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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

Sessão de 12 de Fevereiro de 1836.

O Sr. Vice-Presidente occupou a Cadeira, e disse, que estava aberta a Sessão, sendo uma hora menos vinte minutos.

O Sr. Secretario Machado, fez a chamada, e concluida declarou estarem presentes 26 Dignos Pares, fallando 23, e destes 3 com causa motivada. — Estava tambem presente o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares, leu a Acta da Sessão antecedente, que foi approvada sem reclamação.

O Sr. Secretario Machado, leu uma Carta do Vice-Presidente da Direcção da Companhia de Pescarias Lisbonense, offerecendo cincoenta exemplares de uma Memoria sobre a pesca do Bacalhao, para serem distribuidos pelos Dignos Pares; o que se verificou, declarando-se, que a Camara os recebia com agrado.

O mesmo Sr. Secretario leu um Officio do Tenente Coronel Commandante do 1.º Esquadrão da Guarda Nacional de Lisboa, remettendo em virtude dos Artigos 26 e 27 da Carta Constitucional, todos os Documentos relativos aos dous Conselhos de disciplina, formados ao Digno Par Visconde de Fonte Arcada, Soldado da 2.ª Companhia do mesmo Esquadrão. — Terminada esta leitura, disse

O Sr. Vice-Presidente: — Nos termos dos Artigos 26 e 27 da Carta Constitucional, os Processos em que fique implicado qualquer Par do Reino, devem ser remettidos á Camara a fim de tomar conhecimento dos mesmos Processos, e decidir se o Par de que se tracta deve, ou não continuar no exercicio das suas funcções: e neste sentido foram enviados á Camara os Conselhos de Disciplina relativo ao Sr. Visconde de Fonte Arcada. Creio por tanto, que a Camara convirá em que estes papeis passem a uma Commissão Especial, que sobre elles dê o seu Parecer. (Apoiado.)

A Camara resolveu nesta conformidade, e bem assim que a mesma Commissão fosse composta, de 5 Membros, e nomeada pelo Sr. Vice-Presidente; e passando á

ORDEM DO DIA.

O Sr. Secretario Machado, leu o seguinte

Parecer.

A Secção de Legislação, examinando com a attenção devida a Proposição de Lei, enviada a esta Camara pela dos Senhores Deputados da Nação Portugueza, sobre o modo de provêr a falta de Conselheiros no Supremo Tribunal de Justiça, tem a honra de propôr á Camara que é digna de ser approvada com as pequenas e leves alterações, feitas no artigo 1.º, e deste no §. primeiro e segundo, as quaes constam da cópia junta.

Sala da Secção, Lisboa 6 de Fevereiro da 1836. = Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato. = Visconde de Laborim. = Sebastião Xavier Botelho. = Conde de Mafra. = Fernando Luiz Pereira de Sousa Barradas. = Barão de Renduffe. = Manoel de Macedo Pereira Coutinho.

Proposição sobre o modo de provêr a falta dos Conselheiros no Supremo Tribunal da Justiça.

Artigo 1.º A Divisão do Supremo Tribunal de Justiça em duas Secções Civel e Crime, na conformidade do Decreto de 19 de Maio de 1832, terá logar, e sempre que existir o numero de seis Conselheiros effectivos, além do Presidente, ou daquelle que fizer as suas vezes, e quando não exista, a concepção ou denegação de Revista nas Causas Civeis e Crimes ficará pertencendo ao Tribunal reunido.

§. 1.º Quando o Tribunal estivei dividido em Secções, a concepção ou denegação de Revista pertencerá, segundo à natureza das Causas á Secção respectiva, e nesta disposição como Civeis ficam comprehendidas as Causas Commerciaes.

§. 2.º Concedida a Revista nas Causa Commerciaes, os Feitos serão remettidos ou a uma das Primeiras Instancias, ou a uma das duas Relações de Lisboa e do Porto, segundo a nullidade constante dos Autos, fôr na primeira ou na segunda instancia praticada, observando-se a este respeito, no que fôr applicavel o artigo 4.º do mencionado Decreto de 19 de Maio de 1833.

§. 3.º Nos logares aonde houver Juizo Commercial de Primeira Instancia, o Juiz da Direito a quem o Feito fôr enviado, instaurará o Processo com Jurados Commerciaes, se estes deverem intervir nelle, porém nunca servirão de Jurados os que o foram no primeiro processo.

§. 4.º Para o fim determinado no antecedente se procederá, logo que esta Lei fôr promulgada, á eleição dos Jurados Commerciaes, em numero igual aos dos que actualmente existem. Nas futuras eleições de Jurados Commerciaes se elegerá de uma só vez o numero total delles, necessario tanto para o primeiro julgamento, como para o que tiver logar concedida a Revista.

§. 5.º Nos logares em que não houver Tribunal Commercial de Primeira Instancia, o Feito remettido ao Juiz de Direito designado pelo Supremo Tribunal de Justiça, será instaurado ou julgado de novo, segundo o disposto no Codigo Commercial.

Art. 2.º Se depois da providencia do artigo o numero dos Membros do Supremo Tribunal não fôr ainda sufficiente, será preenchido com Juizes da Relação de Lisboa dos mais antigos, e que não tiverem tido voto nas Causas de que houverem de conhecer no gráo de Revista.

§. Unico. Os Juizes da Relação de Lisboa chamados em virtude da presente Lei, para preencher a falta dos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, não vencerão por isso ordenado ou gratificação alguma, nem terão accesso ao mesmo Tribunal com prejuizo da antiguidade, o direito daquelles que o tiverem melhor.

Art. 3.º Vindo a faltar na Relação de Lis-

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boa, por causa do serviço de alguns de seus Juizes no Supremo Tribunal, o numero necessario para as tres Secções em que a mesma Relação se acha dividida, serão estas reduzidas a duas, e por ambas distribuidos com igualdade, e indistinctamente os Feitos Civeis e Crimes.

Art. 4.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Proposição (da Camara Electiva) a que se refere o Parecer.

Art. 1.º A Divisão do Supremo Tribunal de Justiça em duas Secções na conformidade do Decreto de 19 de Maio de 1832, deixará de ter logar, sempre que faltar o numero de Conselheiros necessario para cada uma dellas; e neste caso a concessão ou denegação de Revista nas Causas Civeis e Crimes ficará pertencendo ao Tribunal reunido.

§. 1.º Quando o Tribunal estiver dividido em Secções, a concessão ou denegação de Revista pertencerá, segundo a natureza das Causas, á Secção respectiva, e nesta disposição ficam comprehendidas as Causas Commerciaes.

§. 2.º Concedida a Revista nas Causas Commerciaes, os Feitos serão remettidos a um Juiz de Direito de Primeira Instancia, ou a uma das Relações, observando-se a este respeito, no que fôr applicavel, o artigo 4.º do mencionado Decreto de 19 de Maio de 1832.

§. 3.º Nos logares onde houver Juizo Commercial de Primeira Instancia, o Juiz de Direito, a quem o Feito fôr enviado, instaurará o Processo com Jurados Commerciaes, se estes deverem intervir nelle; porém nunca servirão de Jurados os que o foram no primeiro Processo.

§. 4.º Para o fim determinado no §. antecedente se procederá, logo que esta Lei fôr promulgada, á eleição dos Jurados Commerciaes, em numero igual ao dos que actualmente existem. Nas futuras eleições de Jurados Commerciaes se elegerá de uma só vez o numero total delles, necessario tanto para o primeiro julgamento, como para o que tiver logar, concedida a Revista.

§. 5.º Nos logares em que não houver Tribunal Commercial de Primeira Instancia, o Feito remettido ao Juiz de Direito, designado pelo Supremo Tribunal de Justiça, será instaurado ou julgado de novo, segundo o disposto no Codigo Commercial.

Art. 2.º Se depois da providencia do artigo 1.º o numero dos Membros do Supremo Tribunal não fôr ainda sufficiente, será preenchido com Juizes da Relação de Lisboa, dos mais antigos no serviço della, e que não tiverem tido voto nas Causas de que houverem de conhecer no gráo de Revista.

§. Unico. Os Juizes da Relação de Lisboa, chamados em virtude da presente Lei, para preencher a falta dos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, não vencerão por isso ordenado ou gratificação alguma, nem terão accesso ao mesmo Tribunal, com prejuizo da antiguidade, e direito daquelles que o tiverem melhor.

