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verno, para regular as antiguidades pedisse a cada um dos Juizes, que dissesse quaes eram as suas pretensões a tal respeito; porque como bem disse um Digno Par, aqui não se tracta de julgar; isto não é uma demanda, e o Governo está authorisado a fazer esta nomeação conforme a Lei, e fazendo conforme a Lei existente, a ninguem faz injustiça; este é o meu parecer; e em geral approvo o Projecto com a excepção que já disse.
O Sr. Ministro das Justiças: — Sr. Presidente, eu não posso deixar de prestar um tributo á lealdade do meu honrado amigo e Collega, o Digno Par que acabou de fallar, nem outra cousa era propria da sua probidade, o faltar ao que uma vez tinha tractado.
Sr. Presidente, aqui não ha commissão na medida que o Governo propoz, e eu o poderia sustentar; porque commissão é = Delegata judicandi potesta = isto é, aquella Jurisdicção que se concede para certa pessoa ou cousa; e nem uma, nem outra existe nas medidas propostas, já expliquei á Camara que a escolha que o Governo queria fazer ente os mais antigos, para que não acontecesse que viessem Juizes dos que já tivessem julgado alguma das causas; em consequencia é bem claro que o Governo não queria uma commissão.
O Governo não tem difficuldade em fazer despachos segundo a Lei, e o Governo está disposto a fazer tudo o que possa segundo a Lei, mas nada contra a Lei: o artigo 15 da de 16 de Maio de 1832 diz, que as antiguidades serão reguladas: estão reguladas estas antiguidades? Não; logo o Governo não podia fazer aquelle despacho. Eu não disse que queria Lei para julgar das antiguidades; o que digo é que as antiguidades estão reguladas, e que o Governo não as julga. — Tambem não disse que o Procurador Geral da Corôa era inhabil para julgar todas as causas, a inhabilidade era para as causas passadas, e não fallei das presentes; e parece-me que me expliquei bem: disse que o Ministerio Publico tem conhecimento, ou deve ter de todas as causas, e sobre ellas deve dar, ou póde suppor-se dar a sua opinião, e dirigir os Procuradores Regios, e seus Delegados nos Tribunaes de 1.ª e 2.ª Instancia, e que assim poderia acontecer achar-se julgando uma causa para que já tivesse influido. O Digno Par o Sr. Visconde de Laborim parece que me não entendeu, ou eu tive a infelicidade de me não fazer entender. Por esta occasião depois de se ter fallado do Procurador Geral da Corôa, eu seria injusto se não declarasse que reconheço os talentos e capacidade daquelle Magistrado, e que em tudo o que diz respeito ás funcções do seu ministerio, elle o desempenha com a maior intelligencia e assiduidade.
O Sr. Freire: — Será talvez estranho que eu vá fallar de uma materia inteiramente alheia da minha profissão; mas fizeram-me grande peso as reflexões do Digno Par o Sr. Visconde de Laborim, porque eu tinha pensado o mesmo, quando li este Projecto, mas não me atreveria a apresentar as minhas observações, se não fosse precedido de uma authoridade tão respeitavel. Primeiramente parece-me estranho que tres cousas realmente distinctas se apresentem em um só Projecto; e um Projecto transitorio.
