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N.º 3

SESSÃO DE 22 DE JUNHO DE 1897

Presidencia do exmo. sr. Marino João Franzimi

Secretarios - os dignos pares

Julio Carlos de Abreu e Sousa
Luiz Augusto Rebello da Silva

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - O digno par Antonio Candido manda para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes, favoravel ao requerimento em que o sr. conde de Casal Ribeiro pede que lhe seja permittido prestar juramento e tomar assento como immediato successor de seu fallecido pae. - O sr. presidente declara que a deputação encarregada de participar a Sua Magestade El-Rei a constituição da camara foi recebida pelo mesmo augusto senhor com a costumada affabilidade. - O digno par D. Luiz da Camara Leme requer que o parecer apresentado pelo digno par Antonio Candido entre immediatamente em discussão. Approvado este requerimento, é seguidamente approvado o parecer por 35 espheras brancas. - O digno par Pimentel Pinto manda para a mesa um projecto de lei e um requerimento. O projecto ficou sobre a mesa para segunda, leitura e o requerimento foi mandado expedir. - O digno par conde de Lagoaça dirige perguntas ao sr. presidente do conselho e ao sr. ministro da marinha, e conclue mandando para a mesa dois requerimentos. São expedidos. - O sr. presidente do conselho apresenta quatro propostas para accumulação de funcções legislativas com as que varios dignos pares exercem nos ministerios do reino, obras publicas e fazenda. Por ultimo responde ao digno par conde de Lagoaça. As quatro propostas são approvadas. - Responde ao digno par conde de Lagoaça o sr. ministro da marinha. - Entre o digno par Jeronymo Pimentel e o sr. presidente do conselho trocam se explicações ácerca de actos eleitoraes. - O digno par Antonio Candido manda para a mesa o parecer de resposta ao discurso da coroa. Vae a imprimir. - O digno par Ernesto Hintze Ribeiro apresenta um projecto de lei. içou sobre a mesa para segunda leitura. - O digno par conde de Lagoaça agradece a resposta do sr. ministro da marinha, e insiste em considerações anteriormente adduzidas. - Encerrada a sessão aprasa-se a seguinte, bem como a respectiva ordem do dia.

Ás tres horas e dez minutos da tarde, verificando-se a presença de 32 dignos pares, foi aberta a sessão.

Foi lida e approvada sem reclamação a acta da sessão antecedente.

(Estava presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros; e entraram durante a sessão o sr. presidente do conselho e o sr. ministro da marinha.}

Mencionou-se a seguinte correspondencia:

Officio do ministerio do reino, accusando a recepção de um outro em que se lhe communicava achar-se constituida a mesa d'esta camara.

Para o archivo.

Officio do ministerio da guerra, acompanhando 90 exemplares das contas do mesmo ministerio, relativas á gerencia de 1894-1895 e ao exercicio de 1893-1894.

Para o archivo.

Officio do digno par Luiz A. Rebello da Silva, participando que, por motivo justificado, não tem podido comparecer ás sessões da camara, nem tão pouco acompanhar a deputação ultimamente nomeada.

Para o archivo.

O sr. Antonio Candido: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um parecer da commissão de verificação de poderes sobre o requerimento em que o sr. conde de Casal Ribeiro pede para prestar juramento e tomar assento como immediato successor de seu fallecido pae.

Sr exa. dignar-se ha dar a este documento o competente destino.

O sr. Presidente: - Cumpre-me declarar que a deputação encarregada de participar a Sua Magestade El-Rei a constituição da camara, foi recebida pelo soberano com a sua costumada affabilidade.

O sr. D. Luiz da camara Leme: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que, dispensado o regimento, entre immediatamente em discussão o parecer mandado para a mesa pelo digno par o sr. Antonio Candido.

Approvado o requerimento, é em seguida approvado o alludido parecer por 35 espheras brancas, igual numero ao da contra prova.

O sr. Pimentel Pinto: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei sobre a reorganisação das nossas forças militares no continente do reino e no ultramar.

É um projecto antigo, que estava sepultado numa das minhas gavetas e que por certo ahi se conservaria, se eu não quizesse seguir o exemplo do digno par o sr. D. Luiz da Camara Leme.

S. exa., querendo que o paiz, o exercito e o governo conhecessem a sua opinião em assumpto de tanta importancia, despertou em mim desejo identico.

Sr. presidente, não tenho a pretensão de que o meu projecto seja melhor do que o do sr. D. Luiz da Camara. Não o apresento com o fim de que, entre os dois, se estabeleçam comparações que eu vaidosamente julgue sejam favoraveis ao meu; nem na esperança de conquistar sympathias no exercito, e ainda menos o apresento na intenção de disputar para mim gloria que muito justamente cabe ao sr. D. Luiz da Camara pelo seu valiosissimo trabalho.

Outro, muito mais modesto, é o fim que tenho em vista: pretendo apenas pôr na tela da discussão algumas questões que interessam a nossa defeza militar, antes que o governo apresente ao parlamento duas propostas de lei que annunciou no discurso da corôa e, sobre tudo, antes que elle tome qualquer resolução que difficulte ou que não permitia depois a boa e economica organisação da nossa força publica, pelo unico modo que ella se me afigura ainda possivel.

Diz-se n'aquelle diploma, que o governo apresentará ás côrtes uma proposta de lei sobre a reorganisação do nosso exercito da metropole e uma outra sobre a reorganisação das nossas forças ultramarinas. Tanto no interesse do thesouro, como no da nossa defeza militar, julgo da maior conveniencia que o parlamento se occupe quanto antes destas questões e auctorise o governo a resolvel-as com toda a possivel brevidade. Ha, porém, uma cousa peior, muito peior ainda do que deixar tudo como está e não fa-

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zer cousa alguma: é querer resolver separadamente os dois problemas. Resolver um independentemente do outro, é, no meu entender, tornar impossivel a resolução de um d'elles.

Já em 1890 eu expunha esta opinião na commissão superior de guerra, e, se bem me recordo, com o applauso de v. exa., sr. presidente.

Já então eu julgava impossivel uma boa e economica organisação militar no nosso paiz emquanto tivéssemos uns poucos de exercitos, cada um d'elles com um sem numero de officiaes. Já então eu pensava que, para baratear a nossa organisação militar, sem prejuizo dos legitimos interesses creados pela reforma do exercito de 1884, era mister atacai- do frente e simultaneamente as duas questões: era mister reorganisar o exercito do reino, conjugando o serviço militar da metropole com o das colonias. N'esse tempo, porém, v. exa., sr. presidente, bem. o sabe, nesse tempo, 1890, poucos eram os officiaes que tinham a minha opinião, e hoje, felizmente, são poucos aquelles que a não têem.

Penso, pois, que presto algum serviço ao governo dizendo o que penso- neste assumpto, antes que elle apresente as suas propostas de lei, e tenho a convicção, que immodestamente confesso, de que tanto o sr. D. Luiz da Camara Leme, como eu, prestamos um bom serviço ao exercito, trazendo para a discussão algumas questões que tão essencialmente lhe interessam.

Antes de ler o projecto que vou ter a honra de mandar para a mesa, devo dizer a v. exa., sr. presidente, que elle é exclusivamente meu e que d'elle não tem a minima responsabilidade o partido a que pertenço.

Esta declaração liça feita de uma vez para sempre, em relação a todo e qualquer assumpto militar sobre o qual eu emitta parecer.