Art. 3.º Vindo a faltar na Relação de Lisboa, por causa do serviço de alguns de seus Juizes no Supremo Tribunal, o numero necessario para as tres Secções, em que a mesma Relação se acha dividida, serão estas reduzidas a duas, e por ambas distribuidos com igualdade, e indistinctamente os Feitos Civeis e Crimes.

Art. 4.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 4 de Fevereiro de 1836. = Manoel Antonio de Carvalho, Presidente. = João Alexandrino de Sousa Queiroga, Deputado Secretario. = Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario.

Terminada esta leitura disse

O Sr. Vice-Presidente: — Está em discussão na sua generalidade o Parecer da Commissão de Legislação.

Pediu a palavra em primeiro logar, e disse

O Sr. Visconde de Laborim: — Sou forçado a emittir algumas das idéas, que sobre esta materia tive a honra de apresentar á Secção de Legislação e Justiça, de que sou Membro; e principiarei por dizer que este Projecto, vindo da Camara dos Srs. Deputados da Nação Portugueza, teve origem em outro, alli apresentado pelo Sr. Ministro da Justiça, meu digno Collega, e que presente se acha; isto para o fim de provêr de remedio a falta de Conselheiros, que actualmente se experimenta no Supremo Tribunal de Justiça, a ponto de se não poderem fazer as Sessões da Lei.

Neste Projecto S. Ex.ª propunha áquella Camara que se permittisse ao Governo a liberdade de escolher dos Desembargadores mais antigos da Relação de Lisboa aquelles, que fossem necessarios, para supprir as vagaturas; igualmente S. Exc.ª requeria que todo o Tribunal se reunisse, para decidir assim os feitos civeis, como crimes; importava pois o Projecto de S. Ex.ª uma medida simples, pessoal, e provisoria: S. Ex.ª considerou talvez, que, não sendo a antiguidade sempre o Juiz mais exacto nas suas decisões sobre merecimento, este defeito estava remediado com uma judiciosa escolha do Governo; porém eu não posso excusar-me de dizer a S. Ex.ª, guardados os principios da maior attenção, que o Projecto, assim concebido, continha um Juizo de Commissão, providencia sem duvida contraria em toda a extenção ao §. 16 do artigo 145 da Carta Constitucional da Monarchia Portugueza, e effectivamente não póde a materia do Projecto olhar-se de outra maneira, attento o deixar ao arbitrio do Governo a escolha dos Desembargadores mais antigos, que deveriam servir nas faltas dos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça.

Não sei se por este motivo, ou se por diverso foi quasi repudiado o Projecto, e se formou outro na Camara dos Srs. Deputados, não só para pôr em pratica de uma fórma Constitucional a medida emittida pelo Sr. Ministro da Corôa, relativamente á falta de Conselheiros no Tribunal, mas tambem para ser tomada providencia sobre o impate, que alli experimentavam as Causas do Commercio; isto é que, álem daquella medida transitoria, e pessoal, se tomasse esta permanente, e processoria.

Apresenta-se este Projecto da Camara dos Srs. Deputados, para ser discutido, e apesar de eu ter assignado o Parecer da Secção, que exige nelle algumas alterações simplesmente, não posso, pelo que fica exposto, deixar de o impugnar, por isso que o primeiro defeito que lhe encontro, consiste em conter materia, da qual se deveriam formar dous diversos Projectos, um sobre o pessoal, e provisorio, outro sobre o permanente, e processorio; defeito muito notavel, quando se tracta de dar a Legislação aquella divisão, e regularidade, que faz toda a sua belleza.

O segundo é fundado na falta da necessidade de uma similhante medida, falta esta, que desde logo divisei naquelle Projecto do Sr. Ministro da Justiça. Digo que a medida é desnecessaria, porque me parece que estava nas attribuições do Governo remediar o mal, e até creio que fazer com que o Tribunal trabalhasse desde que se experimentou aquella falta, não se seguindo assim, como se tem seguido, irreparavel damno contra a liberdade, e propriedade do Cidadão; fallando daquella, pelo que respeita ao empate das causas crimes, e desta, pelo que pertence á móra da decisão das civeis, no numero das quaes se comprehendem as importantissimas do Commercio, as quaes todas teriam neste ponto melhor sorte, se desde logo se abraçasse a providencia, que passo a expôr.

O Decreto de 14 de Setembro de 1833 marca, além do Presidente, e do Procurador Geral da Corôa, o numero de doze Conselheiros, dos quaes se deve compôr o Supremo Tribunal de Justiça; destes acham-se impedidos nove, um por molestia, e os outros por se acharem occupados em Commissões: com tres, que restam, não é possivel satisfazer-se nem a uma das Secções, determinadas pelo Decreto de 19 de Maio de 1832, e então mais que justo é remediar o mal, que dahi provém á Nação, e com effeito convenço-me que se poderia ter remediado da maneira seguinte:

Sendo o Procurador Geral da Corôa pelo artigo 5.º, Titulo 2.º, sobre a organisação pessoal, da Lei de 16 de Maio de 1832, Conselheiro nato do Supremo Tribunal, e tendo elle um Ajudante; não vejo difficuldade alguma para que o segundo não tome sobre si a tarefa, que diz respeito ao primeiro, passando este a exercer unicamente as funcções de Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça; e assim já temos tres Membros effectivos, além do Presidente, e verificada a possibilidade, de que reunidos possam satisfazer aos seus deveres.

Se o Governo tivesse adoptado esta medida, facilima de abraçar, e em toda a extensão efficaz, não se viria hoje tomar o tempo á Camara, nem as cousas do commercio, e outras importantissimas estariam paradas com grave detrimento da partes; mas parece-me que ainda mais estava, e está na alçada do Governo; eu me explico = acha-se vago um dos logares de Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, e ignoro a razão, porque o não tinham provido; se isto se fizesse, ou se agora se fizer, teremos, além dos acima ditos, mais um, que preenche o numero de cinco; todavia o que ha de mais notavel neste negocio é, que ao mesmo passo, que o Presidente da Relação de Lisboa se queixa de que não tem Membros sufficientes para desempenhar os trabalhos; e que por este motivo soffrem empate immensas causas, que estão a cargo do Tribunal a que preside, se pretenda tirar delle individuos, para servirem na falta dos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça; esta reflexão, Senhores, merece toda a vossa attenção.

Não posso deixar de notar mais na generalidade deste Projecto uma outra difficiencia, e vem a ser = estou convencido de que toda a Lei tem um caracter provisorio, porque effectivamente as Lei o assentam sobre bases, que os tempos mudam, e fazem caducar, e por tanto é indispensavel altera-las, e até substitui-las por outras diversas, passada certa época, isto deve entender-se geralmente fallando, mas não em particular, e em relação a ellas entre si; por tanto digo, que o Projecto em discussão, quando seja approvado, deve isto fazer-se como uma medida provisoria (o que nelle não vejo especificado, como especificára no seu Projecto, aliàs, no meu ver, imperfeito, S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça) porque bom é que, indo assim de encontro com algumas Leis, que concorrem para o bom andamento da Administração da Justiça, se diga, que ha de durar pouco, e em quanto se não der mais legal providencia.

São estes os principios, que na generalidade do Projecto, vindo da Camara Electiva, emendado pela nossa Secção de Legislação, apresento a esta Assembléa, para que sobre estes medite, e decida o mais acertado; e se elle fôr approvado em globo, então reservo-me para dizer alguma cousa sobre cada um de seus artigos.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, a Proposição tal qual veio da Camara dos Srs. Deputados, tem duas partes; a que era propriamente a proposta do Governo, e a outra contendo aquillo que a mesma Camara julgou dever accrescentar-lhe. O Governo só pedia modo de occorrer ao andamento do Supremo Tribunal de Justiça, que se achava fechado por falta de Juizes; e justificando eu a proposta originaria do Ministerio, parece-me que tambem ficará respondida a parte principal do discurso do Digno Par que acaba de fallar.