Quanto á primeira de provêr ao serviço do Supremo Tribunal de Justiça, entendo que nenhuma vantagem se tirará de qualquer providencia para a presente Sessão; esta Lei ainda ha de levar tempo a passar nesta, e na outra Camara hão de depois nomear-se os Juizes da Relação, talvez que estes o não possão ser por terem votado nos processos, que lhes tocarem, hão de nomear-se outros Juizes, é preciso examinar os autos; e assim se passa o pouco tempo que resta. – Pelo que toca á parte regulamentar que vem no fim do Projecto essa pertence ao Governo. Quanto ás revistas nas causas de Commercio, é esta materia não só de legislação permanente, mas da maior transcendencia: quando eu estive na administração houve uma disposição sobre este objecto, e eu votei por essa medida, e apesar de ser dada por um digno magistrado honrosamente apreciado por seus collegas, e cujos talentos fazem honra ao Povo Portuguez; foi ella combatida, e dividiram-se respeitaveis opiniões a este respeito por se achar em opposição com o Codigo do Commercio, o qual se diz nesta achar-se igualmente em contradicção com a Carta. – A grande dificuldade que acho pois nesta materia, é de comprehender tão differentes objectos cumulativamente, e quereria que as disposições relativas ás causas do Commercio fossem inteiramente separadas, porque são objecto differente, e porque não posso admittir que uma Lei provisoria contenha disposições permanentes. — Não fiquei igualmente satisfeito com a resposta relativa ao Procurador Geral da Corôa, dada pelo Sr. Ministro da Justiça quanto a não poder servir de Juiz, não fallarei na capacidade deste benemerito Magistrado, sem o qual entendo que não [...] a Administração, naquella parte ao menos, em que está mais ligada com a Jurisprudencia, porque os seus honrados collegas lhe fizeram devida justiça, mas acho que elle pode servir de Juiz no Tribunal, substituindo-o ahi o seu ajudante, e continuar nas outras funcções que exerce para com o Governo. Resumindo pois direi, que chamo a attenção da Camara para que se separe tudo o que pertence a Lei transitoria, e quanto pertence a direito, que é do que entendo menos, passe para uma Lei permanente, e proponho a V. Ex.ª que a passar-se á discussão dos artigos, se tracte da 1.ª parte do artigo 1.º, e em seguimento do artigo 2.º
O Sr. Visconde do Banho: — Parece-me que depois das reflexões feitas pelo Digno Par o Sr. Freire, já se não pode tomar nenhuma resolução sem que o Projecto volte á Commissão para dizer o que se deve fazer, porque vejo a Camara inclinada a adoptar a emenda do Sr. Visconde de Laborim, e Freire. Eu não achava muita difficuldade em adoptar o Projecto, porque o que pretendo é que as Leis sejam boas; o mais não é da mesma importancia, porque a Sociedade tira o mesmo interesse, ainda que a collocação da Legislação não seja a mais perfeita, com tanto que a Legislação em si seja boa; em consequencia parece-me, que só a Commissão pode dar um Parecer á Camara, porque de outra sorte vamos a ter um embaraço de que só a Commissão nos póde livrar.
O Sr. Ministro das Justiças: — Supponho que agora o objecto é separar o que pertence ás causas de Commercio das Ordinarias. — Sobre isto direi que o Codigo de Commercio diz = que as causas quando subirem ao Supremo Tribunal de Justiça, se conhecerá dellas pelo Tribunal todo reunido. = Ora está claro que havendo só tres Juizes não pode haver esta reunião, e em consequencia no estado em que se achava o tribunal não podia deixar de se adoptar esta medida provisoria, e então não era possivel separar esta parte, e entendeu-se que se devia aqui incluir. A referencia que fez o Sr. Freire a uma providencia que se tomou, apesar que seja uma opinião que eu tenho propria, com tudo esta opinião não é geralmente adoptada, e os Membros do Tribunal foram divergentes sobre a execução daquella Portaria; e por isso é que se julgou, vista a urgencia do negocio, como já mostrou o Sr. Visconde do Banho, que esta era a occasião de tractar da materia para que hão houvessem mais duvidas, e o direito das partes não adiasse tropeços.
O Sr. Visconde de Laborim: — Levanto-me para dizer á Camara que, conformando-me com as mui judiciosas observações que acabou de fazer o Digno Par o Sr. Freire sobre o projecto em discussão, preciso com tudo de responder a uma dellas.
Posto que mui juridicamente o Digno Par entrasse na questão, tornando-se assim desnecessaria a delicada modestia com que principiou a fallar, entende que para serem emendados os defeitos do presente Projecto de Lei deve este voltar á Secção para o converter em dous diversos, um que tracte da materia permanente e processoria, e outro que verse sobre a pessoal e provisoria; devo dizer que me parece que, se este negocio tivesse nascido na Camara dos Dignos Pares, facil era o satisfazer á pertenção do Digno Par, mas, tendo vindo da dos Srs. Deputados da Nação Portugueza, creio que apesar de um tal defeito radical que se lhe encontra, não é possivel uma similhante divisão.
A Carta é clara, ella diz no artigo 51 em summa, que nós podemos deixar de adoptar um Projecto, ou no todo, ou em parte; e neste segundo caso, que o podemos alterar, emendando-o ou addicionando-o, mas não diz que de um Projecto possâmos fazer dous; que vale o mesmo que mandar para lá, na forma; que é o que basta, o que de lá não veio.
