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SESSÃO DE 28 DE DEZEMBRO 1853.

PRESIDÊNCIA DO SR. SILVA SANCHES

Chamada: — Presentes 59 srs. deputados.

Abertura: — ao meio dia e um quarto.

Acta: — Approvada.

O sr. Presidente: — Convido os srs. secretario Tavares e vice-secretario Costa o Silva a introduzirem na sala o sr. deputado Manoel Joaquim do Quintella limam, que está nos corredores.

Foi introduzido, prestou o juramento e tomou assento.

Correspondencia.

Declarações: — 1.ª Do sr. Silva Pereira (José) de que o sr. Torquato Maximo não póde comparecer á sessão de hoje, e a mais algumas, por justos motivos. — Inteirada.

2.ª Do sr. Lourenço Cabral, de que o sr. J. M. de Andrade não comparece á sessão de hoje por incommodo de saude. — Inteirada.

Officios: — 1.º Do sr. Jeremias Mascarenhas, datado de hontem, participando que, por incommodo de saude, não assistiu á sessão do ante-hontem e de hontem. — Inteirada.

2.º Do sr. Antonio Augusto Cabral de Sousa Pires, expondo que tendo sido eleito deputado pelo circulo de Arcos de Val-de-Vez e não sendo o exercicio deste mandato compativel com o cargo do administrador do bairro de Santa Catharina, no Porto, declara que opta pela cadeira de deputado. — Inteirada.

segundas leituras. 1.º — projecto de lei (n.º 123 D.)

Senhores: — Ha na legislação academica que rege a Universidade do Coimbra, uma formula hoje condemnada pela opinião publica, e que se resente de algumas disposições barbaras e inquisitoriaes promulgadas em tempos de obscurantismo em que a liberdade era soffocada pelo absolutismo. Esta formula é o juizo de costumes nas informações fiscaes dos bachareis formados.

A Universidade é primeiro que tudo um instituto de sciencia, ainda que deve tambem ser ir de escola de moral o religião Mas a educação moral e religiosa não se infiltra na mocidade por por julgamentos severos absolutamente improprios da missão paternal do magisterio, e sempre sujeito a paixões e erros funestos, e a desigualdades e injustiças flagrantes.

O mestre devo ensinar moralmente o discipulo pelos exemplos, pelas acções, pelos conselhos e pela palavra. O professor deve ser o modelo de virtudes, mas converte-lo em juiz dos costumes de seus discipulos, é redusi-lo a Condições ignobeis o mesquinhas, incompativeis com o saneio e suave sacerdócio do ensino. O professor é o homem menos competente para julgar do procedimento moral do-i mancebos, porque só é auctoridade na sciencia: a auctoridade na moral e na religião pertence de direito e de facto a outros funccionarios do estado e da igreja, aos magistrados civis e ecclesiasticos; é destes, que o governo deve colher informações convenientes para a distribuição dos empregos publicos.

Os direitos e deveres do professor não devem estender-se além da educação puramente litteraria. Neste campo é a razão e consciencia do mestre segura garantia para o julgamento, porque a lei e a sciencia lhe concede esse privilegio. Mas fóra disto não leiu os professores direito algum para approvar ou reprovar; e dar-lhes as attribuições de juizes de costumes, A verdadeira usurpação dos foros administrativos e ecclesiasticos. Com as votações de costumes na Universidade, para que servem as informações das auctoridades, e dos parochos? Ou são uma contradicção, ou uma redundancia.

O que mostram os factos na practica de tal legislação? uma historia deploravel, o que degrada a nobre profissão do magisterio. Um alumno pode ter um procedimento reprehensivel, mas desculpavel no verdor dos annos, e no logo das paixões, mas ser um estudante distincto o um talento transcendente. Neste caso, que tantas vezes se verifica, o professor para ser juiz em ambas as cousas, approva uma e reprova outra. Mas por mais rectidão o imparcialidade, que presida a ambos os votos, a consciencia a mais pura treme nestas julgamentos, porque dominada por impressões contrarias, hade ser escrava do sentimento mais forte, o proferir uni sentença desigual. Se tem a premiar um grande merecimento, tom de condemnar ao mesmo tempo um grande escandalo e uma grande devassidão, o estes juizos encontrados fazem desvairar o espirito, e condusam a aberrações o absurdos.

Que meios faculta a lei ao professor para ser juiz de crimes fóra das aulas? Nenhuns, a não se pretender que o professor desça á baixeza e indignidade do espião. Admittindo mesmo, que o in estro lenha obrigação de vigiar pelo procedimento moral do discipulo, segue-se que hade commetter injustiças manifestas absolvendo alumnos immoraes só porque viu ou não ouviu factos escandalosos. E quantos innocentes lia condemnar illudido por intrigas o por informações falsas e injustas?

Em fim as informações de costumes são instrumentos de mesquinhas vinganças em mãos pouco escrupulosas, e em homens apaixonados o imprudentes são uma arma de tirannia e de prepotencia, que o professor intolerante e vingativo dardeja impunemente á sombra de um escrutinio secreto. A historia da Universidade offerece infallivelmente muitos exemplos de taes iniquidades bem conhecidas por todos vós o pela nação. E pelo amor que consagro ao credito o dignidade do magisterio do Coimbra, que o quero ver desassombrado dessa arvore infesta e venenosa; declaro com toda a affouteza que a Universidade não teria tantos inimigos e detractores, se da legislação academica se tivesse riscado ha muito essa providencia inutil e impropria da sciencia — as informações de costumes.

Por estas e por outras muitas razões, bem patentes á vossa intelligencia o sabedoria, tenho a honra de vos propôr o seguinte

Projecto de lei. — Artigo 1.º São abolidas as informações em cortumes na Universidade.

Art. 2.º E revogada a carta regia de 3 de junho de 1782, e o § 6 do artigo 6.º do regulamento de policia academica do 5 de novembro de 1830, na parte em que determinam que haja votação em informações de costumes para os bachareis formados e doutores na Universidade.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario. — Sala da camara dos srs. deputados em 21 de dezembro de 1853. — O deputado José de Moraes Pinto de Almeida.

Foi admitido. — Mandou-se imprimir no Diario ao Governo. — E remetteu-se A commissão de instrucção publica.

2.º — projecto de lei. (n.º 123 B) Senhores. — Por diversos decretos tem sido prorogado o prazo para o pagamento dos direitos de mercês com o beneficio concedido pela carta de lei de 28 de fevereiro de 1851.

Muitos empregados tiveram a fortuna de aproveitar semelhante beneficio, mas das duas classes houve as dos empregados das repartições de fazenda dos districtos, e das administrações dos correios — que pela circumstancia — os primeiros de lhes ser exigido o pagamento de

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direitos de mercês depois de findo o ultimo prazo e os segundos de serem nomeados recentemente para os logares dos quadros estabelecidos pelo decreto de 27 do outubro de 1852 — não puderam gozar daquelle beneficio o estão actualmente soffrendo um desconto tal em seus diminutos ordenados, que addicionados com as despezas dos provimentos os tem reduzido a tristissimas circumstancias; e como na conformidade do art. 145 § 12 da Carta constitucional, a lei deve ser egual para todos: — tenho a honra do apresentar o seguinte:

Projecto de. Lei: — Artigo 1.º E prorogado por mais 60 dias o prazo concedido para o pagam mio dos direitos de merces lucrativas, nos termos do art. 1.º da carta de lei do 28 de fevereiro do 1851.

Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da camara dos srs. deputados, em 21 de dezembro do 1853. — O deputado, José de Moraes pinto de Almeida.

Foi admittido — E remetteu-se d commissão de fazenda.

3.º — Projecto de lei. (n.º 123)

Senhores: — A producção do café constitue hoje a principal riqueza das ilhas de S. Thomé é Principe. Pois sua boa qualidade, quando bem escolhido, é estimado nos diversos mercados a que tem sido levado, e classificado como o primeiro depois do de Maio, achando nelles prompta venda. Mas infelizmente individuos ha, na ilha de S. Thomé, que, desconhecendo os seus verdadeiros interesses, tem modernamente feito perder ao mesmo genero grande parte do seu valor no mercado, depreciando-o não só pela má escolha, senão tambem pela mistura de materias estranhas.

A verdade que para esta concorro em grande parto o processo da sécca, porque não estando alli introduzidos os seccadores do alvenaria, sendo seco no chão, o quando] muito em esteiras, ajunta-se-lhe muitas materias estranhas. Do mesmo modo recorro o processo da colheita, a respeito do qual nenhum cuidado tem os cultivadores em melhoral-o: afferrados ao antigo costume, deixam amadurecer o café até o ponto do cair sacudindo os cafeseiros; e assim fazem a colheita no chão; na ilha do Principe porem o café é apanhado na arvore, lavado, o secco na casca interpor, por isso reputado do melhor qualidade o mais limpo

O damno que de lai procedimento provirá áquella provincia é manifesto, e manifesta tambem é, no meu entender, a necessidade do adoptar providencias que obviem o descredito do genero, cuja cultura tom lido grande desenvolvimento nas referidas ilhas, e que podo concorrer tão poderosamente para a sua futura prosperidade.

Em taes circumstancias julgo do meu dever, como deputado pela sobredita provincia, apresentar á vossa consideração as providencias, que me parecem mais efficazes, para o fim que tenho em vista. Estas providencias são reclamadas pelo commercio daquellas ilhas, ha mais de quatorze annos; mas sem resultado, pela consideração de que iam atacar a ampla liberdade das permutas, quando só se limitam a não permittir se exporte, por bom, um genero tornado máo pelo nenhum cuidado em beneficial-o. A experiencia que tenho daquellas ilhas, aonde resido há mais do vinte annos, me convence, de que não haverá outro meio mais prompto para obstar aos grandes prejuizos, que do descredito do café alli produzido, lhes resultará.

Finalmente a medida, que vos proponho, não é nova; tem existido, e ainda existem analogas ou similhantes em Portugal o em outros paizes.

Venho pois propôr-vos, senhores, a approvação do seguinte

Projecto de Lei: — Art. 1.º E creada na ilha de S. Thomé uma commissão que se denominará, commissão inspectora do café, produzido na mesma ilha, composta de um dos maiores cultivadores deste genero, de um negociante, o de um empregado fiscal.

§ 1.º Os membros desta commissão devem ser eleitos de dois em dois annos, em escrutinio secreto pelo conselho do governo.

§.º O presidente deve ser nomeado pelo governador dentre os dois primeiros membros, servindo de secretario o empregado fiscal.

Art. 2.º A camara municipal fará, em tempo competente, duas pautas, que enviará ao governador, contendo ums dez nomes dos principaes cultivadores do café, o a outra os dos dez principaes negociantes para os fins do § 1.º do artigo antecedente.

Art. 3.º São gratuitas as funcções dos 2 primeiros membros ds inspecção. Terá porém direito a uma gratificação, não maior do metade do seu respectivo ordenado, o empregado fiscal servindo de secretario.

Art. 4.º Os membros da commissão pódem ser reeleitos, mas não são obrigados a servir dous biennios seguidos.

Art. 5.º Os individuos que estando no caso do art. 1.º se recusarem a servir estes cargos, incorrerão nas penas impostas pelo codigo administrativo, aos que se recusam a servir os cargos municipaes.

Art. 6.º No edificio da alfandega, ou em outro, se designará casa ou armazens para se depositar todo o café que for destinado á exportação.

§ unico. Este deposito estará sob a fiscalisação da alfandega, pelo que toca á guarda e conservação do genero, e aos pagamentos dos direitos de saída.