O Tribunal mencionado acha-se constituido pela Lei de 14 de Setembro de 1334; e esta diz que será composto de quatorze Juizes, comprehendendo neste numero o Presidente, e o Procurador Geral da Corôa. O Presidente é Membro da Camara dos Srs. Deputados logo não póde continuar neste exercicio em quanto durar a Sessão Legislativa; e quanto as Procurador Geral da Corôa, pareceu ao Governo que não podia ser Juiz, por isso que na Lei estão designadas suas funcções; e que se alguma vez as deixasse para exercer as de Juiz, necessariamente se daria o caso de ser Juiz, e parte ao mesmo tempo; porque não póde considerar-se causa alguma de que o Ministerio Publico não tome conhecimento, ou seja pelos Delegados do Procurador Regio nos Tribunaes da primeira instancia, ou nos de segunda; e devendo os mesmos Delegados receber do Procurador Geral da Corôa as instrucções convenientes, é de suppôr que elle lhas tenha dado relativamente aos objectos do Seu cargo, por tanto seria muito difficultoso fazer uma distincção entre as diversas causas em que desta maneira houvesse pronunciado uma opinião, e aquellas de que não houvesse tomado conhecimento algum; e sendo necessario, além disto, não desviar aquelle Funccionario do seu primeiro destino, pareceram estas razões bastantes para lhe não fazer tomar o exercicio de Juiz no Supremo Tribunal de Justiça. Por conseguinte vinham assim a faltar dous Membros do mesmo Tribunal. Dos doze restantes, um é fallecido, quatro são Membros da Camara dos Srs. Deputados, tres são Dignos Pares do Reino, ficando por estes motivos apenas quatro; mas um delles está doente de molestia continuada, e dos tres que restam, um tomou a Presidencia, ficam dous disponiveis, que não podem constituir o Tribunal.

Mas pergunta-se, (poderia fazer-se o despacho do logar que está vago quando fosse bastante)? Na opinião do Ministerio, não. A Carta no Art. 130 diz = que os Juizes do Supremo Tribunal de Justiça, serão tirados das Relações por suas antiguidades etc. = e a Lei de 16 de Maio de 1832, no Art. 15 que = a anti-

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guidade será regulada depois de todos despachados: = esta não está regulada, logo o Ministerio não podia fazer o despacho para não offender os direitos de cada um. O embaraço em que o Governo se tem achado a este respeito não é novo; todos os que me precederam no Ministerio se viram na mesma difficuldade. Nunca, nem mesmo nos tempos despoticos, os Ministros d'Estado decidiram as antiguidades na Magistratura, foi sempre em Tribunal, este negocio era commettido á Casa da Supplicação (que era o Supremo Tribunal de Justiça) e ahi mesmo conhecia della a Mesa de Aggravos, que era a mais graduada; porque então mesmo podiam os seus Membros reputar-se independentes, e julgar pelas Leis existentes. Mas o Governo não póde ser Juiz neste caso, porque involve direitos de terceiro: não estando reguladas as antiguidades como manda a Lei de 16 de Maio de 1832, e não tocando ao Governo essa regulação, é claro que não podia fazer o despacho. Parece-me que tenho justificado a medida proposta pelo Ministerio, e a sua necessidade. Nella se dizia que os Juizes da Relação que houvessem de servir no Supremo Tribunal de Justiça, seriam escolhidos pela sua antiguidade, e aptidão; (não me lembra precisamente, mas creio que estes eram os termos da proposta); mas tendo muitos delles sido já Juizes nas causas que subiam ao Tribunal Supremo, era forçoso referir a aptidão a esta circumstancia: não foi talvez bem explicada na proposta ao Governo; e d'ahi procede a nova forma que a Commissão de Legislação da Camara dos Srs. Deputados julgou dar-lhe.

Sobre o inconveniente que resultará de se tirarem Juizes da Relação, que virão nella a faltar para o expediente deste Tribunal; digo que isto se acha providenciado (no Art. 3.º do Projecto) pela disposição que manda reduzir a duas, as tres Secções alli existentes, ás quaes serão distribuidos indistinctamente todos os feitos civeis, e crimes. E na verdade, na Relação de Lisboa se dá o mesmo inconveniente por terem sahido nove Membros della para a Camara Electiva mas se ao governo tivesse sido presente esta difficuldade, pelo Presidente da mesma Relação, teria proposto algum meio para a remediar.

Finalmente o Projecto contém algumas providencias relativamente ás causas commerciaes; porque a Camara dos Srs. Deputados julgou util incluidas aqui, para tirar uma duvida de tanta ponderação, e que por vezes tem demorado as causas daquella especie, (como aconteceu no anno passado) aproveitando para isso uma occasião em que se tracta de fazer algumas modificações no Supremo Tribunal de Justiça. Se a Camara julgar dever approvar o Projecto na generalidade; quando se tractar na especialidade farei o possivel por sustentar cada um dos seus Artigos.

O Sr. Visconde de Laborim: — Estou convencido da necessidade de uma medida a este respeito, e tanto que, sendo este Projecto redigido contra a minha opinião, como tenho demonstrado, nenhuma difficuldade tive em assignar o Parecer da Secção de Legislação, e Justiça; entretanto este facto não véda que eu expenda as minhas razões em contrario: partindo deste principio, tractarei de responder a alguns argumentos de S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça, meu benemerito Collega.

Disse S. Ex.ª, que tendo o Procurador Geral da Corôa figurado, exercitando seu Emprego na maior parte das causas, ficava por isso inhabilitado para exercer as funcções de Juiz no Supremo Tribunal de Justiça; se este principio é exacto, ha de perdoar-me S. Ex.ª que eu delle tire a conclusão, de que o Procurador Geral da Corôa nunca poderá ser Conselheiro deliberante do referido Tribunal, visto que aquelle impedimento sempre o ha de acompanhar; proposição, que na realidade é insustentavel, e se podesse defender-se, e se existisse (seja-me licito aproveitar esta occasião de dizer á Camara) a Magistratura perderia uma das pessoas mais dignas pela sua litteratura, prudencia; um Orador, segundo o systema actual, eloquente, e respeitavel, o qual a estas qualidades ajunta a de um tino particularissimo para exercer as importantes funcções, de que se acha encarregado; mas já se vê que em presença do principio estabelecido cahe o argumento feito pelo Sr. Ministro da Justiça; e tambem fica sem vigor, porque, se eu tive a infelicidade de não ser bem entendido por S. Ex.ª todos me farão a justiça de que eu jámais poderia enunciar que o Procurador Geral da Corôa fosse Juiz, e Parte ao mesmo tempo, nem mesmo era possivel que eu tal dissesse, tendo, como tenho, algumas leves tinturas de Jurisprudencia em geral; e é obvio que a minha opinião a tal respeito só era relativa áquellas causas, cujos Julgados não complicassem com os deveres, que estavam inherentes ao Cargo de Procurador Geral da Corôa, que exerce aquelle meu distincto Collega, de que fallei; e fazendo-se isto, creio que se não ataca principio algum, porque, dando-lhe a Lei um Ajudante, Magistrado actualmente tambem habilissimo, temos pessoa capaz de bem desempenhar aquelle Emprego; sendo isto assim, está em pé a minha Proposição, e adoptando-se a medida que por ella indiquei, não só se pouparia á Camara o tempo tão necessario para seus importantes trabalhos, mas igualmente se não acharia fechado o Supremo Tribunal de Justiça, deteriorada assim a liberdade e a propriedade do Cidadão, como ainda ha pouco expuz.

Tractando da Lei, que deve regular as antiguidades, tambem me não agradam as razões, a este respeito expendidas pelo meu digno Collega o Sr. Ministro da Justiça; diz S. Ex.ª que a referida Lei ainda não está feita, e que por tanto, não se podendo decidir legalmente sobre antiguidades, não é possivel provêr-se o logar, que no Supremo Tribunal de Justiça se acha vago; primeiramente observarei que qualquer Lei, que tenha de se fazer sobre este objecto, e caso em questão, será inutil, porque nunca poderá olhar para trás, mas sim para diante, isto é, não deve tractar de um facto passado, mas sim de um, ou mais que lhe succederem.

Talvez que o unico modo de remediar os actos precedentes consista em authorisar por Lei um Tribunal, para julgar as pertenções de antiguidades; mas nunca se poderá dizer, sem perigo de errar, que é necessaria uma Lei, que julgue as antiguidades, vencidas antes della, por ser impossivel moral organisa-la, attento, que pelos seus effeitos retroactivos está em toda a extensão contra a Carta no §. 2.º do artigo 145. A marcha, que apontei, vai conforme com os principios do Srs. Ministro da Justiça quando disse que o Governo não decidia por si estes casos mesmo nos tempos absolutos mas que os commettia ás Relações, para as suas decisões; entre estas tem talvez o primeiro logar o assento de 14 de Fevereiro de 1817.

