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20 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

tres extinctos, por cujo eterno descanso eu dirigirei aos céus intimas, fervorosas e ardentes preces.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Conde de Thomar: - Eu não sei, sr. presidente, se ha mais algum digno par inscripto sobre este incidente, e, como o assumpto de que desejo occupar-me é inteiramente diverso do que se está tratando, não deseja na intercalar as minhas palavras n'elle.

O sr. Presidente: - Sobre este incidente ainda estão inscriptos mais alguns dignos pares.

O sr. Conde de Thomar: - Então peço a v. exa., que me reserve a palavra para antes de se encerrar a sessão.

O sr. Thomás de Carvalho: - Sr. presidente, a lista funeraria que v. exa. nos leu ha pouco, mostra bem claramente quanto a Providencia nos tem experimentado n'estes ultimos tempos.

Quiz, por assim dizer, chamar a si os seus eleitos, poupando-lhes o desgosto de assistirem á miseria da nossa decadencia. (Pausa.)

"Dá vontade de morrer", dizia o grande historiador que linha escripto as paginas brilhantes da fundação da monarchia.

Dá vontade de morrer, dizia elle, ao ver o modo como era considerada, a monarchia no seu tempo, elle, que tinha escripto em letras de oiro aquelle alevantamento sublime do povo constituindo a nação portugueza.

Todos os que estão ahi n'essa lista, sr. presidente, eram dos que engrandeciam a patria, e todos n'um momento desappareceram da superficie da terra. Mas, não morreram de todo, porque não morrem os que deixam de si memorias gloriosas.

E são esses os grandes luminares dos povos; astros de primeira grandeza que desde seculos têem sempre o mesmo esplendor, são como o Syrius, que tinha em tempo de Ptolomeu o mesmo brilho e esplendor que hoje tem, estando, entretanto, todos os dias a afastar-se de nós. Está sempre fugindo do nosso systema, arredando-se successivamente e conservando, todavia, o mesmo brilho e o mesmo esplendor. Abaixo d'elles, porém, ha outros astros que sem possuirem a mesma luz e o mesmo brilho, entretanto são dignos das nossas contemplações.

Escuso de remorar os nomes que já foram citados pelo gr. presidente do conselho e pelo reverendissimo e dignissimo sr. bispo do Algarve.

Entre elles, alguns dos quaes dos quaes eu me permittirei dizer algumas palavras, porque fui intimo d'elles.

A um tratei desde a primeira infancia. Foi Carlos Lobo d'Avila, esse espirito selecto e extraordinario, para cuja formatura cheguei a concorrer.

Na universidade não o queriam deixar formar-se por lhe faltar um simples exame de desenho! Como se para o estudo ou para, o exercicio da jurisprudencia fosse necessario saber traçar com preceito quatro riscos n'um papel!

Pois tive eu o prazer de afastar esse obstaculo, propondo no conselho superior de instrucção publica uma dispensa que foi adoptada pelo popular e liberal ministro Antonio Rodrigues Sampaio.

De Mártens Ferrão tambem fui amigo, do aio dos nossos principes, como Egas Moniz o foi do primeiro rei de Portugal.

Mas não é já por estes, precisamente, sr. presidente, pois que v. exa. lhes fez o elogio, que eu desejei usar da palavra.

Lembrei-me de um companheiro e amigo de longos an-nos, que perdi repentinamente: refiro-me a José Maria da Ponte e Horta, parlamentar distincto, professor de primeira plana, e que foi tambem governador de varias provincias do ultramar; aquelle que foi nas aulas companheiro das grandes illustrações d'este paiz: de Fostes, Latino, Andrade Corvo e outros da mesma estatura.

Alumno glorioso e professor notavel da escola polytechnica, escola celebre entre todas as do paiz. Cinco, seis ou sete professores d'esta escola têem sido ministros d'estado.

Temos aqui presente um d'elles, o sr. Antonio de Serpa Pimentel.

Das glorias que na sua vida publica o tem acompanhado, não é de certo a menor a de ter sido professor da escola polytechnica.

Homem liberal, liberal convicto, José Maria da Ponte e Horta combateu pela liberdade, seguindo em tempos calamitosos a facção de Passos Manuel e Passos José. Foi vencido e prisioneiro com a expedição que saíra a barra do Porto e tomada por uma esquadra estrangeira; jazeu largos mezes nas prisões de S. Julião da Barra.

Era algarvio, tinha o instincto da liberdade; tinha a fidalguia do arabe. Todos os algarvios são arabes e fidalgos.

Disputou uma cadeira na escola polytechnica, e foi logo ali recebido, sendo um dos mais prestantes professores. Mais tarde foi nomeado deputado e depois par do reino.

N'este theatro não era onde elle brilhava mais, ainda que, todas as vezes que tomou a palavra, fosse muito considerado pelos seus collegas; a scena que prezava era exactamente outra; era na escola onde elle resplandecia.

Não termina aqui a sua biographia. Chamaram-no os poderes superiores do estado a governar algumas provincias ultramarinas; foi governador de Cabo Verde, de Angola e de Macau. Nas secretarias d'estado devem existir os papeis d'este professor, d'este governador, em que previra muitos dos acontecimentos, que posteriormente se vieram a realisar, principalmente em Africa.

Partiu para todos os governos pobre, e delles regressou pobre.

Não empenhara as barbas como D. João de Castro, porque já não era tempo para isso. Hoje ninguem daria nada por ellas. As barbas dos grandes homens são de menos preço para gente inclinada ás materialidedes, e dominada pelo bezerro de oiro.

Quando aquelles que governavam no ultramar empenhavam as barbas, sabiam o que ellas valiam. Hoje não só não valem nos que governam, como não valem em qualquer estado, quer nas sciencias quer nas letras.

Com mágua direi a v. exa. e á camara que já ouvi esta profanação: "rir do grande genio de Almeida Garrett", orno sendo um talento inferior, Garrett, que representa uma litteratura inteira.

Diga-se uma vez por todas, que foi não sómente o primeiro na data em todo o genero de litteratura, mas o primeiro de todos os seus contemporaneos e de todos os que he seguiram os passos.

Foi o primeiro lyrico do seu tempo; não ha lyrico superior a elle, qualquer que seja o seu nome.

Os dois ultimos livros de poesias que publicou eram a admiração de Alexandre Herculano, que dizia parecer-lhe impossivel que um homem da idade de cincoenta annos escrevesse as Folhas caídas e as Flores sem fructo.

Foi tambem o primeiro dramaturgo, não se deixando influenciar pelas exagerações da escola romantica.

Compoz o Fr. Luiz de Sousa, a tragedia grandiosa do futuro.

Foi tambem o primeiro romancista, e nenhum posteriormente o excedeu.

Pois esse chefe supremo da litteratura de um povo é menosprezado pelos litteratos de agora, ou que assim se chamam!

Eu trouxe isto a proposito do meu collega e amigo, colega e antigo companheiro de mais de quarenta annos, que rã, alem de um homem de sciencia, um homem tambem de letras.

De factos são muitos os artigos que escreveu em diffe-