Em todas as questões que se relacionam com a defeza militar do paiz, eu creio, sr. presidente, que não hanesta casa partidos que tenham idéas contrarias 5 todos nós queremos, por sem duvida, que ellas sejam resolvidas pelo modo que melhor e mais conveniente for para essa defeza. A diversidade de opiniões, quando a haja, só póde versar sobre os melhores processos a adoptar para que ella seja tão efficaz quanto possivel, isto é, só poderá versar sobre pontos technicos, absolutamente independentes das nossas crenças politicas, quaesquer que ellas sejam. É por isso, sr. presidente, que em assumptos d'esta natureza eu me reservo o direito de não acceitar de futuro a menor responsabilidade por quaesquer opiniões que sejam contrarias ás minhas, e é tambem por isso que nestes assumptos eu não quero que se attribua, seja quem for, a minima responsabilidade pelas idéas que eu defender.

Para que estas minhas palavras não possam ser mal interpretadas, consinta-me v. exa., sr. presidente, que eu diga á camara que ellas não representam o minimo desaccordo actual entre mim e os chefes do partido regenerador. São unicamente destinadas a prevenir o futuro. Podendo acontecer que em alguma discussão de interesse militar eu vote com o governo contra os meus correligionarios, ou me afaste por igual d'elles e do governo, quiz fazer esta declaração para que em tal caso se não supponha que politicamente me separo do partido a que me honro de pertencer.

Vou ter a honra de mandar para a mesa o projecto, que passo a ler, se v. exa. no interesse da camara, me não dispensa da sua leitura.

V. exa. dirá se quer que eu o leia ou não.

O sr. Presidente: - A camara acaba de ouvir que o digno par deseja ser dispensado da leitura do projecto.

Os dignos pares que concedem esta dispensa, tenham a bondade de se levantar.

Foi concedida.

O sr. Pimentel Pinto: - Agradeço a v. exa. e á camara a sua decisão; vou mandar para a mesa o projecto, pedindo que, se for admittido á discussão, seja enviado á commissão de guerra, logo que ella esteja constituida.

É claro, sr. presidente, que não tenho illusões sobre a sorte que o espera, mas, qualquer que ella seja, o meu dever está cumprido e eu nada mais pretendo. Unicamente desejo tambem que se saiba que as idéas contidas n'este projecto eram minhas, muito antes do partido progressista subir ao poder. Nos papeis que mando para a mesa vae a prova material d'esta affirmação.

Sr. presidente, aproveito a occasião de estar com a palavra para mandar tambem para a mesa um requerimento, pedindo que, pelo ministerio da guerra, me sejam enviados alguns documentos, de que absolutamente careço, para entrar na discussão de uma outra proposta de lei, que foi tambem annunciada no discurso da corôa.

Rogo a v. exa. que o meu requerimento seja enviado ao seu destino com toda a possivel brevidade.

O sr. Presidente: - Vão ler-se o projecto mandado para a mesa pelo digno par o. sr. Pimentel Pinto.

O sr. Pimentel Pinto: - V. exa. dá-me licença?

Querendo v. exa., poder-se-ia dispensar a leitura do projecto, n'esta occasião, por isso que as suas disposições não podem ser apreciadas pela camara numa simples leitura, e porque, não tendo eu solicitado a dispensa do regimento, deverá sor lido na proxima sessão.

O sr. Conde de Lagoaça: - O digno par não pediu urgencia, e, portanto, o projecto tem de ficar para segunda leitura.

Ficou para segunda leitura o projecto apresentado pelo digno par Pimentel Pinto, que é do teor seguinte:

Projecto de lei n.° 2

Artigo 1.° É o governo auctorisado a modificar a organisação do exercito nos termos e nos limites fixados nas bases seguintes:

.ª O territorio do continente do reino será repartido para a organisação do exercito e das reservas em quatro divisões militares territoriaes, subdivididas em districtos de recrutamento e reserva.

2.ª Cada divisão militar territorial comprehenderá quatro districtos de recrutamento e reserva. Cada um destes terá a população necessaria para alimentar de recrutas um regimento de infanteria, e fornecerá, conforme o numero dos seus habitantes, maior ou menor contingente para as outras tropas da divisão e para as que não fizerem parte de nenhuma das quatro divisões activas.

3.º Na arca de cada uma das quatro divisões militares estará permanentemente aquartelada, pelo menos, uma das quatro divisões do exercito activo e serão estabelecidos, segundo as verbas votadas, pelo parlamento, os depositos de material precisos para as tropas e serviços que n'essa circumscripção deverem ser mobilisados.

4.ª Cada uma das divisões do exercito activo será constituida pelas seguintes tropas:

a) Duas brigadas de infanteria de dois regimentos a tres batalhões;

b) Um regimento de cayallaria a quatro esquadrões;

c) Um grupo de quatro baterias de artilheria montada;

d) Uma companhia de sapadores de campanha;

e) Unia fracção da companhia do sapadores conductores;

f) Uma fracção da companhia de trem e equipagens;

g) Uma fracção de uma companhia de enfermeiros;

h) Uma fracção, de uma companhia de obreiros militares.

5.ª Alem das quatro divisões activas, o exercito comprehenderá as seguintes tropas:

A - Engenharia

d) Uma companhia de caminhos de forro

b) Uma companhia de telegraphistas;

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c) Duas companhias de pontoneiros;

d) Uma companhia de sapadores de praça;

é) Uma companhia de sapadores conductores.

B - Artilheria

f) Dois regimentos de artilheria montada de dois grupos de tres baterias;

g) Um grupo de duas baterias a cavallo;

h) Um regimento de artilheria de montanha de dois grupos de tres baterias;

i) Cinco batalhões de guarnição a quatro companhias.

C - Cavallaria.

j) Duas brigadas de dois regimentos a quatro esquadrões.

D - Infanteria

k) Duas brigadas de dois regimentos a tres batalhões.

E - Trem

l} Uma companhia de trem de equipagens.

F - Serviços auxiliares

m) Duas companhias de enfermeiros;

n) Duas companhias de obreiros militares.

As tropas enumeradas nas alineas e), l), m) e n) fornecerão em tempo de paz e de guerra as fracções precisas ás quatro divisões activas.

6.ª O archipelago dos Açores formará um commando, militar, dividido em dois districtos de recrutamento e reserva, em ciada um dos quaes será recrutado e aquartelado:

a) Um regimento de infanteria a dois batalhões;:

b) Uma companhia de artilheria de guarnição.

7.ª A ilha da Madeira constituirá um cominando militar e um unico districto de recrutamento e reserva, no qual será recrutado e aquartelado:

a) Um regimento de infanteria a dois batalhões;

b) Uma companhia de artilheria de guarnição.

8.ª As unidades do exercito activo serão completadas, no caso de mobilisação, com as praças da 1 .ª reserva; e quando estas não forem em numero sufficiente, com as praças mais modernas da 2.ª reserva que tenham pertencido ao exercito activo.

Com os reservistas que sobrarem, serão constituidas as seguintes unidades de reserva:

a) Duas companhias de sapadores de campanha,, cujos quadros estarão juntos das companhias activas da 1.ª e 3.ª divisões militares;

b) Oito baterias montadas e oito columnas de munições,, cujos quadros estarão juntos de cada um dos grupos activos de artilheria montada;

c) Duas baterias de. montanha e duas columnas de munições de montanha, cujos quadros estarão juntos dos dois grupos de artilheria d'esta especialidade;

d) Dez companhias de artilheria de guarnição, havendo junto de cada um dos batalhões activos, os quadros para duas d'essas companhias;

e) Oito esquadrões de cavallaria, estando o quadro de cada um d'elles junto de cada um dos regimentos activos;

f) Dezenove regimentos de infanteria, cujos quadros serão formados pelos dos commandos dos districtos de recrutamento e reserva, e sendo os regimentos do continente a tres batalhões e os das ilhas a dois.

9.ª Os commandantes dos districtos de recrutamento e reserva serão completamente independentes dos regimentos activos, devendo metade, pelo menos, ter a patente de coronel, e os outros a de tenente coronel.