Art. 7.º Constituida a commissão inspectora, nenhuma porção de café poderá obtar despacho de saída, senão depois de ter sido por ella examinado e classificado.

§ 1.º A classificação será feita em 3 sortes: 1.ª, a do superior qualidade. 2.ª a de inferior apparencia, mas que não contenha grãos da unificados; 3.ª o refugo ou escolhi.

§ 2.º As saccas, barricas, ou qualquer outro volume de café, terão em logar bem vizivel um carimbo particular da commisão, contendo a designação da sorte.

Art. 8.º No acto do deposito será o café classificado, na fórma estabelecida no § 1.º do art. antecedente, dando-se ao depositante um titulo, no qual se declare a porção que de cada sorte do café fica depositada, descontando-se 1 por cento do pezo liquido, para o bom pezo e despezas do deposito.

Art. 9.º O governo decretará o necessario regulamento para a melhor execução dista lei.

Art. 10.º O disposto nesta lei poderá estender-se á ilha do Principe, se o governo assim o achar conveniente.

Art. 11.º O governo fica auctorisado, ouvido o conselho ultramarino, para dissolver a commissão creada por esta lei, logo que, a julgue desnecessaria.

Art. 12.º Fica revogada toda a legislação em contrario

Sala das cortes 21 de dezembro de 1853. — Jacintho Pereira Carneiro.

Foi admittido. — Mandou-se imprimir no Diario do Governo — E remetteu-se á commissão do ultramar.

Deu-se pela meza destino ao seguinte

requerimento: — « Requeiro se peça ao governo, pela repartição competente, para que envie a esta camara o mappa do movimento dos passageiros entre o porto do Lisboa e archipelago dos Açores nestes ultimos tres annos, com designação do numero de passageiros com relação a cada um destes annos, o a cada uma das ilhas do mesmo archipelago.» — Soares de Albergaria.

Foi remettido ao governo.

requerimento: — «Requeiro que pelo ministerio da marinha seja remettido a esta camara:

1.º Uma relação nominal dos alumnos que nestes ultimos tres annos sentaram praça de aspirantes de 2.ª classe na companhia dos guardas marinhas, por terem o curso preparatorio da escóla polytechnica para a arma da marinha, com declaração da idade de cada um na data do assentamento de praça, e das qualificações que tinham obtido nos seus exames em o dito curso.

2.º Uma igual relação nominal, com as mesmas declarações, dos que assentaram praça, nos ditos tres annos, de aspirantes de 3.ª classe, passando immediatamente depois para aspirantes de 2.? classe por terem o dito curso preparatorio.

3.º Uma relação nominal, com as mesmas declarações dos alumnos da escóla de construcção, que nos men-

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cionados tres annos passaram para aspirantes de 2.ª classe da companhia dos guardas marinhas, por terem o curso preparatorio da escóla polytechnica.

4.º Uma relação nominal dos aspirantes de 2.ª classe destes ultimos tres annos, na qual se mencione quaes delles apresentaram carta de approvação como ordinarios no seu curso preparatorio da escóla polytechnica, o quaes a carta de voluntarios.» — Pegado..

Foi remettido ao governo.

requerimento: — «Em 1848 foi encontrado na alfandega da ilha de S. Thomé um caixão, contendo diversos objectos de ouro. e prata dê igreja, no valor, pouco mais ou menos, de 1:000$000 réis; no caixão não havia indicação alguma pela qual se podesse conhecer a quem pertencia, nem se encontrou no archivo daquella repartição assento algum que o designasse. Estes objectos foram por ordem do governador pessoa recolhidos ao cofre da fazenda publica, e deu parte ao governo. Por tanto

«Requeiro que pelo ministerio da marinha e ultramar se envie a esta camara:

1.º O processo e mais diligencias que so fizeram em S. Thomé, para descobrir a quem pertenciam os objectos contidos no caixão.

2.º Uma copia da relação desses objectos, com os seus respectivos valores.

3.º Todos os esclarecimentos que houverem, relativos ao destino que se lhes deu, no caso que fosse julgado pertencerem á fazenda publica.» — Pereira torneiro.

Foi enviado ao governo.

O sr. Santos Monteiro: — Mando para a meza os seguintes pareceres da commissão do fazenda. (Leu)

O sr. Presidente: — O parecer sobre as contas da Commissão administrativa fica sobre a meza, para poder ser examinado pelos srs. deputados. Em quanto ao parecer que versa. «-Sobre as alterações feitas pela camara dos dignos pares, á preposição de lei, que lhe foi enviada desta camara, regulando o censo, que dá direito a votar e ser votado para membros da junta do credito publico, vou consultar a camara sobre se quer que se discuta desde já.

Resolveu-se affirmativamente. — E é o seguinte.

Parecer (n.º 123 a): — Foi presente á commissão do fazenda a alteração feita na camara dos dignos pares ao art. 3.º dá proposição da lei, enviada desta camara, sobre o censo e mais qualificações exigidas aos juristas para poderem votar e ter votados na eleição dos membros da junta do credito publico, o sobre a lixarão do quadro dos empregados da mesma junta. Consiste esta alteração no augmento de mais quatro logares do amanuenses de 2.ª classe além dos tres de que tractava o citado artigo. A commissão é de parecer que esta alteração deve ser approvada, e a referida proposição submettida á sancção regia. — Sala da commissão 27 dó dezembro do 1853. — V. da Junqueira — A. dos Santos Monteiro — J. M. do Casal Ribeiro — J. Antonio de Freitas, vencido — A. Xavier Palmeirim.

Foi logo approvado.

ORDEM DO DIA.

Parecer. — A commissão do verificação do pudores, em continuação dos seus trabalhos sobre a verificação e exame dos differentes processos eleitoraes, que lhe foram submettidos, vem dar-vos conta do seu juizo sobre os seguintes circulos eleitoraes, que examinou: circulo n.º 1 — Arcos de Val de Vez.

No processo eleitoral de Arcos do Val de Vez não encontrou a commissão protesto ou facto algum que alterasse a regularidade desta eleição. Votaram eleitores, e foi é mais votado Antonio Augusto Cabral de Sousa Pires com 4:5 votos; tendo obtido os dois immediatos 1 voto, havendo além disto uma lista branca. A commissão é de parecer que a eleição se deve julgar valida, e que deve Sor proclamado deputado o relendo Antonio Augusto Cabral de Sousa Pires, que aumentou o seu diploma, devendo tornar assento na camara quando opte pois cadeira de deputado, por ser, o mesmo, administrador do 1.º bairro do Pôrto. circulo n.º 1 — Villa Real.

Nessa ocasião votaram 3:302 eleitores, e. foi eleito deputado Antonio Felisberto da Silva Cunha Leite com 3.272 votos; sendo os immediatos em votos Antonio Ferreira do Carvalho com 40 votos, e Manoel Ignacio Pinto com outros 10.

A commissão não encontrou duvida alguma ou protesto contra esta eleição, o é por isso de parecer que a mesma se julgue valida.

Circulo n.º 4 — Aveiro.

Na cidade de Aveiro, onde se procedeu a eleição de um deputado, votaram 4.301) eleitores, tendo obtido maior numero de votos Manoel José Mondes Leite, que foi eleito deputado com 4.087 votos, sendo o immediato Antonio Luiz de Seabra com 2011 votos.

Á commissão, não encontrando duvida, nem pretexto algum, é do parecer que se devo julgar válido este processo eleitoral.

Círculo n.º 10 — Oliveira de Azemeis. Na eleição a que se procedeu no circulo de Oliveira Azemeis, foi o mais votado Diogo Pereira Forjaz com 1:708 votos; sendo o immediato Bento José da Silva Lima com 180 votos; e o numero real dos votantes 1 901 votos.

A commissão não encontrou duvida, ou protesto algum nesta eleição, e é por isso do parecer que a mesma se julgue válida, o que seja proclamado deputado, para tomar assento na camara o referido Diogo Pereira Forjaz, que apresentou o seu diploma em forma legal. círculo n.º 35 — Béja: Na cidade de Béja, e seu respectivo circulo eleitoral, procedeu-se igualmente á eleição dê um deputado; o tendo votado 2.528 eleitores, obteve o maior numero do votes Joaquim Thomás Lobo do Avila, que foi eleito deputado com 2.404 votos; sendo o immediato José da Silva Mendes Leal Junior com 17 votos.

A commissão não encontrou duvida, nem protesto algum que alterasse a regularidade desta eleição; o é por isso de parecer que ela se julgue válida, e que seja proclamado deputado o mesmo Joaquim Thomás Lobo de a vila, que apresentou o seu diploma; e porque o mesmo fizera constar á commissão, que era director, nomeado pelo governo, da companhia contrai peninsular dos caminhos de ferro de Portugal, intendeu a mesma, que na conformidade do art. 13.º, § 3.º, e do art. 16.º do decreto eleitoral ele 30 de Setembro de 1852, não podia deferir-se o juramento para tomar assento na camara, sem que declare, se opta pelo logar de deputado, e que mostre ter cessado o motivo da incompatibilidade.

Circulo n.º 37 — Lagos.

No circulo eleitoral do Lagos, para a eleição de um deputado, votaram 1:458 eleitores, tendo obtido maior numero de votos Manoel Maria Coutinho de Albergaria Freire, que foi eleito deputado com 1:454 votos, sendo immediato Jacinto Alexandre Travassos Neves com 2 votos.

A commissão não encontrou protesto, nem duvida alguma neste processo eleitoral, o é por isso de parecer que se deve julgar valido este processo eleitoral, e proclamado deputado o referido Manoel Maria Coutinho de Albergaria Freire, que apresentou o seu diploma.

E pondo-se á discussão, e logo á votação a parte que diz respeito ao

Circulo n.º 1. — Arcos de Val-de-Vez — foi approvado.

O sr. Presidente: — Tendo este sr. deputado eleito declarado, como a camara sabe, que opta pelo logar de deputado, não ha duvida em proclamal-o já deputado, visto que está nos corredores; mas como estão tambem para entrar outros srs. deputados por outros circulos, altera-se a ordem do parecer, discutindo-se as eleições desses circulos, afim de o dar entrada a todos juntos.

Passou-se pois á parte do parecer que diz respeito á eleição da

Ilha do Principe — foi logo approvada Ilha de S. Thomé — idem Macáo — idem.

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Proclamaram-se deputados

Os srs. — Antonio Augusto Cabral de Sousa Pires.

Jacintho Pereira Carneiro.

Augusto Sebastião de Castro Guedes.

José Antonio Dias Pegado.

E introduzidos na sala, com as formalidades do estilo, prestaram o juramento, e tomaram assento,

Passou-se aos seguintes

Circulo n.º 11 — Villa Real — foi logo approvada

Circulo n.º 14 — Aveiro — idem

Circulo n.º 16 — Oliveira d'Azemeis — idem.

Circulo n.º 35 — Béja.

O sr. Santos Monteiro: — (Sobre a ordem) Como este parecer está assignado pelo sr. Casal Ribeiro com declaração, achando-se ausentes da camara todos os membros da commissão de verificação do poderes, por estarem na respectiva commissão, occupados com os trabalhos, que lhe estão affectos, seria conveniente avisal-os, para virem tomar parte na discussão.

O sr. Presidente: — Foram-se avisar; no entanto dou a palavra sobre a ordem ao sr. D. Rodrigo.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: Mando para a meza o parecer da commissão encarregada de propor os meios de melhorar a publicação das sessões: e peço que se mande imprimir (Leu).

