie o mais possivel, sem que levo a camara a fazer uma lei, que não pareça propria de um parlamento ilustrado; pois creio que nenhum parlamento tenha feito uma de semelhante natureza.

O sr. Arroba: — Sr. Presidente, usando da palavra começarei por dar ao sr. deputado por Macáo os agradecimentos pela acção que acaba de praticar: acção que é propria de um venia loiro homem de bem. S. ex.ª suscitou na sessão anterior um conflicto comigo a respeito da existencia de um facto, e lendo se depois convencido na commissão de que o objecto sobre que versa o parecer n.º 99 foi muitas vezes tractado em commissão, como eu affirmei, pois assim o declararam unanimemente todos os outros membros da commissão, na presença s. ex.ª, não teve duvida em vir hoje retirar a sua proposta do adiamento; reconhecendo eu que s. ex.ª insistiu tanto na sua affirmativa hontem, porque, tendo-se passado da memoria o occorrido, estava convencido lo que affirmava, servindo o que hoje fez para dar mais uma prova das boas qualidades que o adornam, e que todos lhe reconhecera.

Reconhecendo tambem a alta capacidade de s. ex.ª, o a proficiencia com que tracta sempre as questões de que se occupa; sinto me n'uma posição difficil, tendo de combater nela primeira vez os argumentos que s. ex.ª tão habilmente acaba de apresentar. Unicamente me anima o estudo que tenho feito da materia.

Começarei por mostrar a s. ex.ª que se não tracta, como s. ex.ª acaba da dizer, de levar a camara a dar um diploma da estudos, de decretar a sciencia a quem não a possue.

Se da tal se tractasse, eu seria o primeiro a juntar-me a s. ex.ª.

Seria mesmo uma cousa estranha se eu tendo as maiores habilitações militaras scientificas, que ha no paiz, e pertencendo a uma arma especial scientifica viesse agora pugnar para que a camara commettesse o absurdo de conferir titulos scientificos que só ás academias compete conferir.

Sr. Presidente, o objecto de que se tracta, é de admittir na classe ellectiva da armada um digno official, que a commissão, o governo, e mais estações competentes julgam habilitado a bem desempenhar as funcções de official da marinha portugueza.

Sua ex.ª reconheceu, que em Portugal não ha uma

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lei geral de promoções da marinha, devendo nesse caso recorrer-se aos precedentes; e que nenhum ha até hoje de se conceder a entrada para a classe effectiva da armada, para a artilheria, estado-maior ou engenharia a individuo que não provasse achar-se habilitado com o curso de estudos das respectivas armas.

Sinto dizer a s. ex.ª, que se acha muito mal informado. Nas armas scientificas do exercito ha em todas ellas distinctos officiaes sem as habilitações scientificas das academias. E na marinha ha um sem numero de exemplos, e admittidos como no caso ordinario e vulgar, e isto em todos os tempos: lembro-me dos distinctos officiaes, os srs. Francisco Laranja, José do Santa Iota, Matheus Pereira de Campos, que da classe de marinheiros chegaram a officiaes generaes, e honraram o pavilhão portuguez. Ainda hoje conheço muitos distinctos officiaes superiores e generaes da nossa marinha, que foram capitães de navios mercantes, e que são muito conhecidos de s. ex.ª e do paiz como bons officiaes.

A s. ex.ª se tem affigurado que ha uma lei que prohibe, que o governo despache officiaes que não sejam habilitados com o curso da escóla naval; e é isto mesmo o que se faz em todos os paizes aonde ha marinha, e por não haver em Portugal, nem em qualquer outra nação outras habilitações para ser official de marinha senão as adquiridas nas respectivas escolas navaes, julga s. ex.ª que declarar em parlamento que um official está habilitado para entrar na classe effectiva da armada, equivale a conferir-lhe um diploma de sciencia que elle não tem, e isto nenhum parlamento o fez nunca, nem o poderá fazer.

Nego a premissa, isto é, que além das escolas e cursos scientificos ha tanto em Portugal como em todas as mais nações, outros meios do chegar ao posto de official da marinha; que as nossas leis antigas reconhecem além da academia o meio de servir como piloto cinco annos em um navio de guerra, findo este tempo o piloto passa a 2.º tenente sem nunca ter estudado o curso de marinha.

Nenhuma lei ha que prohiba ao governo considerar habilitados para officiaes individuos que não tiverem o curso da escola naval.

Uma ha que marca o modo como de guarda-marinha se passa a 2.º tenente pelos estudos; mas esta é uma lei só applicavel aos alumnos da escola, e não aos outros individuos da armada.

As mesmas exigencias se fazem na lei franceza para promover os alumnos da escóla naval a officiaes; mas a par destas a lei reconhece os direitos dos mestres da armada, e dos capitães da marinha mercante admittidos, como o official de que se tracta, como auxiliares na marinha de guerra.

Passo a ler alguns artigos da lei de 20 de fevereiro de 1832, e regulamentos que regulam as promoções em França; no paiz aonde mais sciencia se exíge ao official de marinha que se habilita pela escóla naval (Leu):

«Art. 7.º Ninguem podera ser tenente de fragata sem ter servido em os navios do estado dois annos pelo menos, seja na qualidade de aspirante de 1.ª classe, seja em qualidade de tenente de fragata auxiliar.

«Ou se não tiver servido em os navios do estado durante dois annos, pelo menos, como 1.º mestre; e se não tiver feito, nesta qualidade, uma campanha em uma náo ou fragata, e se além disso não tiver satisfeito a um exame, tanto sobre a theoria da navegação, como sobre os conhecimentos praticos da marinha.»

Para se não julgar que o exame, que se exige aos mestres, tem alguma analogia com os exigidos aos alumnos da escóla naval, passo a ler o titulo 5.º da ordenança de 24 de abril, que regula as materias sobre que deve ser feito o exame exigido pela lei de 20 de abril, cujo artigo 7.º acabo de ler.

(Leu). «Titulo 5.º — Exame dos primeiros mestres. — Art. 19. Os primeiros mestres que satisfizerem as condições prescriptas pelo artigo 7.º da lei de 10 de abril de 1832, serão susceptiveis de ser propostos para tenentes de fragata, logo que tenham feito um exame sobre a theoria e pratica da navegação. Este exame versará sobre os pontos seguintes: em quanto à theoria — sobre a arithmetica, a geometria, a trigonometria rectilinea, e a primeira secção do tractado de navegação de Bezout.

«Pelo que respeita á practica será sobre o aparelho, manobra de um navio, navegando só — sobre a artilheria, manejo de armas, e exercicio de infanteria até a escóla de pelotão.