Ás ordens de cada um d'esses commandantes servirão no continente tres officiaes, e nas ilhas dois, para os coadjuvarem no cominando e na instruccão especial a ministrar á 2.ª reserva.

Nos respectivos periodos de instrucção serão nomeados os officiaes e sargentos tanto do exercito activo como reformados, indispensaveis para que a instrucção seja dada na séde dos concelhos pertencentes aos districtos de recrutamento e reserva.

10.ª Os mancebos destinados em cada anno á 2.ª reserva, e que não tiverem servido no exercito activo, serão chamados no primeiro anno do seu alistamento por vinte e um dias, e nos seguintes, até ao nono, em tres periodos annuaes de quinze dias, a fim de receberem a instrucção conveniente, adoptando-se as disposições necessarias para que essa instrucção seja ministrada na sede dos concelhos pertencentes ao districto de recrutamento e reserva. A epocha da instrucção será fixada para cada districto de maneira que a agricultura e as industrias predominantes nas diversas regiões do paiz soffram o menos possivel com o chamamento dos reservistas.

1.ª A direcção superior do exercito será concentrada na secretaria da guerra, modificando-se a actual organisação e sendo extincta a direcção da administração militar.

12.ª Será creado um corpo de intendencia militar para que o exercito, tanto em tempo de paz como no de guerra, possa contar com um regular funccionamento dos serviços administrativos.

13.ª Serão convenientemente reorganisados os estabelecimentos fabris de material de guerra, entregando-se á industria particular o fabrico dos artigos que por ella possam ser fornecidos, sem inconveniente para o serviço militar.

14.ª Será extincto o quadro das praças de guerra, organisando-se o serviço do ahnoxarifado de engenharia, artilheria e saude.

15.º O quadro do secretariado militar será convenientemente ampliado, por modo a poder satisfazer o serviço da sua especialidade em todas as repartições dependentes do ministerio da guerra.

16.ª Será creado o quadro de serviço do estado maior, do qual farão parte os officiaes do actual corpo de estado maior até á sua completa extincção.

17.ª Será organisado um archivo militar, concentrando-se n'elle o actual archivo e bibliotheca do ministerio da guerra, assim como os archivos de memorias e plantas, e os depositos e instrumentos topographicos e photographicos, que se acham dispersos por varias repartições, e creando-se o serviço de cartographia militar.

18.ª O quadro privativo dos officiaes combatentes do corpo do estado maior de cada uma das armas do exercito será fixado no numero restrictamente indispensavel para o serviço das tropas e serviços especiaes do estado maior ou de cada arma, tanto no continente como no ultramar. Alem d'esses quadros haverá mais um quadro compensador de promoção, constituido pelo numero de officiaes de cada posto que for julgado preciso para o exercicio das varias commissões militares que, tambem no continente ou no ultramar, poderem ser indifferentemente desempenhadas por officiaes do estado maior ou de qualquer arma.

19.ª Os officiaes combatentes e não combatentes do exercito, que completarem trinta annos de serviço effectivo, terão direito á reforma no mesmo posto com o augmento de 20 por cento do soldo da sua patente.

20.ª Será revisto o regulamento de 27 de agosto de 1884, que concede aos sargentos empregos publicos, a fim de se alargar o numero d'esses empregos e de garantir melhor essa vantagem aos sargentos que tiverem servido bem no exercito.

21.ª Serão convenientemente reorganisadas as tropas de l.ª linha no ultramar, creando-se em cada um dos governos geraes de Angola, Moçambique e India, pelo menos:

a) Uma companhia de engenharia;

b) Uma bateria de montanha;

c) Um esquadrão de cavallaria.

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Em Macau:

d) Uma companhia de artilheria de guarnição.

E estabelecendo-se em todas as colonias as unidades de infanteria que forem julgadas precisas para a defeza de cada uma d'essas possessões.

22.ª As tropas do ultramar, tanto de 1.ª como de 2.alinha, ficarão tambem subordinadas ao ministerio da guerra, havendo em cada um dos governos geraes e governos de provincia um commandante da força armada, responsavel pela sua instrucção, disciplina e administração.

23.ª O commandante da força armada nos governos geraes de Angola, Moçambique e India, será um general de brigada, a cujas ordens servirão:

a) Dois ajudantes de campo, tenentes de qualquer arma;

b) Um chefe d'estado maior, official superior do corpo, e um adjunto, capitão do mesmo corpo;

c) Um inspector de engenharia, official superior da arma, e os adjuntos, capitães, que forem indispensaveis;

d) Um inspector de material de guerra, official superior de artilheria, e adjuntos os capitães que forem indispensaveis;

e) Um chefe do serviço de saude;

f) Um chefe dos serviços administrativos militares.

24.ª Aos inspectores de engenharia e artilheria, assim como aos chefes do serviço de saude e de administração militar de Angola e da India, poderá ser commettida, respectivamente, a inspecção dos competentes serviços em Cabo Verde, Guiné e S. Thomé, e em Macau e Timor.

25.ª Os officiaes e sargentos das tropas de 1.ª linha serão todos do exercito do reino; as outras praças poderão ser indigenas, ou europeus, servindo, porém, em unidades distinctas.

26.ª Alem das tropas de 1.ª linha poderá haver companhias de policia, nos pontos em que forem julgadas precisas, e, conforme as necessidades do serviço, irão sendo estabelecidas as colonias militares agricolo-commerciaes creadas por lei de 26 de maio de 1896.

27.ª Será fixado o numero e postos dos officiaes precisos para o exercicio das diversas commissões militares em cada uma das provincias ultramarinas.

28.ª Os officiaes que servirem nas provincias ultramarinas, a não ser nas tropas de 1.ª linha ou nas commissões a que se refere a base antecedente, serão collocados fóra do quadro.

29.ª Qualquer vacatura que se der nos quadros dos officiaes das tropas de 1.ª linha ou no das commiss5es no ultramar, a que se refere a base 27.a, excepto no posto de alferes, será preenchida por algum official do mesmo posto que voluntariamente se offereça, e se nenhum se offerecer,; será chamado e promovido o official mais antigo do posto immediatamente inferior, qualquer que seja a situação em que se ache. Se este official não desejar servir no ultramar, ou for pela junta considerado incapaz de tal serviço, será chamado o segundo, e assim successivamente, até haver um que acceite, o qual será logo promovido, não podendo os mais antigos considerarem-se preteridos por esta promoção.

Na falta de voluntarios no quadro dos generaes de brigada para o exercicio do commando da força armada, era qualquer dos tres governos geraes: Angola, Moçambique e India, será promovido ao posto immediato o coronel mais antigo no quadro geral ou algum dos immediatos d'esse quadro, nos termos prescriptos para os officiaes dos outros postos.

30.ª Os officiaes que forem servir nas tropas de 1.ª linha, ou nas commissões militares no ultramar, nos termos da base antecedente, serão obrigados a servir ali effectivamente por um praso fixado entre dezoito e vinte e quatro mezes, conforme o ponto para onde forem servir.

31.ª Será revista a tabella de vencimentos dos officiaes que servirem no ultramar, devendo esses vencimentos variar conforme o ponto em que o official estiver.

32.ª Dos officiaes que actualmente fazem parte dos quadros do exercito do ultramar serio reformados os que não tiverem a precisa capacidade physica ou moral, e os outros serão empregados em commissões para cujo exercicio estejam devidamente habilitados.

Por cada duas vagas que occorrerem nos referidos quadros, até sua completa extincção, será preenchida a primeira por um dos officiaes que d'elles continuarem a fazer parte, e a outra por um official do exercito da metropole, nos termos da base 29.ª

33.ª Quando as circumstancias o exigirem, poderão destacar para o ultramar unidades completas do exercito da metropole, fixando-se uma escala invariavel para a nomeação d'estes destacamentos, que serão rendidos em prasos curtos e determinados, conforme o sitio onde forem prestar serviço.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos dignos pares do reino, 22 de junho de 1897. = Luiz Augusto Pimentel Pinto.

