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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

Sessão de 11 de Fevereiro de 1836.

Tres quartos depois do meio dia occupou a Cadeira o Sr. Vice-Presidente; e feita a chamada pelo Sr. Secretario Machado, declarou estarem presentes 28 Dignos Pares, faltando 21, e destes, 4 com causa motivada.

O Sr. Vice-Presidente: — O Digno Par o Sr. Luiz de Vasconcellos, com quem estive hontem, pediu-me participasse á Camara, que apesar de desanojado, não podia por alguns dias assistir ás suas Sessões. — A Camara ficou inteirada.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu a Acta da Sessão antecedente, que foi approvada sem reclamação.

Distribuiram-se pelos Dignos Pares exemplares de um folheto intitulado = Notas ao impresso denominado: Esclarecimentos do General Saraiva, Barão de Refoios = pelo Coronel Jeronymo Pereira de Vasconcellos.

Teve a palavra o Sr. Barão de Renduffe, como Relator da Commissão de Legislação, para ler o Parecer da mesma, assim como o Projecto de Lei, que apresenta, declaratorio do Decreto de 13 de Agosto de 1832. (Vide Diario N.º 38, pag. 189.)

Concluida a leitura, teve a palavra, e sobre o assumpto disse

O Sr. Visconde do Banho: — Eu pediria a V. Ex.ª que sobre uma materia tão importante tivessemos toda a madureza, e então desejava que este Projecto se imprimisse immediatamente no Diario do Governo; e além disso se tirasse maior numero de copias; para se mandarem para os Governadores Civis os distribuir; porque poderão malvados dizer, que nós queremos decidir este negocio por surpreza; e este é o unico modo de responder a este espirito de calumnia e contra o qual a Camara dá uma prova da sua boa fé; boa fé, com a qual desfaça todas as imputações que se pretendam inventar, e que espiritos máos lhe queiram fazer; e esta boa fé resplandecerá, vendo-se de que desta Lei se não tracta já, e que se da tempo para que todos conheçam o espirito della; é isto o que os Inglezes chamam = fair play. = Eu trago em favor da minha proposta o argumento do Digno Par o Sr. Barão do Sobral na Sessão de hontem, que mostrou com a sua costumada madureza e circumspecção a necessidade, que havia de não se decidir de Leis acceleradamente; por tanto, parece-me que a Camara não deixará de approvar o que proponho, por isso mesmo que tende para lhe dar aquella força moral, e obstar a que possam dizer essas más vontades, que mesmo sem motivo apparecem. Espalhando-se que a Camara vai tractar desta materia diminuirá muito o numero de pleitos, além dos que já ha e isto é de muita utilidade, porque os interessados, vendo agora que as Côrtes vão tractar deste assumpto hão de esperar pelo resultado das medidas que tomarem as Côrtes. Eu me regosijo de ver que neste Projecto reluzem principios sociaes que são garantes do direito de propriedade; porque como nos tempos antigos desse Cicero = a sociedade civil não é senão uma sociedade de direitos = e neste sentido é que os primeiros que estudaram o direito social se explicavam por outra maneira, chamando-lhe a = guarda da vida e fazenda = e que hoje se chama = direito de segurança e propriedade. = Este Projecto é muito importante, deve pois dar-se-lhe a maior publicidade, para que se não diga que houve surpreza, com isto se mostra a melhor fé do mundo. Tracta-se de emendar uma das Leis, que circumstancias imperiosas constrangeram o Dictador a promulgar, a fim de procurar a salvação do Throno da nossa Augusta Rainha, porém ou egoismo, ou o que é mais certo, o terror da usurpação tornou inefficazes os recursos de conquistar com folhas de papel; não foi isto que venceu a Causa da Rainha, foi polvora e bala, e o sangue de muitos Portuguezes, a cujo sacrificio devemos a nossa existencia politica, e a nossa liberdade: essas tempestades estão acabadas, resta-nos ser-mos gratos, e honrar-mos a memoria de tão illustres victimas, e reorganisar-mos a Administração da nossa Patria pelo melhor modo, combinando o interesse de todos os Portuguezes.

Não posso acabar este meu pequeno discurso sem fazer os maiores elogios á Commissão pela promptidão com que apresentou o seu Parecer sobre assumpto tão transcendente, e de tão complicada difficuldade.