Passo a ler os artigos da mesma ordenança, que marcam as materias sobre que devem versar os exames de admissão, e saída da escola naval.

(Leu.) «Titulo 1.º — De admissão para a escola naval. — Artigo 5.º Os conhecimentos exigidos para a admissão na escóla naval são:

«1.º A arithemetica completa, etc.

2.º A geometria elementar, e as duas trigonometrias.

3.º Os elementos de algebra, binómio de Newton, etc., e applicação das formulas ao calculo das pilhas de ballas de diversas especies.

«4.º a statica demonstrada, syntheticamente applicada ás condições de equilibrio das machinas simples.

«5.º Os candidatos traduzirão um pedaço em um autor latino, da força dos que se explicam em terceiro logar.

«6.º Elles analysarão por escripto um assumpto de composição dada.

«7.º Elles explicarão, sem diccionario, uma passagem de uma obra ingleza facil.

«8.º Elles copiarão uma cabeça ou uma paizagem, etc.

«9.º Devem ter uma lettra intelligivel, e boa orthografia, etc.

Isto são só os preparatorios exigidos, sendo o curso da escóla o seguinte: (Leu.)

«Titulo 2.º - Exame da saida da escóla naval. — 1.º O curso de navegação e astronomia nautica, a descripção e o uso dos instrumentos empregados, seja para observar no mar, seja para determinar a posição dos navios e transportal-a sobre as cartas.

«2.º O curso de hydrografia, comprehendendo o levantamento de plantas a vela, a determinação das sondas, a construcção das sondas, a construcção das cartas maritimas, geograficas e topograficas.

«3.º O curso elementar de geometria descriptiva, applicado á architectura naval, e ás principaes machinas empregadas a bordo dos navios e nos portos.

«4.º O curso elementar de fisica geral.

«5.º O curso de grammatica geral, de bellas-lettras, e de historia moderna.

«6.º O curso de lingoa ingleza.

«7.º Curso de desenho pittoresco e linear.

«Além disto haverá exames sobre a manobra, os aparelhos, a theoria, e o exercicio de peça e espingarda.»

Pela leitura que acabo de fazer, se vê que a lei em França exige muito mais sciencia e instrucção theorica aos alumnos da escóla naval, para passarem á classe de officiaes, do que se exige em Portugal; mas que, a par deste luxo de sciencia, a mesma lei exíge apenas um exame insignificantissimo para os primeiros mestres, que pertendam passar á classe de officiaes, e admitte sem exame algum a passagem de officiaes auxiliares á classe effectiva dos tenentes do quadro effectivo da armada. Para tirar ao meu collega na commissão todos os escrupulos, passo a ler a definição que a lei franceza dá de officiaes auxiliares (Leu).

«Ordenança do rei sobre a reorganisação do corpo de marinha de 31 de março de 1831 — Titulo 4.º — Dos officiaes auxiliares — Artigo [...] — quando a totalidade dos officiaes effectivos se reconhecer insufficiente para as necessidades dos armamentos, recorrer-se-ha aos officiaes auxiliares, escolhidos entre os capitães do commercio.

«Elles não poderão ser chamados ao serviço senão como tenentes de fragata. (Artigo 32.º) Os officiaes auxiliares serão susceptiveis de serem admittidos a fazer parte do corpo de marinha como tenentes de fragata effectivos; poderão mesmo ser directamente nomeados tenentes de não quando tiverem merecido este adiantamento por servidos distinctos, ou por acção extraordinaria de valor. (Artigo 31.º da ordenança de outubro de 1819.»

Agora a camara que vê que os officiaes auxiliares da marinha franceza são exactamente individuos da mesma classe daquelle de que se tracta, vou mostrar como elles

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são considerados nas promoções ordinarias da marinha franceza (Leu) «Lei de 20 do abril. Os dois terços dos tenentes de «fragata serão tirados dos aspirantes da 1.ª classe, e o outro terço dos tenentes de fragata auxiliares em actividade de serviço nesta qualidade, e os primeiros mestres «em actividade do serviço que tiverem satisfeito ás condições indicadas no 2.º paragrafo do artigo 7.º da «presente lei. Comtudo á falla de tenentes de fragata auxiliares e de primeiros mestres com as condições determinadas, este ultimo terço poderá ser completado com aspirantes de 1.ª classe.»

Pelo que acabo de ler se vê que pela lei franceza se reconhece tres meios de se habilitar para official de marinha: ou o curso da escóla naval; ou o serviço como official auxiliar; ou o logar de primeiro mestre.

Pelo artigo que acabo de lêr se vê, que um terço dos officiaes da marinha franceza tem por lei uma origem diversa da escóla naval; não tem o curso de marinha. E por certo ninguem dirá, que o parlamento francez fazendo esta lei tão completa proclamou diplomas de sciencia a quem a não tinha.

Unicamente a lei declara, que se póde ser official de marinha, sem ter o curso scientifico. E isso e mais nada, o que a commissão propõe no caso presente.

Na marinha ingleza, que é a rainha dos mares, e onde ha os melhores officiaes de marinha póde chegar-se a almirante, sem ter os estudos da escola naval de Portsmouth, que a final é mais um asylo para os filhos dos officiaes; e mesmo assim ha só um professor de mathematicas, outro de latim; um primeiro ajudante, dois outros ajudantes; um mestre de francez; um de desenho; um mestre de armas; um mestre de esgrima, e dois sargentos de artilheria.

Isto dá uma instrucção theorica limitada em comparação da escora naval franceza, e da nossa; mas a maior parte dos aspirantes são desde a sua origem instruidos a bordo, e para a sua instrucção theorica, ha só a bordo um mestre do mathematicas. Além destas duas classes ha as mestraes, que mediante um exame passam a officiaes. Para acabar de mostrar que este systema, não tem dado á Inglaterra senão vantagens, basta lembrar-lhe, que o maior almirante do nosso seculo, o almirante Nelson começara a sua carreira de mar por moço em um navio carvoeiro do commercio; depois passando a um navio de guerra, chegou pelo sou valor amestro; official, e morreu par de Inglaterra, e o maior almirante da Inglaterra.

Para mostrar á camara a vantagem que resulta de não admittir só ao posto de official os individuos habilitados com os cursos scientificos das escolas navaes, vou lêr a opinião do muito celebro Charles Dupin, sobre este ponto. Este é um dos homens mais notaveis e profundos na sciencia que a França tem produzido. O seu voto em materias de marinha é uma sentença, porque elle é uma verdadeira auctoridade.