O sr. Presidente: - Vae ler-se agora o requerimento mandado para a mesa pelo digno par o sr. Pimentel Pinto.

Leu-se na mesa e mandou-se expedir o requerimento, que é do teor seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da guerra, me sejam enviados com urgencia os documentos seguintes:

1.° Copias de todas as consultas enviadas á secretaria da guerra pelo conselho de instrucção da escola do exercito, propondo alterações no artigo 1.° do decreto de 23 de agosto de 1894, que reorganisou a escola, ou ao artigo 1.° da lei de 13 de maio de 1896;

2.° Copias dos relatorios enviados á mesma secretaria pelos commandantes da escola, sobre as vantagens ou inconvenientes da actual organisação, tanto em relação ao aproveitamento escolar dos alumnos, como em relação á sua disciplina;

3.° Copia da consulta enviada á secretaria da guerra pelo conselho de instrucção, acompanhando o projecto do regulamento da escola, que depois foi publicado na ordem do exercito n.° 20, de 1896;

4.° Copia do officio do ministerio da guerra, mandando o conselho de instrucção consultar sobre a reducção dos cursos preparatorios para as armas de infanteria e cavallaria;

5.° Copias authenticas das actas de todas ás sessões do conselho, em que foi discutido o projecto de regulamento da escola, e bem assim d'aquellas em que ultimamente, por effeito do officio a que o numero antecedente se refere, se tratou no mesmo conselho das alterações a propor na lei organica da escola;

6.° Copias de todas e quaesquer propostas apresentadas n'aquellas sessões por algum dos membros do conselho de instrucção;

7.° Nota dos alumnos matriculados na escola do exercito, nos annos lectivos de 1894-1895,1895-1896 e 1896-1897, indicando-se na mesma nota os cursos que frequentaram e as habilitações preparatorias com que foram admittidos á matricula no curso geral;

8.° Um exemplar de cada um dos discursos lidos na escola por occasião da distribuição de premios aos alumnos nos ultimos quatro annos lectivos.

Sala das sessões da camara du, dignos pares do reino, 22 de junho de 1897. = Pimentel Pinto.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o digno par o sr. conde de Lagoaça.

O sr.. Conde de Lagoaça: - Quando pediu a palavra, ainda não tinha entrado na sala o sr. presidente do conselho, e, portanto, não era sua intenção dirigir-lhe qual-

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quer pergunta; mas como está presente, desejava que s. exa. dissesse, se nisso não houver inconveniente, pois são melindrosas as questões que se prendem com, a ordem publica - desejava que s. exa. dissesse, repete, seja chegou o relatorio do sr. governador civil do Porto ácerca dos factos ali occorridos por occasião do ultimo comicio n'aquella cidade.

Parece-lhe que não podem tel-o na conta de impaciente, porque já ha oito dias que o sr. presidente do conselho disse que aguardava a remessa d'aquelle documento.

Deposita muita confiança no sr. presidente do conselho, e, portanto, espera que s. exa. ha de proceder, se não procedeu já, em harmonia com o que for mais justo e conveniente; no entretanto aguarda o que s. exa. possa dizer-lhe.

Tinha pedido a palavra para se dirigir ao sr. ministro da marinha.

A camara deve lembrar-se de que perguntou a s. exa., na sessão antecedente se considerava era vigor o decreto chamado travão, e s. exa. respondeu-lhe, sem restricções, que effectivamente considerava em vigor esse decreto.

Perguntou depois se s. exa. encarava a questão da carta organica da companhia de Moçambique e a da prorogação de praso como offensa ao alludido decreto, e s. exa. respondeu que, em consciencia, entendia que não.

Vae referir-se a outro ponto, mas não o descutirá agora com a largueza com que promette apreciar todas as questões, que affectem os interesses nacionaes e a administração publica.

É evidente que os conhecimentos e a competencia do sr. Barros Gomes dão direito a esperar que a passagem de s. exa. no governo será assignalada por actos de incontestavel utilidade.

S. exa. tem dotes e merecimentos para ser um bom ministro da marinha e ultramar.

Respondeu-lhe o illustre ministro, na sessão passada, que considerava o decreto chamado travão em vigor; no entretanto viu no Diario o que passa a ler.

(Leu.}

Parece-lhe que estas duas concessões são contrarias a esse decreto.

S. exa. disse que, em sua consciencia, entendia que não tinha infringido esse decreto; mas ao orador afigura-se que tal modo de ver está em opposição com os factos.

Respeita muito a consciencia do sr. Barros Cromes; mas tambem respeita muitissimo a consciencia da camara, e para ella appella.

(Continuou lendo.)

Pergunta, pois, ao nobre ministro como é que s. exa. justifica ou explica as duas concessões de 3 de maio, e ambas publicadas na folha official?

O orador apresenta ainda algumas considerações no sentido de mostrar que essas duas concessões não só offendem o decreto travão, como contrariam a carta constitucional e o acto addicional.

Sente não ver presente o sr. ministro das obras publicas, e por isso pede aos membros do governo que estão presentes o favor de communicarem áquelle seu collega que o orador deseja o comparecimento de s. exa. n'esta camara para discretear sobre a questão do operariado.

É necessario resolver esta e outras questões de uma maneira inteiramente satisfactoria, e não foi para outra cousa que os actuaes membros do governo acceitaram a missão que lhes foi confiada.

Termina, mandando para a mesa os seguintes requerimentos.

(Leu.)

Requerimentos

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, me sejam enviados os seguintes esclarecimentos:

1.° Qual o numero de operarios existentes em 25 de fevereiro do corrente anno nas obras publicas de Lisboa, e qual a despeza semanal com os respectivos salarios n'aquella epocha.

2.° Qual o numero de operarios actualmente existentes nas referidas obras, e qual a despeza semanal com os respectivos salarios.

3.° Qual o numero de operarios despedidos em virtude do disposto no n.° 3.° do decreto de 25 de fevereiro do corrente anno, até á presente data.

4.° Qual o numero de operarios mandados para as obras publicas das provincias por virtude do disposto no n.° 6.° do referido decreto desde a data da sua promulgação até ao presente, e bem assim o numero de operarios que, pela inobservancia do preceituado no n.° 6.° do mesmo decreto, tenham sido despedidos até ao presente.

Sala das sessões da camara dos pares, 22 de junho de 1897. = Conde de Lagoaça, par do reino.

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, me seja enviada copia do parecer da junta consultiva do ultramar sobre as novas concessões feitas á companhia de Moçambique, e bem assim copia de qualquer parecer em separado que, porventura, tenha sido elaborado ácerca do referido assumpto.

Sala das sessões, em 22 de junho de 1897. = Conde de Lagoaça.

Mandaram-se expedir.

(O discurso a que este extracto se refere será publicado na integra, e em appendice, quando o orador haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Sr. presidente, por lapso da secretaria do reino deixou .de se incluir o nome do sr. conselheiro Hintze Ribeiro na proposta que apresentei a esta camara, na ultima sessão, para que alguns dignos pares possam accumular as funcções legislativas com as que exercem em logares dependentes do ministerio do reino. Suppro hoje este lapso, pedindo a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se consente que o sr. conselheiro Hintze Ribeiro possa accumular as funcções que exerce no supremo tribunal administrativo com as funcções legislativas.

Faço igual pedido em relação ao digno par sr. Ferreira de Novaes, secretario do governo civil de Lisboa.

Agora:, em nome do sr. ministro das obras publicas, mando para a mesa a seguinte proposta.

