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N.° 2

SESSÃO DE 9 DE MAIO BE 1890

Presidencia do exmo. sr. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel

Secretarios - os exmos. srs.

Conde d'Avila
Visconde da Silva Carvalho

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - O sr. conde d'Avila participa á camara que apresentou os comprimentos de pezames ao sr. conde de Carnide pelo fallecimento de um cunhado. - Entram na sala, prestam juramento e tomam assento os srs. Almeida Maia, Pinto de Magalhães, Holbeche, Antonio José Teixeira, conde da Folgosa, visconde de Ferreira do Alemtejo, José Bandeira Coelho, Neves Carneiro e Jeronymo Pimentel. - O sr. conde de Bretiandos allude á crise agricola na provincia do Minho. - Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas, que conclue mandando para a mesa duas propostas, que têem por fim permittir que varios dignos pares possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as que exercem nos ministerios das obras publicas e da marinha. Estas propostas são approvadas. - O sr. conde de Bretiandos agradece a resposta do sr. ministro, e apresenta ainda varias reflexões sobre assumptos agricolas. -O sr. Margiochi, referindo-se á proxima abertura da nova estação dos caminhos de ferro no Rocio, dirige algumas perguntas ao sr. ministro das obras publicas; e este, respondendo a essas perguntas, termina por apresentar uma proposta de accumulação de funcções legislativas com as que desempenham varios dignos pares no ministerio da justiça. Esta proposta é approvada. - O sr. Margiochi replica ao sr. ministro das obras publicas, insistindo em rasões anteriormente adduzidas. - O sr. D. Luiz da Camara Leme, apresentando algumas considerações, renova a iniciativa do parecer n.° 184-A, de 3 de maio de 1888, propõe que seja nomeada uma commissão de onze membros para estudar o assumpto a que se refere aquelle parecer, e conclue mandando para a mesa um requerimento, pedindo documentos ao ministerio da guerra. A proposta foi considerada urgente e posta em discussão, e o requerimento mandou-se expedir. - O sr. presidente do conselho responde ao sr. D. Luiz da Camara Leme, e é approvada a proposta d'este digno par. - O sr. Francisco Costa apresenta o diploma do par eleito o sr. Botelho de Faria, e por ultimo allude tambem á, abertura da nova estação do Rocio. - Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - É mandado o diploma do sr. Botelho de Faria á commissão respectiva. - O sr. Vaz Preto manda para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos, pelos ministerios da justiça e do reino, e acompanha-o de algumas considerações, ás quaes replica o sr. presidente do conselho. É mandado expedir o requerimento. - O sr. Vasconcellos Gusmão participa que o sr. visconde de Alemquer tem faltado ás sessões por incommodo de saude. - O sr. Thomás Ribeiro manda para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao ministerio da marinha, e uma nota de interpellação ao governo sobre a execução da ultima concordata com a Santa Sé. Mandou-se dar a estes dois documentos o competente destino. - O sr. presidente do conselho responde ao sr. Thomás Ribeiro, e manda para a mesa uma proposta, por parte do sr. ministro da instrucção publica e bellas artes, que tem por fim conceder que varios dignos pares, dependentes do mesmo ministerio, possam accumular, querendo, as funcções que n'elle exercem com as legislativas. Esta proposta é approvada. - O sr. Margiochi reporta-se a uma parte das considerações apresentadas pelo sr. D. Luiz da Camara Leme. - O sr. conde de Bretiandos faz ver a conveniencia de não se concentrar exclusivamente o movimento de passageiros na nova estação do Rocio. - Sendo dada a palavra ao sr. Costa Lobo, este digno par desiste d'ella por já não estar presente o sr. ministro das obras publicas. - Entre os srs. Coelho de Carvalho e presidente do conselho trocam-se algumas palavras com respeito a umas noticias que dão conta de acontecimentos graves na provincia de Moçambique. - O sr. visconde de Moreira do Rey participa que a deputação encarregada de communicar a Sua Magestade a constituição d'esta camara, foi recebida com a costumada benevolencia. - O sr. ministro da fazenda manda para a mesa uma proposta, que se destina ao fim de permittir que varios dignos pares, dependentes do mesmo ministerio, possam accumular, querendo, as funcções que ali desempenham com as legislativas. Esta proposta é approvada. - O sr. conde d'Avila apresenta o diploma do sr. Augusto César Ferreira de Mesquita, par eleito pelo collegio districtal de Angra do Heroismo. Foi enviado á respectiva commissão. - O sr. presidente do conselho responde a diversas perguntas feitas pelo sr. Thomás Ribeiro. - Os srs. Franzini e presidente do conselho permutam algumas considerações com referencia ao fornecimento de lanificios para o fardamento das tropas. - Levanta-se a sessão, apraza-se a seguinte e designa-se a respectiva ordem do dia.

Ás duas horas e meia da tarde, achando-se presentes 30 dignos pares, abriu-se a sessão.

Foi lida e approvada a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Officio do sr. presidente do conselho e ministro do reino, declarando que envia para o destino conveniente o processo relativo á eleição de pares do reino pelo collegio districtal de Angra do Heroismo, de Antonio do Rego Botelho de Faria e o respectivo diploma.

Officio do sr. administrador do circulo aduaneiro do sul, enviando 80 exemplares do relatorio sobre os negocios da administração em 1889, comprehendendo tambem a estatistica dos consumos de Lisboa na mesmo anno.

Officio do sr. João D. Alves de Sá agradecendo á camara dos dignos pares o voto de sentimento pelo fallecimento de seu pae.

(Estava presente o sr. presidente do conselho de ministros e ministro das obras publicas.)

O sr. Conde d'Avila (primeiro secretario): - Cumpre-me participar á camara que fui apresentar os comprimentos de pezames ao nosso collega o sr. conde de Carnide, pelo fallecimento de seu cunhado. Esta missão foi tanto mais dolorosa para mim quanto eu tinha em grande apreço as distinctas qualidades e merecimentos do illustre finado.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Acham-se nos corredores da camara alguns dignos pares, que desejam prestar juramento e tomar assento.

Convido os dignos pares os srs. Gusmão e Quaresma a introduzirem na sala o sr. Almeida Maia.

S. exa. foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Peço aos dignos pares os srs. conde de Cabral e Placido de Abreu que queiram ter a bondade de introduzir na sala o sr. Pinto de Magalhães.

Em seguida foi s. exa. introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Convido os dignos pares os srs. visconde de Castro Solla e Tavares de Pontes a introduzirem na sala o sr. Holbeche.

Entrando s. exa. na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Nomeio os dignos pares os srs. Baima de Bastos e Coelho de Carvalho para introduzirem na sala o sr. Antonio José Teixeira.

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134 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Em seguida foi s. exa. introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Peço aos dignos pares os srs. Vaz Preto e conde da Ribeira Grande queiram ter a bondade de introduzir na sala o sr. conde da Folgosa.

Em seguida foi s. exa. introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Convido os dignos pares os srs. visconde da Azarujinha e Margiochi a introduzirem na sala o sr. visconde de Ferreira do Alemtejo.

S. exa. foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Convido os dignos pares os srs. Sá Carneiro e Sebastião Calheiros a introduzirem na sala o sr. José Bandeira Coelho de Mello.

Entrando s. exa. na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Peço aos dignos pares os srs. Holbeche e Sousa e Silva que queiram ter a bondade de introduzir na sala o sr. Neves Carneiro.

O exa. foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Convido os dignos pares os srs. Baima de Bastos e Lages a introduzirem na sala o sr. Jeronymo Pimentel.

S. exa. foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Vou ler a relação dos dignos pares que pediram a palavra para antes da ordem do dia. Se ha alguma omissão, peço que reclamem.

(Leu.)

O sr. Conde de Bertiandos: - Como vejo presente o sr. ministro das obras publicas, desejo dirigir a s. exa. algumas palavras com relação á provincia do Minho.

Venho agora de lá, sr. presidente, e venho triste e desanimado.

Aquella tão decantada provincia encontra-se n'um estado desgraçado, e bem necessita de que os poderes publicos lhe dêem a merecida attenção. As colheitas têem sido escassas, e apesar d'isso os generos vendem-se por um preço nada remunerador; estão mal os lavradores, andam sem trabalho os artistas e operarios.

Aquella gente vive afflicta e preoccupada agora, e rasão tem, com a noticia que por lá corre, de novos acrescentamentos nos impostos, que nem sei como poderão ser pagos, quando já mal se podem pagar os actuaes.

A emigração para o Brazil continúa assustadora. Os engajadores apparecem por todos os lados, e em algumas aldeias ha apenas mulheres, velhos e creanças para os trabalhos da agricultura.

É necessario, é indispensavel, tomar cuidado em tudo isto, que vae andando de mal para peior e um dia estala.