(Leu). «Volume 3.º das viagens á Inglaterra, pag. «77, — Para ser nomeado tenente, deve o candidato ter pelo menos 19 annos; ter navegado em navios de guerra, durante 6 annos completos, dos quaes 2 com o gráo «de contra-mestre, ou de aspirante. E necessario que «além disso o candidato apresente attestados de boa conducta, e de bom serviço, passados por todos os chefes «debaixo das ordens dos quaes elle tiver servido, e que «passe pelos exames determinados pelo almirantado. Com «tudo quando um official é obrigado a partir antes de os «ter feito, póde fazel-os no mar; por ordem do commandante em chefe. Então o candidato é examinado por «tres dos primeiros capitães da esquadra.

A pag. 79, lê-se: (Leu). «Os mestres podem ser nomeados tenentes, e chegar por este modo a todas as dignidades da marinha militar. E uma muito grande e «bella vantagem offerecida á emulação de todos os homens da equipagem, que são estudiosos, e que tractam «por este motivo de juntar os conhecimentos theoricos ao «seu saber practico.

A pag. 81, le-se: (Leu). «Comparemos a sorte dos «officiaes de marinha á dos officiaes de terra na Gram-Bretanha, O accesso não tem nada de venal na marinha «aonde os postos nunca se compram. O marinheiro menos «rico póde portanto chegar, sem obstaculo da classe mais «baixa, á mais elevada. Assim Nelson moço a bordo de «um navio carvoeiro, passa depois para um navio da «guerra; a alli chega a official, não pelo seu dinheiro, «mas pelo seu valor; chega ao posto de almirante e morre «par de Inglaterra. Em um regimento do infanteria, ou «cavallaria elle teria cora certeza chegado até ao posto «de sargento: mas difficilmente dalli teria passado.»

Se Charles Dupin estivesse agora aqui, accrescentaria, e na marinha portugueza nunca passaria de mestre? E que aconteceria ao almirante Parker, um dos mais celebres almirantes que hoje existem, se o governo quizesse honrar a nossa marinha com a sua admissão? Segundo os principios do meu illustre collega elle não poderia senão ser tenente com clausula.

Teria ainda para chegar a 1.º tenente de ir aprender o latim, a phisica e chimica, &c. &c.

Por tudo o que tenho lido o ponderado me parece ter provado exuberantemente, que o terror do sr. deputado por Macáo e infundado; e que não se tracta de praticar um acto inqualificavel, um acto nunca praticado em parlamento algum. Unicamente se tracta de fazer um acto de justiça muito vantajoso para o estado, e cujo principio está consignado nas leis das primeiras nações maritimas do mundo, o que se funda nos precedentes havidos em Portugal; nos tempos antigos o modernos por parte não só dos diversos governos, mas ainda em 1850 pelo parlamento em caso analogo.

O meu digno collega me ensinou a consultar os precedentes, mas eu não só fui buscar ossos precedentes, em abono do parecer, mas alem disso fui buscar a legislação estrangeira das nações mais adiantadas neste ramo, e consultei a sã rasão e a utilidade publica. E não havendo em Portugal uma lei geral de promoções parece-me ter seguido um bom caminho.

Tendo destruido o mais forte argumento apresentado pelo meu collega, passo a mostrar as rasões porque a illustre commissão de marinha não podia deixar de rejeitar os arbitrios apresentados pelos illustres deputados.

O illustre deputado por Macáo, o sr. Pegado, lembrava antes que se dissesse ao governo, que elite linha direito do promover este 2.º tenente a 1. tenente com clausula, e depois a capitão-tenente com clausula, capitão de fragata com clausula, e até almirante com clausula se quizesse, porque tinha o direito de o lazer. Ouvi tambem, que o governo merecia elogio pelo despacho que deu a este official, fazendo-o 2.º tenente com clausula.

Peço licença ao meu illustre collega para lhe dizer, que não sei o que s. ex.ª quer lazer da palavra clausula. O governo não tem direito de crear corporações de clausulas. Só pode promover conforme as leis, e ale o numero auctorisado pelas côrtes. Não ha lei, aviso, decreto, nem poder algum que auctorise a fazer tenentes, sem pertencerem ao quadro, e muito menos a promovel-os sempre com clausula até aos mais elevados postos. Acho isso tau extraordinario que me maravilha ouvil-o a um membro tão notavel do parlamento. Um official com clausula leiu as mesmas honras, as mesmas vantagens, vencimentos e commandos que os sem clausula; tanto uns, como outros são encarregados de sustentar a honra do pavilhão portuguez. A differença e toda illegal e imaginaria. E minha opinião que o governo estava no seu direito, despachando 2.º tenente do quadro effectivo da armada o tenente Guedes, porque nenhuma lei se oppunha a isso; mas acho que elle exorbitou despachando-o para a armada, com a condição de não pertencer á classe ellectiva da mesma armada, porque essa e uma classe que não existe senão na imaginação do governo.

Na armada não ha senão as classes da effectivos, veteranos e reformados. Sendo este official já de facto official da armada, por decreto se 23 de fevereiro de 1853, e não podendo pelas leis do paiz ser collocado nas classes de reformados, nem de veteranos, elle pertence de direito a classe effectiva. Por este modo a camara não faz mais do que dar melhor redacção a um decreto, o tornal-o em lei, tornar em facto o que já existe de direito. Passando o principio do illustre deputado, os srs. ministros podiam lazer todos os seus criados almirantes, bastando para terem a approvação geral, que se lhes accrescentasse a palavra milagrosa, com clausula.

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Se o illustre deputado quer intender por clausula — não pertencente ao quadro — peço licença para lhe dizer, que eu fui na sessão passada, quasi fulminado, por dizer que havia um quadro legal. O governo e a illustre commissão do fazenda fizeram passar em julgado que na marinha não havia quadro legal, a por isso a clausula de não pertencer ao quadro, equivale a dizer — clausula do não pertencer ao que não existo.

Tambem não posso deixar passar a opinião de que o governo podia sem vir ás cortes, aumenttar o soldo a este official, e dar-lhe uma grande gratificação, em logar do posto. Isto de certo foi um lapso. O illustre deputado bem sabe, que o governo não póde alterar os vencimentos; isso é uma exclusiva attribuição das cortes, e por isso a commissão ainda não adopta este parecer, pois equivaleria a dizer ao governo, que elle tinha o direito de violar a lei fundamental do estado.

Tambem peço licença para dizer ao meu illustre col lega, que o exemplo que trouxe para provar que o governo quando julga conveniente, tem o direito de augmentar os vencimentos, não exprime o que o illustre de pulado julga, mas antes proa o contrario.