O sr. Rivara. — Peço que tambem sejam impressas as condições a que se refere a resolução quarta do parecer.

Decidiu-se, que fosse assim impresso.

O sr. Presidente: — Continúa a discussão sobre a parte do parecer relativa á eleição de Béja.

O sr. Casal Ribeiro: — Sr. presidente, pedi a palavra simplesmente para expor á camara os fundamentos com que assignei o parecer com declaração; declaração que certamente se refere á parte do parecer, que actualmente se tracta de discutir e votar, houve na commissão duvida sobre se o cargo de director da companhia dos caminhes de Urro, devia eu não ser incompativel tom o logar de deputado: e eu em vista das disposições da lei eleitoral, não pude inteiramente concordar com os meus collegas, e por isso assignei o parecer com declaração.

Se porém não fosse a circumstancia de ser membro daquella commissão, e por consequencia ter necessidade de fundamentar o meu voto, não diria cousa alguma nesta questão, porque tendo relações particulares de amisade, com o cavalheiro de que se tracta, poderia parecer que eram essas relações de amisade, que me moviam a suscitar esta questão: posso comtudo desde já declarar á camara, que o eleito de bom grado, acceita qualquer decisão, opta sempre pelo logar de deputado, e só o que deseja é que ella seja prompta, para vir quanto antes tomar assento na camara.

Agora, vou, não entrar na questão, mas dar as razões do meu voto.

A lei eleitoral estabeleceu os casos em que se dá a incompatibilidade no artigo 13 e seus diversos n.ºs, e a commissão entendeu que o cavalheiro de que se tracta, está comprehendido na disposição do n.º 3.º deste art. 13.º, que é o seguinte (Leu).

Art. 13.º É incompativel o logar de deputado:

1.º Com qualquer emprego da casa real, estando o empregado em effectivo serviço.

2.º Com o logar de arrematante, director, caixa geral, e principal gestor de qualquer contracto de rendimentos do estado, e com o de arrematante e administrador de obras publicas.

3.º Com o logar de director de quaesquer companhias ou sociedades, que recebam subsidio do estado, ou administrem algum dos seus rendimentos.

Não quero entrar na questão se a companhia dos caminhos de ferro é ou não subsidiada pelo governo; direi antes que me inclino á opinião affirmativa, porque me parece, que se pode considerar como subsidiada, n'uma accepção mais larga, se tractarmos do juro concedido áquella companhia; mas, pondo de parte essa questão, o que me faz duvidar, é a especialidade que se dá na organisação desta companhia, pelo facto de entrar nella o governo por accionista de uma terça parte.

Deste facto resultou a necessidade do governo se fazer representar na direcção por pessoas da sua confiança, e deste facto deriva a nomeação do cavalheiro eleito para director da companhia, sendo por consequencia director representante dos interesses do governo, e não director representante dos interesses particulares da companhia.

Ora se ha casos em que para se interpetrar a lei é preciso recorrer ao seu espirito, é de certo este um delles; e parece-me que, lendo-se o artigo que tracta das incompatibilidades, ninguem poderá deixar de reconhecer, que se estabelecem ali duas cathegorias diversas, uma nos n.ºs 2.º e 3.º, outra nos n.ºs seguintes. A dos n.ºs 2.º e 3.º tem, como razão, a supposição de que o individuo, que occupa similhantes posições, pode representar interesses oppostos aos interesses publicos; e essa collisão de interesses lança sobre elle uma certa suspeição, debaixo da qual não poderá exercer, com toda a independencia conveniente, o logar de deputado; a dos n.ºs seguintes refere-se á dependencia immediata, em que certos cargos publicos collocam o individuo.

Quanto a esta segunda cathegoria é muito expressa a lei designando quaes os logares de confiança, que se consideram incompativeis com o de deputado, como são os governadores civis, administradores de concelho etc. Mas quanto a cathegoria do individuo ainda que tenha sim o nome de director é verdadeiramente um funccionario publico, é um procurador do governo, um representante dos interesses que o governo tem na companhia; não tem interesse nenhum individual nem proprio; o que alli representa é o interesse do estado. E por consequencia pareceu-me, e parece-me ainda, que, embora possa affigurar-se á primeira vista pela letra da lei, que nella está comprehendido, pela sua interpretação não julgo que o esteja.

Quiz unicamente explicar á camara qual é o meu voto nesta materia, não entro mais largamente na questão, mas direi sómente que não pode deixar de parecer repugnante que se considere incompativel o logar de deputado com o que este cavalheiro exerce na companhia, quando nella não representa senão os interesses do estado. Aqui a qualidade de director é simplesmente questão de nome. Se o governo em logar de lhe chamar director lhe chamasse fiscal, lhe chamasse procurador, lhe desse outro nome, e lhe desse o mesmo direito, ninguem, em vista da lei, poderia julgar este caso de incompatibilidade. Este logar corresponde ao de um funccionario publico, e parece-me que a camara, sem fazer injustiça poderia declarar não incompativel este logar com o de deputado. Repito, entrei nesta questão sómente forçado pelo facto de ser membro da commissão de poderes e por consequencia ter necessidade de explicar o voto que alli dei; se não fosse esta circumstancia, limitar-me-ia a dar um voto silencioso na questão sem apresentar os fundamentos desse voto, porque não desejaria parecer movido pelas relações de amizade que tenho com o eleito.

O sr. Justino de Freitas: — Sr. presidente, levanto-me para apresentar á camara as razões que levaram a commissão a exarar o parecer como se acha redigido. A commissão olhou exactamente para as prescripções do artigo 13.º do decreto de 30 de setembro do anno ultimo e nesse artigo diz-se no n.º 3.º que ha pouco se invocou o seguinte (Leu.)

O eleito de que se tracta, ninguem pode negar que é director da companhia dos caminhos de ferro, como tal foi nomeado por diploma do governo para representar a parte das acções que tomou o governo; por consequencia sendo director, está comprehendido debaixo das disposições da lei. Na lei não se faz distincção, e onde a lei é clara, onde não distingue, nao ha logar a interpretação, nem nós podemos distinguir. Eu admitto a interpretação quando ha obscuridade nas palavras da lei, mas quando ella se pode intender com clareza, quando não ha duvida alguma nos seus termos, não sei que se possa invocar o seu espirito. Todos reconhecem o grandissimo inconveniente, de, quando a lei está escripta com toda a clareza, se invocar o seu espirito, de se pôr em guerra a letra da lei cem o seu espirito; deste modo fica ao arbitrio de qualquer illudir a lei. O meu illustre collega que acabou

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de fallar não podendo achar fundamento para sustentar a sua opinião na leira clara e expressa da lei, foi invocar o seu espirito para rebellar o espirito contra a letra da mesma lei, mas parece-me que neste seu modo de argumentar não apresentou ainda razão plausivel que me possa pelo menos convencer a mim de que o illustre deputado eleito de que se tracta, não deve optar. Qual é a razão que a lei teve em vista para excluir os directores de companhias etc.? Foi pela influencia que elles poderiam exercer com o governo, e a dependencia em que elles estavam do mesmo governo para conseguir seus fins; por consequencia esta reciproca alliança para assim dizer, de um lado os interesses da companhia de que o eleito fosse director, de outro lado a dependencia em que elle estava do governo, obrigou o legislador a estabelecer que o eleito optasse nesse caso, e pela lei antiga era até excluido de tomar assento na camara. Ora, no caso actual não se verifica a hypothese da dependencia do director, da companhia, mas verifica-se a dependencia em que está do governo. N'uma palavra a commissão entendeu que a letra da lei era clara, a lei expressamente falla dos directores de companhias, e sendo o sr. deputado eleito director da companhia des caminhos de ferro, não restava á commissão senão applicar a lei.

O sr. Cardoso Castello-Branco: — Eu não tenho a honra de estar ligado por vinculos de amisade ao cavalheiro de que se tracta, não o conheço; e comtudo resolvi-me a pedir a palavra para fallar contra o parecer da commissão, porque a sua conclusão repugna aos principios que eu tenho. Já eu disse em outra occasião nesta casa, que, sem duvida, sempre voto pelo pleno grao dos direitos politicos; agora accrescentarei que entendo não ter esta camara direito de restringir esses direitos politicos, de fazer em que o seu goso completo fique dependente de condições, senão quando a lei expressamente as determina. Eu não recorrerei ao espirito da lei; seguirei os mesmos principios que seguiu o illustre deputado que acabou de fallar, mas para tirar uma conclusão contraria.

Eu entendo que se a lei não for expressa e clara para privar o cidadão de que se tracta, do goso pleno dos seus direitos politicos, esta camara não o pode fazer. E vejamos o que diz a lei (Leu) A illustre commissão diz que o sr. deputado eleito não poda deixar de optar em vista do art. 13 da lei eleitoral: mas a commissão não recorreu a alguns principios, aos quaes talvez podesse recorrer, fundados no art. 13.º dessa mesma lei. Que diz o n.º 3 desse artigo? Diz o seguinte (Leu) Entendo, pois, que em vista deste n.º 3 o sr deputado eleito não pode ser obrigado a optar entre o logar de deputado e o de director da companhia dos caminhos de ferro; reduzindo-se a questão a saber se a companhia do que é director o sr. deputado eleito, recebe subsidio do estado. Eu digo que não; e acho que é clara e manifesta esta intelligencia que dou á lei. Que se entende por subsidio, ou por uma companhia que recebe subsidio do governo? Eu entendo por subsidio aquella prestação que o governo voluntariamente e sem alguma outra obrigação, presta a qualquer individuo ou companhia. Por exemplo, a companhia dos vinhos do Alto Douro era subsidiada pelo governo, por que o governo prestava annualmente uma quantia de 150 contos, em beneficio desta companhia, voluntaria e generosamente; mas a companhia dos caminhos de ferra não este neste caso. Por ventura esta companhia recebe algum subsidio do governo? Eu entendo que não; porque e uma companhia que contracta com o governo a construcção de um caminho do ferro por preço certo e determinado, que ha de ser pago certa e determinadamente a ella; aqui o que ha é uma cousa que parece contracto; não um subsidio cuja natureza é que seja voluntario e gratuito. Por tanto se a companhia nos caminhos de ferro não o ama companhia subsidiada pelo governo, está visto que o sr. deputado eleito de que se tracta, não está comprehendido nas disposições do art. 13.º da lei eleitoral,

Mas diz-se — o governo garante juros das quantias e capitaes que a companhia gastar na construcção dos caminhos de ferro — é verdade; porem isto não e subsidio, é preço do contracto; porque a companhia obrigou-se a

construir os caminhos de ferro por um certo preço, é o governo estabeleceu o modo de pagar este preço; por consequencia não devemos confundir o subsidia com o preço do contracto.

Eis-ahi pois somo não sendo a companhia subsidiada pelo governo, o sr. deputado eleito não pode estar ligado á disposição do n.º 3 do art. 3.º, isto é, não pode ser obrigado optar entre o logar de deputado e o de director da companhia.