Aquella provincia, sr. presidente, tem uma agricultura muito diversa da agricultura das provincias do sul. As terras estão muito divididas, por isso o lavrador tem de lançar mão, não só da cultura dos cereaes e do vinho, mas da creação dos bois, do porco, etc., e alguns têem a sua égua.

Ora, como a provincia é grande, apesar de não haver manadas de éguas, nem por isso deixa de haver muitas, e poderiam, portanto, crear-se ali muitos e bons cavallos se por lá houvesse postos de cavallos reproductores; essa medida animaria os lavradores a importarem-se com a boa raça das suas éguas.

Parece incrivel, mas é certo, que em todo o Minho não exista um só cavallo reproductor de merecimento.

É sobre este ponto que eu mais especialmente chamo, por agora, a attenção do sr. ministro das obras publicas.

N'este paiz, sr. presidente, merecia a pena estudar-se a philosophia do circulo vicioso, porque elle impede muitas cousas boas que poderiam fazer-se.

Diz-se geralmente que os governos não estabelecem postos no Minho porque os lavradores não têem éguas boas; os lavradores não tratam de adquirir boas éguas por saberem que não ha na provincia cavallos reproductores de boa raça. E por causa d'este circulo vicioso vae decaíndo completamente a raça cavallar com grande damno para o paiz e empobrecimento da provincia.

Consta-me que já ha bastantes annos estiveram nos Arcos de Valle de Vez alguns cavallos de padreação, para ali mandados não sei por qual governo, e é certo que n'este concelho ainda hoje existe uma raça que, embora degenerada, faz differença para muito melhor da que se encontra pelo resto da provincia.

Ao menos nas duas cabeças de districto do Minho e Vianna deveria haver postos hippicos.

Ainda que nos primeiros annos não produzissem muito, por isso que os lavradores não têem éguas de marca e sem defeito e não comprariam de repente éguas de primeira qualidade, é certo que a pouco e pouco a raça iria melhorando, e dentro em alguns annos e com pouco despendio haveria cavallos de valor.

Se fosse possivel, como disse, o governo mandar estabelecer um posto hippico em Braga e outro em Vianna, seria isso de grande utilidade para a provincia; mas se quizer estabelecer um para para experiencia, eu lembrava ao sr. ministro das obras publicas a vantagem de o collocar na villa de Ponte do Lima, e digo isto, porque esta villa é central e é toda cortada de estradas.

Termino as minhas considerações e espero que o sr. ministro das obras publicas levará a bem esta minha lembrança.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Frederico Arouca): - Na conformidade do artigo 3.° do acto addicional, tenho a honra de mandar para a mesa uma proposta que tem por fim permittir que alguns dignos pares, que são funccionarios do ministerio a meu cargo, possam accumular, querendo, as funccções legislativas com as do serviço publico que exercem no mesmo ministerio.

Mando tambem para a mesa, por parte do sr. ministro da marinha, uma proposta que tende ao mesmo fim, pelo que respeita aos dignos pares dependentes d'este ministerio.

Sr. presidente, ouvi com toda a attenção as observações do digno par o sr. conde de Bertiandos, as quaes tomo na devida consideração.

Já em uma conversação particular eu tive occasião de dizer a s. exa. que ligarei a este assumpto a importancia que elle realmente exige.

No curto espaço de tempo da minha gerencia na pasta das obras publicas, não tenho podido remediar os inconvenientes que se encontram nos ramos de serviço publico, a que o digno par se referiu, tanto mais que, nos ultimos annos, têem-se gasto quantias importantes em tudo o que diz respeito á agricultura, podendo ser que, com as verbas consignadas no orçamento para essas despezas, se podesse ter conseguido resultados superiores aos que temos alcançado.

Visitei ultimamente as coudelarias do norte e do sul, e se por um lado não posso deixar de louvar a intelligencia com que foram executados os planos em que assentou a organisação d'esses estabelecimentos, por outro lado não posso concordar com a orientação n'elles seguida.

Na coudelaria do norte foram muito importantes as sbaro que se fizeram, e, no entanto, aquella propriedade não póde satisfazer ás condições exigidas, porque a região onde ella se encontra não produz pastos em quantidade necessaria para a alimentação de muitos cavallos.

Entendo que bom seria espalhar pelo paiz postos hippicos, com reproductores de primeira ordem que se fossem renovando á proporção da sua inutilisação; mas no estado em que encontrei as cousas, nada mais pude fazer do que mandar estudar a fórma por que, dentro dos recursos orçamentaes, se possa, quanto possivel, seguir o meu pensamento.

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Referindo-se á provinda do Minho, fez notar o sr. conde de Bertiandos as circumstancias em que ella se encontra, chamando para o assumpto a attenção do governo.

Quando ha dois annos ou fazia parte da opposição parlamentar, lembrei um alvitre que me pareceu adequado ao fim de minorar as tristes circumstancias que flagellam aquella provincia. Era a exploração da industria da engorda do gado e o estabelecimento de uma fructuaria.

Julguei que o meu alvitre era acceitavel, porque só uma provincia onde a creação do gado se desenvolve facilmente pela abundancia de pastos, podia estabelecer com manifesta vantagem a industria da fabricação da manteiga.

Não foi acceito esse alvitre, e mandaram estabelecer uma fructuaria em Santarem, onde não ha abundancia de pastagens.

Do que digo, facilmente se infere que advogo a idéa do estabelecimento de uma fructuaria no Minho desde que os proprietarios d'aquella provincia se constituissem em syndicato e se compromettessem a fornecer o leite necessario para que esse estabelecimento podesse produzir manteiga em quantidade tal que compensasse as despezas.

Na conversação particular com s. exa., tive occasião de lhe communicar este pensamento com relação aos postos hippicos, não se trata de um circulo vicioso.

O sr. Conde de Bertiandos (interrompendo): - Não me referia a v. exa., quando proferi essa expressão.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Arouca) (continuando): - Dê-me v. exa. licença que eu continue.

Justamente porque as éguas são pequenas é que se torna necessario estabelecer os postos hippicos; mas é preciso que os cavallos que estejam nos postos sejam aptos para o fim a que são destinados, e que dos cruzamentos não resultem abortos.

Posso affirmar ao digno par, que dentro das forças do orçamento do anno futuro, hei de tratar de estabelecer os postos reproductores, nas melhores condições possiveis. São estas as explicações que posso dar ao digno par, e s. exa. me dirá se ellas o satisfazem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Conde de Bertiandos: - Pedi a palavra para agradecer ao sr. ministro a sua resposta e para dizer que estou muito certo que s. exa. está dando a este assumpto toda a importancia e todo o desenvolvimento.

Com relação ás fructuarias, parece-me que s. exa. tem rasão em dizer que é esse um melhoramento importante para a provincia do Minho; mas, sr. presidente, creio que é muito difficil que os lavradores se reunam em associações e não se animam a estas reuniões, porque elles têem visto, com relação a bancos e companhias, que os accionistas perdem quasi sempre, sem que os directores empobreçam.

O sr. Thomás Ribeiro: - Apoiado.

O Orador: - Fallou o sr. ministro em syndicatos.

V. exa. comprehende que hoje é impossivel no paiz fallar-se em syndicato.

Eu bem sei que o sr. ministro deu a esta palavra uma accepção completamente diversa d'aquella que modernamente se lhe attribue, isto é, que lhe deu a significação de parceria; mas a verdade é que o paiz dá á palavra syndicato uma accepção diversa; dá-lhe a accepção de companhia do olho vivo.

É esta a significação que tem actualmente no paiz a palavra syndicato.

Quando se pede aos lavradores que reunam, que formem, não um syndicato, mas uma parceria, elles recusam-se logo, dizendo que ficam sem as suas terras, sem os seus haveres, e elles têem rasão, porque, como disse, na maioria das emprezas, os accionistas perdem, emquanto que os directores não empobrecem.

O sr. Thomás Ribeiro: - Apoiado, apoiado.

O Orador: - A verdade, sr. presidente, é que os accionistas de muitas emprezas que se formara no nosso paiz ficam peiores do que estavam.

Diz se geralmente que os lavradores não se juntam, não formam parcerias, e eu creio, sr. presidente, que todos os dias elles terão mais difficuldade n'isso, á vista dos exemplos que estão succedendo.

Ou nós não temos leis que garantam a segurança dos capitães que se arriscam n'essas especulações, ou o costume fez com que essas leis se não cumpram.

Eu estou a tomar tempo á camara; mas, sr. presidente, em todo o caso desejaria muito que o sr. ministro procurasse dar uma solução a este assumpto, fazendo vingar o estabelecimento das fructuarias; porque estou persuadido de que effectivamente na provincia do Minho se poderia fabricar queijos e manteiga, como se pratica em alguns departamentos da França e na Suissa.