O illustre deputado disso, que fizesse o governo com este official, o que fez com os officiaes que estavam no Brazil, que lhes mandou pagar um augmento de 25 por cento nos seus vencimentos.

Pareceu ao illustre deputado, que por esta operação houve uma justa alteração de vencimentos legaes. Mas foi justamente o contrario; esta operação teve por fim levar os vencimentos dos officiaes que serviam o Brasil, á sua importancia legal. Estes officiaes eram pagos no Brazil em moeda fraca, o por isso o governo mandou, como devia, que se attendesse ao cambio, que era de 25 por cento nesse tempo. E teve por fim esta ordem, conseguir o contrario do que se figurou ao illustre deputado.

Sr. Presidente, o illustre deputado elogiou muito o governo por ter promovido o sr. João da Silva Carvalho a tenente de marinha por distincção. Eu tambem me junto a s. ex.ª, mas estou nos meus principios em quanto o illustre deputado vai caír em uma contradicção.

O governo violou a unica lei que expressamente ha para a promoção dos guardas-marinhas a 2.ºs tenentes. Essa lei que se ião oppõe a que um mestre ou um capitão da marinha mercante, com longos serviços entre ermo tenente para a marinha de guerra, se oppôe formalmente a que o sr. guarda marinha João da Silva Carvalho fosse promovido a 2.º tenente sem ter concluido o curso de estudos da escola naval.

O governo merece grandes louvores por ter muito bem comprehendido, que as leis são para os casos ordinarios;.mas em todo o caso tem do pedir á camara um bill de indemnidade, e o illustre deputado já declarou, que vota por elle. Permitta s. ex.ª advertir o que é agora que vaidar um verdadeiro diploma, segundo os seus argumentos, por que no caso de que falla o illustre deputado, a lei o que pede e um diploma para o sr. Carvalho ser tenente e depois de ser tenente toda a clausula é illegal, porque a lei não exige nada para passar de 2.º tenente a 1.º Da modo que o illustre de pulado vota agora para que se lhe dê o que a lei prohibe, isto é, o posto do tenente; o depois tira-lhe o que lhe dá a lei isto é, tira-lha o direito de passar do posto de 2.º tenente ao de 1.º como a lei regula para todos. Pois não julgará o illustre deputado que os serviços do tenente Carvalho valem bem uma carta da escóla naval para ser tenente, o capitão tenente? Noto o illustre deputado, que á força do querer combater o parecer, cae em repetidas contradições.

Ha pouco queria que a camara não concedesse o posto de tenente sem o curso da escóla, aconselhando o governo para recompensar os serviços relevantes com dinheiro ou condecorações, e agora já vota por em posto, e isso aconselha em que o governo empregasse o dinheiro ou as condecorações.

Eu em um e outro caso voto pelo posto, porque estes dois officiaes honram a corporação de marinha por serem muito dignos officiaes de marinha, e porque o paiz, tira vantagem em que elles cheguem a postos elevados.

Tambem ouvi dizer ao illustre deputado, que assim como um individuo não formado em leis nunca tinha chegado a juiz do supremo tribunal, ainda que fosse muito bom advogado, assim um individuo que não tivesse o curso da escola naval, nunca devia poder chegar a almirante, ainda que fosse o melhor official do marinha do mundo.

A isto basta responder, que para evidenciar que um caso nenhuma relação tem com o outro, basta notar que em paiz nenhum do mundo um leigo chega a ser juiz do supremo tribunal, em quanto o todos os paizes do mundo um moço de bordo de um navio de guerra tem chegado, sem obstaculo, a ser o primeiro almirante, ss tem merecimento para isso, sem que lhe exijam os documentos das escolas navaes

Tendo destruido completamente todos os argumentos do illustre deputado, tenho-me talvez demorado mais do que conviria a um assumpto da tão grande simplicidade, pára mostrar á camara, que o parecer da commissão de marinha lei feito com conhecimento de causa e depois de muito pensadas e avaliadas todas as circumstancias que revestiram o caso de que se tracta.

Concluirei dizendo, que peço ao sr. Pegado me desculpe alguma expressão, que no calor da discussão por ventura soltasse, pois não tenho por s. ex.ª senão muita consideração e respeito pelas suas virtudes, talento e zelo pelo bem publico.

O sr. Presidente: — Ha alguns srs. ainda inscriptos a favor ou contra o projecto, mas o sr. ministro da fazenda tem a palavra sobre a ordem.

O sr. Ministro da Fazenda: — E para ler algumas propostas (São as seguintes.)

1.ª — Estabelecendo a dotação do uni conto do réis diario para Sua Magestade El-hei Sr. D. Pedro V. assim como as dotações dos Principes e Princezas Reaes.

2.ª — Submettendo á approvação da camara o emprestimo feito em Paris com a casa Chabrol para ser empregado na viação publica de Portugal.

3.ª — Sujeitando á aprovação da camara o emprestimo feito no Porto para as estradas do Minho.

4.ª — Para se adjudicar a uma empreza a conducção das malas-postas entre Aldeagalega e Badajoz.

Estes projectos são por sua natureza urgentes, e ou podia a v. ex.ª que os considerasse como taes para irem sem demora ás commissões respectivas.

Julgaram-se urgentes e começou o sr. secretario à lel-os.

O sr. Justino de Freitas: — Pedia a v. ex. que consultasse a camara sobre se dispensava a leitura das propostas na meza porque é desnecessaria visto que acabaram de ser lidas pelo sr. ministro da fazenda., Foi dispensada a leitura na meza e remetidas as propostas.

1.ª — á commissão de fazenda,

2.ª — as commissões de fazenda, e obras publicas.

3.ª — ás mesmas commissões.

4.ª — á das obras Publicas.

N. B. — Estas propostas serão consignadas, quando se

discutirem os respetivos pareceres.

O sr. Justino de Freitas: — Mando para a mesa o parecer da commissão da verificação do poderes. (Leu-se na mesa).

O sr. Presidente: — Não sei se a camara quer occupar-se já deste negocio, ou que fique sobre a mesa ou que se mande imprimir: vou consulta-la sobre se é de parecer que se mande imprimir.

Verificou se não haver numero.