(Leu.)

Mando igualmente para a mesa, por parte do sr. ministro da fazenda, a seguinte proposta, que passo a ler.

(Leu.)

Permitta-me agora v. exa. que eu, aproveitando a occasião, responda á pergunta que me foi feita pelo meu nobre amigo o digno par sr. conde de Lagoaça.

Só hoje recebi o relatorio que me foi enviado pelo sr. governador civil do Porto ácerca das occorrencias que se deram no comicio ultimamente realisado n'aquella cidade.

Devo dizer ao digno par que ainda não pude examinar esse relatorio. Logo que o tenha examinado, o governo ha de proceder contra quem quer que seja, se entender que assim o deve fazer.

Creia o digno par que o governo não faltará ao cumprimento do seu dever.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Vou consultar a camara sobre as propostas verbaes que o sr. presidente do conselho acaba de fazer, sobre as que mandou para a mesa por parte dos seus collegas os srs. ministros da fazenda e o das obras publicas.

Os dignos pares que permittem que os dignos pares os srs, Hintze Ribeiro e Ferreira; do Novaes accumulem as

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funcções legislativas com as que exercem dependentes do ministerio do reino, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

Vae ler-se a proposta que o sr. presidente do conselho mandou para a mesa por parte do seu collega o sr. ministro da fazenda.

Leu-se na mesa e foi approvada a seguinte

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara permissão para que possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as dos seus empregos ou commissões os dignos pares:

Alberto Antonio de Moraes Carvalho, vogal da junta do credito publico.

Antonio Emilio Correia de Sá Brandão, presidente da commissão nomeada por decreto de 21 de junho de 1894.

Antonio de Serpa Pimentel, presidente do tribunal de contas.

Arthur Hintze Ribeiro, vogal do mesmo tribunal.

Augusto César Barjona de Freitas, idem, idem.

Conde de Restello, presidente do conselho fiscal da caixa geral de depositos e instituições de previdencia.

Frederico de Gusmão Correia Arouca, vogal do tribunal de contas.

Julio Marques de Vilhena, governador do banco de Portugal.

Luiz Augusto Pimentel Pinto, vogal da junta do credito publico.

Thomás Antonio Ribeiro Ferreira, presidente da mesma junta e vogal do tribunal de contas.

Visconde de Asseca, sub-inspector dos tabacos.

Visconde de Athouguia, recebedor chefe da 3.º secção de arrecadação e fiscalisação de Lisboa.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 15 de junho de 1897. = Frederico Ressano Garcia.

O sr. Presidente: - Vae ler se a outra proposta que diz respeito ao ministerio das obras publicas.

Leu-se na mesa e foi approvada a seguinte

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo de Sua Magestade pede á camara permissão para que possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as dos empregos ou commissões dependentes do ministerio das obras publicas, commercio e industria, os dignos pares:

Francisco Simões Margiochi.
Conde de Bertiandos.
Conde de Ficalho.
Luiz A. Rebello da Silva.
Conde de Valbom.
Conde de Linhares.
José Maria dos Santos.

Secretaria d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, em 15 de junho de 1897. = Augusto José da Cunha.

O sr. Ministro da Marinha (Barros Gomes): - Nem sempre lhe será possivel responder de prompto a qualquer pergunta que lhe faça um ou outro membro do parlamento, porque póde não estar habilitado a dar uma resposta immediata. Reserva-se, pois, o direito de lhe ser concedido o tempo necessario para se preparar quando assim acontecer.

Crê na boa fé com que o digno par lhe fez a sua pergunta. Do que não tem idéa é de ter fallado em consciencia a proposito da questão a que o digno par se referiu na ultima sessão.

O que trata de saber-se é se o governo obedeceu ou não ao que está estabelecido na lei?

Julga que obedeceu.

Toda a argumentação .do digno par se funda n'um lapso,

Na nossa legislação tão vasta os diplomas succedem-se continuamente: leis novas, que foram promulgadas ha poucos annos, teem sido revogadas e alteradas. Daqui resulta ser difficilimo o perfeito conhecimento da legislação vigente.

A este facto se deve attribuir o desconhecimento do digno par de um diploma que partiu de uma administração a que pertenceu o meu illustre collega o sr. presidente do conselho, referendado por um distincto homem de estado, um dos mais eminentes homens de letras do nosso paiz, o sr. Luiz Augusto Rebello da Silva.

Foi s. exa., como ministro da marinha, quem promulgou a lei em virtude da qual foram feitas as concessões a que se referiu o digno par conde de Lagoaça.

O decreto travão não se refere em cousa alguma á legislação que regula as concessões mineiras ou industriaes no ultramar.

A lei do sr. Rebello da Silva é a que está ainda hoje em vigor.

O decreto travão veiu pôr termo ao abuso que se estava fazendo de umas certas e determinadas concessões, mas exceptuou as mineiras. Para se ver isto basta ler o § 1.° desse decreto, que diz:

(Leu.)

Onde é que s. exa. vê aqui qualquer disposição que Be refira ás concessões mineiras?

Nem no ministerio da marinha nunca se poz em duvida este facto, teem-se feito sempre estas concessões, não se entendendo nunca que o decreto abrangesse quaesquer concessões mineiras.

A lei do sr. Rebello da Silva que regula estas concessões não manda ouvir a junta consultiva, portanto procedeu segundo a legislação que está em vigor. Fel-as dentro da esphera das suas attribuições, aã certeza de que não exorbitava da lei.

(O discurso do digno par, a que este extracto se refere, publicar-se-ha na integra, quando s. exa. se dignar rever as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Hintze Ribeiro.

O sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - Sr. presidente, julgo que o sr. Jeronymo Pimentel pediu que lhe fosse reservada a palavra para quando estivesse presente o sr. presidente do conselho. Se assim é, não desejo antecipar-me ao sr. Jeronymo Pimentel e peço a v. exa. que me reserve a palavra para fallar depois de s. exa.

O sr. Presidente: - Tem e palavra o digno par o sr. Jeronymo Pimentel; todavia na ordem da inscripção, era a v. exa. que pertencia a palavra.

O sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - Em todo o caso v. exa. já a deu ao sr. Jeronymo Pimentel.

O sr. Jeronymo Pimentel: - V. exa. concede-me a palavra? Tantas vezes a pedi, até que a final v. exa. ma concede.

O sr. Presidente: - Tem, v. exa. a palavra.

O sr, Jeronymo Pimentel: - É para mim desagradavel! levantar nesta casa questões politicas, e sobretudo questões de politica mais ou menos irritante.

Fugi sempre d'isso, mesmo quando esta camara, pela sua anterior organisação, tinha um caracter mais accentuadamente politico.

E se hoje me afasto d'esse meu proposito, é porque a tanto me obrigam as circumstancias; é porque entendi

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que n'esta camara, onde sempre e em todas as occasiões encontraram echo os protestos contra os ataques á liberdade, as offensas á lei, e as violencias de todos os governos, tinham cabimento as explicações que vou pedir, e porventura os protestos que julgue dever fazer.

Sr. presidente, corre accesa a lucta nos circulos, onde pela resolução do venerando tribunal de verificação de poderes se procede a novas eleições. Com surpresa minha, com espanto de toda a gente, e de certo com admiração de estranhos, que conhecem as desgraçadas circumstancias do nosso paiz, vimos a attitude que o governo tomou nas passadas eleições em que se praticaram factos que não estavam em harmonia com as suas anteriores affirmações, nem com as condições do paiz, nem ainda com os precedentes ha muito estabelecidos na nossa politica.