Parece-me pois, que, tractando agora o Governo de praticar sobre tal assumpto o mesmo, que tinha logar em outros tempos, isto é recorrer, ou consultar quem o podesse aconselhar sobre antiguidades, ninguem lhe poderia tolher o decidir na presença dessa Consulta, ou Conselho; e assim dos principios até aqui em pratica recebidos. O Governo regula-se entre nós por Leis, que existem, ou por Leis, que hão de existir, não se tem julgado por muitas vezes casos sobre antiguidades?

Se o Governo tem algum plano, que deva contrariar esta minha proposição, digne-se manifesta-lo; mas se o não tem, forçoso é confessar que a vagatura do Tribunal não se preenche, porque se não quer preencher; mas Sr. Presidente este é o logar da verdade: sejâmos sinceros, e digamos que os Candidatos que aspiram a esse logar, são muitos, e de tal pulso, que a decisão a seu respeito não é obra de pouco compromettimento, para quem não quer arrosta-lo.

Quanto ao outro principio emittido por S. Ex.ª, em que procura persuadir que no seu Projecto não havia um Juizo de Commissão, prohibido pela Carta, respondo com as forças do mesmo Projecto, que são estas = que seriam chamados, para servir no impedimento dos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, os Membros mais antigos da Relação de Lisboa, que o Governo escolhesse =; á face de taes expressões não é possivel duvidar que o Governo se preparava para ter Juizo de Commissão nesta parte, contra a letra do §. 16 do artigo 145 da Carta Constitucional.

Creio pois ter respondido de uma maneira satisfatoria aos argumentos, que contra a minha opinião apresentou o meu digno Collega o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Visconde do Banho: — O Sr. Ministro da Justiça teve a bondade de mostrar o seu Projecto antes de o apresentar, e confesso ingenuamente que depois da razões, que elle deu, entre ellas descobri que o Governo carecia dos serviços do Conselheiro Procurador Geral da Corôa, porque no estado actual, o conselho delle é necessario, para a execução de muitos objectos, que antigamente eram encarregados ás Mesas, ou Tribunaes, que se extinguiram. Annuí; posto que no principio fosse de differente opinião. — Faço esta confissão, porque é preciso ser verdadeiro, e ser homem de bem. Escuso agora de repetir o que disse o Digno Par que acabou de fallar. — É preciso tambem por esta occasião fazer justiça aos méritos, e serviços distinctos do Procurador Geral da Corôa. Elle hoje é ouvido sobre differentes objectos, e tudo isto não pode deixar de lhe ter dado um trabalho immenso: é de admirar o bem, e o expediente, que elle dá a tantos e tão complicados objectos; em consequencia é um dever, hoje que se tracta dos serviços que este empregado tem feito á sua Patria, o reconhece-los, o que eu faço não só por motivos de amisade como porque eu até faltaria á justiça, se não apoiasse o que disse o Digno Par, que acabou de fallar não só a respeito deste empregado, como do seu habil Ajudante. É preciso tambem dar toda a attenção ao que propõem o Governo: é não menos verdade que as nossas Administrações tem sido sujeitas em certo modo a um receio quando se tracta de medidas de certa natureza: mas eu creio que o meu Illustre Amigo o Sr. Visconde de Laborim já desfez muitas das duvidas, que podiam haver a este respeito, e então não sei porque se priva o Supremo Tribunal de um Membro cujo logar se acha vago. Não sei se isto se faz por principio de economia, por se julgar um modo de popularidade, e talvez que o Governo intenda poupar esta despeza; eu não intendo que isto sejam economias, nem pretendo atacar o meu Collega o Sr. Ministro da Justiça, mas o que queria era que o Governo tivesse coragem, para fazer tudo aquillo para que a Lei o authorisa; e em quanto houver uma Lei, que determina o numero destes empregados, o Governo pode preenche-lo porque executa a Lei, o que é do seu dever. Basta olhar para o numero de causas que vem de montão, fallo das listas por differentes vezes publicadas no Diario, de causas da Fazenda mandadas ao Presidente da Relação de Lisboa, para ver que é impossivel, que a Relação de Lisboa as possa decidir. Dão-se seis dias para rever todas as causas, e mais quatro por misericordia, quando ha algumas, que se não podem examinar se não depois de tempo; medem porém, todas pela mesma bitola; digo pois que por muito tempo ha de ser preciso que os Tribunaes estejam não só preenchidos de toda a sua gente; mas talvez seja necessario que a Relação de Lisboa tenha Juizes addicionaes por algum tempo. É Digno de notar-se que em todas as Nações os Tribunaes, e a administração de Justiça não está organisada como se deseja: repare-se entre outros o que vai presentemente em Inglaterra, a respeito do seu Tribunal de Chancellaria Mór; e então não sei como se suppõem que nós possamos estar em toda a perfeição, quando ainda ha pouco sahimos da casca do ôvo Constitucional.

Ha tres considerações que vem neste Projecto chamar a attenção da Camara; a primeira supprir o Tribunal de Justiça de Membros que lhe faltam; a segunda e terceira, é incluir aqui neste Projecto, as causas do Commercio, e o dar uma uniformidade aos Processos das differentes causas, que sobem ao Supremo Tribunal em recurso de revista. Quando se tractar de cada um dos Artigos, terei de dizer sómente alguma cousa sobre o caso de revista concedida, de alguma determinação de um Tribunal de primeira Instancia Commercial: no mais não posso deixar de approvar o Projecto, porque as difficuldades apresentadas pelo Sr. Ministro tem algum fundamento.

Em quanto á decisão sobre as Antiguidades dos Juizes, (vejo que o meu sabio amigo, e Collega o Sr. Visconde de Laborim, ainda continua usar da frase = de Desembargadores =) é certo que hoje não ha Casa da Supplicação, e seria de algum modo necessaria uma Lei para decidir das antiguidades em cada uma das Relações. Mas a este respeito, como muito bem disse o meu Illustre Amigo, o Governo não tem mais que guiar-se pelas Leis existentes: antigamente, quando haviam Desembargadores, o que hoje já não existe, mandou o Governo que cada um respondesse a certos quisitos, relativamente ás pretenções, a respeito de antiguidades, assim se procedeu no anno de 1828, e na Secretaria d'Estado deve existir esse trabalho: é verdade que sobre isto não houve resolução, porque então principiou a usurpação. Siga o Governo agora aquelle methodo, e parece-me que seria mais facil que o Go-

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verno, para regular as antiguidades pedisse a cada um dos Juizes, que dissesse quaes eram as suas pretensões a tal respeito; porque como bem disse um Digno Par, aqui não se tracta de julgar; isto não é uma demanda, e o Governo está authorisado a fazer esta nomeação conforme a Lei, e fazendo conforme a Lei existente, a ninguem faz injustiça; este é o meu parecer; e em geral approvo o Projecto com a excepção que já disse.

O Sr. Ministro das Justiças: — Sr. Presidente, eu não posso deixar de prestar um tributo á lealdade do meu honrado amigo e Collega, o Digno Par que acabou de fallar, nem outra cousa era propria da sua probidade, o faltar ao que uma vez tinha tractado.

Sr. Presidente, aqui não ha commissão na medida que o Governo propoz, e eu o poderia sustentar; porque commissão é = Delegata judicandi potesta = isto é, aquella Jurisdicção que se concede para certa pessoa ou cousa; e nem uma, nem outra existe nas medidas propostas, já expliquei á Camara que a escolha que o Governo queria fazer ente os mais antigos, para que não acontecesse que viessem Juizes dos que já tivessem julgado alguma das causas; em consequencia é bem claro que o Governo não queria uma commissão.