O sr. Avila: — Eu tambem estou convencido que não ha irregularidade nas eleições a respeito das quaes se acaba de ler o parecer, entretanto se a camara não quer passar desde já á discussão, parece-me que tanto importa ficar o parecer sobre a mesa para ser discutido ámanhã, como imprimir-se no Diario do Governo, que ámanha estará nas mãos dos srs. deputados. Digo se a camara quer passar desde já á discussão, não me opporei, mas a querer que o parecer tique sobre a meza, era melhor imprimir-se no Diario do Governo, dar se para ordem do dia do amanhã, e ámanha mesmo discutir-se. (Apoiados)

O sr. Presidente: — Na camara ha numero legal para se votar, e eu vou submetter á sua resolução os expedientes que ha a seguir; ou occupar-se já do parecer,

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Visto que não ha duvida sobre a validade das eleições, ou ficar sobre a mesa, ou adtptar-se o meio lembrado pelo sr. Avila de se imprimir no Diario do Governo para se discutir ámanhã; consulto a camara sobre este ultimo meio.

Resolveu-se que se imprimisse no Diario do Governo.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — A mesa recebeu dois officios, um no ministerio da fazenda, o outro do ministerio das obras publicas de que vou dar conta á camara, (Leu).

Officios: — 1.º do ministerio da fazenda, acompanhando 110 volumes da estatistica geral do commercio de Portugal com as suas possessões e nações estrangeiras, relativas ao anno de 1851. — Mandaram-se distribuir.

2.º Do ministerio das obras publicas acompanhando 125 exemplares do boletim do ministerio do obras publicas, commercio e industria, que até hoje se tem publicado, a fim de se serem distribuidos pelos srs. Deputados da nação portugueza. — Mandaram-se distribuir.

O sr. Presidente: — Continua a discussão sobre o projecto n.º 99. O sr. ministro da marinha pediu a palavra, é a favor ou contra?

O sr. Ministro da Marinha: — Eu pedi-a por parte do Governo.....

O sr. Presidente: — Quando algum sr. ministro pede a palavra por parte do Governo é poetica preferir a todo e qualquer outro orador, mas não póde inverter a ordem estabelecida de um fallar a favor o outra contra; ora o sr. Arrobas acabou de fallar a favor, naturalmente v. ex.ª falla tambem a favor, e por isso tu intendia que devia dar a palavra ao sr. Julio Maximo que se inscreveu contra.

O sr. Ministro da Marinha; — Perdoe-me V. ex.ª, isso é exacto, mesmo porque v. ex.ª o diz; entretanto quando o Governo precisa pôr ao facto a camara de alguma cousa, o cujo esclarecimento póde concorrer para que não se perca tempo, parece-me ser conveniente que se lhe conceda a palavra: é debaixo desse ponto de vista que eu quero dar alguma explicação sobre despachos que se tem feito com relação a um e outro officio, porque a explicação que dôr, póde impedir que se continuem a fazer mais algumas observações sobre este pomo.

O sr. Presidente. — Nesse caso, como é para esclarecimento, tem a palavra.

O sr. Ministro da Marinha: — Agradeço ao nobre deputado que encetou a dicussão a forma delicada com que se dirigiu ao Governo, e a mim particularmente, como ministro da marinha. S. ex.ª achou muito regular a nomeação que se havia feito deste official Guedes pela fórma porque foi exarado o seu de despacho. E pelo que toca ao sr. Silva Carvalho, a quem os illustres deputados se referiram, o governo, sr. presidente, quando o nomeou 2.º tenente, teve em vista dar um posto tanto no campo de batalha; (Apoiados) mas note-se, que salvou toda a responsabilidade, porque poz a clausula, de que não podia ir avante sem completar os seus estudos (Apoiados).

Parece-me, talvez me engane, que o illustre deputado que encetou esta discussão, disse, que o governo nesta nomeação não tinha andado com muita regularidade, ou se tinha desviado algum pouco das disposições da lei, entendo que o illustre deputai o não teve rasão, e eu sinto não vir bem preparado para fallar a respeito deste official (que é filho de um homem muito distincto, e bem conhecido neste paiz pelos serviços que tem feito á Liberdade) por consequencia não poderei detalhar circunstanciadamente quaes foram as rasões, e muitas foram as que se deram já a respeito deste official, não só para se lhe dar este posto, mas o habito da Torre Espada. Este official foi convidado pelo almirante Inglez para o acompanhar n'uma expedição na qual o mesmo almirante não tinha os conhecimentos locaes, e lhe faltavam embarcações apropriadas, porque era preciso que ellas fossem pequenas para servirem naquellas paragens; E tendo o Sr. João da Silva Carvalho annuido a este convite, achando-se no flanco esquerdo, por tal maneira se houve no ataque que recebeu do almirante inglez e de todos os officiaes que alli se achavam, muitos elogios e não é possivel que fossem immerecidos, porque um official como o almirante inglez não os presta com facilidade (Apoiados).

Já v. ex.ª vê, e a camara, que embora eu tenha sido sempre amigo, e companheiro do pae deste joven official, não fui arrastado pelos principios da amisade, em favor para com seu pae, que eu o fiz 2.º tenente, porque esta concessão foi feita em vista dos serviços relevantes prestados no campo de batalha; (Apoiados), e Sua Magestade julgou por bem, condecoral-o com o habito da Torre Espada. Eis aqui está, sr. presidente, explicada a rasão do procedimento do governo para com este official.

Agora, sr. presidente, preciso explicar a rasão, porque na commissão me não oppuz ao projecto que está em discussão, a lei foi executada por parto do governo, como o illustre deputado que encetou esta discussão reconheceu, mas a lei podia ser alterada por quem? Pelas Cortes. O official de que se tracta, querendo entrar na armada recorreu ao corpo legislativo, pois é aonde podia achar deferimento ao seu requerimento. Entendo, como o illustre deputado, que o corpo regulativo deve ser muito parco nestas concessões; sou o primeiro a reconhecer este direito, mas que disto se siga immediatamente a consequencia de que se hade fazer a todos, não vejo rigor na deducção.

Sr. presidente, eu convim na commissão, porque examinando os paizes que são mais rigorosos, e que procuram elevar mais a instrucção dos seus officiaes de marinha, achei, que alli se seguia muitas vezes esta doutrina. Na França, quando na marinha se precisa de um ciliciai vai se buscar aos navios mercantes, e dão-lhe logo um posto, a que chamam tenente de fragata, não fazendo parte desde logo da marinha; mas em havendo promoções, um terço e comtemplado; e quando elles tem […] servidos relevantes, não só são admittidos logo para a armada, mas logo nomeados tenentes para navios de alto bordo. Ora não podendo entrar em duvida que a França ha annos se tem dado tanto ao estudo da arma da marinha, e promulgado muitas leis, que se tem tornado senão superior, ao menos igual a qualquer das marinhas do mundo; vendo eu no projecto opposições analogas áquellas, não duvidei por parte do governo, dar o meu assentimento a este projecto.