O que é preciso é que o governo facilite quanto possivel a organisação das parcerias, tomando em linha de conta a difficuldade que tem o lavrador do Minho em dispor de capitães, e até mesmo de esperar muito tempo pelo preço do leite das suas vaccas. Alguns são tão pobres que nem sei como se lhes poderá tornar effectiva qualquer responsabilidade.

Pela minha parte estou prompto a fornecer a s. exa. quaesquer informações que de mim queira utilisar, no que toca ao conhecimento especial que tenho da provincia do Minho.

Eu, sr. presidente, comecei a fallar só para agradecer ao sr. ministro; mas depois occorreram-me outras cousas e algumas reflexões fiz que não tencionava apresentar. Peço desculpa do tempo que tomei.

Leram-se na mesa, e foram seguidamente approvadas as duas propostas, mandadas para a mesa pelo sr. ministro das obras publicas, que seio do teor seguinte:

Propostas

Senhores. - Em conformidade do disposto no artigo 3.° do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos dignos pares permissão para que possam accumular, querendo, o exercicio das suas funcções legislativas com o dos seus empregos ou commissões, os dignos pares:

Francisco Simões Margiochi.
Conde d'Avila.
João Chysostomo de Abreu e Sousa.
João Ignacio Ferreira Lapa.
Placido Antonio da Cunha e Abreu.
Antonio Augusto de Sousa e Silva.
Antonio Augusto Pereira de Miranda.
Rodrigo Affonso Pequito.
Marino João Franzini.

Ministerio das obras publicas commercio e industria, em 9 de maio de 1890. = Frederico de Gusmão Corrêa Arouca.

Senhores. - Em conformidade do disposto no artigo 3.° do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos dignos pares permissão para que possam accumular, querendo, o exercicio das suas funcções legislativas com o dos seus empregos ou commissões, os dignos pares:

Cardeal patriarcha.
Bispo de Bethsaida.
Conde da Arriaga.
Conde de Linhares.
Antonio de Sousa e Silva Costa Lobo.
Francisco Joaquim da Costa e Silva.
Francisco Maria da Cunha.
José Baptista de Andrade.
José de Castro Guimarães.
Visconde do Soares Franco.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 9 de maio de 1890. = Julio Marques de Vilhena.

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O sr. Margiochi: - Sr. presidente, eu tinha pedido a palavra quando vi entrar na sala o meu amigo o sr. ministro das obras publicas, pois desejo fazer a s. exa. uma pergunta; mas por pouco tempo occuparei a attenção da camara.

A pergunta que vou dirigir ao illustre ministro e individual; não a faço em nome de qualquer serviço publico que eu aqui possa representar; e digo isto porque todos sabem que eu sou actualmente presidente da commissão administrativa do municipio de Lisboa.

Annuncia-se para d'aqui a, poucos dias a inauguração da estação principal dos caminhos de ferro do Rocio. Ora, todos sabem a desconfiança que ha sobre a estabilidade do tunnel, sobre a sua solidez. (Apoiados.)

Eu não sei realmente se são ou não fundadas essas desconfianças; o que pergunto é se é verdade que todo o movimento das linhas de Torres e de Cintra se vae fazer já por aquella estação.

Não sei absolutamente nada do que está determinado e por isso me limito a fazer a pergunta.

Se s. exa. não póde dar-me immediatamente a resposta, dal-a-ha opportunamente.

Por agora limito aqui as minhas observações.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Frederico Arouca): - A companhia real do caminhos de ferro portuguezes participou ao governo, por intermedio da sua fiscalisação, que tencionava abrir ao publico a estação do Rocio no dia 17 do corrente. Não posso affirmar ao digno par se esse pedido de auctorisação se limitava a um certo numero de comboios ou não. É certo, comtudo, que, desejando a companhia abrir provisoriamente aquella estação, fez-se o que é costume fazer em assumptos d'esta ordem; foi nomeada uma commissão de engenheiros para examinarem as condições do tunnel, a fim de illustrarem o governo com o seu parecer e habilitarem-no a tomar uma resolução. Como o assumpto é muito importante e grave, houve tambem todo o cuidado em escolher tres dos engenheiros mais conspicuos, a fim de fazerem parte d'aquella commissão, que são os srs. Justino Teixeira, Joaquim de Matos e Vargas.

Estes tres engenheiros formam a commissão que ha de, como disse, examinar as condições do tunnel e depois dar o seu parecer ao governo, que em conformidade com elle resolverá.

Perguntou o digno par se o governo toma sobre si a responsabilidade da abertura da linha do que se trata.

E evidente que, para tomar essa responsabilidade, ha de apoiar-se necessariamente na opinião, dos engenheiros.

Se estes funccionarios disserem que a linha póde ser aberta ao publico e não apresentarem restricções que tornem inacceitavel o seu parecer, é claro que o governo não deixará de se conformar com elle.

Não tenho outra explicação que dar a s. exa.: o mais que posso dizer-lhe é que havemos do estudar este assumpto com toda a attenção.

Já que estou com a palavra, mando para a mesa uma proposta por parte do meu collega o sr. ministro da justiça.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Margiochi: - Pedia a palavra para uma rectificação.

O sr. Presidente: - Vae-se ler a proposta mandada para a mesa pelo sr. ministro das obras publicas.

Leu-se na mesa, foi seguidamente approvada a proposta, que é do teor seguinte:

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, pede o governo á camara dos dignos pares do reino a necessaria permissão para que possam accumular; querendo, as funcções legislativas com as dos seus logares na capital, dependentes do ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, os dignos pares: conselheiro Adriano de Abreu Cardoso Machado, conselheiro João Ignacio Holbeche, Augusto Neves dos Santos Carneiro.

Secretaria d'estado dos negocios eclesiasticos e de justiça, em 9 de maio de 1890. = Lopo Vaz de Sampaio e Mello.

O sr. Margiochi: - Vou dizer algumas palavras explicativas em relação ao que eu ha pouco expuz e que provocou a resposta do sr. conselheiro Arouca.

O que eu desejava era, que o governo não tomasse a responsabilidade de obrigar toda a população de Lisboa a passar pelo tunnel desde o momento em que ha mais duas estações na capital.

Diz o sr. conselheiro Arouca que logo que o governo tenha as informações dos homens competentes sob o ponto de vista technico, ácerca da estabilidade da obra, a que me refiro louva-se no parecer d'elles e assume a responsabilidade que lhe pertence; mas, repito, o que eu desejo e me parece ser esta opinião de muita gente, é que não seja forçada toda a população de Lisboa a passar por um tunnel de que algumas pessoas têem desconfiança.

Visto que ha tres estações, não vejo necessidade de que todos os viajantes se utilisem de uma só.

Comprehende-se perfeitamente que a companhia proceda em virtude de uma certa rasão industrial: fez uma obra e precisa obter determinado rendimento para com elle occorrer aos encargos d'essa obra; mas, francamente, se os interesses da companhia são muito respeitaveis, os interesses da segurança publica tambem me parece não o serem menos.

Havendo tres estações para as mesmas linhas, devia tornar-se facultativo e não obrigatorio para todos os passageiros atravessarem um tunnel que algumas pessoas podem reputar perigoso.

E estes receios têem factos a auctorisal-os.

O monte de S. Gens, em Lisboa, ha muitos annos que tem estado a desmoronar-se, e tanto que a camara municipal de Lisboa foi obrigada a fazer uma obra, que consite n'uma avenida que vae do largo da Graça á avenida Estephania, e cujas muralhas de supporte servem ao mesmo tempo de travamento ao desmoronamento d'aquelle monte.

Essa obra, em que já se têem gasto quantias importantes, está agora interrompida por difficuldades que sobrevieram em negociações com o ministerio da guerra.

A avenida, a que já me referi, fica uma das mais bellas de Lisboa e dá serventia do largo da Graça para differentes pontos da cidade.

Ora desde o momento em que alguns montes de Lisboa tendem a desmoronar-se, parece-me que não vieram fóra de proposito as considerações que fiz, com o fim de evitar que haja algum perigo em resultado da trepidação produzida pelos comboios na sua passagem pelo tunnel que termina no largo de Camões.

Findo aqui as minhas considerações, porque o meu unico desejo era chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para o assumpto a que me referi.

O sr. camara Leme: - Disse estar sempre coherente e logico, e, como a camara está constituida, está prompto para a lucta.

N'uma das sessões da legislatura passada declarou que, visto embargarem-lhe a palavra n'uma questão que reputava de alto interesse politico, compromettia-se a tratar d'ella na imprensa, e assim aconteceu. No mez em que se fechou a camara publicou um folheto sobre incompatibilidades politicas; essa obra poderia não inspirar interesse á opinião publica, mas o que é certo é que, apesar da humildade do nome do auctor, foi necessario tirar tres edições. Portanto, o assumpto interessava sobremaneira a opinião publica. Em harmonia com estas idéas, o orador vem

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hoje renovar a iniciativa do seu projecto de lei e do parecer sobre elle, de que foi relator o actual sr. ministro dos negocios estrangeiros.