Em conclusão voto contra o parecer da commissão, para que seja proclamado deputado da nação portugueza o cidadão de que se tracta, sem que seja obrigado a declarar se quer optar pelo logar de deputado.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sinto ter de fallar em seguida ao nobre deputado, que está de accordo com a opinião que vou emittir não por parte do governo, porque o governo não costuma tomar parte nestas questões eleitoraes, que são proprias unicamente da camara, a não ser para dar alguns esclarecimentos; mas sim como deputado e membro desta casa a que tenho a honra de pertencer. Entendo emittir o meu voto em sentido do que a camara, pela resolução que tomar qualquer que ella seja, não incorra em absurdo ou inconveniente; estando persuadido que não póde ser da mente da camara tomar uma resolução sobre este objecto, de que resulta um absurdo evidente e manifesto. E sr. presidente, este absurdo resultará inevitavelmente se acaso o cavalheiro do que se tracta, fôr obrigado a optar entre o logar que tem de commissão do governo, como director da companhia dos caminhos de ferro, e o logar de deputado que lhe deram os seus constituintes.

É certo que a lei usou da expressão generica — directores — e que este cavalheiro foi effectivamente nomeado director da companhia dos caminhos de ferro por parte do governo; mas parece-me que entre a observancia grammatical da lei e a observancia do seu espirito, ha alguma differença; devendo notar-se que a lei a que me retiro, não foi feita por esta camara, mas foi approvada por ella, que importa o mesmo. Parece-me que a camara não deve obrigar o cavalheiro do que se tracta, a optar entre o logar de deputado e o do director da companhia dos caminhos de ferro, que é um logar de pura commissão do governo, e que por este facto o não inhibe de tomar assento nesta camara, sem que lhe seja necessario declarar a opção; parece-me que a camara não póde obrigar este individuo a optar, por isso que não tem outros interesses na companhia que não sejam os interesses do estado, quando outros cavalheiros que tem alli grossas quantias e interesses, se sentam nesta camara, sem que a lei os obrigue a optar. Pois o cavalheiro de que se tracta, ha-de ser obrigado a optar, quando elle não tem interesses alguns na companhia, quando não tem alli um real de fundos seus, quando náo administra cousa nenhuma, em quanto que aquelles que tem alli grossos fundos e quantias, e que tem os seus interesses ligados aos interesses da companhia, podem ter assento nesta camara som optar?!! Eu peço á camara que considere este objecto, e que não queira incorrer neste absurdo manifesto.

Mas diz-se — não é o espirito, é a letra da lei que regula para o caso em questão.

Sr. presidente, a camara não é um tribunal judicial; a camara sabe o espirito da lei; a camara compenetrou-se dos fundamentos pelos quaes a lei foi feita e apresentada: e por isso não creio que a camara queira approvar um principio que é manifestamente contrario ao espirito da mesma lei.

Para que a camara veja a pouca razão que se dá por parte da commissão de verificação de poderes, para se approvar o parecer no ponto de que se tracta, basta observar que absolutamente fallando, é uma questão de palavras; isto é, a camara vai obrigar a optar a um individuo que por uma questão de palavras se acha collocado nestas circumstancias, ou de perder o seu logar que tem as companhia dos caminhos de ferro; ou de renunciar ao logar de deputado, e por consequencia renunciar a um dos mau bellos direitos politicos do cidadão.

Quando se fizeram as nomeações para a companhia dos caminhos de ferro, póde dizer-se que os individuos no-

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meados pelo governo eram seus delegados e seus fiscaes; e effectivamente é o que actualmente são por parte do governo.

Foi um modo de expressar, mas não alterou em nada a essencia da cousa. Elles não estão alli representando a companhia; teem interesses diametralmente oppostos aos da companhia; elles são obrigados a zelar os interesses do estado dentro da companhia, são delegados do governo. E note a camara que, desta maneira, vai excluir o delegado sem excluir o que delega. Eu neste caso, devia ser obrigado a optar entre a minha cadeira de deputado e a situação de ministro das obras publicas. Em consequencia daquelle contracto o sr. Lobo de Avila é meu delegado, é delegado do governo naquella companhia, a camara obriga o delegado a perder a sua cadeira de deputado, em quanto que eu que delego, eu que tenho direito de fazer demittir o sr. Lobo de Avila no momento em que elle tiver opinião differente da minha, continúo a ser deputado!... Elle que não tem opinião sua, que tem apenas a opinião do governo, que não pode ter outra, é obrigado a optar! Isto é um absurdo manifesto. Parece-me que não se deve levar a lei tanto pela letra quanto ella assim repugna ao senso commum. Foi a razão porque tomei a liberdade de dizer estas poucas palavras, que não são por parte do governo, porque o governo não entra nestas questões eleitoraes, mas como membro que sou deita casa, e entendo que como tal podia emittir o meu voto.

Eu abando ainda na opinião do sr. deputado Cardozo Castello Branco, de que esta companhia não póde ser considerada como subsidiada; não o póde ser porque o não é effectivamente, porque quando muito, quando se quizesse entender da maneira a mais restricta a disposição da lei sobre este objecto, o mais que se podia dizer era — que seria subsidiada eventualmente em circunstancias particulares, e nunca geralmente subsidiada. A companhia tem um juro garantido por parte do governo, mas este juro que o governo garante á companhia, quer dizer, esta vantagem póde não ser fruida pela companhia; no caso do que o producto liquido do caminho de ferro seja egual pelo menos ao juro que o governo garante, acabou-se a garantia do juro, acabou se o subsidio, não ha subsidio a companhia. Comtudo obriga-se em nome desse subsidio a optar entre a cadeira de deputado, e o logar de director da companhia!...

Direi mais: Se o juro for superior, se exceder alem de um certo limito marcado na lei, ainda esse juro, ainda esse interesse se reparte com o governo; de maneira que longe, nesse caso, de ser a companhia subsidiada, é o governo que tira partido da companhia. E é em nome deste subsidio que neste caso é contraproducente, que se quer obrigar á optar entre a cadeira de deputado, e o lugar de director da companhia do caminho de ferro!...

Sr. presidente, eu não tenho interesse senão pelas conveniencias que de certo todos os deputados desejam que esta camara guarde em negocios importantes, o sobretudo nos negocios eleitoraes, em que se tracta dos direitos politicos dos cidadãos, que devem merecer á camara muita consideração, e de certo merecem. Foi por este motivo sómente que me animei a expor a minha opinião individual, opinião como deputado, mas que, se for adoptada pela camara, estou persuadido, a salva do que eu supponho, sem nenhuma intenção de offender nem remotamente os cavalheiros que assignaram este projecto, que seria um absurdo, seria uma inconveniencia para a camara.

O sr. Presidente: — O sr. Cunha pediu a palavra: é o favor ou contra?

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Se v. ex.ª quer que lhe diga a verdade, com esta camara não sei se sou a favor ou contra; mas serei contra, serei a favor do parecer.

O sr. Presidente: — Tem a palavra.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, é triste, é tristissimo ver estar uma camara a discutir e querer pôr duvidas, sobre as cousas mais claras, mais simples e mais intelligiveis que ha.

O que diz a lei? A lei diz «os directores de quaesquer companhias.» Onde é que a lei faz a distincção estabelecida pelo illustre deputado que fallou primeiro e pelo outro que tambem se senta no lado esquerdo, e agora pelo sr. ministro da fazenda? Onde está essa distincção?

Pois vós, jurisconsultos, não sabeis que é axioma de direito, que onde a lei não distingue, ninguem póde distinguir? Sr. deputado Cardozo Castello Branco, olhai para traz de vós um pouco! Não vedes que está vazia a cadeira de um cavalheiro que foi vosso collega? Não sabeis que o sr. Pinto basto, quando foi nomeado director pela companhia do caminho de ferro, veiu á camara e renunciou á sua cadeira do deputado? Pois se o sr. Pinto Basto entendeu que não podia conciliar o seu logar de deputado com o seu logar de director da companhia do caminho de ferro, achais que o sr. Lobo de Avila póde ser deputado e ao mesmo tempo director da companhia do caminho de ferro? Entendeis isto? Por que quizestes estabelecer uma differença na minha opinião, absurda, e que me faz lembrar a ideologia da chicaneira do Baixo-Imperio, entre director por parte do governo e director por parte da companhia? A lei não estabelece esta differença.

E depois, como se isto fosse pouco, viestes dar uma definição errada, uma definição falsa, uma definição equivoca do que era subsidio. Pois se acaso o que o governo presta á companhia do caminho de ferro, não é subsidio, e não deve tomar-se como subsidio o que tem a companhia do caminho de ferro prestado pelo governo, dizei-me qual é o subsidio que tem a companhia do contracto do tabaco? Qual é? E então se o contracto do tabaco não tinha subsidio, se o contracto do tabaco porque não tinha subsidio, não estava na dependencia do governo, se membros desta camara porque eram caixas do contracto do tabaco que não tinha nada com o governo, foram excluidos daqui em duas votações successivas, porque entendeis que podeis excluir os directores do contracto do tabaco, e não os do caminho de ferro?

Uma voz: — Veja a lei.

O Orador: — Eu não quero ver a lei. Pois necessito de ver a lei? Sei-a de cór e salteada como a sabem os srs. deputados, e tanto sabem que combateram o parecer com razões pueris!... Uns dizem — ou apezar de ser amigo do sr. Lobo d'Avila, posso votar contra. Outro diz — não conheço o sr. deputado eleito. Pois eu sou amigo delle conheço-o, ou, se acaso me faz conta, não sou amigo nem o conheço; (Riso) mas quer seja amigo ou não, quer o conheça ou não conheça, conhecer ou não conhecer, ser amigo ou não ser amigo, não influo nada para o que está escripto na lei.

Se a lei foi mal feita, emendassem-na. Mas a lei não foi feita pela camara, foi um acto de dictadura que o sr. ministro e a maioria obrigaram a camara a approvar sem discussão. Houve discussão nesse decreto? Quando se abriu a discussão sobre elle? Foi a camara que fez a lei? Foi a maioria compacta, que com a brutalidade do numero, approvou o decreto. Não se vem enganar o publico dizendo que foi feita pela camara. Foi um acto de dictadura, e foi a força bruta do numero que approvou, não foi a discussão, não foi a intelligencia, não foi o raciocinio.

Ora o sr. ministro da fazenda disse uma grande verdade, é esta grande verdade que eu vou repetir com enfase, ha de rematar o que eu acabo de dizer: o sr. ministro da fazenda disse e muito bem — a camara não pode nem deve obrigar o sr. deputado eleito a optar, não póde, nem deve. — Sei que não póde porque não tem força, sei que não deve porque ha de ser contradictoria em vista do seu silencio em presença do muitos outros factos. Por consequencia a camara não póde nem deve obrigar o sr. deputado eleito a optar.

O sr. Presidente: — Peço ao sr. deputado que se abstenha de tudo quanto é interpretação de intenções.

O Orador. — Mas estamos aqui a interpretar, o que? Pois v. ex.ª, que é jurisconsulto, acha que esta lei merece interpretação? Pois não são claras as palavras, não exprimem idéas? A lei diz «os directores.» E agora prova-se que o sr. Lobo de Avila não é director, e prova-se que a companhia não é companhia, e que o subsidio nao é subsidio. Ora isto é magnifico! E quer v. ex.ª que eu em virtude de razões tão fundamentaes, de opiniões tão solidas, tome a cousa muito a serio? Não posso tomar. A companhia do caminho de ferro não é

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companhia, o subsidio não é subsidio, o sr. Lobo de Avila não é director do caminho de ferro! Pois pode-se ser deputado quando se dão razões destes, o partidas de cavalheiros que eu estou acostumado ha muito tempo a respeitar? Não sei como hei de argumentar.