Não me oponde á doutrina que apresentou o illustre deputado de o governo poder dar pensões e gratificações; é verdade, mas contudo ha os mesmos tramites a seguir, porque o governo não pode dar pensões nem graduações, sem vir perante o corpo legislativo com a competente proposta, porque e justamente o corpo legislativo quem as concede. E eis-ahi temos, pois, chegado o caso em que compito ao corpo legislativo examinar, se convem mais ou dar a este official um posto e chamal-o á marinha, aonde já tem prestado serviços de uma forma que fez honra ao seu paiz — ou cortar a carreira a um official que tem mostrado tanta aptidão — ou dar-lhe uma pensão, que é o mesmo que tirar-lhe toda a utilidade. (Apoiados.) Eu sou muito do principio das pensões, mas não para aquelles que ainda estão no caso de servir: parecendo-me portanto que no caso presente, o governo ganharia mais collocando este homem na armada.

Esta opinião que apresento, é convicção propria; mas não quero de modo algum oppor-me aos argumentos fortes e bem deduzidos que o illustre deputado que encetou esta discussão, apresentou. E acceitando a sua observação que eu julgo me faz muita honra, de que na qualidade de lente de uma escola em que encetei a minha carreira como homem publico, eu não podia deixar de ter muita predilecção e amor pelo bom serviço, é por isso que entendo que o estado pode tirar deste official alguma vantagem, chamando-o para a marinha.

Portanto, sr. presidente, tendo mostrado á camara os motivos que me levaram a não impugnar este parecer, e os que levaram o governo a conceder o posto de 2.º tenente ao official João da Silva Carvalho, que tantos e tão relevantissimos serviços tem prestado em Macáo, por onde o nobre orador é distinctissimo deputado.

O sr. Julio Pimentel: — Sr. Presidente, pouco tenho a dizer sobre esta questão, e occupar-me-hei parti-

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cularmente da irregularidade da medida proposta. Nós que fazemos as leis, somos os primeiros que as devemos acatar para que os outros as respeitem. Ha ou não uma lei que regula os despachos e promoções na marinha real? Ha, e essa a lei, ou decreto com força de lei, que em 1845 creou a escola naval, e que regala as habilitações necessarias para ser despachado 2.º tenente Ora se este official de que se tracta, não tem as habilitações da lei, o merece pelos seus serviços e longa pratica entrar ao quadro da marinha real, já se vê que era então necessario fazer a seu respeito uma excepção pessoal. E para este ponto que esta lei se dirige. Mas eu opponho-me, e oppor-me-hei sempre ás excepções que são puramente individuaes. Se a lei não satisfaz a certa e condições, proponha-se uma nova lei e revogue-se a actual. Se esta lei não previne todos os casos, é necessario que se proponha uma que os abranje a todos. Era isto que eu tendo que a commissão devia fazer o não propor uma excepção particular para um individuo. Agora accresce alem disto que ou, relatorio se alega para motivar a eliminação da clausula, com que foi feita a promoção, o precedente de haver sido despachado outro 2.º tenente da armada. Jeronymo Homero, com as mesmas condições e a respeito do qual se diz que estava em identidade do circumstancia, mas segundo ouvi dize a quem consultou os documentos não ha tal identidade de circumstancias. Este Jeronymo Romero mostrava possuir as habilitações scientificas proprias para o serviço; em quanto que a respeito do individuo do que se trata, não se menciona senão a sua practica, o comquanto seja esta uma condição importante, são tambem necessarias outras habilitações no serviço da armada.

A lei requer essas habilitações; e se o official as não tem, não se estabeleça ainda outro precedente violando a lei, porque isto hade repetir se sem limites. O remedio é outro. Por estas razões entendia que o mais conveniente era que o governo ou a commissão apresentassem um projecto de lei que satisfizesse a tolas as condições necessarias, e que evitasse a repetição dessas irregularidades e obstasse aos inconvenientes que a taes despachos se hão-de seguir. Voto portanto contra o projecto.

O Sr. Cunha — Eu em todo o caso não desisto da palavra. Esta questão que parecia simples em si, tem tomado uma face muito differente. Talvez os illustres deputados que não são da minha opinião, julguem que eu venho fazer a apologia da ignorancia, não venho; mas com que não nosso de maneira nenhuma conformar-mo, é cor; o respeito que os illustres deputados que combatem o parecer, mostram pelas academias e universidades. Eu o que tenho visto é que das academias e universidades sáem doutores muitissimo ignorantes. (Riso) Não se segue que por um homem sair de uma academia, esse homem seja sabio; e nós em Portugal temos o dictado, de que um burro carregado de livros é doutor. (Rio).

Sr. presidente, o que se quer n'um official de marinha, é a practica. E aonde se aprende esta practica? E na escola naval? E na Escóla Polytechnica? Não, é no meio do mar luctando com as tempestades. E dizei-me senão foi nos perigos, senão é apalpando os trabalhas, como official de guarnição, como commandante de uma estação naval que se aprende.

Se o governo ouviu a supplica que fez este official, se consultou o major general da armada, e se o major general da armada informou a favor, e o governo seguiu a informação do major general, como quer o illustre deputado que essa pertenção seja desattendida? Diz o illustre deputado que não ha exemplo nenhum que manda dispensar as habilitações scientificas. Sr. presidente, toda a lei tem uma excepto. Haverá alguns officiaes nas circumstancias deste, que tenham estado na marinha! Eu digo que sim. Não promoveram o anno passa do o Sr. Pedro Ollegario a 1.º tenente? Porque e que então os illustres deputados não ergueram a sua voz contra o governo actual, o governo que os illustres deputados apoia o, visto que este official não tinha as habilitações scientificas? Este governo fel-o primeiro tenente da armada. Quaes eram as habilitações delle? Tinha usado a escola naval? Não. Pois então porque é que os illustres deputados emmudeceram, e não tiveram uma palavra de reprehensão contra o governo?... Talvez o sr. Guedes não seja da loja dos illustres deputados (Riso). Realmente não posso suppor outro motivo; porque sendo este negocio tão corriqueiro, admira como os illustres deputados viessem com tanto clamor e alarido pedir que, se cumprissem as disposições da lei. O de que toda a gente faz menos caso é da lei. Qual é a lei que se executa em Portugal? Em 1845 o Sr. Guedes o que era então? Já estava na marinha de guerra contra esse decreto que illustres deputadas invocam. Há 12 annos que commanda uma estação, e vem o illustre deputado esfalfar-se por amor da lei, como se houvesse alguma lei que se cumprisse! Para que é estar aqui a turbar-nos a cabeça com a Escola Polytechnica, com a escola naval e com a universidade? Já estive algum tempo na universidade o confesso que foi onde menos aprendi.