E para prova de que o seu pedido de urgencia para este assumpto deve ser approvado, basta-lhe invocar o que succedeu em 1821, em que Borges Carneiro, Fernandes Thomás e outros apresentaram como questão previa, que as côrtes geraes deviam por todos os modos firmar a necessaria independencia do poder legislativo: era uma lei sobre incompatibilidades. E em 1821 deu-se tambem uma coincidencia notavel, por causa do que ha dias se passou na camara: só porque um lente da universidade de Coimbra não pediu licença á camara para ir n'uma certa deputação ao paço, um digno par de então, sr. Margiochi, estygmatisou esse facto; agora, em 1890, é o proprio neto d'esse digno par que pede que ás commissões se aggreguem mais quatro membros, conforme succedeu n'uma das sessões preparatorias passadas. Isto prova que o precedente que se estabeleceu é falso.

Vendo agora no poder o digno par sr. Hintze Ribeiro, que foi relator do parecer sobre o seu projecto relativo a incompatibilidades, não póde deixar de louvar o governo por ter promulgado a lei sobre este assumpto; apesar de o ter feito em dictadura, o orador absolve-o d'esse peccado. E como não deseja que esse projecto vá, conforme disse um distincto jornalista, de palmito e capella para a cova, espera que o sr. ministro dos negocios estrangeiros o auxiliará com a sua maior influencia, para que esse projecto seja convertido em lei.

Manda por isso para a mesa a seguinte renovação de iniciativa, assignada pelo orador e por mais tres dignos pares.

«Renovo a iniciativa do parecer n.° 184-A, de 3 de maio de 1888, sobre incompatibilidades parlamentares, apresentado pela minoria da commissão especial eleita por esta camara, proponho seja nomeada pela mesa uma commissão composta de onze membros, para dar parecer sobre este assumpto.

«Sala da camara, 9 de maio de 1890. = Camara Leme = Vaz Preto = Coelho de Carvalho = Thomás Ribeiro.

Pergunta ao governo se está resolvido a dar o seu apoio a este projecto, e pede urgencia para a sua proposta.

Fazendo outras considerações sobre o mesmo ponto, o orador terminou mandando para a mesa o seguinte requerimento, e queixou se de não terem alcançado deferimento outros que tem apresentado em epochas anteriores:

«Requeiro que se peça ao governo, pelo ministerio da guerra, remetta com urgencia a esta camara:

«1.° Uma relação dos officiaes do exercito que foram reformados depois de 11 de janeiro do corrente anno, até á data d'este requerimento.

«2.° Uma nota da despeza total resultante d'estas reformas e das promoções em todos os postos de que ellas foram consequencia.»

(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)

Consultada a camara, resolveu considerar urgente a proposta mandada para a mesa pelo sr. D. Luiz da Camara Leme. pelo que foi posta em discussão, e o requerimento mandou-se expedir.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): - Sr. presidente, o meu amigo sr. D. Luiz da Camara Leme fez varias considerações sobre um assumpto a que dá grande importancia, e que a tem realmente, a questão das chamadas incompatibilidades parlamentares.

Esse assumpto tem tres pontos distinctos, incompatibilidades de ministros, de pares e de deputados. O governo, por seu lado, já resolveu pelo que lhe respeita; mas entendeu que devia deixar ao parlamento a resolução do que a elle pertence.

O digno par perguntou se o governo está ainda de accordo com o projecto que s. exa. apresentou.

O governo, concordando com o pensamento d'esse projecto, não acha inconveniente que se nomeie a commissão proposta por s. exa.

Finalmente, o digno par apresentou um requerimento pedindo varios documentos, pelo ministerio da guerra, e disse que ha dois annos que insta pela remessa d'elles sem que até hoje os tenha alcançado.

Não me cabe responsabilidade da falta que s. exa. aponta e a verdade é que, se não ordenei ainda a remessa d'esses documento, é porque no ministerio da guerra se julgava que o digno par tinha prescindido d'elles.

Pelo que s. exa. acaba de dizer, porém, vejo que assim não é, e por isso desde já declaro que providenciarei de fórma que, tanto o requerimento hoje feito por s. exa. como os anteriores, sejam satisfeitos com a possivel brevidade.

(S. exa. não reviu.)

Não havendo mais quem pedisse a palavra foi a proposta, do sr. D. Luiz da Camara Leme posta á votação e approvada.

O sr. Francisco Costa: - Mando para a mesa o diploma do sr. Botelho de Faria, digno par eleito pelo districto de Angra do Heroismo, e peço a v. exa. que se sirva remettel-o á respectiva commissão de verificação de poderes para dar sobre elle o seu parecer. E já que estou com a palavra permitta-me a camara que, em additamento ao que disse o digno par e meu amigo o sr. Margiochi, eu acrescente algumas palavras.

Disse s. exa. que ia ser aberto o transito do tunnel do caminho de ferro de Cintra que parte da Avenida, e significou as suas e as apprehensões do publico ácerca da segurança d'aquella obra de arte.

O sr. ministro das obras publicas respondeu correctamente ás observações de s. exa. A mim cumpre-me acrescentar que tenho por dever dar noticia a s. exa. de que na cidade ha tambem graves apprehensões sobre as tarifas que a companhia dos caminhos de ferro do norte quer impor no transito, na linha e pelo tunnel desde Lisboa até Cintra. Pelo menos, segundo o que eu ouvi, e pelas representações que conheço e que têem de ser presentes no ministerio das obras publicas e na camara dos senhores deputados, reconhece-se que o preço é elevadissimo, oppondo-se a essa innovação nas tarifas a lei que regula os negocios do caminho de ferro. Não quero provocar nenhuma resposta do nobre ministro, mas sómente chamar a sua attenção para este assumpto, e pedir-lhe que quando a proposta da companhia seja presente no ministerio que s. exa. dirige dignamente, s. exa. a estude bem e analyse, para ver se ella é consentanea com o que a lei dispõe a respeito de tarifas de caminhos de ferro.

Uma innovação nas tarifas nos termos que são receiados, parece-me um abuso; não posso classifical-o de outra fórma, e é, alem d'isso, um mau systema da companhia, porque quanto mais elevadas forem as tarifas, menos será o transito n'aquella linha, que tem sido ultimamente muito frequentada pelos habitantes da capital, com destino a um ponto que eu reputo ser um bairro de Lisboa.

Quasi todos os dias, sobretudo nos dias santificados, uma grande parte da população de Lisboa dirige-se a Cintra para passar algumas horas n'aquelle benefico clima, o que faz muito bem á saude de cada um. O operario, cansado de trabalhar durante sete dias nas officinas, encontra grande allivio e uma sensação agradavel da sua estada em Cintra durante cinco, seis ou oito horas. Ora desviar este concurso a Cintra dos habitantes de Lisboa, por um modo inconveniente, será prejudicial e mal visto na cidade. Eu não desejo, nem provoco resposta alguma do sr. ministro das obras publicas, porque supponho até que ainda não lhe chegou ás mãos a proposta da companhia; entretanto chamo a attenção de s. exa. para este assumpto, que eu julgo importante para a cidade de Lisboa, e tambem de valor para os estrangeiros que a visitam, e que pouco mais

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138 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

têem que ver nos arrabaldes d'esta cidade. Obrigo-me a não esquecer o assumpto a que me tenho referido.

(O diploma apresentado pelo digno par foi á commissão respectiva.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Frederico Arouca): - Quando ainda agora respondi ao digno par sr. Margiochi, eu disse que o governo tinha nomeado uma commissão para examinar o estado em que se achava o tunnel, e para habilitar o governo a permittir ou não a abertura provisoria da linha.

Parece-me, contudo, que não interpretei bem as palavras do digno par, porque s. exa. queria, não só saber o que havia a este respeito, mas tambem se o governo tinha permittido á companhia dos caminhos de ferro, que estabelecesse todo o transito de passageiros pela estação do Rocio. Não posso responder precisamente a s. exa. n'esta occasião, porque não tenho aqui os contratos e v. exa. sabe que, se a companhia tem deveres, tem tambem direitos. Para que se lhe imponha o cumprimento de um dever, é necessario que se lhe garanta o exercicio do seu direito,

Preciso examinar esse contrato, e creia o digno par que hei de fazer cumprir a lei, e o mesmo digo ao digno par o sr. Francisco Costa.

A proposta para o augmento das tarifas ainda me não foi apresentada, e quando o seja, examinarei o contrato com toda a cautela, a fim de que as clausulas n'elle estipuladas sejam rigorosamente cumpridas.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Vaz Preto: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento que acompanharei de ligeiras considerações.

Pela leitura d'este requerimento a camara verá e reconhecerá, que o assumpto é grave, serio, e de alta importancia para mim.