O Sr. Barão de Renduffe: — Eu só posso apoiar uma parte do que acabou de dizer o Digno Par, quando instou para que se não accelerasse a discussão do Projecto de Lei que tem a honra de apresentar, porém observações a este respeito encontram a convicção geral, que todos temos, da prudencia com que V. Ex.ª regula os trabalhos desta Casa. Tenho porém de rectificar algumas frases de que se serviu o meu nobre amigo. A Commissão por certo nem quiz surprehender a Nação, nem a Camara com a apresentação do resultado de suas fadigas: em primeiro logar a opinião, e os interesses geraes reclamavam ha muito tempo uma providencia legislativa que puzesse termo ás confusões occasionadas pelo Decreto de 13 de Agosto; depois disto já dous Dignos Pares apresentaram Projectos de Lei no mesmo sentido, que foram publicados com as nossas Sessões que correm impressas, e se por isso a Nação não póde ficar surprehendida, nem o póde ficar esta Camara quando a Secção de Legislação nada mais fez do que cumprir com as ordens que recebeu a similhante respeito. Se o Digno Par pretende o esperar que sobre o novo Projecto venham reclamações, e annotações de toda a parte, e pretende pesar cada uma dellas para se decidir em presença de tudo, permitta-me o observar-lhe que esta complicada materia está debatida desde a publicação do Decreto, e que á Commissão foram presentes os escriptos que teem sido impressos, e entre elles o do sabio antiquário João Pedro Ribeiro, e que por outro lado fez consultar a este, e a outros respeitaveis Jurisconsultos sobre o que calcou o Projecto offerecido; e que por tanto essa indefinida demora conduz a uma especie de addiação sine die, que pouco se conforma com a anxiedade publica. Além disto, eu tenho a observar que se alguns esclarecimentos importantes nãoo vierem a aproveitar para a nossa discussão que elles aproveitarão para a que se deve seguir na Camara dos Srs. Deputados; e por tanto sem eu ser da opinião que cumpre precipitar a discussão, menos tambem o sou de que convém demora-la muito. Mas o Digno Par diz que os interessados sabendo que nós temos em vista este negocio, ficarão tranquillos, e esperançados. Sr. Presidente, desta esperança viveram elles até á convocação da Sessão Extraordinaria, depois ainda mantiveram esperanças no decurso da primeira Sessão Ordinaria de Côrtes; e que resultou desta esperança? resultou o transtorno de propriedade, e a miseria de muitas familias; troquemos pois a esperança por alguma realidade. Dê pois V. Ex.ª este Projecto para ordem do dia com o intervallo que julgar conveniente, e ouça agora a um dos meus visinhos que só temos quarenta dias de Sessão; e não fique por tanto em legado para o anno a restituição que deve fazer-se aos prejudicados pelo Decreto de 13 de Agosto de 1832.

O Sr. Visconde do Banho: — De modo algum pretendi tomar a posição e V. Ex.ª; porém creio que é licito a qualquer Membro da Camara dizer em publico o que intende, e o que eu desejo é que antes de se discutir este Projecto toda a Nação Portugueza soubesse delle; que se tirassem mais copias na imprensa, e que se mandassem para as Provincias; que se imprimisse no Diario do Governo; e que se désse para ordem do dia, em um praso razoavel: isto não é querer uma addiação sine die. O Digno Par parece que me não intendeu bem, ou eu não me sube explicar; o fim de minha proposta era, para de alguma maneira dar tempo a que se manifestassem as idéas a este respeito, e estou certo de que algumas hão de apparecer sobre uma materia, que a fallar a verdade, nem todos se acham muito habilitados para tractar della sem ouvir a opinião de muitos. Esta era a explicação que eu queria dar ao Digno Par, e creio que elle agora me ha de ter intendido bem, sem me attribuir que eu queria um addiamento sine die.

O Sr. Visconde de Villarinho de S. Romão: — Depois do que tem dito o Digno Par o Sr. Barão de Renduffe, pouco me resta a dizer; mas é certo que discutindo nós esta Lei démos-lhe toda a publicidade necessaria, e satisfizemos ao mesmo tempo a essas immensas representações, que tem vindo a esta Camara, escriptas com lagrimas de tantas familias, que estão esbulhadas de seus bens por causa das disposições injustas, absurdas, e anti-constitucionaes do Decreto de 13 de Agosto de 1832. Em consequencia disto é preciso que com toda a possivel brevidade tractemos de remediar males tão grandes, sem as demoras que propoz o Sr. Visconde do Banho; porque o Systema Constitucional traz comsigo, e é cousa propria da sua natureza, a demora da discussão das Leis, em razão da muita circumspecção com que devem ser feitas. Desta Camara passará o Projecto para a dos Srs. Deputados, aonde entra n'uma Commissão, e tem novas demoras; por conseguinte quem quizer escrever sobre ella tem bastante tempo de o poder fazer. — Lembrem-se porém os Dignos Pares que me escutam = que dous terços dos proprietarios de Portugal estão esbulhados de todos, ou de parte de seus bens por causa do tal Decreto já mencionada, e que na Cidade do Porto acontece uma cousa mui singular. = Aquelles que tiveram as suas casas despedaçadas com as bombas, que concorreram com o sangue de seus filhos ou parentes para sustentar a liberdade, e que fizeram os maiores sacrificios por ella, estão agora esbulhados passando a fruir os fóros que elles deviam receber, aquelles mesmos Milicianos do Minho que tantas balas dispararam contra os peitos de nossos illustres defensores!... Cousa tão monstruosa nunca se viu em tempos despoticos, e não pode deixar de encher de affronta e de horror os tempos constitucionaes. Por consequencia apoio o Digno Par o Sr. Visconde do Banho, em tudo quanto respeita á publicidade deste Projecto; quanto a demora delle, por nenhuma forma, e peço a V. Ex.ª que se restrinja ao Regimento, e o dê para ordem do dia quando o julgar conveviente.

O Sr. Freire: — Parece-me que esta questão póde acabar com muita facilidade, se ella se reduzir ao seu verdadeiro ponto: todos os Projectos se publicam com a Sessão em que se discutem, e este póde mandar-se já publicar no Diario do Governo: assim, pelo que pertence á primeira parte creio se satisfaz: pelo que pertence á segunda questão é simplesmente das attribuições de V. Ex.ª e por isso nada ha que alterar em quanto á ordem estabelecida, porque, em quanto a este caso, como em todos, a V. Ex.ª pertence designar o dia da discussão; e talvez que se deva dar um espaço até que todo o Paiz tenha conhecimento, porém como elle não é muito extenso, seis ou oito dias talvez seja bastante. — Esta questão já não é nova, tem-se aqui fallado nella, apresentaram-se Projectos, e nomeou-se uma Commissão Especial para tractar della pela sua transcendencia; em consequencia já todos devem estar