Sr. presidente, acho que a camara fará muito em approvar o parecer em discussão, a exemplo do que aconteceu em 1850. Eu tenho aqui o projecto apresentado em 50, o qual está em circumstancias tão favoraveis para com, o sr. Jeronymo Romero, como este se acha para com o sr. Guedes; e com tudo foi approvado pela commissão de marinha, composta dos srs. (Leu). Por conseguinte aqui está que uma commissão composta quasi toda de officiaes de marinha não teve a menor duvida em approvar a proposta do governo, e o nobre deputado que não é official de marinha, não só não quer approvar o parecer, mas levo a camara 48 horas suspensa, vindo ante hontem propor o adiamento, porquanto não tinha lido o projecto, e hoje veiu retiral-o porque o tinha lido.

Quando vi que o nobre deputado retirava o adiamento, estava disposto a congratular-me com s. ex.ª, porque julguei que queria approvar o projecto; mas agora vejo que o nobre deputado depois de se enfronhar bem veiu retirar o adiamento, não para approvar o projecto, mas para o combater; espero porem que a camara não ha de acompanhar o sr. deputado, e se o acompanhar é por uma circumstancia, é por me desfeitear a mim: (Vozes: — não, não) porque eu sou tão infeliz, que quando advogo alguma causa, esta torna-se tambem infeliz. Espero, digo que a camara não acompanhe o sr. deputado, porque se o acompanhar, vai fazer um grande mal a um individuo que tem serviços importantes, cortando-lhe a sua carreira, o deixando-o sem meios de subsistencia, por isso que perde oposto que tem. O individuo de que se tracta, é hoje 2.º tenente da armada; o que elle pede é pertencer ao quadro effectivo da armada, e que se lhe tire a clausula com que foi despachado, clausula que se tem tirado a todos os officiaes de marinha em circunstancias iguaes a este. (Apoiados). Por todas estas rasões voto pelo projecto em discussão.

O sr. Rivara: — Aqui não se tracta nem de academias, nem de universidades; tracta-se da especie contida no projecto; o sobre ella já fui, em parte, provenido pelo sr. Julio Pimentel. Ou temos lei, ou não temos, que regule este caso? Creio que a não lemos; e a prova está no projecto; se a não temos, está claro que é preciso faze-la para poder aproveitar ao individuo de que se tracta. Mas eu entendo que seria melhor fazer uma lei á similhança do que se pratica em outras nações mais adiantadas do que a nossa para que certo numero de officiaes do quadro effectivo da armada seja preenchido por homens que tenham começado pelos lugares inferiores, embora não hajam cursado as academias. Será isto justo e conveniente? Parece-me que sim: o intendo que do governo deve partir uma proposta neste sentido, afim de que uma lei geral, e não uma lei especial, de futuro possa regular para casos taes; o não estarmos todos os dias a fazer leis excepcionaes, porque em resultado a excepção é sempre odiosa. Voto, por Unto, contra o projecto em discussão por ser uma excepção á regra geral; mas não hei de votar contra ama lei geral que comprehenda todas as hypotheses, que comprehenda não só o individuo de que se tracta, mas todos aquelles que estiverem no mesmo caso.

O sr. Tavares de Macedo: — Na altura em que me chega a palavra, é impossivel que não tenha tido preve-

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nido por alguns srs. deputados sobre aquillo que eu tinha a dizer. Pedi a palavra quando fallava o senhor orador; mas tanto o primeiro como o segundo deram á materia uma extensão demasiada; um fallando sobre a necessidade de habilitações, e o outro desenvolvendo até que ponto a lei deverá exigir habilitações. Pela minha parte declaro, (e parece-me que ninguem deixará de concordar com a minha opinião) que entendo necessario que a lei exija certas habilitações para certos casos approvados); o homem só quando tenha adquirido certos conhecimentos na ordem social, é então é que se acha habilitado pára igualar os homens distincto. (Apoiados). Mas, em quanto a mim, a questão de que se tracta não sobre o exigirem-se habilitações; a questão é, se as habilitações são uma cousa tal, que em caso nenhum possam ser dispensadas, e se ha uma só formula pela qual os homens cheguem a habilitar-se para certos casos (Vozes: — Muito bem.) Em geral, as leis quando são bem feitas escolhem sempre o melhor modo de habilitações; com tudo ha homens que chegam ao mesmo fim sem ser pelos mesmos meios... (Apoiados), A lei estabelece certas habilitações para os officiaes de marinha; mas apparece um homem. que de facto tem dado provas distinctas de que possue essas habilitações; pergunto porque a este homem lhe faltaram certos estudos e não seguia certa carreira, havemos de negar-lhe o favor que a lei presume que pode rir a ser bom official de marinha, por isso que quando sahe das escola não ha certeza, mas sim presumpção de que poderá chegar a ser bom official? Logo que apparece um homem, a respeito do qual podemos ter esta certeza, porque ha vemos de recusar conceder-lhe este favor? (Apoiado). Accresce que o individuo de que se tracta, tem 13 annos de serviço na marinha, e merece recompensa de serviços já feitos. (Apodados).

Por tanto entendo que não ha rasão alguma para que a este official se negue o favor que a lei concede a outro a respeito do qual apenas ha presumpção de que virá a ser bom official de marinha. Tanto é certo que ha homens que chegam ao mesmo fim por differentes meios, que sendo a jurisprudencia um dos ramos em que se exigem mais profundos conhecimentos, creio que um dos mãi celebres jurisconsultos portuguezas que temos, não cursou a universidade; affirmam me isto pessoas que teem conhecimento de objectos practicos. Trago isto simplesmente para exemplo, de que ha homens que chegam ao mesmo fim por differentes meios. (Apoiados).

O sr. Pegado; — Pedi a, palavra unicamente para fazer uma observação a uma proposição que o sr. ministro da marinha aventou, relativamente as promoções: permitta-me s. ex.ª lhe diga, que a lei das promoções da armada não é applicavel aos que não estão habilitados em officiaes. O artigo que falla das promoções dos que se distinguem no campo da batalha, fallados officiaes que já estão officiaes habilitados, e não dos que estão ainda por habilitar.