Eu não tinha tenção de fallar nesta questão, nem queria fallar. Estou tão aborrecido de ser deputado que tomara que a taça da minha indignação ficasse bem cheia para poder retirar-me daqui; porque já vejo que em Portugal são necessarias qualidades para funccionar que eu não tenho, nem posso ter, nem quero ter, nem hei deter, porque não posso, nem quero, nem devo. Por consequencia estou aqui desvairado, estou aqui desnaturalizado, porque é necessario fechar os olhos á evidencia e aos escandalos para se poder funccionar. Por isso não tinha tenção de fallir nesta questão, e porque, vendo-me obrigado desgraçadamente pela imprudencia de uma promessa a calar-me em outras questões, queria ficar calado nesta.

A camara não póde nem deve obrigar o eleito a optar, a camara não póde nada; tem estado e está calada diante de outras questões; eu não sou o unico deputado que se acha nesta camara que deve ter a iniciativa em tudo e por tudo. O eleito não póde nem deve optar, ha muito que devia estar aqui, eu levantei-mo a favor do parecer, mas r parecer devo ser rejeitado, e v. ex.ª, sr. presidente, devo desde já proclamar deputado da nação portugueza o director da companhia doscaminhos de ferro.

O sr. Cardozo Castello Branco: — Sr. presidente uso, da palavra que v. ex.ª me dá, para responder ao illustre deputado que acaba de fallar.

O illustre deputado disse, que sendo eu jurisconsulto devia conhecer a lei, que quando a lei não distingue, nós não podemos nem devemos distinguir — Concordo perfeitamente com o illustre deputado, e já elle vê que é por essa mesma razão de — onde a lei não distingue, não nos é dado distinguir — que eu sustento a opinião contraria áquella do illustre deputado. Se a lei dissesse — todos os directores de companhias não podem ser deputados, isto é não podem ser eleitos deputados, e quando o sejam, devem optar — estava eu então perfeitamente concorde com o illustre deputado; mas a lei faz distincção, a lei não diz — todos os directores de companhias não podem ser deputados e directores; a lei o que diz — é que não póde ser deputado e director ao mesmo tempo, o director de quaesquer companhias ou sociedades que recebam subsidio do estado, isto é, que sejam subsidiadas pelo governo. O que devi fazer o illustre deputado era mostrar, que a companhia dos caminhos de ferro era subsidiada pelo governo; mas isso não prova o illustre deputado; e por tanto deve permittir, que eu conserve a minha opinião de que esta companhia não é subsidiada. Se se mostrasse que o era, bem iam os illustres deputados que defendem o parecer; como porém se não mostra, fica em pé o meu argumento.

Mas diz o illustre deputado — a companhia do contracto do tabaco tambem não é subsidiada pelo governo, e com tudo os seus directores eram excluidos de ser deputados. — Eu direi ao illustre deputado, que não é por elles serem directores da companhia subsidiada ou não subsidiada pelo governo que não podem ser deputados; se elles nao são directores da companhia subsidiada pelo governo, são comtudo directores de uma companhia arrematante de rendimentos do estado; e essa é outra exclusão marcada na lei eleitoral, art. 13, § 2.º — Já vê pois o illustre deputado, que não tem applicação nenhuma o que diz a lei a respeito dos directores do contracto do tabaco, aos directores da companhia des caminhos do ferro.

Não tendo visto até agora apresentar argumento algum, contra a opinião que emitti, insisto por isso na minha opinião.

O sr. Justino de Freitas: — Sr. presidente, a minha qualidade de relator da commissão me impõe ainda a obrigação de fallar segunda vez nesta questão. Ouvi alguns argumentos ao sr. ministro da fazenda com os quaes, permitta-se s. ex.ª que o diga, não posso concordar — s. ex.ª argumentou com o accionista, e disse, que pela doutrina da commissão, podia haver um director que não tivesse fundos alguns na companhia que dirige, e não podia ser deputado; ora quanto havia outros que podiam ter grandes fundos nesta companhia e entre tanto estavam sentados nesta casa. Mas permitta-me s. ex.ª que lhe diga, que ha a attender á organisação das companhias como ellas devem ser consideradas por direito. — O accionista não tem inspecção nem importancia algema politica na companhia, o accionista entra com o seu capital que fica entregue a uma direcção, essa direção é que gere tudo, por consequencia aqui não se verifica o preceito da lei, que foi evitar a influencia que o director de um contracto podia ter para mover o governo, e mesmo a camara, a favor de seus interesses, ou para seus fias, e ao mesmo tempo evitar collocar-se debaixo da immediata dependencia do governo, a companhia os contracto de que tracta a lei: por tanto a respeito do accionista não se verifica isto, elle entra com o seu capital para qualquer companhia ou sociedade, e não tem mais do que receber o dividendo, no tempo competente, do capital empregado, não tem gerencia nem influencia alguma na administração desse capital. Assim já se vê que o argumento do nobre ministro não póde colher.

Tambem s. ex.ª argumentou dizendo, que o director por parte do governo desta companhia, era um delegado do governo. Parece-me que não ha paridade alguma. O director não é um delegado, o director desta companhia entra como representante de um certo numero de acções, e é por esse numero de acções que póde entrar; este director de que se tracta, entra juntamente com outros, por que as acções com que o governo entrou, correspondem a seis directores, é pois por este facto que tem de ser regalados os direitos do director, e resolvida a questão de que se tracta. Por tanto no caso actual não se verifica a razão que se quer invocar para contrariar o preceito da lei, e não se verificando, o parecer deve approvar-se tal como está.

O illustre deputado que quiz combater o sr. Cunha Sotto-Maior, com o que disse em relação ao ponto de — onde a lei não distingue, não podemos distinguir — não teve razão no seu argumento. A letra da lei é clara, não precisa de interpretação alguma, a lei não podia ser mais clara, ella diz — que é incompativel o logar de deputado com o logar de director de quaesquer companhias os sociedades que recebam subsidio pelo estado, ou administrem alguns do seus rendimentos: — assim, considerada a companhia dos caminhos de ferro como ella deve ser considerada, não póde deixar de se tirar a conclusão, de que o logar de director desta companhia é incompativel com o logar de deputado.

Por ultimo devo lembrar á camara, que se tem considerado como uma das maiores garantias para a liberdade eleitoral as incompatibilidades para os empregados publicos, ou directores de companhias. — A lei eleitoral de 1851 consignou este principio, essa lei foi revogada pela de 30 de setembro da 1852, por esta se admittiu a entrada a immensos empregados na camara; as unicas incompatibilidades que restam nesta lei de 1852 são ainda as que et tão consignadas no seu art. 13.º Veja bem a camara que se acaso se quizer agora prestar a interpretações cerebrinas, então neste caso é melhor acabar completamente com o systema das incompatibilidades. (Apoiados.)

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Mandei neste intervallo buscar á livraria da camara o diccionario portuguez para ver o que era subsidio. Quiz certificar-me se acaso o que tinha aprendido quando pequeno, era verdadeiro; se o diccionario ainda hoje conservava a ideia que havia ha 20 annos da palavra subsidio; se o subsidio ainda hoje é a mesma coiza que era então. Vi pois o diccionario e achei, que subsidio é toda a prestação de auxilio para a execução ou realisação de toda e qualquer empreza. — Póde pois o illustre deputado deitar a sua livraria abaixo: diga que é menos exacta esta significação da palavra subsidio; diga que a companhia dos caminhos de ferro não é subsidiada pelo governo: póde dizer o que quizer que não me convence, nem convence a camara. E esta é mais uma occasião para acreditar quanto é absurda a paixão politica.

O que diz o decreto eleitoral? Diz que é incompativel o logar de deputado com o logar de arrematante,

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director, caixa geral, e principal gestor de qualquer contracto de rendimentos do estado, e com o de arrematante e administrador de obras publicas. — Pergunto, o caminho de ferro é uma obra publica, ou não?

A lei eleitoral diz mais — que é incompativel o logar de deputado com o de director de quaesquer companhias ou sociedades, que recebam subsidio do estado, ou administrem algum dos seus rendimentos.

O sr. ministro da fazenda, com a franqueza que é propria do seu caracter, quando fallou da companhia disse — que esta companhia podia ainda dar lucro ao governo: e portanto á vista desta declaração do sr. ministro é claro, que sendo o sr. Lobo de Avila director da companhia dos caminhos de ferro, é-lhe impossivel tomar assento na camara como deputado, seno ao mesmo tempo director.

Eu, sr. presidente, approvo a eleição. Eu tomara que em logar de estarem na camara tão poucos deputados, estivessem 300 ou 400; por que alguns são para alguma cousa. Não cuide s. ex.ª, nem cuide a camara que eu combato a reunião do logar de deputado com o cargo de director da companhia dos caminhos de ferro pelo desejo de affastar da camara o sr. Lobo de Avila. O que quero é mostrar que essa exaltação que a camara tem pelos principios, o clamor com que os srs. deputados aturdiram o povo para estabelecer as incompatibilidades, foi uma falsidade. Hoje já o empregado publico que até aqui era um servil, é livre e sabio. O militar que d'antes era um carrasco, hoje é chamado a entrar na divizão dos poderes politicos. Appella-se para o coração do soldado!

Hoje tudo é benemerito: ha apenas meia duzia de corruptos Mas estes já se vão fazendo ou tornando uteis: Em precisando de algum homem de intelligencia, vem-se buscar aos corruptos. Eu que então era são — já sou corrupto e cabralista; (Riso) e sou corrupto e cabralista por que quero hoje o mesmo que então queria, porque sempre acreditei e acredito ainda que o soldado não tem independencia. Eu seu corrupto e cabralista por que acreditei e acredito ainda na dependencia de todo o empregado publico. Sou corrupto e cabralista, porque acredito ainda nas mesmas cousas em que vós acreditaveis; porque acredito na minha fé que era a vossa. Eu agora sou um homem perdido na opinião publica, sou um homem que acredita fielmente na qualidade do deputado. Hoje porque acredito em tudo isto, que vós acreditaveis, sou até um homem que empasto a minha cadeira de deputado, que contamino aquelles que teem a desgraça de sentar-se ao pé de mim. Mas eu nasci assim, vou andando assim; já agora não me quero emendar; porque ainda que olhando só para mim me considero humilde, quando olho em volta de mim fico muito soberbo.

Sr. presidente, se acaso o decreto eleitoral é uma lei; se a missão de um parlamento qualquer é guardar, cumprir e vigiar na execução das leis, é claro que o illustre deputado deve optar, ou per ser director da companhia do caminho de ferro, ou pelo logar de deputado. Agora, se isto é obscuro, se não é stricto, se a missão de uma camara é hoje decidir uma cousa, amanhã outra, então a camara póde dizer ao deputado eleito Lobo de Avila, que apesar de director da companhia de caminhos de ferro, póde vir tomar assento no parlamento.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello) — Sr. presidente, o meu voto sobre este assumpto, declarei já e torno a repetir que é um voto singular; na emissão delle não ha paixão politica, nem odio, nem enthusiasmo, nem reconsideração, nem nenhuma cousa dessas a que alludiu o nobre deputado. É um negocio muito simples do dominio desta camara de que tenho a honra de fazer parte, e creio que estou no meu direito de emittir opinião como o illustre deputado tem direito de emittir a sua. Mas permitta-me o nobre deputado dizer-lhe que nos seus argumentos, que lhe pareceram tão fortes para com bater as observações que eu fiz sobre o possibilidade e sobre a legalidade da reunião do cargo de director da companhia do caminho de ferro e das funcções de deputado ião acho o alcance que o nobre deputado lhes dá.