«Requeiro que, pelo ministerio da justiça, seja enviada com urgencia copia do corpo de delicto directo e indirecto com a declaração do queixoso no processo instaurado na comarca do Fundão pelo facto de terem sido arremessadas bombas de dynamite (em novembro passado) á casa de Frederico Carlos Ferreira Franco, na povoação do Alcaide da referida comarca; e bem assim copia do summario e despacho de pronuncia; do despacho que tiver julgado o processo em termos de entrar em julgamento, e do que tiver mandado inquirir por deprecada algumas testemunhas de fóra da comarca apontadas no libello; e da ultima promoção do delegado e seu despacho.

«Requeiro que, pelo mesmo ministerio, seja enviada a esta camara a correspondencia trocada entre o procurador regio de Lisboa e o seu delegado na comarca do Fundão ácerca do mesmo processo.

«Requeiro que, pelo ministerio do reino, se envie a esta camara copia do resultado das diligencias policiaes e administrativas feitas ácerca do mesmo processo, indicando-se ao mesmo tempo quem requereu as investigações policiaes. = Vaz Preto.

«N. B. - Estes documentos são pedidos sem prejuizo do julgamento do processo. - Vaz Preto.»

Por esta simples leitura a camara avaliará sem duvida o valor e alcance da questão.

Sr. presidente, a camara deve estar lembrada ainda dos acontecimentos eleitoraes do Fundão, e da bomba lançada no Alcaide na casa de Frederico Ferreira Franco. Não deve estar ainda esquecida das insinuações, imputações e accusações que certa imprensa escreveu. Não deve ignorar que os meus adversarios politicos tiveram o intuito de me fazerem mandante d'aquelle acto ignobil, e asqueroso, e de me tornarem responsavel, e aos meus amigos, pelas occorrencias a que o meu requerimento se refere.

Sr. presidente, contra este attentado altamente desprezivel, baixo e indigno, protesto eu, os meus amigos e correlegionarios com todas as nossas forças o com verdadeira indignação.

O sr. Thomás Ribeiro: - Apoiado.

O Orador: - Pelo que respeita ás insinuações ou ás accusações que me foram feitas, tenho por ellas profundo desprezo, e deixo ao paiz que conhece a minha vida particular e publica o meu passado e caracter, que me faça a justiça que me é devida e a que tenho direito. (Apoiados.)

Pelo que respeita aos meus amigos o caso é outro: não posso deixar de tomar a palavra para os defender, para impedir que vá por diante o grande escandalo que se projecta, e pôr termo ás vinganças mesquinhas que se estão fazendo todos os dias ali n'aquelle concelho.

Sr. presidente, o que eu quero e os meus amigos é luz, muita luz, é apurar a verdade. Espero em Deus que havemos desembrulhar esta meada e dar a cada um o que é seu.

Sr. presidente, tudo quanto affirmar hei de proval-o.

Emquanto, porém, não vierem os documentos que pedi, não alongarei as minhas considerações; não obstante sinto que não esteja presente o sr. ministro da justiça, porque queria dirigir-lhe algumas perguntas.

Sr. presidente, é conveniente que o sr. ministro da justiça e a camara saibam já o seguinte, que os presos a quem imputavam o crime da bomba, para protestarem contra o labeu infamante que lhe pretendem lançar, e provar a sua innocencia têem feito todos es esforços para serem julgados com a maxima brevidade. Deixaram até de usar da garantia que a lei lhes dá de aggravar da injusta pronuncia, não quizeram requerer que lhe fosse applicada a amnistia, não se queixaram mesmo que o juiz e o delegado deixassem da applicar, pois o seu empenho todo é que haja a discussão quanto antes para mostrarem no julgamento a sua completa innocencia.

Sr. presidente, estes esforços da parte dos réus são honrosos e presumem a sua innocencia. O processo estava prompto para entrar em tabella e até se tinham comprido já algumas deprecadas fóra da comarca; é, pois,n'esta occasião em que se ía realisar o julgamento que o delegado recebeu ordens superiores, diz-se que do sr. ministro da justiça, por via do procurador regio, para sustar o processo!!! Sr. presidente, quem deu essas ordens tão tarde, quem as exigiu, e o motivo que as determinou é o que eu quero saber? Quero saber quem procura impedir o julgamento para conservar ainda os réus presos mais seis mezes.

As taes ordens superiores foram d'aqui, e a 2õ de abril o delegado requereu que se sustasse o processo, e a 28 o juiz mandou sustar o processo.

É claro pelo menos, se não é certo que o delegado, zeloso cumpridor das ordens dos seus superiores, mandasse logo a representação pedindo o jury de tres comarcas.

Sr. presidente, até hoje essa representação não deu entrado, no supremo tribunal de justiça!!

É necessario que se saiba, pois, onde para essa representação, quem a esconde, quem impede que ella chegue ao seu destino, e com que fim e com que intuito.

Sr. presidente, os presos não lhe importa serem julgados pelo jury de tres comarcas nem pelo jury de todas as comarcas do paiz; o que querem é ser julgados quanto antes, porque estão avidos da justiça e desejosos de provar a sua innocencia. Se o supremo tribunal de justiça não resolver o jury das tres comarcas dentro de trinta dias, os réus ficarão mais um semestre na prisão; é isso que se pretende, e é contra esses manejos indecorosos e indecentes, que eu venho protestar.

Sr. presidente, eu sei os meios que se têem empregado para que os réus não sejam agora julgados, conheço as baixezas a que se tem descido, é por isso que eu não levantarei mão d'estaquestão emquanto o publico não ficar completamente esclarecido.

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Torno a repetir e bem alto, sr. presidente, o que eu quero é que se faça toda a luz; o que eu quero é que se conheça quem são os verdadeiros petroleiros e os detractores da honra alheia.

Estes meus desejos, são os desejos dos presos, e por isso não quizeram servir-se das garantias que a lei lhes facultava; não quizeram aggravar da injusta pronuncia, nem quizeram tão pouco requerer que lhes fosse applicada a amnistia, que comprehende o crime de que elles são accusados. Sr. presidente, a este procedimento digno e correcto, corresponde-se-lhes com uma trica, procurando illudir as leis, e fazer desapparecer as garantias que ellas dão aos opprimidos.

Sr. presidente, não querer julgar os réus, querer conserval-os presos mais seis mezes, sem se saber se elles estão culpados, é um procedimento inaudito, e um escandalo, e mais do que isso, é uma infamia.

Isto não póde ser, e é para apurar a responsabilidade que o governo tem n'este assumpto, que eu desejo interpellar o sr. ministro da justiça.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o requerimento do sr. Vaz Preto.

Foi lido na mesa o requerimento e mandou-se expedir.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa Pimentel): - Sr. presidente, pedi a palavra unicamente para dizer ao digno par e meu amigo o sr. Vaz Preto, que o meu collega o sr. ministro da justiça promptamente se prestarei a responder ás perguntas de s. exa.

O que eu posso dizer desde já ao digno par, é que devemos confiar nas leis portuguezas, que, todos nós sabemos, não peccam por falta de garantias.

Portanto, estou persuadido de que toda a luz se ha de fazer sobre o assumpto.

Nada sei sobre o facto que s. exa. citou, e por isso nada mais posso acrescentar.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Vasconcellos Gusmão: - Sr. presidente, o sr. conde de Alemquer encarregou-me de participar a v. exa. e á camara, que não tem comparecido ás nossas sessões, por incommodo de saude, e que pelo mesmo motivo terá de faltar a mais algumas.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Thomás Ribeiro: - Sr. presidente, eu pedi a palavra quando estava aqui presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros e desejaria obter uma resposta de s. exa. ou do seu collega da marinha, pois o assumpto é da especial competencia das suas pastas.

No emtanto como se acha aqui o sr. presidente do conselho que tem conhecimento geral e especial dos negocios de todos os ministerios, desejava que s. exa. me dissesse, alguma cousa a respeito d'aquillo a que me vou referir, se n'isso não visse inconveniente.

Eis o meu requerimento:

«Requeira que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja enviada a esta camara uma representação que foi enviada no governo por alguns catholicos de Bengalla, bispado de S. Thomé de Meliapor.»

Eu trouxe para illustração dos srs. ministros e da camara, um jornal, que é orgão official do sr. bispo de Cochim, alguns trechos do qual se referem a instituições que se acham estabelecidas pelo sr. bispo em S. Thomé de Meliapor sobre congregações religiosas.

Ora, se é conveniente que haja ou não essas congregações em dominios ou padroados de Portugal, isso é uma questão para ser tratada pelo governo e pelo parlamento, tanto assim, que nem em dictadura se decretou.

Portanto desejava que estivesse aqui o sr. ministro da marinha e ultramar para me responder sobre este facto.