O Governo não tem difficuldade em fazer despachos segundo a Lei, e o Governo está disposto a fazer tudo o que possa segundo a Lei, mas nada contra a Lei: o artigo 15 da de 16 de Maio de 1832 diz, que as antiguidades serão reguladas: estão reguladas estas antiguidades? Não; logo o Governo não podia fazer aquelle despacho. Eu não disse que queria Lei para julgar das antiguidades; o que digo é que as antiguidades estão reguladas, e que o Governo não as julga. — Tambem não disse que o Procurador Geral da Corôa era inhabil para julgar todas as causas, a inhabilidade era para as causas passadas, e não fallei das presentes; e parece-me que me expliquei bem: disse que o Ministerio Publico tem conhecimento, ou deve ter de todas as causas, e sobre ellas deve dar, ou póde suppor-se dar a sua opinião, e dirigir os Procuradores Regios, e seus Delegados nos Tribunaes de 1.ª e 2.ª Instancia, e que assim poderia acontecer achar-se julgando uma causa para que já tivesse influido. O Digno Par o Sr. Visconde de Laborim parece que me não entendeu, ou eu tive a infelicidade de me não fazer entender. Por esta occasião depois de se ter fallado do Procurador Geral da Corôa, eu seria injusto se não declarasse que reconheço os talentos e capacidade daquelle Magistrado, e que em tudo o que diz respeito ás funcções do seu ministerio, elle o desempenha com a maior intelligencia e assiduidade.

O Sr. Freire: — Será talvez estranho que eu vá fallar de uma materia inteiramente alheia da minha profissão; mas fizeram-me grande peso as reflexões do Digno Par o Sr. Visconde de Laborim, porque eu tinha pensado o mesmo, quando li este Projecto, mas não me atreveria a apresentar as minhas observações, se não fosse precedido de uma authoridade tão respeitavel. Primeiramente parece-me estranho que tres cousas realmente distinctas se apresentem em um só Projecto; e um Projecto transitorio.

Quanto á primeira de provêr ao serviço do Supremo Tribunal de Justiça, entendo que nenhuma vantagem se tirará de qualquer providencia para a presente Sessão; esta Lei ainda ha de levar tempo a passar nesta, e na outra Camara hão de depois nomear-se os Juizes da Relação, talvez que estes o não possão ser por terem votado nos processos, que lhes tocarem, hão de nomear-se outros Juizes, é preciso examinar os autos; e assim se passa o pouco tempo que resta. – Pelo que toca á parte regulamentar que vem no fim do Projecto essa pertence ao Governo. Quanto ás revistas nas causas de Commercio, é esta materia não só de legislação permanente, mas da maior transcendencia: quando eu estive na administração houve uma disposição sobre este objecto, e eu votei por essa medida, e apesar de ser dada por um digno magistrado honrosamente apreciado por seus collegas, e cujos talentos fazem honra ao Povo Portuguez; foi ella combatida, e dividiram-se respeitaveis opiniões a este respeito por se achar em opposição com o Codigo do Commercio, o qual se diz nesta achar-se igualmente em contradicção com a Carta. – A grande dificuldade que acho pois nesta materia, é de comprehender tão differentes objectos cumulativamente, e quereria que as disposições relativas ás causas do Commercio fossem inteiramente separadas, porque são objecto differente, e porque não posso admittir que uma Lei provisoria contenha disposições permanentes. — Não fiquei igualmente satisfeito com a resposta relativa ao Procurador Geral da Corôa, dada pelo Sr. Ministro da Justiça quanto a não poder servir de Juiz, não fallarei na capacidade deste benemerito Magistrado, sem o qual entendo que não [...] a Administração, naquella parte ao menos, em que está mais ligada com a Jurisprudencia, porque os seus honrados collegas lhe fizeram devida justiça, mas acho que elle pode servir de Juiz no Tribunal, substituindo-o ahi o seu ajudante, e continuar nas outras funcções que exerce para com o Governo. Resumindo pois direi, que chamo a attenção da Camara para que se separe tudo o que pertence a Lei transitoria, e quanto pertence a direito, que é do que entendo menos, passe para uma Lei permanente, e proponho a V. Ex.ª que a passar-se á discussão dos artigos, se tracte da 1.ª parte do artigo 1.º, e em seguimento do artigo 2.º

O Sr. Visconde do Banho: — Parece-me que depois das reflexões feitas pelo Digno Par o Sr. Freire, já se não pode tomar nenhuma resolução sem que o Projecto volte á Commissão para dizer o que se deve fazer, porque vejo a Camara inclinada a adoptar a emenda do Sr. Visconde de Laborim, e Freire. Eu não achava muita difficuldade em adoptar o Projecto, porque o que pretendo é que as Leis sejam boas; o mais não é da mesma importancia, porque a Sociedade tira o mesmo interesse, ainda que a collocação da Legislação não seja a mais perfeita, com tanto que a Legislação em si seja boa; em consequencia parece-me, que só a Commissão pode dar um Parecer á Camara, porque de outra sorte vamos a ter um embaraço de que só a Commissão nos póde livrar.

O Sr. Ministro das Justiças: — Supponho que agora o objecto é separar o que pertence ás causas de Commercio das Ordinarias. — Sobre isto direi que o Codigo de Commercio diz = que as causas quando subirem ao Supremo Tribunal de Justiça, se conhecerá dellas pelo Tribunal todo reunido. = Ora está claro que havendo só tres Juizes não pode haver esta reunião, e em consequencia no estado em que se achava o tribunal não podia deixar de se adoptar esta medida provisoria, e então não era possivel separar esta parte, e entendeu-se que se devia aqui incluir. A referencia que fez o Sr. Freire a uma providencia que se tomou, apesar que seja uma opinião que eu tenho propria, com tudo esta opinião não é geralmente adoptada, e os Membros do Tribunal foram divergentes sobre a execução daquella Portaria; e por isso é que se julgou, vista a urgencia do negocio, como já mostrou o Sr. Visconde do Banho, que esta era a occasião de tractar da materia para que hão houvessem mais duvidas, e o direito das partes não adiasse tropeços.

O Sr. Visconde de Laborim: — Levanto-me para dizer á Camara que, conformando-me com as mui judiciosas observações que acabou de fazer o Digno Par o Sr. Freire sobre o projecto em discussão, preciso com tudo de responder a uma dellas.

Posto que mui juridicamente o Digno Par entrasse na questão, tornando-se assim desnecessaria a delicada modestia com que principiou a fallar, entende que para serem emendados os defeitos do presente Projecto de Lei deve este voltar á Secção para o converter em dous diversos, um que tracte da materia permanente e processoria, e outro que verse sobre a pessoal e provisoria; devo dizer que me parece que, se este negocio tivesse nascido na Camara dos Dignos Pares, facil era o satisfazer á pertenção do Digno Par, mas, tendo vindo da dos Srs. Deputados da Nação Portugueza, creio que apesar de um tal defeito radical que se lhe encontra, não é possivel uma similhante divisão.

A Carta é clara, ella diz no artigo 51 em summa, que nós podemos deixar de adoptar um Projecto, ou no todo, ou em parte; e neste segundo caso, que o podemos alterar, emendando-o ou addicionando-o, mas não diz que de um Projecto possâmos fazer dous; que vale o mesmo que mandar para lá, na forma; que é o que basta, o que de lá não veio.

Este Projecto, Sr. Presidente, bem se deixa vêr que está formado com alguma precipitação, porque tractando de remediar um mal (fallo da materia permanente e processoria) esqueceu-se de remediar outro maior, e vem a ser, o erro que introduziu no fôro mercantil a Portaria de 7 de Março de 1834, que não podendo por sua naturesa infringir uma simples Lei regulamentar, ataca o artigo 128 da Carta Constitucional, em quanto dispensa os processos mercantis do meio da reconciliação; observancia porque S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça, quando Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, tanto tem propugnado.

É esta a reflexão que tenho a fazer, e me parece que, se o Projecto voltar á Secção de Justiça e Legislação, pouco ou nada mais se poderá adiantar; no entanto a Camara decidirá o mais acertado.

O Sr. Freire: — Eu não dei a minha opinião se deste Projecto se podiam fazer dous, e por isso propuz que o Projecto fosse á Commissão a ver se se podia dividir, e creio que nisto não haveria nenhuma irregularidade pelo Projecto ter vindo da outra Camara, uma vez que nós podemos fazer-lhe alterações, dando para isso os motivos, porque não posso entender que em uma Lei permanente se ponham disposições transitorias. Ora além disto vendo eu que o Sr. Ministro da Corôa adoptou algumas das reflexões que eu fiz, não vejo razão para que o Projecto deixe de voltar á Commissão; e ainda quereria mais que a Commissão peça ao Governo tudo quanto tem havido a este respeito, não só a respeito de nomear os Membros da Relação, como de todos os outros objectos relativos ás causas de Commercio, e opiniões dos diversos Magistrados, pois que se não póde decidir uma questão desta natureza sem todas as informações necessarias.