O illustre deputado ouvindo-me dizer que a garantia de juro ou subsidio que se dava ou concedia á companhia dos caminhos de ferro, podia em certos cazos converter-se em rendimento, e que por isso mal podia considerar-se subsidio essa garantia, disse, que se isto era verdade, se podessem dar-se estas circumstancias, aqui tinhamos o director da companhia dos caminhos de ferro a administrar estes rendimentos e por tanto excluido em virtude do art.º 13 do decreto eleitoral — engana-se o illustre deputado. Quando mesmo se desse essa hypothese, o director não administrava esse rendimento; nesse cazo o rendimento entra no thesouro e quem o administra hade ser o funccionario publico dependente do governo, e não os directores da companhia dos caminhos de ferro. Por tanto cae completamente o argumento triunfante que o illustre deputado quiz apresentar para combater as minhas opiniões.

Permitta-me tambem o sr. Cunha dizer-lhe que a companhia dos caminhos de ferro não é arrematante das obras deste caminho; a companhia arrematou a um terceiro, ha um empreiteiro que é o arrematante, não é a companhia. Por consequencia não pode ser em virtude dessa disposição que se hade obrigar a optar entre a cadeira de deputado e o logar de director da companhia do caminho do ferro. E eis-ahi como não posso acompanhar o nobre deputado nas deducções que fez dos §§ 2.º o 3.º; porque suppoz uma hypothese que realmente não existo nem nella nem noutra parte.

Quanto ao que disse o sr. Justino de Freitas, direi, que a invocação que o nobre deputado fez á liberdade, neste cazo prova duas couzas: a primeira que o illustre deputado considera agora o espirito da lei, e não a sua letra; e a segunda que se enganou completamente, apesar dos seus bons desejos, suppondo que a liberdade da urna, e sinceridade da eleição, exigia neste cazo a opção daquelle deputado eleito entre o cargo da director dos caminhos de ferro, e o logar de representante, do paiz. As incompatibilidades podem ser em muitos cazos; e são effectivamente garantia de liberdade, mas neste cazo não; porque a lei eleitoral permitte que muitos funccionarios que são demissiveis pelo governo, possam ter assento na camara. Eu agora não estou discutindo, se a lei é boa ou má, eu o que estou é assentando o facto, e dizendo que não é em nome desse principio que a commissão pretende excluir esse cavalheiro: a commissão exclue-o em nome de outro principio, em nome do interessa, que elle, como director dos caminhos do ferro, pode ler contrario aos interesses publicos; mas esse principio, essa intelligencia, essa idéa, esse espirito (e posso occupar-me do espirito, porque tambem o illustre deputado tractou do espirito da lei, quando fez invocação á liberdade da urna) seria um absurdo, um grandissimo absurdo, se acaso em nome los interesses do estado se excluisse de director da companhia o individuo que é obrigado, o que não tem outra missão senão defender os interesses do mesmo estado. E diz o nobre deputado, que elle não é delegado. Pois que é? (O sr. Cunha: — Representante de acções).

Muito bem. De quem são essas acções? São do governo; então é o ministro das obras publicas que deve perder o logar de deputado. (O sr. Cunha: — Mas perde o seu logar, quando é nomeado ministro). Não se tracta da nomeação de ministro, perdôe-me o nobre deputado, isto está estabelecido na Carta; não vem para o cazo. O que eu estou combatendo agora é a opinião do sr. Justino do Freitas, que diz, que não é delegado por parte do governo: não póde ser outra cousa; e tanto é delegado que quando elle não cumprir bem a sua missão, quando não traduzir bem as opiniões do governo, este retira-lhe a sua confiança, e não póde continuar porque teve uma opinião differente da sua. Pois sois seu delegado, e não representais as suas idéas? Logo não é senão um delegado, um director por parto do governo, e não outra cousa; elle não tem alli interesse nenhum particular, tem o interesse geral.

E para que se vem fallar aqui no sr. Ferreira Pinto Basto? Pois as circunstancias não são differentes, do cavalheiro, de que se tracta? Pois não é uma hypothese inteiramente diversa? Pois querem de hypotheses differentes

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tirar a mesma conclusão para o caso de que se tracta? (O sr. Cunha: — A lei não distingue) A lei não distingue! Distingue o bom senso: o que a lei não póde querer é absurdos: o que a lei não distingue, o que a lei não póde querer, é que as palavras signifiquem uma cousa que não é.

Por tanto, sr. presidente, movido principalmente pelo dezejo de responder ao illustre deputado, quando appellou para o espirito da lei, tendo-me combatido a mim, por invocar o mesmo espirito, fiz estas ponderações á Camara, ponderações que submetto á sua deliberação, e que ella avaliará, como entender, porque de certo resolverá como julgar melhor.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, a questão não é ministerial, porque eu vi que a maioria da commissão assignou o parecer deste modo; e mesmo porque o sr. ministro acaba de entrar nesta discussão, não como ministro, senão como deputado, segundo a declaração de s. ex.ª

Sr. presidente, quando se principiou a tractar deste parecer, eu estava bastante embaraçado pela convicção, que tinha a respeito delle, e pelas relações de amisade que me ligam com o sr. Lobo de Avila, relações baseadas na uniformidade que tinhamos no tempo, em que eramos verdadeiros opposicionistas; mas depois da declaração do illustre deputado eleito, de que estava resolvido a ceder o seu logar, optando pelo de deputado, cousa que eu sempre esporei da honra e do caracter deste cavalheiro, não tenho agora duvida nenhuma, e tractarei de emittir a minha opinião.

Sr. presidente, diz o artigo da lei, que todos os directores de companhias subsidiadas pelo governo não pódem ser deputados; e o sr. deputado eleito reconheceu que esta companhia era subsidiada pelo governo (nem póde deixar de o ser) que cede o seu logar. Pois o juro que se segura á companhia, não é um subsidio? Logo é uma companhia subsidiada; logo o cavalheiro de que se tracta, está no caso do § 2.º E note-se bem: o ministro é ministro das obras publicas, não é director da Companhia (Apoiados) para isso já está o artigo da Carta Constitucional.

Ora agora o espirito da lei é este (Leu). Esta lei não quiz que os directores de companhias viessem á camara, porque está claro que elles podem, pela sua qualidade de deputados, influir nas decisões que haja a tal respeito das companhias ou sociedades que representam.

O sr. Presidente: — Como a questão é pura e simplesmente sobre, se o cavalheiro a quem o parecer diz respeito, tem de optar, e como só sobre a opção é que deve ter logar a votação por esferas, por isso consulto a camara se approva a eleição do circulo de Beja.

Foi approvada.

O sr. Presidente: — Agora tracta-se de saber se o eleito tem de optar ou não: quem entender que elle deve optar, lança na urna direita a esfera branca, e os que votam pela não opção, a esfera preta: a urna da direita significa o voto do deputado.

E procedendo-se logo ao escrutinio

Entraram na urna da direita 76 esferas, das quaes foram — brancas 49 — pretas 27; — ficando portanto decidido, que o sr. deputado eleito deve optar entre os dois logares de deputado ou director.

O sr. Presidente: — A deputação que hade apresentar á sancção real, o decreto das côrtes ácerca da proposta de lei relativa ao censo para os membros da junta do credito publico, será composta dos srs. José Joaquim da Silva Pereira — Canto e Castro — Menezes e Vasconcellos — Archer — Arrobas — Paredes — e Faria de Carvalho.

Esta deputação é ámanhã recebida ao meio dia por Sua Magestade Elrei.

Agora vai dar-se conta á camara de um officio que se recebeu durante a sessão.

Era do ministerio do reino communicando, que não podendo Sua Magestade Elrei Regente assistir á sessão real do encerramento das côrtes no dia 31 de dezembro, este teria logar por um decreto que seria lido pelo presidente do conselho, assistindo a este acto os ministros. Remettia tambem os exemplares do programma para a sessão real de abertura, que deve ter logar em 2 de janeiro de 1854.

O sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — A camara fica inteirada, e os exemplares do programma ficam sobre a mesa para puderem ser vistos pelos srs. deputados.

Continuou-se com o parecer sobre as eleições. E pondo-se á discussão e logo á votação na parte que diz respeito ao

Circulo n.º 37 — Lagos — foi approvado

Em seguida, foram proclamados deputados

Os srs. Antonio Felisberto da Silva Cunha.

Manoel José Mendes Leite.

Diogo Pereira Forjaz.

Joaquim Thomaz Lobo de Avila.

Manoel Maria Coutinho do Albergaria Freire.

Passou-se á discussão do projecto n.º 110. (Vide sessão de hontem).

O sr. Vellez Caldeira: — Este projecto segundo a minha lembrança já esteve em discussão, e apresentaram-se-lhe algumas emendas, additamentos ou substituições, e por tanto, pedia a v. ex.ª que as mandasse ler pelo sr. secretario.

O sr. Presidente: — Permitta-me o illustre deputado lhe diga que este projecto só hontem entrou em discussão: é o projecto n.º 110.

O sr. Vellez Caldeira: — Peço desculpa, eu estava equivocado: julguei que era outro projecto.

O sr. Silva Pereira: — Fui eu quem reclamei a presença do sr. ministro da fazenda, para nos dar alguns exclarecimentos sobre o que tem pensado relativamente á applicação que devo dir-se ao dinheiro proveniente da venda deste edificio: tenho fé na gerencia do nobre ministro da fazenda, mas assim como ha conveniencias que demandam muito segredo nos negocios publicos, entendo que neste é conveniente a publicação.

Vai-se vender um edificio na cidade do Porto, e eu espero que o nobre ministro tirará dahi um grande partido; porque, não sendo elle proprio para aquillo a que estava destinado, como era um hospital, é com tudo mais proprio para alli se poder estabelecer, já escriptorios, já armazens, e finalmente todas as officinas para o commercio em grande. Este edificio está junto á bolsa, á praça do commercio, á alfandega e não longe do Douro: é de muita extensão, e se de certo houver toda a cautella na sua venda, elle ha de produzir grandes quantias.

Desejava pois, que o illustre ministro nos dissesse alguma cousa sobre a applicação que tenciona dar a este dinheiro; se tem havido alguns esclarecimentos a este respeito, e, finalmente quaes são as suas intenções. Em o nobre ministro respondendo, me darei ou não por satisfeito, e verei se tenho de pedir novamente a palavra.

O sr. ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Parece-me que as principaes explicações que o illustre deputado deseja, constam do relatorio do projecto. Por elle, se vê que o governo tem a intenção de vender este edificio que estava applicado para um hospital militar, por isso que os peritos tem reconhecido que elle é pouco proprio para este destino, applicando o producto desta venda para a construcção do outro hospital, ou para o melhoramento de algum edificio publico, adoptando-o para esse fim. Esta é a intenção do governo, e esta é a applicação que se pertende dar ao producto desta venda.

Não tenho na minha mão nem o projecto para a construcção desse novo edificio, nem para a adopção de outro edificio publico: este negocio deve correr pelo ministerio da guerra, por isso que os hospitaes militares estão dependentes desse ministerio. Não posso por tanto sobre este ponto dar mais esclarecimentos ao illustre deputado. O que lhe posso dizer é que a applicação que se pertendo dar ao producto desta venda, é para se proceder á construcção de um outro edificio em outro local e com melhores accomodações.