Quando este governo assumiu as rédeas do poder, publicou oficialmente um programma politico-administrativo no relatorio que precedeu o decreto que dissolveu a camara dos senhores deputados, e ahi, depois de appellar para o patriotismo dos bons cidadãos, e dos diversos agrupamentos partidarios que no intuito de facilitar pela sua parte esse concurso de dedicações adoptaria uma politica de tolerancia, que permittisse, sem quebra de principios, a concentração dos esforços de todos n'uma obra que a todos interessava.

E como cumpriu elle esse programma? Como se desempenhou das promessas feitas?

Todos o sabem; não é mister eu dizel-o, porque faliam por mim os factos praticados nas ultimas eleições, e que se estão repetindo agora nas supplementares.

Houve ingenuos que, esquecidos das tradições do partido progressista, acreditaram na sinceridade d'aquellas palavras, que pareciam dictadas pelo bom senso, porque deve estar na consciencia de todos e no patriotismo de cada um a convicção de que as lamentaveis condições do paiz impunham a necessidade de tréguas nas paixões politicas, de uma acalmação nas luctas partidarias.

Não seria o meu partido, não seriam os meus amigos politicos que faltariam a esse appello, quando elle fosse sincero; posso affirmal-o.

Não quero dar largas ás minhas considerações, nem interpellar o governo por agora sobre o modo como procedeu nas eleições que se realisaram no dia 2 de maio; apenas desejo limitar-me ao assumpto que me levou a pedir a palavra n'esta occasião.

É natural desejo dos governos fazer vingar as candidaturas dos seus amigos; e o nosso systema politico, ou, melhor, a nossa tolerancia, permitte, o que não devia ser, que se empreguem uns certos meios para a realisação desse desejo. Esses meios, porem, teem um limite imposto pela lei que deve garantir a liberdade do suffragio e respeitar a independencia- do eleitor; limite traçado pelo acatamento da opinião e até pelos nossos costumes estabelecidos por um certo aperfeiçoamento do nosso mechanismo constitucional.

Mas, sr. presidente, com relação á eleição supplementar de Braga, o governo tem empregado meios de tal fórma violentos que ultrapassam todos os limites; tem praticado! actos que merecem a mais aspera censura.

Não é meu proposito investigar os intuitos do governo,,1 principalmente do nobre presidente do conselho, n'esta: questão da eleição de Braga; não tenho o direito de prescrutar os motivos que o impellem a empregar meios e processos tão extraordinarios para vencer aquella eleição.

Não os quero attribuir a desforço contra o tribunal de verificação de poderes que annullou a primeira eleição; muito menos ainda os quero explicar por um desafogo de odios politicos e pessoaes contra o candidato opposicionista, porque isso seria offender o caracter de s. exa.; tambem os não quero lançar á conta do seu proposito em liquidar antigas disputas entre os seus velhos e novos amigos da localidade; prefiro antes explical-os por um desejo pessoal ou por interesse politico em que venha á camara o candidato governamental por aquelle circulo.

Não pretendo tambem neste momento occupar-me dos factos que precederam ali a eleição de 2 de maio; já foram julgados por um poder independente, e não está nos meus principios, nem do partido a que me honro do pertencer, fazer a critica dos diversos poderes politicos, a não ser do executivo, que pela natureza das suas funcções está sujeito ao exame e julgamento do poder legislativo.

Se eu podesse acreditar o que dizem alguns jornaes, e asseveram mesmo sem reserva alguns amigos do governo d'aquella localidade, podia suppor, em vista dos factos que se estão dando, que era verdadeira a affirmação do que o sr. presidente do conselho auctorisára o seu delegado naquelle districto a empregar todos os meios, mesmo, os mais violentos, para vencer a eleição.

Não o creio, porque isso seria descrer de tudo; seria attribuir ao governo o proposito de escrever o epilogo da historia das nossas liberdades e cavar a ruina das instituições e do paiz. É por isso que não quero ainda d'este momento tornar o governo responsavel pelo que lá estão fazendo o seu delegado e os seus amigos.

Aquelle trabalha pro domo sua; trabalha, por seu irmão, que é o candidato governamental, e é por isso que ainda não veiu occupar o seu logar na camara dos senhores deputados, continuando á frente d'aquelle districto, porque de mais ninguem quer confiar o vencimento de uma causa em que estão empenhados os seus affectos fraternaes.

Os seus amigos politicos querem mostrar a sua valia e justificar a preferencia que lhes deu o sr. presidente do conselho na politica local, pondo de parte os seus velhos partidarios, tão illustres e honrados, como cheios de largos serviços ao seu partido.

Que as auctoridades lá ameacem; que ellas e os amigos do governo usem de todos os meios de corrupção; que façam offerecimentos de empregos, despachos de parochos, livramento de recrutas, melhoramentos publicos, dissolução de mesas de irmandades e da camara municipal; emfim, tudo quanto lhes suggerir a sua imaginação fertil em promessas, não deitarei isso a cargo da responsabilidade do governo.

Mas ha factos que são da exclusiva responsabilidade do governo..

A esses é que eu me vou referir; por elles é que tenho de lhe pedir contas desde já:

Não censuro o governo pelas promessas feitas, e não sei se pelas ordens dadas para a continuação da estrada de Braga a Chaves.

Por esse facto só mereceria os meus agradecimentos, como interessado que sou em tudo o que possa concorrer para fomentar a riqueza das provincias do Minho e de Traz os Montes, porque se a esta me liga o berço natal, aquella me prendem as minhas mais sinceras affeições, e a ambas os interesses que lá tenho.

Seria aquelle acto do governo motivo para os meus mais cordiaes agradecimentos, se aquillo não fosse uma especulação eleitoral. É um laço com duas pontas, prendendo uma a Braga e outra a Chaves, onde tambem a lucta corre ardida, com que se pretende assim apanhar a, boa fé d'aquelles povos; mas parece-me que se enganam, porque já não ha boa fé que se deixe illudir com essas bandeirolas eleitoraes.

Hontem, sr. presidente, cheguei a julgar que estava em Braga, ou que então a sua burocracia tinha sido transgrida para a capital por algum ukase do governo, que eu desconhecia.

Era o delegado do thesouro, o director das obras publicas, o visitador do sêllo, o professor da escola industrial, o desenhador das obras publicas, o recebedor do concelho, o aspirante de fazenda, e não sei quantos mais funcionarios publicos d'aquella capital do Minho.

Cheguei a perguntar se já cá estavam tambem os

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srs. arcebispo primaz, juiz de direito e o coronel de infanteria n.° 8; creio que eram estes apenas os que faltavam!

Ainda não estavam; mas é de esperar que um aviso régio, ou outro diploma, que. melhor nome deva ter, faça chegar aqui o sr. arcebispo, não para vir tomar o seu logar n'esta camara, mas para o governo ver se consegue que elle possa influir na eleição.

Como de certo nada pôde conseguir d'elle o delegado do governo naquelle districto, que me consta o procurara não sei se para o ameaçar, se simplesmente para lhe estranhar que a maior parte do clero naquelle circulo votaria no candidato da opposição, talvez o governo pense em conseguir que aquelle santo prelado, sempre e em todos os tempos completam ente alheio ás luctas partidarias, vá agora influir a favor da eleição do candidato governamental.

O juiz de direito é provavel que não seja chamado aqui, porque ha muito que o partido progressista não olha bem o poder judicial. Agora a auctoridade militar, essa é que é muito preciso que venha aqui, para receber directamente do governo as convenientes instrucções para o dia da eleição.

Mas para que foi tudo isto; este chamamento aqui de diversos chefes de serviços naquelle districto? Sem duvida por causa da eleição e só por causa d'ella.

Perguntar-me-ha o governo se não tem o direito de chamar aqui os seus empregados para tratar com elles assumptos de serviço publico.