Outro:

Realmente não desejo tomar de assalto o governo, mas parece-me que o sr. presidente do conselho me poderá dizer, pouco mais ou menos, o que póde haver de verdade sobre o que apparece annunciado em Lisboa, era jornaes de todas as cores politicas, sobre difficuldades com que se lucta na nossa Africa occidental, sobre receios de perturbações de ordem, sobre o que ha de exacto ácerca de se haver desmontado a artilheria de uma nova canhoneira para estabelecer uma bateria era terra africana; sobre a remessa para Mossamedes, emfim, de uma bateria Krupp.

Eu desejarei muito que o governo me diga que não ha absolutamente nenhuns cuidados pela segurança das nossas possessões na Africa oriental ou na Africa occidental. Quanto á oriental, não pergunto cousa alguma, porque parece que sobre isso ha desejo de não dar a menor informação. Quanto á occidental, supponho que não se fez ainda nenhuma pergunta na camara dos senhores deputados e eu desejaria ouvir resposta á que formulo agora.

Se effectivamente se effectuou aquelle embarque a toda a pressa, alguma rasão houve; e nós desejâmos ouvir as informações do governo, não para lhe cercearmos os meios de que precisa ou para lhe fazermos acerba critica sobre esse ponto, mas ao contrario, para nos associarmos, pelo menos eu, aos seus esforços, e concedermos-lhe os meios necessarios a fim de poder acudir aos revezes que se começaram, que se consummaram ou que se receiam.

Outro assumpto:

Não vi nos jornaes portugueses, e eu leio bastantes, não todos, porque levaria isso muito tempo, não mo tomem a mal os escriptores nacionaes que os illustram diariamente com as suas producções, não vi nos jornaes portuguezes uma noticia que vem n'um jornal hespanhol, La Epoca, e que foi mandada de Lisboa. Póde se duvidar d'ella, porque nós sabemos que de tudo se tem feito industria para obter dinheiro, para ganhar alviçaras.

Sc não é verdadeira, estimo muito. Se é verdadeira, parece que todos os dias estão infelizmente crescendo as nossas difficuldades.

Vou traduzir da Epoca um telegramma do dia 7, ás dez horas da manha:

«Os representantes da Inglaterra e dos Estados Unidos (n'esta capital), obrando de commum accordo, apresentaram ao governo portuguez uma nota comminativa, para que em praso fixo dê uma resposta categorica sobre as reclamações entabuladas a respeito do caminho de ferro de Lourenço Marques, ou, em caso contrario, que se submetia a questão a uma arbitragem.»

Nota comminatoria!

A de 11 de janeiro já nos deixou em mau estado e do maus humores. Agora, se vem outra, feita de commum accordo entre os ministros dos Estados Unidos e da Inglaterra, a respeito de uma questão que eu supponho nacional, porque é com uma companhia portugueza, organisada segundo e sob as nossas leis, será muito demais.

Virem os governos estrangeiros intrometter n'isto a sua mão e demais, para ser sómente serio.

Eu, que gosto de fazer justiça a todos, creio que o sr. Barros Gomes, quando foi ministro dos negocios estrangeiros, não quiz acceitar nunca esta interferencia dos governos; e pelo contrario, nas suas notas, o que me consta por noticias que se têem publicado, sustentou sempre que tratasse com o governo portuguez a companhia que se julgava prejudicada e que se dariam as necessarias providencias n'aquelle sentido.

Aqui está sobre que peço hoje ao nobre presidente do conselho me responda em primeiro logar, se é verdadeira esta noticia, e em segundo, se é tambem verdade que nos achâmos em graves difficuldades quanto ás nossas possessões africanas da costa occidental. Sobre isto, principalmente.

Por agora tenho concluido.

Foram lidos na mesa o requerimento e a nota de interpellação do sr. Thomás Ribeiro, que são do teor seguinte:

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Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja enviada a esta camara uma representação que foi enviada ao governo por alguns catholicos de Bengalla, bispado de S. Thomé de Meliapor.

Nota de interpellação

Desejo ouvir o governo sobre os tramites diplomaticos por que têem passado os decretos ou chamados decretos das congregações, relativamente á execução da ultima concordata, e o que sobre ella ha assentado. - Thomás Ribeiro.

O requerimento mandou-se expedir e a nota de interpellação foi enviada ao governo.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): - É infelicidade minha que, quando venho a esta camara, não me perguntam nada sobre negocios dos ministerios a meu cargo, e só me dirigem perguntas sobre assumptos relativos ás pastas dos ministros que não estão presentes.

O digno par e meu amigo o sr. Thomás Ribeiro referiu-se a varios assumptos, sendo um d'elles a execução da concordata no bispado de Meliapor.

Em resposta devo dizer a s. exa. que communicarei ao meu collega dos negocios estrangeiros, e sobre tudo ao da marinha, as observações do digno par.

O que posso desde já dizer ao digno par é que não me consta que nas nossas possessões da Africa estejam estabelecidas quaesquer providencias contrarias ás leis, do paiz, e o que affirmo desde já tambem é que as nossas leis constitucionaes hão de ser ali, como em qualquer outro ponto, integralmente executadas.

Referiu-se tambem o digno par a munições e armamentos que foram mandados a toda a pressa para a Africa occidental, e pergunta s. exa. se este facto se havia dado com receio de que n'aquellas paragens fossemos invadidos por estrangeiros, ou que corresse qualquer perigo uma parte das nossas possessões.

Eu creio poder asseverar ao digno par que as munições e armamentos de guerra, a que s. exa. se referiu, foram para ali enviados sem que houvesse algum facto extraordinario, mas unicamente para estarmos precavidos contra qualquer eventualidade, e talvez que para conter em respeito alguns regulos, quando isto se torne necessario.

Não ha, pois, receio de invasão ou ataque de qualquer nação estrangeira.

Se as encommendas foram feitas a toda a pressa, isto significa unicamente que, tendo nós poucas relações directas com as nossas possessões, quando chega ao nosso porto algum vapor que para ali se dirija, trata-se com toda a pressa de preparar o que esse vapor deve levar, porque só muito mais tarde sairá outro para aquelle ponto.

É esta a rasão da pressa em que fallou o digno par.

O terceiro ponto a que se referiu o digno par é o que diz respeito a uma noticia telegraphica enviada de Lisboa para o estrangeiro.

O digno par sabe perfeitamente que é necessario dar muito desconto ás noticias que uma ou outra vez a nosso respeito vem publicadas nos jornaes estrangeiros, principalmente ás noticias telegraphicas.

S. exa. conhece bem o jornalismo, e sabe que é verdade o que acabo de dizer.

O que posso affirmar ao digno par é que não foi enviada ao governo nenhuma nota comminatoria, conforme diz a noticia que s. exa. leu á camara.

Creio ter respondido d'esta fórma ás perguntas que s. exa. fez, e de certo seria mais explicito se essas perguntas dissessem respeito a assumptos relativos a alguma das pastas a meu cargo.

Como estou com a palavra, aproveito a occasião para mandar para a mesa uma proposta, por parte do meu collega o sr. ministro da instrucção publica.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta que o sr. presidente do conselho acaba de mandar para a mesa.

Leu-se na mesa a proposta, que t do teor seguinte:

Proposta

Senhores. - Em conformidade do artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo de Sua Magestade pede á camara dos dignos pares do reino a necessaria permissão para que possa accumular, querendo, as funcções legislativas com as do emprego dependente do ministerio da instrucção publica e bellas artes, que exerce em Lisboa o digno par Antonio José Teixeira.

Secretaria d'estado dos negocios da instrucção publica e bellas artes, em 9 de maio de 1890. = João Marcellino Arroyo.

Foi approvada.

O sr. Margiochi: - Sr. presidente, eu tinha pedido a palavra quando ha pouco fallava o sr. D. Luiz da Camara Leme e na occasião em que s. exa. tratava de estabelecer uma comparação entre diversos procedimentos politicos.

S. exa. não está presente, entretanto, eu sempre farei uso da palavra, porque o meu desejo era unicamente dizer a s. exa. que não comparasse o procedimento politico de meu avô em 1821, com um certo procedimento politico meu em 1890.

Queria pedir a s. exa. que, em logar de comparar epochas tão afastadas e pessoas diversas, comparasse o procedimento de meu avô em 1821 e a sua maneira de proceder em 1834.

Em 1821 meu avô era muito doutrinario, muito puritano em politica, e em 1834 fazia parte de uma dictadura que extinguiu as ordens religiosas.

É o opportunismo (dentro de limites dignos), tão necessario aos homens politicos.

O sr. Conde de Bertiandos: - Sr. presidente, com relação ao assumpto que me levou a pedir a palavra, já o sr. Margiochi disse o que era necessario dizer, e de mais a mais não está presente o sr. ministro das obras publicas.

Eu respeito muito todos os interesses da companhia real; mas, como muito bem disse o sr. Margiochi, é necessario que não nos vamos a importar tanto com os interesses da companhia, que forcemos a população de Lisboa a caminhar debaixo d'esses montes, e talvez a morrer, só porque a companhia lucra com essa exploração.