O Sr. Ministro das Justiças: — Devo uma explicação ao Digno Par, o Sr. Freire: entendeu elle que haviam duvidas a respeito da doutrina daquella Portaria, porém sobre a doutrina ninguem questionou: todos os conhecem que o Codigo do Commercio, sahiu fóra de toda a marcha ordinaria de Legislação; agora sobre que houveram questões era sobre a execução da Portaria; todos os membros do Tribunal conheceram a necessidade da medida, em que não estavam de acordo (menos eu que sempre sustentei que ella era regulamentar) era se ella cabia nas attribuições do Governo, e para tirar novas duvidas é que se incluiu no Projecto esta doutrina, que estava na Portaria, e que na minha opinião, como disse o Governo, estava nas suas attribuições quando a publicou.

O Sr. Visconde do Banho: — Torno a pedir á Camara que tome em sua consideração a minha pretenção; tocou-se agora uma especie nova, que se não tinha tocado ainda, e foi o Digno Par o Sr. Visconde de Laborim, quem a lembrou, e é o caso da conciliação, que deve ter logar antes de começo de processo algum, na fórma do que determina a Carta. No Supremo Tribunal de Justiça tem havido recursos interpostos, allegando-se como fundamento delles, não se ter guardado esta tão positiva determinação da Carta. É certo que ha casos em objectos commerciaes, onde é impossivel o intentar a conciliação antes de outro meio judicial. Como póde embargar-se por meio da conciliação, a partida de uma embarcação que deu á véla, e outros casos de embargo?

Ora parece-me, que na parte relativa aos Tribunaes de primeira instancia, necessariamente convirá fazer-se alguma alteração, porque elles tem uma organisação, que é particular delles. — Indo as decisões destes Juizos para serem revistas pelos Juizes de primeira Instancia, vão ser sujeitos á decisão de um Juizo organisado differentemente. Não me parece logar opportuno, para se tractar qual dos methodos é o mais conveniente para o processamento das revistas, se aquelle que adoptou o Codigo do Commercio, ou se o que está estabelecido na Lei de 1832. Esta Lei, segue até certo ponto a Legislação Franceza, e a quis accommodar quanto era possivel, ao nosso antigo systema. Parece-me que é conveniente pôr em harmonia o systema do processo em revista, e não haver differença alguma nas differentes causas, deixando o aperfeiçoamento, para outra opportunidade.

Eu devo confessar que tributo todos os respeitos, e faço justiça ao muito merecimento do Auctor do Codigo do Commercio, que tanto tem trabalhado em proveito da Nação, a ponto de estar cego por causa dos seus trabalhos, e da sua extraordinaria applicação.

Elle mesmo ha de convir, que a parte do Processo das causas commerciaes, no que diz respeito á organisação do Jury especial ha de

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admittir mais perfeição. Porém convenho que ainda não é tempo entrar nesta reforma.

Senhores, de repente não é possivel fazer-se tudo, porque acontecerá irmo-nos achar em um montão de difficuldades, e por isso esperemos mais algum tempo, para então ellas se destruirem, pouco a pouco, e não entrarmos em um perfeito labyrinto, em resultado do qual só encontraremos ruinas, e á maneira de uma grande cidade, onde cahiram por terra os seus edificios, não teremos veredas por onde transitar, achando-se o chão alastrado com os differentes fragmentos dos edificios cahidos.

O Sr. Visconde de Laborim: — Eu não me opponho a que o Projecto volte á Secção, mas para que ella de uma vez emitta a sua opinião sobre este objecto, parecia-me ser conveniente discutir primeiro a materia; porque do contrario, ella ha de ver-se em muitos embaraços, e encontrar grandes difficuldades, as quaes se poderão melhor remover, sabida a opinião da Camara; e então assim fará depois a Secção melhor trabalho.

O Sr. Vice-Presidente: — Proponho se está sufficientemente discutido? — A Camara decidiu affirmativamente.

O Sr. Vice-Presidente: — Proporei agora se deve voltar á Commissão; mas advirto que ella não póde ter dúvida alguma em tornar a ver este Projecto; porém é forçoso confessar, e expôr á Camara que talvez seja difficultoso o dividi-lo em duas partes; e por isso seria melhor que a Camara decidisse antes este ponto. Tambem entro em dúvida, como Membro e Presidente da Commissão, se ella póde demorar o Parecer sobre uma das suas partes, e apresentar já os seus trabalhos pelo que pertence á outra parte: a Camara o decidirá.

O Sr. Ministro da Justiça: — Peço a palavra, para dizer alguma cousa sobre a ordem.

O Sr. Freire: — O Sr. Ministro da Corôa não póde entrar nesta questão, porque é propriamente do regimen da Camara.

O Sr. Barão de Renduffe: — Parece-me que esta questão não é tão facil de decidir, como parece á primeira vista. Eu entendo que quaisquer resolução que esta Camara tomasse hia estabelecer um precedente: ella póde approvar, rejeitar ou alterar os Projectos que vem da outra Casa, mas não divididos em dois; por esta razão, eu julgo dever requerer a V. Ex.ª, que dê esta materia para ordem do dia, a fim de que os Pares possam meditar a este respeito. É com tudo certo, que ha muita necessidade de que a Camara decida este Projecto, porém como a materia é muito grave, continuamos nós hoje na ordem do dia, e ámanhã se tractará disto, ou encarregue V. Ex.ª uma Commissão, que dê o seu parecer á Camara, sobre esta questão incidental.

O Sr. Duque de Palmella: — Eu apoio o que acaba de dizer o Digno Par; mas entro em duvida será possivel, e conforme com o que se acha determinado na Carta, dividir os Projectos que vem da outra Camara; talvez conviria que a mesma Commissão, que se encarrega agora de rever o Parecer, tivesse este objecto em consideração; e apresentasse tambem a sua opinião a este respeito.

Haveria dois modos a seguir, ou discutir-se já na Camara este objecto, para se decidir se elle se oppõe á Carta, e dizer depois á Commissão que normalize o seu Parecer, na conformidade da decisão da Camara, ou então dizer agora á Commissão, que quando apresentar o seu trabalho, nos dê tambem a sua opinião sobre isto.

Por esta occasião, eu só direi, que o Projecto que hoje se apresenta, é de utilidade permanente, porque a falta que actualmente ha de Juizes no Supremo Tribunal de Justiça, provêm de que alguns dos seus Membros, são tambem Membros da Camara dos Srs. Deputados; ora este mesmo inconveniente se ha de tornar a apresentar para a Sessão seguinte, e é muito provavel que continue a apparecer mesmo em outras Legislaturas. Por consequencia, não se póde reputar como uma Lei transitoria, a que tem por objecto provêr substitutos para o Tribunal Supremo de Justiça.

O Sr. Freire: — Sr. Presidente, esta questão é muito grave, e eu mesmo que a propuz comecei pelo dizer; e por isso me parece ser conveniente que ella fique addiada, ou que volte á Commissão. Agora em quanto á observação que acaba de fazer um Digno Par, só direis que reparar-se que esta medida é provisoria, e eu voto por ella, por conhecer que é de muita necessidade, e para sahir-mos do embaraço em que actualmente estamos.

O Sr. Duque de Palmella: — Devo explicar o que acabei de dizer, e foi que não sabia era conforme com o que expressamente se acha determinado na Carta, o dividir-se os dois Projectos, o que peço á Camara tome em consideração.

O Sr. Ministro dos Negocios das Justiças: — Eu não entro na questão da divisão do Projecto; mas o que eu queria, era dizer duas palavras sobre a conveniencia, ou inconveniencia de o dividir. Ainda que esta Proposição contém disposições das quaes uma parte pareça provisoria e outra permanente, não ha com tudo difficuldade nenhuma, para que vão ambas debaixo da mesma Lei. Este objecto é de muita urgencia; o Tribunal está fechado ha mez e meio, e continuará a estar a não se tomar uma decisão prompta.

Julgada a materia sufficientemente discutia, propoz o Sr. Vice-Presidente, e a Camara resolveu que o Projecto voltasse á Commissão de Legislação para o refundir, propor qualquer questão preliminar que julgue necessario decidir.

O Sr. Secretario Machado, leu a seguinte

Nova redacção.