Não posso negar-lh'o; o que posso é dizer-lhe que é estranhavel que elles sejam desviados pelo governo do exercicio das suas funcções e que venham para aqui simplesmente pelo facto de uma eleição que o governo pretende ganhar a todo o custo.

Poderá ainda perguntar-me quem me disse a mim que elles vieram aqui por esse motivo?

Dizem-no os factos e as illações que é licito d'elles tirar.

Com relação ao visitador do sêllo, por exemplo, quem me deu a conhecer o motivo da sua vinda aqui foi o proprio sr. ministro da fazenda, por um telegramma que mandou á associação commercial de Braga, e que veiu publicado nos jornaes. Aquella corporação havia-se queixado ao sr. ministro da fazenda de que aquelle funccionario, no desempenho e cumprimento do seu dever, estava levantando processos contra estabelecimentos de vendagem, que estavam sujeitos ao imposto do sêllo pelas licenças que eram obrigados a tirar, e a associação commercial pediu providencias, que o governo não demorou, respondendo-lhe em telegramma que daria ordens immediatas para que aquelle empregado moderasse o seu zêlo pelo serviço publico.

Ora, para que essas ordens fossem mais instantes, era preciso que elle viesse aqui para ouvir directamente do ministro as necessarias recommendações, porque o governo agora já não precisa de dinheiro; emquanto as falladas medidas de fomento não produzem os seus resultados, espalhando a riqueza por toda a parte, temos dinheiro a rodos que nos hão de trazer os variados emprestimos, em que ha muito pensa o sr. ministro da fazenda; agora, n'este momento, do que carece o governo é de votos em Braga.

Mas não foi só este empregado que foi chamado a Lisboa; não foram só aquelles, como o director das obras publicas e o delegado do thesouro, que recebem directamente- as ordens dos directores geraes; foram chamados outros, e que ainda aqui estão, com quem os directores geraes se não correspondem, e a quem as ordens de serviço são transmittidas pelos seus respectivos chefes. A um professor da escola industrial qualquer ordem é transmittida pelo chefe da repartição ao inspector da respectiva circumscripção, por este ao director da escola, que por sua vez a communica ao professor. Agora pozeram-se de parte todos esses tramites; o caso era urgente, e o professor foi chamado directamente pelo chefe da repartição.

Tambem aqui está, chamado telegraphicamente, o recebedor do concelho a fim de receber as ordens do governo.

Foi um caso novo; um recebedor do concelho, que está sob a immediata direcção do delegado do thesouro e é este quem lhe transmitte as ordens sobre objectos de serviço, é chamado a Lisboa para tratar de negocios com o ministro!

Eu teria a agradecer ao sr. ministro da fazenda o ter-me poupado a uma viagem incommoda e sobre tudo neste tempo calmoso, proporcionando-me ensejo de ver e abraçar aqui um irmão, que tanto prezo, só esse prazer não fosse aguado pela violencia que elle soffreu, sendo obrigado a vir aqui precipitadamente, deixando gravemente enferma sua esposa.

Se aponto esta circumstancia do parentesco não é porque ella venha aggravar o facto; que importava que elle fosse meu irmão, irmão d'este ou d'aquelle, ou mesmo que não tivesse irmãos? Aponto-o apenas para mostrar que fallo do facto com conhecimento de causa.

Mas foi para objecto de serviço que elle foi chamado á capital; serviço tão urgente e tão transcendente, que lhe não foi communicado pelo delegado do thesouro nos termos da lei?

O director geral que em nome do ministro o chamara aqui, nenhumas instrucções de serviço lhe deu, porque não se tratava do serviço publico.

O caso era tão grave, que só com o ministro se podia tratar. Foi ameaçado e tratado por modos tão rudes pelo sr. ministro da fazenda, improprios de um homem que se senta n'aquellas cadeiras.

Mas não é para admirar, que é o seu feitio; resultado, talvez, de um vicio do sangue, agitado agora por não lhe correrem de feição os seus planos financeiros.

Os grandes crimes praticados pelo recebedor d'aquelle concelho são de escrever n'um jornal e pedir votos para a opposição.

Sr. presidente, não sabia que era crime previsto e punido no codigo progressista escrever em jornaes um empregado dependente do ministerio da fazenda. E ainda bem que o vigoroso jornalista o sr. José de Alpoim, tendo a previsão do que havia de acontecer n'estes tempos que vão correndo, passou d'aquelle ministerio para a procuradoria geral da corôa, senão a estas horas ou a imprensa tinha perdido tão distincto collega ou o ministerio da fazenda ficaria privado dos intelligentes serviços d'aquelle distincto funccionario.

Mas estejam de sobre aviso os nossos collegas, os srs. conselheiros Antonio de Serpa, Thomaz Ribeiro, ou outros quaesquer que sendo jornalistas e empregados dependentes do ministerio da fazenda correm grave risco de cair nas censuras do sr. ministro da fazenda.

Segundo as suas doutrinas qualquer empregado dependente d'aquelle ministerio, desde o mais alto, como um membro do tribunal de contas, até ao mais humilde, como um. recebedor de concelho, não póde escrever na imprensa que não seja a ministerial.

Mas, sr. presidente, discutida a hypothese e apreciado o facto do horrivel crime de que é accusado o recebedor do concelho de Braga, direi a v. exa. com toda a franqueza e Verdade que esse recebedor nunca foi jornalista e apenas collaborou ha annos n'um jornal O Regenerador, que ha muito deixou de se publicar em Braga.

Mas não está n'isto só o seu crime. O recebedor do concelho de Braga recebe em sua casa os meus amigos e pede-lhes os votos. Não sei em que lei se funda o sr. ministro para obstar a que um empregado peça votos. Talvez queiram invocar o artigo 136.° da lei eleitoral. Mas ahi e só aos empregados que estiverem nas condições ali prescriptas, o que se prohibe não é pedir votos- é angariar votos, o que é cousa differente. Mas eu affirmo a v. exa. que elle nem sequer pediu votos, nem tinha a quem os pedir. Esses votos que tanto incommodam o governo, são meus, são dos meus amigos politicos, são dos cavalheiros que apoiam dedicadamente o candidato da opposição.

Se um empregado publico que é inellegivel para depu-

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tado não póde pedir votos, eu e v. exa., que não podemos ser deputados, se pedirmos votos estamos incursos n'essa penalidades que o codigo progressista inventou.

Pois, sr. presidente, eu sou um réu confesso; tenho pedido votos, hei de pedir votos, e se isto é um crime o governo que me applique as penas que elle conhece.

Tambem ahi está, tambem foi chamado a Lisboa um aspirante de fazenda, antigo empregado, zelosissimo e intelligente, da junta geral e que foi administrador do concelho da ultima situação. Esse estava doente e no. goso de licença ha mais de um mez e até tinha estado ausente de Braga por bastante tempo.

Pois, sr. presidente, nem esse escapou! Ahi está e estará não se sabe até quando, porque eu vejo que o governo, sem respeito pelo artigo 137.° da lei eleitoral que expressamente prohibe que toda a auctoridade, qualquer que seja a sua categoria, possa afastar os eleitores do seu domicilio para não votarem sob qualquer pretexto, ainda mesmo por motivo de serviço publico, o governo, esquecendo essa disposição, parece que quer afastar da uma os cidadãos empregados publicos a que ha pouco me referi.

Mas, sr. presidente, é prohibido ao empregado publico trabalhar em eleições; mas se trabalhar a favor do governo, tal prohibição não existe!

Como se trata de recebedores de concelho, aponto apenas um que é o recebedor do concelho de Villa Real e que é ali governador civil substituto e1 sub-chefe do partido progressista.

Esse sim, esse póde trabalhar a favor do governo. E é isto tudo em nome dos immortaes principios! E isto o que quer e o que faz o governo, que avoca para si o titulo de partido liberal e que se diz herdeiro das gloriosas tradições dos Passos, de Leonel Tavares e de outros homens que foram os apostolos da idéa progressista.

