SESSÃO DE 9 DE JANEIRO DE 1897 15
Ribeiro, que não foi inferior a José Estevão, quando se discutiu esse ultimatum a valer da França.
O governo apresentou um projecto para auctorisar a indemnisação que a França pedia ou exigia.
Casal Ribeiro ergueu-se, e em voz alta disse:
«Depois da violencia dê-se um voto de confiança ao governo para dar isso que pedem e muito mais se a França assim o exigir, e digam que Portugal não faz questão de dinheiro.»
Se bem me recordo foram estas as palavras de Casal Ribeiro.
Um dos momentos mais emocionantes das discussões do parlamento portuguez foi esse em que se tratou da reclamação da França a proposito da Charles e George.
Assim procederam as opposições d'essa epocha para com o governo n'uma questão internacional.
Ora o nobre prelado fez uma referencia a todos os partidos, asseverando que nas questões internacionaes, em logar de se collocarem ao lado do governo, o combatiam por politica. Permitta s. exa. que diga, foi s. exa. injusto.
S. exa. citou a Hespanha, que n'este momento tem em torno de si todos os partidos politicos.
Permitta-me s. exa. que diga ainda que se o governo hespanhol tem em torno de si todos os partidos politicos e se o governo portuguez em certas e determinadas circumstancias não tem tido o apoio dos partidos em geral, é porque tambem em Hespanha, v. exa. bem o sabe, as circumstancias têem sido bem diversas.
V. exa. sabe que nós temos tido aqui uma dictadura em que se envolvem actos de toda a especie, inclusive internacionaes, e n'este caso qual o homem publico que póde approvar tal proceder? Eu não.
Debateram-se o anno passado questões internas e externas, e, todavia, n'essa occasião só dois ou tres membros do parlamento se levantaram contra os actos do governo; de resto toda a camara applaudiu esse procedimento. Eu votei contra, e os factos subsequentes vieram justificar o meu voto.
Por conseguinte, parece-me que s. exa. vindo, com relação aos factos que se passam no nosso paiz, fazer referencias ao governo hespanhol, não foi muito feliz; porque o governo hespanhol está dentro da lei e o nosso está fóra d'ella; e contra um governo que está fóra da lei é de toda a justiça que se faça opposição.
S. exa. referiu-se ao partido progressista e disse que elle tinha ensarilhado armas, não vindo á camara.
Eu fui o primeiro que levantei essa questão o anno passado, e agora direi que se o partido progressista não vem á camara, não deixa por isso de fazer uma opposição de certo, mais violenta do que se cá estivesse.
(Áparte do sr. bispo-conde.)
Podia estar na camara, mas não está.
Com relação ás questões internacionaes em que s. exa. diz que o governo não tem apoio dos partidos, permitta-se-me que diga que n'este ponto fez s. exa. uma aspera censura á actual situação politica.
Quem lançou contra o governo progressista o celebre manifesto, origem das perturbações que ainda hoje duram? É conhecido de todos que foi o partido regenerador. A consequencia do manifesto foi a queda do governo e a entrada dos regeneradores.
Com esse governo caíu o sr. Barros Cromes, que s. exa. o sr. bispo-conde acaba de glorificar.
O partido regenerador, n'essa occasião, entendeu que se devia afastar do paternal conselho agora exposto pelo nobre prelado de Coimbra.
Sr. presidente, eu não podia deixar sem reparo estas considerações de s. exa., mas sobre ellas nada mais direi, pois não quero cansar a camara.
O sr. Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro): - Sr, presidente, o digno par e meu amigo, sr. conde de Thomar, dignou-se prevenir-me de que viria fazer as considerações que a camara ouviu.
Perguntou s. exa. se é exacto que algum estrangeiro tivesse vindo a Lisboa para tratar de uma transacção com o governo portuguez ácerca do caminho de ferro de Lourenço Marques, e affirmou que corria que esse estrangeiro tinha relações muito intimas com a companhia ingleza South Africa.
Sr. presidente, eu não sei se veiu a Lisboa algum subdito inglez com tenção de tratar d'esse assumpto, o que sei apenas, é que o governo, em tempo, teve propostas ácerca da exploração do caminho de ferro de Lourenço Marques e que todas repelliu.
Declaro firmemente que nenhuma negociação ha nem houve entre o governo e qualquer estrangeiro com respeito ao caminho de ferro de Lourenço Marques, em virtude da qual o estado vá alienar a exploração d'esse caminho de ferro.
É esta a resolução tomada pelo governo ha muito tempo, e de que não tenciona despartir-se, pendente, como está, a arbitragem de Berne.
Julgo ter respondido de uma maneira perfeitamente clara e terminante á pergunta que o digno par formulou e ácerca da qual s. exa. esperava, certamente, ouvir da parte do governo um juizo formal.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Conde da Azarujinha: - Sr. presidente, pedi a palavra para ter a honra de participar a v. exa. e á camara, que a deputação nomeada por v. exa. para participar a Sua Magestade a constituição d'esta camara, foi recebida pelo mesmo augusto senhor, com a sua costumada benevolencia, no dia e hora para esse fim designada.
A camara ficou inteirada.
O sr. Arcebispo Bispo do Algarve: - Pedi a palavra, sr. presidente, para fazer uma declaração igual á que fez ha pouco tempo o nobre bispo de Coimbra, meu muito distincto collega, de que se tivesse assistido á sessão que por proposta de v. exa. se exarou na acta um voto de profundo sentimento pelo fallecimento dos dignos pares, conde do Casal Ribeiro e conde de Castro, eu ter-me-ía associado a esse justo preito de homenagem á memoria de tão illustres extinctos.
D'elles tive testemunhos de benevolencia e estima, com especialidade do sr. conde do Casal Ribeiro, que foi não só um dos membros mais salientes do parlamento, mas tambem um dos mais prestantes benemeritos cidadãos d'este paiz, pelos relevantes serviços que prestou, não só nos conselhos da corôa, como na carreira diplomatica.
Associo-me, pois, sr. presidente, ás palavras de sentida mágua aqui proferidas em homenagem aos illustres extinctos.
Era simplesmente para fazer esta declaração que tinha pedido a palavra.
(O digno par não reviu.)
O sr. Conde de Lagoaça: - Sr. presidente, começarei, por conselho de um nosso illustre collega, que se senta aqui ao meu lado, por dar as boas festas ao governo, desejando-lhe muito boas entradas de anno, melhores que as saídas do anno preterito.
Sr. presidente, quando estava ouvindo fallar os meus illustres amigos, o sr. bispo-conde de Coimbra, o sr. D. Luiz da Camara e depois o sr. presidente do conselho, uma cousa pensava eu, e era que tudo se poderá dizer do actual governo, ainda que lhe não seja agradavel, porque o fazer-lhe opposição até faz gosto.
O meu illustre amigo o sr. bispo-conde, de quem tão gratas recordações conservo desde a minha permanencia em Coimbra, fez um discurso brilhante, cheio das mais sensatas considerações.
Todo esse discurso me pareceu que assentasse no corpo do governo tão justamente, ou mais ainda, se é possivel, do que as conhecidas luvas brancas do nobre ministro das obras publicas.