O sr. Silva Pereira: — Eu desejaria antes ouvir que se tinham tomado medidas, pedindo esclarecimentos, e que s. ex.ª estava na situação de poder dizer a maneira porque seria, empregado convenientemente aquelle dinhei-

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to: se isto não está feito, se não ha todos os esclarecimentos que seria para desejar, tenho a certesa de que tanto o nobre ministro da fazenda como o illustre ministro da guerra, o farão e que o intervallo da venda á construcção de um novo edificio, ou aos reparos de outro, não será longo, nem creio que possa sel-o, porque me parece que quem comprar o edificio, não ha de estar muito tempo á espera que o hospital tenha de sair.

Confiado em que os nobres ministros farão quanto estiver ao seu alcance para dar uma applicação conveviente ao producto desta venda, que póde ter uma applicação legalissima, dou-me por satisfeito e votarei pelo projecto.

O Sr. Maia (Carlos): — Estou convencido que a applicação do producto deste edificio ha-de ser a melhor para o effeito que se pretende, o de tirar o hospital militar do local em que existe, que não póde estar mais mal accommodado: não posso por isso deixar de approvar o projecto. Mas levanto-me para fazer uma reflexão, e para mandar para a mesa um artigo addicional.

Em 1840 abriu-se uma nova rua junto a esta edificio, e esta rua chamada — do Sr. Dom Fernando — dá uma nova entrada no Porto: isto foi quando era governador civil o sr. Avila.

Este plano foi cortar um pequeno canto da cerca deste convenio, e para se ir vender agora este edificio e a cerca, parece-me que mais difficuldade haverá em se comprar depois esse bocado de cerca. Por isso peço licença para mandar para a mesa um artigo addicional, a fim de se evitarem quaesquer duvida que por ventura possam apparecer.

Foi logo approvado o projecto na generalidade.

O Sr. Santos Monteiro: — Peço que se passe á especialidade.

Resolveu-se affirmativamente — E posto á discussão o

Artigo 1.º — Foi logo approvado.

Artigo 2.º — idem.

Leu-se o

Artigo addicional — É auctorisado o governo a accordar com a camara municipal do Porto, antes de proceder á venda sobre a parte da cerca necessaria para a construcção da nova rua de El-Rei o Senhor Dom Fernando.» — Maia (Carlos).

Foi admittido.

O sr. Maia (Carlos): — Não sei se a camara está bem ao facto do motivo pelo qual ou mandei para a meza, esse artigo addicional.

Em 1842 sendo governador civil o sr. Avila, que tenho o gosto de ver presente, e a quem peço o seu testemunho, tractou-se da abertura da uma nova rua: fez-se a planta para essa rua e cortou-se um canto da cerca do convento: portanto, o meu artigo é para que accordando o governo com a camara sobre este bocado de cerca, se evita um grande processo, que de outra maneira apresentaria bastantes difficuldades e seria bastante dispendioso.

O sr. Avila: — Eu não posso deixar de dar á camara algumas explicações a este respeito, visto o illustre deputado que acaba de fallar, fazer-me a honra de invocar o meu testemunho. Em 1840, sendo eu administrador geral do Porto, entendi que seria muito conveniente abrir naquella cidade uma nova rua, começando para rua do Ferreira Borges, se bem me recordo, porque ha 13 annos que tiveram logar estes fados, e é possivel que a minha memoria os não apresente com toda a exactidão. Esta rua serviria tambem de dar á cidade do Porto, cidade importantissima em Portugal, e que o seria igualmente em qualquer outro paiz, uma entrada digna della, para o que iria terminar na Porta Nobre. Da rua Ferreira Borges á rua da Ferraria era facil a obra, porque atravessava só a cerca do extincto convento de S. Francisco, a qual ganharia consideravelmente em valor com a abertura da mesma rua. Sollicitei pois, e obtive do governo para fazer aquella expropriação, e para dar á nova rua um nome sempre caro aos portuguezes, porém mais ainda agora, o de Sua Magestade El-Rei Regente, o Senhor D. Fernando Segundo (Apoiados geraes). O ministro do reino que me deu essa auctorisação, foi o sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães.

A abertura teve logar no dia 29 de outubro anniversario do El-Rei, e em muito pouco tempo a rua ficou terminada entre a rua Ferreira Borges, e a rua da Ferraria.

Tal era o estado desta obra da Ferraria, quando deixei de ser administrador geral do Porto, e vejo agora que nada mais se fez depois. Entendo que é de grande utilidade que a rua seja continuada segundo o plano primitivo, porque a cidade do Porto della carece e porque será mais uma prova de respeito, affecto, e vivissima sympathia que toda a nação portugueza tributa á Alta Personagem, com cujo nome augusto foi honrada aquella rua. (Apoiados geraes) Por tanto não posso deixar de approvar o additamento do illustre deputado o sr. Carlos Maia, e estimarei muito que a discussão actual dê logar a que aquella obra seja terminada o mais depressa possivel.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, como a proposta foi originariamente do governo, cumpre-me declarar á camara, que por parte do governo, não me opponho ao additamento apresentado pelo sr. deputado Maia; por quanto não acho nenhum inconveniente em que seja approvado, pelo contrario póde delle resultar alguma vantagem publica, porque effectivamente esta rua é de grande utilidade para a cidade do Porto, como eu agora reconheci quando estive naquella cidade; e até trouxe as plantas que se mandaram levantar para se abrir a rua nova de El-Rei Dom Fernando Segundo até á Porta Nobre, obra que desejo se leve á execução. Portanto, como a disposição do additamento não prejudica o pensamento do projecto, e pelo contrario póde apresentar resultados uteis, por isso não duvido concordar com elle por parte do governo.

E pondo se logo á votação o

Artigo addicional — foi approvado.

Artigos 3.º e 4.º — approvados.

O sr. Justino de Freitas: — É para ler este parecer da commissão de verificação da poderes. (Leu um parecer sobre as eleições de Guimarães).

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, uma vez que a commissão pelo seu parecer propõe, que se espere pela apresentação dos respectivos diplomas, para então se tomar conhecimento do ponto que diz respeito á eligibilidade, parece-me não haver urgencia de discutir o parecer, e não a havendo, é melhor que seja impresso em separado, cumprimindo-se o regimento.

O sr. Corrêa Caldeira: — Fui prevenido pelo sr. deputado. As disposições regimentaes foram estabelecidas para que as decisões da camara se tomem sempre com placidez, reflexão, e sisudesa; portanto peço que seja mantido o regimento, mandando-se imprimir em separado.

O sr. Presidente: — Como os illustres deputados não pedem senão a observancia do regimento, manda-se imprimir em separado. (Apoiados).

Agora passasse á discussão do projecto n.º 80, que se achava adiado até estar presente o sr. ministro da fazenda.

(Este projecto acha-se transcripto a pag. 350 do rol 7.º, julho de 1853).

O sr. Quelhas: — Eu já n'outra occasião tive a honra de apresentar á camara algumas ponderações, as quaes não terei duvida de agora reproduzir se fôr necessario. Levantei-me para propor que este projecto volte á commissão. E não tenho duvida em declarar que o sr. ministro da fazenda é desta opinião, porque tanto s. ex.ª como alguns illustres deputados estão concordes, em que o projecto seja mais conforme ás necessidades do objecto de que tracta, pois da maneira porque se acha redigido, parece-me simples de mais. O projecto dispõe, que as custas nas execuções administrativas nunca excedam o capital da divida exequenda; mas isto tem logo contra si um inconveniente, e vem a ser, que um official da diligencia vai a uma ou duas legoas fazer uma citação; o quanto querem que o official tenha por esta citação? Nada? Então não vai fazer a diligencia ou citação, e a fazenda é que perde. Sr. presidente, deste o momento que não se pagar nada ao escrivão que tem de lavrar o processo, e ao official, que tem de fazer as citações, o resul-

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tado será que as diligencias não se hão de fazer, e as verbas pequenas não hão de ser executadas. Portanto proponho que o projecto volte á commissão.

O sr. Presidente: — Entro em duvida em propor este novo adiamento, sem estar presente o sr. ministro da fazenda, tendo já ficado adiado este projecto para quando s. ex.ª estivesse presente. (Vozes — É o mesmo que já se propoz).

Entrou o sr. ministro da fazenda.

O sr. Presidente: — Vai ler-se outra vez o projecto. (Leu-se).

Foi apoiado o adiamento.

O sr. Ministro da Fazenda: — Este projecto foi certamente dictado com as melhores intenções; eu pela minha parte, quando elle se apresentou primeiramente na camara, ou antes nas commissões respectivas, inclinei-me a favor da sua doutrina, porque desejo, assim como desejámos todos, que sejam menos vexatorias quanto possivel as execuções pela fazenda publica. Entretanto, sr. presidente, tenho pensado que é um negocio de mais gravidade do que parece á primeira vista, a doutrina que se acha consignada no projecto; e, como disse ha pouco ainda que dictada pelos melhores desejos póde com tudo produzir um resultado desfavoravel para a receita publica; porque da diminuição da receita publica nasce o deficit, e este não póde deixar de ter logar, visto que se vão ferir os interesses dos escrivães de fazenda que por certo não procederão á arrecadação dos impostos com tanta regularidade, e serão mais negligentes (Apoiado); e o rendimento publico ha de ser affectado.

Accresce além disto uma circumstancia. Decretou-se a contribuição predial de repartição; em consequencia disso os escrivães teem de fazer algumas despezas, e teem um accrescimo de trabalho que não é insignificante com a feitura das matrizes; e é quando se lhe vai pedir novas despezas e trabalhos, que se pertende diminuir os interesses legitimos que teem ou se dão áquelles exactores. Nestas circumstancias, sr. presidente, parecia-me que seria mais prudente que a camara quizesse ouvir a commissão sobre este projecto, para que ponderando as considerações que acabo de apresentar, resolva o que achar mais conveniente para a causa publica.

O sr. Pinto de Almeida: — Sr. presidente, logo que foi distribuido este projecto na sessão de 23 de junho, entendia eu, e entendo ainda agora, apesar das rasões que acabo de ouvir, que era o projecto mais benefico e justo que podiamos e deviamos votar (e devemos votar) a favor do povo. Sr. presidente, eu sou das provincias, vivo no meio das privações, não vivo no meio da opulencia, dos caleches, e dos theatros, e por isso vejo a desgraça dos contribuintes que muitas vezes se veem na necessidade de pedirem parte do dinheiro para pagar. Quer vossa ex.ª saber o que aconteceu n'um concelho de que tenho conhecimento? Foi que um escrivão de fazenda n'um processo de 200 rs. arranjou de custas 2:100 rs. Querem que continuem estes abusos? Eu entendo que não devem continuar, porque nós devemos proteger a classe pobre. Mas o que vejo é que desde que appareceu este projecto, tem-se tractado de chicanar por todos os modos, e o sr. deputado que encetou esta discussão, póde-se dizer que advogou mais a causa dos officiaes de diligencias, do que a dos pobres. Eu creio que a commissão de fazenda quando este projecto lhe foi remettido, pensou e pensou bem o que devia fazer. O sr. ministro da fazenda foi ouvido neste negocio, e se não me engano, se a minha memoria me não falha, parece-me que sua ex.ª quando no principio fallou sobre este projecto não se mostrou hostil a elle. Agora apresenta-se um novo adiamento ao projecto para ir á commissão, que é o mesmo que dizer que não se vote o projecto. Se fosse para erigir alguma tribuneca, ou votar alguma gratificação a alguem, estou certo que a camara votava. Por tanto voto contra o adiamento que se propoz, e contra a todos os que vierem a este projecto.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, o illustre deputado fascina-se um pouco pelos bons desejos que o animam em querer ser util aos contribuintes da classe pobre, são mui louvaveis os seus desejos, mas desgraçadamente engana-se nos meios, por que quer conseguir o seu fim. Se o illustre deputado provasse, que a receita publica não podia diminuir em consequencia deste projecto, então em boa situação estava elle deputado; mas como é provavel que haja diminuição da receita publica, e por consequencia o accrescimo do deficit, o resultado é, que, ou se ha-de luctar com as difficuldades provenientes do deficit, ou esta diminuição de receita ha-de ser preenchida á custa dos pobres: de modo que o beneficio que o illustre deputado pertende fazer, dará em resultado, que os povos hão-de ser vexados com outros tributos, que o illustre deputado ha-de lançar, se quizer ser coherente com os seus proprios desejos. Por consequencia aqui está como muita gente invoca, e invoca de certo com boas intenções, os sentimentos do amôr pelo pobres que quer proteger e beneficiar, mas que depois se vê muitas vezes na necessidade mais dura de impôr-lhes sacrificios com que elle ás vezes não póde. (Apoiados). Em todo o caso, sr. presidente, é necessario não encarar a questão pelo lado do sentimentalismo; porque levar as questões para o campo do sentimentalismo prova que a maior parte das vezes não ha razão (Apoiado). O illustre deputado fallando em classes pobres, em caleches, em opulencias, e theatros, o que prova é que não tem razões solidas para combater aquellas que ou apresentei por parte do governo. Depois de se ponderar que difficuldades se poderão encontrar no momento da execução do projecto tal como está, não ha razão plausivel para impugnar a revisão do projecto (Apoiados).