A Secção do Ultramar revendo novamente o seu parecer, ácerca da Proposição de Lei vinda da Camara dos Srs. Deputados, sobre auxiliar-se o Commercio e Navegação da India, e da China, tendo em vista as emendas feitas pelos Dignos Pares Duque de Palmella, e Barão de Renduffe, entende que o paragrafo unico do primeiro artigo deve ser substituido; assim como eliminado o artigo segundo, feita a redacção pela maneira seguinte:

Artigo 1.º Os productos da India, e da China sómente são admittidos a consumo em Portugal e suas Possessões se forem importados em navios Portuguezes directamente procedentes de Portos daquelles paizes.

§ Unico. Fica o Governo authorisado para exceptuar da disposição deste artigo, quaesquer productos das Colonias Asiaticas, importados directamente para consumo em Portugal e Ilhas adjacentes em navios das Nações a que essas Colonias pertencerem, uma vez que identica admissão reciproca seja concedida aos navios Portuguezes.

Art. 2.º A presente Lei será executada findos dez mezes desde a data da sua promulgação. Os generos existentes, que em começando a ter vigôr esta Lei, não estiverem nos termos della para serem admittidos a consumo, ficarão considerados em deposito para reexportação.

Art. 3.º Ficam revogadas quaesquer Leis, e disposições na parte em que forem contrarias ás da presente Lei.

Sala da Secção, em 10 de Fevereiro de 1836. = Visconde do Banho = Sebastião Xavier Botelho = Conde de Mello = Duarte Borges da Camara.

Obtendo a palavra, disse

O Sr. Duque de Palmella: — Não sei se estou a tempo de poder fazer algumas observações. Quando outro dia propuz um additamento a este Projecto, eu quiz dizer o que agora vou repetir; porque me parece que não fui entendido por alguns Dignos Pares, que suppozeram que eu tinha fallado, em Commercio de Cabotagem: julgo que a reciprocidade que se tem em vista, ou que se espera obter das Nações que tem colonias, não está por esta fórma bem clara. Diz o Projecto (leu): identica admissão reciproca; isto quer dizer, que se poderá conceder esse favor aos navios por exemplo Inglezes, que trouxerem generos directamente da Asia a Portugal, com tanto que os Inglezes concedam o mesmo favor aos navios Portuguezes que trouxerem generos da Asia a Inglaterra: — se é esta reciprocidade que se exige, digo que é inteiramente chimerica, porque se apenas temos navios para o nosso Commercio interno, como poderemos imaginar, que a nossa atenuada Marinha mercante, faça o Commercio entre a Asia e Inglaterra? Estamos muito longe disto! Porém se se quizer que a nossa concessão seja a troco de um favor e reciproco, então digo eu, que este favor deve ser o conceder-se tambem aos navios Portuguezes, o importarem directamente os nossos generos para as Colonias pertencentes ás ditas Nações. (Apoiado.) Isto é essencial, e por isso propunha esta emenda, podendo tambem eliminar-se no artigo a palavra = Asiaticas =; e então ficaria o Artigo redigido assim. Leu incluindo nelle a seguinte

Emenda.

Uma vez que se nos conceda importar os nossos generos para as Colonias pertencentes a estas Nações. = Duque de Palmella.

O Sr. Visconde do Banho: — Parece-me que se deve adoptar esta emenda; e estando vencidos já os outros artigos, fica acabado este Projecto.

O Sr. Freire: — Não sei se poderá eliminar-se a palavra = Asiaticas =: eu conservaria esta palavra, e diria mais = e quaesquer outras =; variando sómente a respeito da redacção.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Parece-me que a reciprocidade não se estabelece perfeitamente desta maneira; porque em quanto nós concedemos isso aos estrangeiros, elles não a concedem a nós: — julgo pois que está melhor como se acha.

O Sr. Duque de Palmella: — A reciprocidade ficava perfeitamente de palavra, mas nulla de facto. Aqui não se determina a admissão dos Navios Estrangeiros, dá-se sómente ao Governo a faculdade de os poder admittir, com tanto que os Estrangeiros nos dêem tambem um favor equivalente.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Eu creio que não se está aqui a fazer um Tractado de Commercio com essas Nações. Quanto maior for a latitude que se der ao Governo neste sentido, tanto milhor elle poderá obrar: mas pelo Projecto vamos nós dar-lhe um favor em troca de outro de muito menor preço; e por isso vejo inconveniente em que se não estabeleça a permissão.

O Sr. Duque de Palmella: — O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros parece-me que acaba de provar o contrario do que quer dizer. Nós não vamos conceder um immenso favor aos Estrangeiros: o immenso favor conceder-se-hia se nós authorisasse-mos o Governo para lhe dar este favor real, em logar de um favor imaginario, que é o que sê vê neste Projecto. A Lei diz: «só os Navios Portuguezes poderão trazer generos da Asia para Portugal»; porém depois continúa: «mas o Governo poderá conceder isto mesmo ás Nações que tem colonias na Asia»; porém este favor a que se chama reciproco, não é real, só o será se aquellas Nações pela sua parte consentirem, que os nossos Navios levem tambem generos nossos ás suas colonias: — o que se faz por tanto com isto, é dar ao Governo uma liberdade mais ampla para poder negociar vantajosamente com as Nações Estrangeiras que possuem colonias.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, foi o § entregue á votação, e approvado com as emendas do Sr. Duque de Palmella pela maneira indicada pelo Sr. Freire, quanto á palavra = Asiaticas.

O Sr. Vice-Presidente: — Parece-me que nesta nova redacção ha um artigo omittido, o que a Camara não tinha precisamente resolvido, ainda que deixou esse arbitrio á Commissão.

O Sr. Visconde do Banho: — A maioria da Camara deu a entender que se eliminasse. O Sr. Vice-Presidente: — Convenho, mas não houve votação que o determinasse.

O Sr. Visconde do Banho: — A Commissão pensou que uma vez que o Codigo de Commercio é Lei geral do Reino, o Artigo devia ser supprimido; porque é conveniente dar força áquella Lei, em vez de fazer outra sobre especie de que aquella tracta, até mesmo para evitar alguma antinomia. Contendo o Codigo de Commercio todas as hypotheses sobre os Navios Nacionaes, pareceu que as do Artigo estavam incluidas em alguma dellas, e assim deixou a definição á Lei que já existe.

O Sr. Vice-Presidente propoz se se eliminaria o Artigo 2.º do primitivo Projecto (como propunha a Commissão do Ultramar), e a Camara resolveu affirmativamente.

Sua Ex.ª proseguiu: — Os membros que hão de formar a Commissão especial para examinar o negocio pertencente ao Sr. Visconde de Fonte Arcada, são

Os Srs. Marquez de Fronteira,

Visconde da Serra do Pilar,

« do Banho,

Barão d'Alcobaça,

Freire.

Ámanhã não póde haver Sessão, porque ha de haver Conselho d'Estado. — A Camara decidiu o anno passado que na Segunda e Terça feira correspondentes ás seguintes, não houvesse Sessão; creio que estará nessa opinião: (Apoiado) por conseguinte, a primeira terá logar na Quarta feira 16 do corrente, e a ordem do dia será o Projecto N.º 12, que tracta dos Expostos.

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O Sr. Duque de Palmella: — Desejava chamar a attenção do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que presente se acha, para um objecto ao qual talvez não deve responder immediatamente. — Distribuiram-se as projectadas Pautas das Alfandegas, e sobre ellas ignora quaes sejam as intenções do Governo; se devem pôr-se immediatamente em pratica ou serem ainda discutidas na outra Camara, que tem a iniciativa em tudo o que é materia de tributos, e neste caso já me calo. Mas parece-me difficil que recáia uma discussão sobre a totalidade das Pautas, e sobre cada um dos seus Artigos em particular, desejava dirigir-me a um dos Membros do Governo, sobre alguns objectos que nas mesmas Pautas se contém, relativamente a generos coloniaes. — Vejo aqui por exemplo, que o assucar do Brazil deverá pagar de direito de entrada 720 réis por arroba, em quanto o de outros Paizes pagará 1:200 réis. Desta differença resulta uma grande vantagem para o Brazil; e creio que será opinião geral (ao menos eu abundo neste sentido) que devemos fazer os maiores esforços para favorecer o nosso commercio directo com o Brazil, procurando assim beneficiar ambos os paizes, mas parece-me que este proveito deve ser reciproco: (Apoiado.) e então conviria que se concedesse esta preferencia, e maior ainda; mas com a condição de que nós tambem fossemos reciprocamente favorecidas no Brazil; quero dizer, com uma preferencia proporcionada á que se dá em Portugal, a respeito das outras Nações; ou, o que é o mesmo, que os nossos generos alli pagassem uma terça ou quarta parte menos que os dos mais paizes. (Apoiado.) Conheço que isto pode depender de uma negociação, que ainda não apresenta resultado, mas isto mesmo é uma razão para chamar a attenção do Governo sobre as novas Pautas, nas quaes vejo o artigo que mencionei, sem observação alguma.