Podem os engenheiros muito embora dizer que não ha perigo em passar o tunnel; mas o publico tem apprehensões, e maiores serão agora as suas desde que souber que o proprio presidente da camara municipal de Lisboa está preoccupado com o perigo; por consequencia o que era necessario era que se deixasse pelo menos nos primeiros tempos inteira liberdade aos passageiros para saírem da capital e entrarem n'ella pelo caminho de ferro sem serem obrigados a passar pelo tunnel. Basta para isso franquear-lhes as outras estações.

Eu agora não tencionava fallar, tinha pedido a palavra antes do discurso do sr. Margiochi; limito-me, portanto, em pedir ao governo que dê a este grave assumpto a importancia que elle merece. Trata-se de acautelar vidas, ou, pelo menos, de apasiguar receios. É grande a responsabilidade do governo.

Tenho dito.

O sr. Costa Lobo: - Como não está presente o sr. ministro das obras pulicas, farei uso da palavra n'outra occasião.

O sr. Coelho de Carvalho: - Sr. presidente, tinha pedido a palavra para dirigir algumas perguntas ao sr. ministro das obras publicas; mas como s. exa. se retirou, reservo essas perguntas para outra occasião; no entanto, como está presente o sr. presidente do conselho, que não póde

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desconhecer os negocios que correm pelas outras pastas, vou pedir-lhe algumas explicações com referencia a assumtos coloniaes, isto a despeito da estranheza com que s. exa. acolheu ha pouco algumas perguntas do digno par o sr. Thomás Ribeiro.

Diz-se que noticias particulares de Moçambique informara com uma certa reserva que tinham ali Decorrido factos de muita gravidade.

Diz-se que as nossas forças em Angoche tinham sido atacadas pelo gentio, e corria com uma certa insistencia em Moçambique que o nosso governador e um outro official tinham sido assassinados.

Este facto, a existir, tem realmente uma gravissima importancia.

O governo de certo não ignora que antes d'este facto já havia certas difficuldades, que tinham obrigado o governo a mandar para aquella possessão uma das nossas canhoneiras e a reforçar as forças de terra com uma importante força de caçadores.

Eu desejava que o governo podesse dizer á camara que as noticias a que me refiro são completamente destituidas de fundamento; mas se as informações officiaes as confirmam, quero saber que providencias o governo tenciona adoptar.

Aguardo a resposta do sr. presidente do conselho, e, se s. exa., por qualquer circumstancia, não me poder dar as informações que desejo ácerca dos factos que aponto, contentar-me-hei com a declaração de s. exa. de que prevenirá o sr. ministro da marinha, a fim de que elle, em occasião opportuna, venha a esta camara dar os devidos esclarecimentos sobre o assumpto.

Em todo o caso peço a v. exa., sr. presidente, que me reserve a palavra para depois da resposta que o sr. presidente do conselho se digne dar-me.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): - Sr. presidente, eu prevenirei o meu collega sobre a pergunta que acaba de fazer o digno par; mas parece-me que já posso dizer a s. exa. que as noticias a que s. exa. se referiu não chegaram ao conhecimento do governo.

Ainda que cada ministro trata especialmente dos negocios a seu cargo, eu sei que quando ha algum objecto importante a tratar elle é apresentado em conselho de ministros, o não tenho a menor idéa de que o sr. ministro da marinha informasse o conselho ácerca de assumptos importantes do ultramar.

Parece-me que a noticia não é exacta; mas em todo o caso eu prevenirei o sr. ministro da marinha.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Coelho de Carvalho: - Agradeço as informações do sr. presidente do conselho.

É inutil declarar á camara que ficarei immensamente satisfeito se as informações que nos der o sr. ministro da marinha possam declarar completamente destituidas de fundamento as noticias a que me referi ha pouco.

Oxalá que isto assim succeda.

Mas, sr. presidente, se as noticias não são inteiramente verdadeiras, e todavia certo que existem lá algumas difficuldades, e tanto isto é assim, que antes de circularem estas tristes noticias já se tinha mandado reforçar as nossas tropas.

O negocio, pois, tem uma certa gravidade.

Acceito as declarações do sr. presidente do conselho; mas aguardo a presença do sr. ministro da marinha.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Visconde de Moreira de Rey: - Pedi a palavra para participar a v. exa. e á camara que a deputação encarregada de communicar a Sua Magestade a constituição d'esta camara foi recebida com a costuma benevolencia.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Mando para a mesa uma proposta, para que os dignos pares n'ella mencionados possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as que exercem no meu ministerio.

Foi lida na mesa a proposta apresentada pelo sr. ministro da fazenda, que é do teor seguinte, e immediatamente approvada.

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara permissão para que possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as dos seus empregos ou commissões os dignos pares: Augusto Cesar Barjona de Freitas, vogal do tribunal de contas; João José de Mendonça Cortez, idem; Thomás Antonio Ribeiro Ferreira, idem; José Luciano de Castro, director geral dos proprios nacionaes; Antonio Augusto Pereira de Miranda, governador do banco de Portugal; conde do Restello, presidente da junta do credito publico; Joaquim de Vasconcellos Gusmão, membro do conselho fiscal da administração geral dos tabacos; visconde de Asseca, sub-inspector dos tabacos; José Augusto da Gama, vogal da junta do credito publico; Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, administrador do circulo aduaneiro do sul; Jeronymo da Cunha Pimentel, presidente do conselho de administração das obras da manutenção do estado.

Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 9 de maio de 1890. = João Franco Castello Branco.

O sr. Conde d'Avila: - Sr. presidente, mando para a mesa o diploma do meu particular amigo o sr. Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, par eleito pelo collegio districtal de Angra do Heroismo.

Fui enviado á commissão de verificação de poderes.

O sr. Thomás Ribeiro: - Sr. presidente, emquanto me não póde ouvir o sr. presidente do conselho, deixe-me v. exa. dizer que me associo da melhor vontade e com plena convicção ás considerações feitas pelo digno par e meu amigo, o sr. Manuel Vaz Preto Geraldes.

Se é certo o que s. exa. ponderou, e eu creio que sim, porque não é proprio do seu caracter senão dizer o que é exactissimo, e se effectivamente de cá se mandaram as ordens a que s. exa. se referiu, eu com todo o empenho peço a v. exa. para que me consinta tomar parte na interpellação que haja com o sr. ministro, se porventura ella se realisar.

Dir-se-ia que n'esse processo do Fundão voltámos aos tempos pombalinos e aos carceres da Junqueira, de para sempre lugubre memoria.

Emquanto ao sr. presidente do conselho de ministros sinto que s. exa. dissesse que eu não lhe tinha perguntado cousas relativas ao seu ministerio. O sr. presidente do conselho não tem ministerio; sabe dos negocios do governo e foi por isso que eu na falta do sr. ministro a quem diz respeito esto assumpto, me dirigi ao sr. presidente do conselho, tendo o cuidado de dizer a s. exa. que não esperava nem estranhava que s. exa. me não respondesse, e comtudo eu devo acreditar que não póde haver nenhum assumpto estranho ao sr. presidente do conselho.

Certo estou de que tudo o que perguntei é demasiadamente importante, aliás não sei o que é importante n'este mundo.

Grita-se contra o nosso costume de adiar tudo, do adiar o embarque de artilheria, de munições de guerra e de tudo mais que se manda para a Africa onde hoje temos uma questão especialissima; uma vez ha, era contrario dessa preguiça uma diligencia excepcional, e s. exa. não entende que isto deva preoccupar os representantes da nação.

Acho extraordinario que isto não seja tambem um dos factos bastante graves para chegar ao conhecimento do sr. presidente do conselho de ministros. Mas o que eu não

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142 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

queria era que elle, o sr. presidente do conselho, sabendo que eu não vinha aqui com más intenções se lembrasse de estranhar que eu lhe perguntasse, a elle, o que só elle me devia dizer.

Sabe v. exa. o que me parece esta maneira de responder? desejo de não responder.

Temos na Africa os nossos cuidados, os nossos mais caros interesses; temos ao pé de Mossamedes, um inicio de colonisão europeia; temos lá vizinhos ambiciosos, famintos do que nos resta e são de todas as cores, desde o branco ao preto; vemos correr para o ponto mais pacifico e por ora o mais indemne da nossa Africa aprestos de guerra embarcados a toda a pressa.

Sr. presidente, não será este assumpto a que me tenho referido, bem digno da attenção de todos os governos de Portugal? Parece-me bem que sim.

Ha um outro facto que tambem me impressionou, e eu desejava saír d'aqui com a minha consciencia tranquilla.

Eu perguntei se tinha havido nota comminatoria das duas potencias reunidas dos Estados Unidos e Inglaterra.