Ora a commissão e o governo considerou este negocio; eu fui ouvido sobre elle; mas para que o illustre deputado veja que não houve da minha parte compromettimento nesta objecto, basta lêr o relatorio da illustre commissão, onde não se diz que foi d'accordo com o governo, como é costume dizer-se em casos identicos. Em ir de novo o projecto á mesma commissão, para ella ter em vista as ponderações expostas, não vem dahi desaire algum (Apoiados). As razões que moveram o signatario do projecto a apresental-o na camara decerto são boas, no entretanto havendo apprehensões ácerca da execução do mesmo projecto, suppondo-se que a sua execução trará graves inconvenientes, de certo que os corpos collegisladores não podem nem devem tomar de prompto certas providencias, som ellas terem sido devidamente examinadas, e sobre tudo quando dellas póde resultar alteração na recita publica do estado. E agora especialmente que em toda a parte se presta o maior cuidado a fim de que a receita publica não soffra alteração tambem para menos; ainda maior cuidado deve haver entre nós quando por uma serie de medidas que se tem adoptado, chegamos quasi a igualar a receita com a despeza, e seria cousa desagradavel fazer concessões que parecem vantajosas aos pobres, e que vão fazer desfalque na receita publica. Não é só a classe pobre que paga pequenas quotas: eu conheço muita gente rica que paga muitas pequenas quotas de decima (Apoiados).

Portanto o illustre deputado não vai beneficiar só a classe pobre, vai tambem beneficiar a classe rica, vai favorecer os da opulencia os dos caleches e theatros, a que o illustre deputado se referiu. (Apoiados).

Tenho feito estas simples considerações e parece-me que a camara convirá comigo em que vale a pena examinar-se de novo este projecto na commissão. (Apoiados).

O sr. Pinto de Almeida: — Sr. Presidente, eu entendo que defendendo este projecto fazia um acto de justiça, porque vai beneficiar os contribuintes pobres, para os quaes não se passam portarias como vejo passar para aquelles que devem grossas sommas...

O sr. Ministro da Fazenda: — Se é uma insinuação, peço que a retire; se é uma accusação, convido o nobre deputado a fazel-a.

O sr. Presidente: — Não ouvi a expressão de que usou o sr. deputado.

O Orador: — A minha expressão é esta. Voto pelo projecto em discussão, e contra o adiamento. Voto pelo projecto em discussão porque estou persuadido que é um acto de justiça, e vai beneficiar a classe pobre, para a qual não se passam as portarias suspendendo pagamentos de decimas. Digo

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Isto, sr. presidente, porque é um facto verdadeiro acontecido no districto de Coimbra e em outros que se concedem moratorias para o pagamento das decimas; e á pobreza não se faz beneficio algum. E deverá este estado continuar? Eu entendo que não; e por isso voto contra o adiamento.

O sr. Avila: — Sr. Presidente, eu sou inteiramente da opinião do illustre ministro, e já expuz a minha maneira de ver este negocio a primeira vez que o projecto foi discutido. Respeito muito as intenções do ilustre deputado, mas parece-me que s. s.ª foi um pouco... um pouco alem daquillo que elle deseja por um zelo louvavel a respeito do que elle chama classes pobres. O nobre deputado disse, que para as classes pobres não ha portarias de espera, e accrescentou, que no districto de Coimbra para a maior parte dos grandes contribuintes, isto é, dos grandes devedores, dos ricos devedores se tem passado portarias de espera; não disse por quem, mas parece-me que em outra occasião em que o nobre deputado fallou neste objecto, claramente se referiu a mim. Eu geri a pasta dos negocios de fazenda quasi dois annos e sai do ministerio muito proximamente á entrada do actual exm.º ministro da fazenda; posso, pois, dizer ao nobre deputado que foi mal informado. Não me recordo de ter concedido espera senão em casos em que a concederia ainda se tornasse a ter a desgraça de ser ministro, o ministro da fazenda. Ha por exemplo um contribuinte que tem de pagar uma verba de decima de 40, 50, 60 ou 200 mil reis; este homem tem reclamações mais ou menos fundadas no thesouro por sommas de que elle se julgava credor, sommas de contos de reis; como quer o nobre deputado que o governo, quando o processo vai seguindo os seus termos, mande executar este homem por 40 mil reis, quando talvez elle seja credor de contos de reis? Isto não pode ser, não ha ministro nenhum que possa ordenar taes execuções sem faltar a todos os seus deveres, e a todas as prescripções da justiça. Nesse caso confesso francamente que concedi moratorias, e havia de tornar a concedel-as em identicas circumstancias. Se concedi alguma outra em caso diverso, digo sinceramente a v. ex.ª que não me lembro, e estimaria que se apresentasse.

Eu pedi a palavra e não foi para sustentar o adiamento, porque o adiamento não precisava ser sustentado depois das explicações que deu o sr. ministro da fazenda. Estas questões são questões administrativas, são questões do interesse de todos, são questões em que não póde haver nem capricho nem desejo do embaraçar o governo. (Apoiados). «Mas o sr. ministro da fazenda tinha, já dado o seu apoio a este projecto»; era razão demais para eu apoiar o adiamento. Pois o sr. ministro tendo dado o seu apoio ao projecto (fallo em hypothese, porque o sr. ministro nega que tivesse dado esse apoio) vem depois dizer á camara franca e lealmente — este projecto tem inconvenientes que eu lhe não encontrei quando da primeira vez o vi, em consequencia do que peço que volte é commissão para ser reconsiderado, e não ha-de a camara annuir ao pedido de s. ex.ª? Não ha camara nenhuma, nem aquella mesma camara que esteja em mais hostilidade com o governo, que possa impugnar similhante adiamento. Pois então quererá a camara que se discuta já um assumpto desta ordem quando o governo é o primeiro a precisar de esclarecimentos? Pois qualquer deputado póde pedir o adiamento de uma questão quando não se acha habilitado para entrar nessa discussão, e não o poderá pedir um ministro da coroa n'um objecto desta ordem? (Apoiados) Pelo amor do Deus, não vamos tão longe! Mas eu pedi a palavra para pedir ao sr. ministro da fazenda, que s. ex.ª, no relatorio que tem de apresentar á camara, veja se é possivel juntar-lhe um documento que acabará com este sentimentalismo todo, um documento que fará ver o quanto a cobrança voluntaria, espontanea produziu depois da ultima organisação de fazenda (eu sinto fallar nessa organisação porque é minha,

mas o sr. ministro já teve a bondade de lhe fazer aqui alguns louvores, e deu um documento ainda melhor que foi conserva-la e mante-la) e pelo qual reconhecerá a camara que a cobrança contenciosa é insignificantissima. (Apoiados). E então querem os nobres deputados que nós vamos desmoralisar os bons pagadores concedendo vantagens aos máos pagadores? É o que resulta sempre de todos estes projectos de privilegios concedidos aos máos pagadores (Apoiados); o máo pagador é sempre máo pagador, e o bom pagador desalenta; — não quero pagar, diz elle porque amanhã ha-de-se apresentar na camara um projecto de lei por virtude do qual, sendo convertido em lei, eu que devia pagar 40, pago 10. (Apoiados) Por consequencia desde uma certa época por diante eu tenho-me sempre opposto a todas as leis de favor, porque essas leis não tem dado senão o resultado que eu torno a repetir — desmoralisar os bons pagadores e augmentar o numero dos máos pagadores.

Tambem tenho a convicção, sr. presidente, de que as classes pobres pelas quaes eu sou o primeiro a ter sympathias, não hão-de aproveitar com este projecto; e de mais a mais, se hoje as classes pobres por virtude de algum vicio na organisação de fazenda, podessem ignorar ou a epocha em que são collectadas, ou em que devem pagar, isto é, em que estão abertos os cofres, eu diria, é necessario ter toda a consideração com ellas, porque póde ser que deixassem de pagar, por não poderem saber quando haviam de pagar; mas hoje não se pode dar tal ignorancia; quem não paga á boca do cofre, é porque não quer pagar; quem paga dez tostões de custas devendo apenas 200 reis, é porque não quer pagar 200 reis (apoiados).

Peço á camara desculpa por a ter entretido com estas considerações, mas julguei que na minha qualidade do antigo ministro da fazenda devia rectificar um facto que o nobre deputado apresentou de certo com as melhores intenções; o nobre deputado sabe que sou o primeiro a ter por elle a maior consideração, mas parece-me que o seu zelo e filantropia o levaram um pouco alem daquillo que s. s.ª desejava. Voto pelo adiamento, nem podia deixar de votar depois que o ministro respectivo vem dizer á camara que o projecto deve ser novamente considerado.

O sr. Ministro da Fazenda: — O illustre deputado fez-me ha pouco uma insinuação que me parece não mereço. Nem as minhas relações publicas com o illustre deputado, nem as particulares creio eu que o auctorisavam a tractar-me de uma maneira que eu tenho a consciencia de lhe não merecer. O illustre deputado deu a entender que eu concedia aos ricos, por favor, portarias para moratorias de pagamentos; se o illustre deputado se refere a mim, peço-lhe por honra sua, por honra da cadeira que occupa que formule a sua accusação; senão se refere a mim, peço-lhe o favor de o declarar na camara.

O sr. Pinto de Almeida: — Eu nem me referi ao sr. ministro da fazenda, nem me referi a ninguem. Contei o facto em geral, disse que existiam as portarias, mas não disse que eram do sr. ministro da fazenda; que ellas existem, não tem duvida nenhuma.... (O sr. Ministro da Fazenda: — Mas são minhas?) Não são de v. ex.ª, mas existem; quem as assignou, pode ser que eu saiba, mas não o quero dizer, e não foram por pequenas quantias, quantias que ainda hoje se devem.

O sr. Presidente: — A hora deu. A ordem do dia para ámanhã é, depois do expediente, dividir-se a camara em commissões. Está levantada a sessão. Eram 4 horas da tarde.

O 1.º Redactor.

J. B. Gastão.

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