Se o Governo julgar conveniente pôr estas Pautas em execução solicitando-se essa faculdade das Camaras, para desde logo, e mesmo antes que possa haver um resultado conhecido das negociações pendentes com o Brazil; tambem me não opporei, com tanto que seja na intelligencia, de que se espera d'aquelle paiz um favor proporcionado, e de que no caso de se não obter, cessará o que lhe damos, ou pelo menos será assumpto de nova discussão.

Accrescentei uma observação, que nada terá de novo para a maior parte dos Membros desta Camara; mas que sempre me parece dever faze-la. — Nós temos um Tractado com o Brazil; é o da Independencia: no Artigo 10.º se estabelece que os generos daquelle Imperio pagarão quinze por cento em Portugal, e vice versa. É o que acontece igualmente n'aquelle paiz ás outras Nações; e então (por exemplo) os vinhos da Hespanha custando muito mais baratos, está visto que causam um grande prejuizo aos nossos, que chegando alli por um preço maior, não podem por tanto concorrer com outros por causa dos direitos. Ora o Artigo do Tractado que estabelece os direitos de quinze por cento aos nossos generos, felizmente não é senão provisorio; não só como o são de sua natureza todos os Tractados de Commercio, mas explicitamente, quero dizer, que aquella disposição vem no Tractado com a qualificação de provisoria, e devendo subsistir só em quanto os dous Governos o consentirem.

A este respeito tem havido da nossa parte, talvez algum descuido, bem facil de explicar pelas nossas circumstancias politicas, em quanto os Brazileiros tem tido em Portugal um mercado quasi exclusivo para os seus generos, e se isto continuar é preciso que se obtenha uma igualdade para o nosso commercio, o que póde ter logar, mesmo em vista do Tractado da Independencia como disse. Concluindo, repetirei que não peço resposta immediata ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, mas sómente peço que considere o que convirá mais, se a execução das Pautas nesta parte, em quanto não houver um resultado das negociações com o Brazil, se pôr-lhe a declaração que este favor será dependente de um favor similhante da parte do Brazil.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Desejava responder ao Digno Par, mas não percebi qual seja qual seja a explicação que deseja.

O Sr. Duque de Palmella: — Parecia-me que, nas poucas palavras que disse, me havia explicado com clareza. — O que eu desejo é que o favor que se conceder ao Brazil (como vejo nessas Pautas) seja suspenso até se ver o resultado das negociações com aquelle paiz, ou considerado com a condicção de subsistir sómente no caso de reciprocidade para o nosso commercio.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — O Digno par quer saber se a disposição das Pautas das Alfandegas deve ser suspensa em quanto não fossem discutidas. Parece-me que esta questão deverá reservar-se, para quando as mesmas Pautas entrarem em discussão na outra Camara. Quanto ás idéas do Governo sobre o Tractado com o Brazil, parece-me prematura qualquer explicação actualmente.

O Sr. Duque de Palmella: — A primeira cousa que eu perguntei foi se as Pautas se discutiriam, mas respondi a mim mesmo, que seria difficil discutil-as e analysal-as artigo por artigo. Reservarei as minhas observações. (que não julgo perdidas) para quando se apresentar n'esta Camara a Lei que deve pôr as Pautas em vigôr.

O Sr. Visconde do Banho: — Como ha de acontecer que só Quarta feira nos tornaremos a reunir, e não estando presente o Sr. Ministro dos Negocios; do Reino, eu pediria ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros quizesse lembrar ao seu Collega, a necessidade de propôr alguma medida, sobre a instrucção primaria. — Acho escusado produzir muitas razões a este respeito, para apoiar a utilidade destes estabelecimentos. Ainda ontem grande parte dos Membros desta Camara foram testimunhas de uma funcção em beneficio das Escolas de primeira Infancia; mas nas Provincias não ha estes meios, e é necessario que o Governo por si mesmo tracte destas cousas, principalmente nos locaes aonde a pobreza é muito grande, o que acontece na maior parte das terras pequenas. Illustrar a geração que já está nascida é o modo de evitar grandes malles; vamos semeando fructos que possamos colher em occasião favoravel.

Parece-me pois que, mesmo separada por agora a idéa de um plano geral de educação, vistas as difficuldades, que apresenta presentemente o estado dos Rendimentos do Thesouro, é muito possivel que o Governo desde logo attenda á primaria. É necessario attender ao estado em que se acha o nosso paiz a respeito de instrucção primaria, e para o avaliar-mos bastará reflectir, que uma das classes mais perseguidas no tempo da usurpação, foram os Mestres de Meninos, o que não deve com tudo admirar, porque o mesmo Cathecismo de Montpelier se reputava então como tendo principios liberaes! Forme-se idéa de quaes eram as intenções d'aquelle governo; e se elle continuasse por mais dez annos, (ou o espaço de tempo em que a Legislação da decima calcula a vida do homem) ficariam os Portuguezes de peior condicção que a ultima das Nações. Por tanto é necessario que o Governo da Carta occorra a esta calamidade, não digo com todos os meios, porque os não ha, mas com os que tiver ao seu alcance. Tracte de proporcionar a instrucção que fallava Juvenal = utilis agris = propria para os campos: d'aquella, que concorre, para melhorar os differentes modos, e habitos de industria, e que abre o espirito para conhecer os multiplicados modos de alcançar subsistencia, e independencia. Quanto á que qualifica os homens de letras, não é presentemente tão urgente, ou póde ir caminhando como se acha á vista do grande numero da candidatos que existem, para os grandes empregos: esta reforma póde esperar pelo melhoramento das rendas do Thesouro. Trata-se do que tem por base a moral Christã, sem o que não póde haver boa educação, razão, que tem levado a Inglaterra, a America, a Suissa, e a Dinamarca a darem tanto cuidado á educação popular. Nestas Nações se tem considerado a religião como o fundamento de toda a instrucção, porque se julga que a religião unicamente é que offerece ao estado civil, e ao governo no que diz respeito aos costumes. — Chamo pois a attenção dos meus Collegas para este ponto e torno a pedir ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros tenha a bondade de o fazer constar na Repartição competente, para ver se se dá alguma providencia já, para este anno; embora fique a instrucção superior, e a questão da Universidade para outro tempo já que tanto tem dado que desertar. Mas estas questões agora não me maravilham; sim me maravilhou a pretenção d'um sabio Alemão Baver, que tomou por thêma para uma disertação = De fanaticio Academiarum hostibus = a dizer a verdade, até as questões que estão agitadas entre nós presentemente, eu não suppunha tanto fanatismo em os inimigos de Universidades; assim como o estrepito desta guerra litteraria me tem feito lembrar outra Disertação de um sabio creio que Italiano, Menzio De litteratorum hominum invidia. Antes do que se passa actualmente causava-me riso imaginar-se, que a inveja dos homens de lettras era de um caracter particular; eu a considerava como a inveja em geral, mas vejo que o tal Menzio acertou, fazendo da inveja dos homens de lettras nova especie. (Riso.)

Volto o assumpto, e conheço que Lisboa, e o Porto tem a seu favor a riqueza, e civilisação dos seus habitantes, para tudo (no que entram as idéas de brilhar álem das de humanidade). Ainda hontem testemunhámos uma magnifica demonstração disto, que digo; nas aldêas porém da Beira, e Tras-os-Montes, não ha nada, se não pobreza, e desgraça, e por tanto é necessario que o Governo tracte de dispôr meios, para nellas haver a instrucção primaria, de que se tanto carece para fundamento de bons costumes; e de honrada industria.

O Sr. Vice-Presidente: — Está levantada a Sessão — Passavam 10 minutos das 3 horas.

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