A dizer a verdade, os governos estrangeiros estão procurando intervir em negocios que são exclusivamente nossos. Eis o que eu perguntei, porque tenho sempre muito medo quando os governos respondem como respondeu o sr. Antonio de Serpa; faz-me lembrar os medicos que respondem aos doentes, gravissimamente doentes, - isso não é nada, ámanhã já se levanta, está excellente, e depois dizem á familia: vá preparando a mortalha. Por isso é que eu desejava que o sr. presidente do conselho me d'esse esta consolação de dizer que não ha effectivamente nada, que nem o ministro dos Estados Unidos nem o da Inglaterra têem ou procuram ter interferencia n'esse negocio. S. exa. diz que não ha nada, mas não é justo que se satisfaça com dizendo que não ha nota comminatoria, porque isso é outra cousa. Já sei que a não ha, mas ainda não sei e desejo que s. exa. me diga se ha interferencia mais ou menos directa de alguma potencia estrangeira, n'um negocio que é exclusivamente nosso. E isto o que eu desejo, e peço a s. exa. desculpa de o enfadar com as minhas perguntas, mas s. exa. reconhece que estou no meu plenissimo direito e no cumprimento do meu dever, e por isso espero que s. exa. me possa par ou prometter resposta mais precisa do que essa que effectivamente deu.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): - O digno par sr. Thomás Ribeiro de certo não comprehendeu bem as minhas palavras. Não era minha intenção estranhar, nem podia fazel-o, que um digno par me dirigisse qualquer pergunta. Não estava isso no meu intuito, porque seria faltar ao meu dever; mas o que disse foi que tinha sempre a infelicidade de me dirigirem perguntas sobre assumptos relativos a outros ministros, e não á pasta que eu dirijo; o que faz bastante differença.

S. exa. referiu-se novamente á noticia que foi de Lisboa para um jornal hespanhol, a respeito da interferencia de governos estrangeiros na questão de Lourenço Marques. Disse que o meu collega dos negocios estrangeires é que poderia responder cabalmente á pergunta do digno par, mas o que em todo o caso eu affirmava era que não havia nota comminatoria.

O digno par quer tambem saber se os governos da Inglaterra e dos Estados Unidos se têem interessado n'esta questão.

Respondo a s. exa. que elles se teem interessado, desde que se deu o facto, creio que ha anno e meio ou dois annos, da rescisão do contrato. Creio ter assim respondido a s. exa.

Não sei se s. exa. fez mais alguma pergunta.

O sr. Thomás Ribeiro: - Alludi á questão do armamento.

O Orador: - Mas eu já disse a s. exa. que desejava mais responder sobre assumptos de que tenho pleno conhecimento.

S. exa. disse que o presidente do conselho devia ter conhecimento de todos os factos.

O presidente do conselho deve ter conhecimento de todos os factos importantes, mas não póde responder com a precisão com que o póde fazer o ministro da respectiva pasta. Em toda a parte do mundo é costume interpellar os ministros sobre os negocios que dizem respeito ás pastas que dirigem. Isto não é queixar-me, nem desconhecer o direito que assiste aos dignos pares de dirigirem perguntas, não só ao presidente do conselho, como a todos os ministros; mas apenas accentuar um facto verdadeiro.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Franzini: - Pedi a palavra, sr. presidente, para chamar a attenção do sr. ministro da guerra sobre um assumpto que tem grande importancia.

Refiro-me ao fornecimento de lanificios para o fardamento de tropas, fornecimento que não é contratado directamente com os fabricantes mas sim cem intermediarios a quem se deve quasi 400:000$000 réis.

Este assumpto foi estudado pelo sr. general José Joaquim de Castro, quando ministro da guerra, e, na mesma qualidade, pretendi eu tambem resolvel-o, para o que mandei elaborar na direcção geral da administração militar um relatorio, que me habilitasse a resolver nas melhores condições para o estado e para a boa hygiene das tropas.

Esse relatorio foi confeccionado pelo distincto official o sr. coronel de artilheria Pacheco, hoje general de brigada, e o sr. ministro da guerra ha de encontral-o na sua secretaria, assim como outro da commissão encarregada de propor os typos de lanificios, dirigido por um distincto official de cavallaria, o sr. tenente coronel Ribeiro.

O fornecimento alludido, pela fórma por que é actualmente feito, tem grandes inconvenientes. Como o estado deve aos fornecedores cerca de 400:000$000 réis, têem elles a certeza de que não encontrarão na praça quem lhes faça concorrencia, affastando-se por isso os fabricantes, que não podem estar a fornecer com grande atrazo nos pagamentos, e ficando sempre o fornecimento adjudicado aos intermediarios.

Assim como quem come fiado paga dobrado, o governo paga no preço da adjudicação o juro elevado da sua divida, e os, pannos, não sendo da qualidade exigida nos respectivos padrões, não têem a duração indicada nas tabellas regulamentares, do que resulta o soldado damnificar em curto praso os artigos do uniforme, haver necessidade de lhes fornecer outros e, quando a praça passa á reserva, ir com uma divida muito superior ao deposito que a lei manda ella tenha no cofre regimental, pois que é de 6$000 réis para as praças montadas e de 4$800 réis para as praças apeadas.

O debito eleva-se, não raro, a 16$000 réis e 20$000 réis.

D'aqui vem enorme perda para o estado, e a maneira pratica de poder resolver estas difficuldades é pagar aos intermediarios; augmentar o fundo permanente dos corpos para que os pagamentos se façam em dia, e contratar directamente com os fabricantes.

Este assumpto, posto que commesinho, é dos mais importantes, tanto como medida altamente economica, como devendo exercer benefica influencia sobre o estado sanitario do exercito.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): - Folgo de poder referir-me a um assumpto que pertence á minha pasta, e folgo de dar uma resposta completa e satisfactoria.

Tudo o que o digno par disse é perfeitamente exacto. Os fornecedores tinham sempre a haver grandes sommas de dinheiro, e d'esta circumstancia provinham em grande parte as pessimas condições dos fornecimentos.

O estado era sempre devedor, e n'esta qualidade via-se obrigado a acceitar dos fornecedores, tanto para as fardas

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SESSÃO DE 9 DE MAIO DE 1890 143

como para os capotes, pannos que não satisfaziam ás condições requeridas.

O inconveniente está sanado, e segundo as indicações do excellente relatorio do actual commandante de artilheria o sr. Paulo Eduardo Pacheco, deve realisar-se nos fornecimentos uma grande economia, e ao mesmo tempo devemos adquirir pannos de boas qualidades.

Quando se pague em dia, e quando se pozerem em concurso os fornecimentos, as condições hão de evidentemente melhorar.

D'aqui em diante não se trata senão com os fabricantes, porque o negocio realisado pelos intermediarios dava as desvantagens que se conhecem e que s. exa. apontou.

Vae-se pagar o que está em debito, e é por isto que o orçamento rectificado d'este anno ha de apparecer infelizmente aggravado em alguns centenares de contos de réis.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Franzini: - Agradeço as explicações que s. exa. acaba de me dar, e folgo de ver que se attendeu a um serviço tão importante.

O sr. Presidente: - A hora está adiantada, e por consequencia vou levantar a sessão. A seguinte é ámanhã, e a ordem do dia a eleição de commissões.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas menos dez minutos.

Dignos pares presentes na sessão de 9 de maio de 1890

Exmos. srs. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel; Antonio José de Barros e Sá; Marquez de Vallada; Arcebispo Bispo do Algarve; Condes, de Alte, d'Avila, da Arriaga, de Bertiandos, do Bomfim, de Cabral, da Folgosa, de Gouveia, de Lagoaça, da Ribeira Grande, de Valbom; Bispo da Guarda; Viscondes, de Almeidinha, da Azarujinha, de Castro e Solla, de Condeixa, de Ferreira do Alemtejo, de Moreira de Rey, de Paço de Arcos, da Silva Carvalho; Barão, de Almeida Santos; Adriano Machado, Moraes Carvalho, Braamcamp Freire, Sousa e Silva, Egypcio Quaresma, Sá Brandão, Antonio J. Teixeira, Serpa Pimentel, Pinto de Magalhães, Costa Lobo, Santos Carneiro, Bernardo de Serpa, Cypriano Jardim, Montufar Barreiros, Pinto Bastos, Hintze Ribeiro, Firmino João Lopes, Rodrigues de Azevedo, Costa e Silva, Margiochi, Barros Gomes, Jeronymo Pimentel, Baima de Bastos, Holbeche, Coelho de Carvalho, Gusmão, Gomes Lages, Gama, Bandeira Coelho, Baptista de Andrade, Ferraz de Pontes, Mello Gouveia, Sá Carneiro, Bocage, Lopo Vaz, Camara Leme, Firmino de Almeida Maia, Pereira Dias, Vaz Preto, Marçal Pacheco, Franzini, Cunha Monteiro, Pedro Correia, Placido de Abreu, Rodrigo Pequito, Calheiros, Thomás Ribeiro.

O redactor = Carrilho Garcia.

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