Eu não posso deixar de dizer a minha opinião a este respeito. As promoções por distincção cio campo da batalha Dão são applicaveis senão aos que já são officiaes, e os officiaes de marinha não são officiaes sem terem todas as habilitações, tanto practicas e theoricas como scientificas Era isto que eu queria dizer a s. ex.ª.

O sr. Palmeirim: — Sr. presidente, tendo eu ouvido opiniões tão diversas aos illustres oradores que me precederam, e talvez mesmo uni pouco affastadas do ponto de que se tracta, aventurei-me a dizer algumas palavras, especialmente porque o illustre deputado por Beja, se referiu ha pouco ao parecer da commigo de marinha, que, n'um outra legislatura se occupou do 2.º tenente Jeronymo Homero. Nessa época fazia eu parte da commissão de marinha e por isso tenho presente o que occorreu, estabelecendo-se a final um precedente, precedente que hoje é invocado pelo official de que se tracta. O governo desse tempo, sr. presidente, disse á camara que o tenente Romero, sendo da marinha marcante, e muito conhecedor dos mares de Moçambique, fôra por falta de officiaes da marinha real nomeado de commissão pelo governador de Moçambique, para commandar um navio do estado, com o qual cruzou aquelles mares, e fez differentes serviços, até que veio á Europa, conduzindo uma presa, que era um navio negreiro. Ora se bem me lembro, foi por isto, por ter servido alguns annos e por ter até commandado em secado aquella estação, que o respectivo ministro propoz á camara a sua entrada no quadro da armada sem condição alguma.

Na commissão foi isto thema de muita discussão, sendo eu um dos que que, mais escrupulos tive: primeiro por ignorar as habitações nauticas do individuo, com quanto soubesse que elle não podia possuir as militares: segundo, porque, havendo uma lei que estabelece certa quantidade, e certa qualidade de estudos, assim como estabeleceu a practica por tempos determinados para pasmar a guarda-marinha e 2.º tenente, não me parecia justo que os que ao abrigo da lei tinham adquirido direitos, ficassem inesperadamente preteridos; terceiro por me constar que o individuo era hespanhol; quando, finalmente por me admirar de que havendo tão extensa lista do officiaes da marinha real, o governo conservasse por tanto tempo no commando daquella esticão um individuo que não era official da marinha, e isto pelo simples facto de elle ser alli residente. Constou-me tambem, por essa occasião que havia mais outro de commissão, e era o actual representante. Mas tudo isto tenho por abuso, porque concordando eu em que este serviço nas estações de Africa, que os estrangeiros classificam de campanha, biennal, entendo tambem que elle deve ser desempenhado pelos officiaes da armada.

De todas estas duvidas da commissão resultou provarem se mais os serviços do tenente Romero; resultou mostrar-se que elle cursava a academia naval de Sevilha; e por ultimo, que se havia naturalisado recentemente como portuguez.

Em presença pois, destes factos, convidou a commissão o governo e fez lhe sentir que ella não admittia o ingresso na armada áquelle official, senão ressalvando os licitos legaes e as habilitações scientificas, militares e nauticas dos que a esse tempo já pertenciam á marinha real. Foi isto o que se couverteu em lei, afim de que o tenente Homero não podesse progredir, mas antes ficasse por muito tempo estacionario, apezar de que, ouvi dizer depois, que, esse official fôra promovido a 1.º tenente sem prejuizo da antiguidade; isto é, esperando que o ultimo guarda-marinha de então passasse a 1.º tenente mais antigo que elle, o que na sua idade equivale a não, passar além.

Em presença desta historia do projecto alludido, convencer-se-ha a camara de que, invocando o 2.º tenente Guedes de que se trata, o mesmo concedido áquelle com quem serviu, e de quem por tantos amos foi camarada; e quando ninguem lhe contesta, mas antes elogia o modo de servir, sobre o que eu nada assevero, porque o não conheço, não é muito que, onde ha a mesma razão se estabeleça igual disposição; sobre tudo quando o referido Guedes foi piloto da nossa armada, o segundo o que diz a commissão, saiu de Lisboa abordo de um navio da guerra ha 13 annos; e visto mesmo ser impossivel attender-se mais a um portuguez da recente data, que ao que nasceu em terra portugueza.

Eu respeito muito as leis que exigem sciencia, mas o caso premente é de excepção: é um caso excepcional. Andam errados aquelles que negam a existencia de uma lei de promoções, porque a ha e muito explicita, e ás suas disposições se soccorrem muitas vezes os que se julgam lesados. Se ha abusos, não se argúa delles ausencia de legislação. E ainda assevero mais que, para a hypothese de que se tracta, é a legislação sufficiente, e acho preferivel que os individuos, ou os governos tenham antes de pedir uma lei no parlamento, do que deixar-lhes em lei geral, porta aberta para a entrada de quantos mercantes pertendessem servir de commissão, porque então logo viria o abuso (Apoiados) e esses officiaes em prejuizo dos outros, ser lhe-iam com tudo, nocivos, occupando no orçamenta a despeza que devia pertencer a outros. Concluo pois, votando pelo parecer da commissão.

O sr. Presidente: — Não ha numero na caza, nem nos corredores, e por conseguinte não póde votar-se.

O sr. Pinto de Almeida (Sobre a ordem.). — Eu pedi

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a palavra a v. ex.ª para requerer o cumprimento de um preceito da camara, e vem a ser, que, quando não possa ter logar qualquer votação porque os srs. deputados se tenham auzentado da sala, o seu nome seja lançado no Diario. Eu estou sempre na camara ás horas; não desejo que se diga, como se diz nas provincias, que os deputados não fazem a sua obrigação, nem cumprem com o seu dever, e que andam passeando por Lisboa, e frequentando o Marrare em logar de estarem aqui.

Peço por tanto, a v. ex.ª que mande cumprir uma deliberação da camara, mandando fazer a chamada. Já em virtude de uma proposta do sr. Nogueira Soares se decidiu que se votasse com o numero de 52, e isto de certo é uma falta de consideração, porque nem ao menos 52 deputados estão na sala para se fazer uma votação.

O sr. Presidente: — Vai proceder-se á chamada para o fim indicado pelo sr. deputado.

O sr. Santos Monteiro: — Os membros da commissão de verificação de poderes estão trabalhando na casa da commissão.

Fez-se a chamada.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para amanhã, é a discussão do parecer da commissão de poderes, e a votação sobre o projecto n.º 99, e depois, constituir-se a camara em commissões. Está levantada a sessão. Eram tres quartos depois das tres horas da tarde.

O 1.º Redactor

J. B. Gastão.

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