Este Projecto, Sr. Presidente, bem se deixa vêr que está formado com alguma precipitação, porque tractando de remediar um mal (fallo da materia permanente e processoria) esqueceu-se de remediar outro maior, e vem a ser, o erro que introduziu no fôro mercantil a Portaria de 7 de Março de 1834, que não podendo por sua naturesa infringir uma simples Lei regulamentar, ataca o artigo 128 da Carta Constitucional, em quanto dispensa os processos mercantis do meio da reconciliação; observancia porque S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça, quando Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, tanto tem propugnado.
É esta a reflexão que tenho a fazer, e me parece que, se o Projecto voltar á Secção de Justiça e Legislação, pouco ou nada mais se poderá adiantar; no entanto a Camara decidirá o mais acertado.
O Sr. Freire: — Eu não dei a minha opinião se deste Projecto se podiam fazer dous, e por isso propuz que o Projecto fosse á Commissão a ver se se podia dividir, e creio que nisto não haveria nenhuma irregularidade pelo Projecto ter vindo da outra Camara, uma vez que nós podemos fazer-lhe alterações, dando para isso os motivos, porque não posso entender que em uma Lei permanente se ponham disposições transitorias. Ora além disto vendo eu que o Sr. Ministro da Corôa adoptou algumas das reflexões que eu fiz, não vejo razão para que o Projecto deixe de voltar á Commissão; e ainda quereria mais que a Commissão peça ao Governo tudo quanto tem havido a este respeito, não só a respeito de nomear os Membros da Relação, como de todos os outros objectos relativos ás causas de Commercio, e opiniões dos diversos Magistrados, pois que se não póde decidir uma questão desta natureza sem todas as informações necessarias.
O Sr. Ministro das Justiças: — Devo uma explicação ao Digno Par, o Sr. Freire: entendeu elle que haviam duvidas a respeito da doutrina daquella Portaria, porém sobre a doutrina ninguem questionou: todos os conhecem que o Codigo do Commercio, sahiu fóra de toda a marcha ordinaria de Legislação; agora sobre que houveram questões era sobre a execução da Portaria; todos os membros do Tribunal conheceram a necessidade da medida, em que não estavam de acordo (menos eu que sempre sustentei que ella era regulamentar) era se ella cabia nas attribuições do Governo, e para tirar novas duvidas é que se incluiu no Projecto esta doutrina, que estava na Portaria, e que na minha opinião, como disse o Governo, estava nas suas attribuições quando a publicou.
O Sr. Visconde do Banho: — Torno a pedir á Camara que tome em sua consideração a minha pretenção; tocou-se agora uma especie nova, que se não tinha tocado ainda, e foi o Digno Par o Sr. Visconde de Laborim, quem a lembrou, e é o caso da conciliação, que deve ter logar antes de começo de processo algum, na fórma do que determina a Carta. No Supremo Tribunal de Justiça tem havido recursos interpostos, allegando-se como fundamento delles, não se ter guardado esta tão positiva determinação da Carta. É certo que ha casos em objectos commerciaes, onde é impossivel o intentar a conciliação antes de outro meio judicial. Como póde embargar-se por meio da conciliação, a partida de uma embarcação que deu á véla, e outros casos de embargo?
Ora parece-me, que na parte relativa aos Tribunaes de primeira instancia, necessariamente convirá fazer-se alguma alteração, porque elles tem uma organisação, que é particular delles. — Indo as decisões destes Juizos para serem revistas pelos Juizes de primeira Instancia, vão ser sujeitos á decisão de um Juizo organisado differentemente. Não me parece logar opportuno, para se tractar qual dos methodos é o mais conveniente para o processamento das revistas, se aquelle que adoptou o Codigo do Commercio, ou se o que está estabelecido na Lei de 1832. Esta Lei, segue até certo ponto a Legislação Franceza, e a quis accommodar quanto era possivel, ao nosso antigo systema. Parece-me que é conveniente pôr em harmonia o systema do processo em revista, e não haver differença alguma nas differentes causas, deixando o aperfeiçoamento, para outra opportunidade.
Eu devo confessar que tributo todos os respeitos, e faço justiça ao muito merecimento do Auctor do Codigo do Commercio, que tanto tem trabalhado em proveito da Nação, a ponto de estar cego por causa dos seus trabalhos, e da sua extraordinaria applicação.
Elle mesmo ha de convir, que a parte do Processo das causas commerciaes, no que diz respeito á organisação do Jury especial ha de