Sr. presidente, é por estes processos que se quer vencer a eleição de Braga, e é com expedientes de tal ordem que o governo procura manter as tradições de que se vangloria!

O paiz que julgue e avalie o procedimento do governo.

Ha um facto sobre que desejava chamar a attenção do sr. ministro da guerra.

Para as passadas eleições em 2 de maio, foram dadas umas determinadas ordens aos commandantes das forcas militares destacadas nas assembléas eleitoraes, que contrariam a letra e o espirito da lei eleitoral.

Essas forças só ficavam á disposição do presidente da mesa dentro do edificio da assembléa; fora dali só recebiam ordens dos delegados da auctoridade Administrativa. Ora v. exa., sr. presidente, que conhece perfeitamente a lei, sabe que ella não permitte que as forças militares, sob pretexto algum, possam entrar na assembléa nem estar na sua proximidade, demarcada por um raio de 100 metros, excepto a requisição do presidente da mesa.

Se a lei impõe penas severas aos commandantes das forças que não respeitarem esta disposição, como é que então se lhes ordenou o contrario?

Desejava saber se essa ordem emanou do ministerio da guerra, e se o sr. ministro titular d'esta pasta, está disposto a dar as mesmas instrucções com relação ás eleições que devem realisar-se no dia 27 do corrente mez.

Sr. presidente, pediu a palavra o meu particular amigo o digno par sr. Antonio de Azevedo, creio que para se referir aos factos que se estão passando no circulo de Chaves; portanto, visto que s. exa. ha de usar da palavra, dispenso-me de tratar d'este assumpto, como tencionava. Limito aqui as minhas considerações.

Lamento profundamente que o governo, esquecendo o que tinha affirmado quanto a, principios de tolerancia, queira vencer as eleições de Braga e Chaves por todos os meios, quaesquer que elles sejam.

Como já se inscreveu o sr. presidente do conselho, naturalmente para me responder, peço a v. exa. que se digne manter-me a palavra para depois das considerações de s. ex.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Dirá muito poucas palavras em resposta ás observações produzidas pelo digno par Jeronymo Pimentel.

Quanto ao exordio, quanto á parte propriamente rhetorica do discurso do digno par, ha de s. exa. dispensal-o de entrar em largas considerações por agora.

Essa discussão terá o seu cabimento natural noutro ensejo, e então ser-lhe-ha facil demonstrar que o digno par foi injusto em todas as arguições que dirigiu ao governo, e que as palavras de s. exa. por muito bem intencionadas, por- muito bem pronunciadas, carecem absolutamente de fundamento.

Quando s. exa. apresentar a prova dos factos a que se referiu, poderá o orador responder-lhe de um modo triumphante.

Por ora, o que ha a respeito das ultimas eleições e o resultado do julgamento do tribunal de verificação de poderes, e esse resultado dá que foram annulladas tres eleições de deputados em todo o reino.

N'uma eleição geral de 112 circulos, o facto de serem apenas annulladas tres eleições, prova que as violencias nem foram tantas, nem tão graves como ao digno par se afigurou.

No circulo de Braga acontece que a eleição não foi annullada por quaesquer violencias que houvesse ou se praticassem no acto eleitoral, porque nem lucta houve. As violencias a que o digno par se referiu em que o tribunal assentou o seu veredictum, foram anteriores á eleição.

O terem sido annulladas tres eleições em 112 circulos,, parece-lhe que não é um argumento muito eloquente em favor das apreciações do digno par.

Tambem se lhe afigura que o digno par fez mal em appellar para o tribunal de verificação de poderes, cujas decisões o orador é o primeiro a acatar e a respeitar, como deve.

Mas, posta de lado a questão das violencias eleitoraes, ponto este que póde ser discutido em occasião opportuna, desde já declara que não se arreceia de tal debate.

Quando elle vier, provará á camara que as eleições foram feitas com a maxima liberdade.

Disse o digno par que se praticaram violencias, e que houve corrupção para que o governo vencesse a eleição de Braga.

Deve dizer que essas asserções são inexactas.

Mantem o programma do governo.

Não fez nenhuma promessa, não auctorisou qualquer corrupção, e, pelo contrario, declarou sempre que taes actos nunca mereceriam o seu assentimento.

Apresenta esta declaração para desilludir os que porventura acreditem que o governo, directa ou indirectamente, auctorisa qualquer violencia ou acto de corrupção eleitoral.

Pretendeu o digno par insinuar que o governo tinha enormes desejos de ver recair os suffragios da eleição de Braga no candidato governamental.

Dirá que s. exa. labora num equivoco a tal respeito, porque, pessoalmente, desinteressa-se do resultado dessa eleição.

Não deixará de lhe ser agradavel o triumpho do cavalheiro que é apoiado pelos amigos do governo; mas não se entristecerá profundamente, nem tomará luto, se porventura esse triumpho couber ao candidato opposicionista. Põe inteiramente de lado questões pessoaes.

(Interrupção do digno par Jeronymo Pimentel.)

O Orador: - Tambem o digno par alludiu á estrada de Braga a Chaves.

Póde asseverar ao digno par que é completamente entranho a este assumpto.

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É possivel que o sr. ministro das obras publicas tenha ordenado a construcção dessa estrada, mas nisso obedeceu de certo a conveniencias de interesse publico, absolutamente alheias á questão eleitoral.

Tambem o digno par apontara o facto de terem sido chamados a Lisboa differentes funccionarios.

Parece-lhe que s. exa. não poderá negar o direito que ao governo assiste de chamar a Lisboa qualquer empregado para combinar com elle este ou aquelle assumpto de interesse publico.

Os funccionarios publicos teem plena liberdade de votar na pessoa que lhes mereça confiança, mas o que não podem é prevalecer-se da influencia inherente ao logar que occupam, para patrocinarem determinadas candidaturas.

É esta a doutrina que o governo sustenta.

Se são exactas as palavras do digno par, em relação ao recebedor de Villa Real, não tem duvida em affirmar que o governo ha de proceder, a respeito d'esse funccionario, com a energia com que procederá sempre que vir desacatada a lei.

O governo está disposto a assegurar o respeito á auctoridade e a manter a ordem em todas as circumstancias, punindo, se tanto for preciso, aquelles que faltarem ao cumprimento dos seus deveres.

Veiu o digno par referir á camara o que se passou numa conversação particular entre o sr. ministro da fazenda e o recebedor do concelho de Braga.

A não ser que haja na sua referencia o seu que de phantasia, afigura-se-lhe pouco invejavel a situação de um funccionario que vem publicamente expor o que se passa n'uma conversação particular.

Em todo o caso cre que o sr. ministro da fazenda não ameaçaria esse empregado pelo facto d'elle escrever num jornal.

Accentua que o governo nunca pediu aos empregados publicos que votassem n'este ou n'aquelle candidato; e, muito ao contrario, recommendou-lhes e recommenda-lhes que não se entremetiam em pugnas eleitoraes.

O governo não promove nem auctorisa. violencias. Se alguem as praticar, se alguem fizer promessas com o fim de extorquir votos, tal procedimento não merecerá nunca a approvacão do governo.

Se ao digno par constar a perpetração de actos menos em harmonia com as declarações do governo, estará o orador ao lado de s. exa. para castigar os delinquentes.

Conclue dizendo que transmittirá ao seu collega da guerra as considerações do digno par respeitante á presença de forças militares nos actos eleitoraes.

(O discurso, a que este extracto se refere, será publicado na integra, e em appendice, quando o orador tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - A hora já deu. Alguns dignos pares pediram a palavra para antes de se encerrar a sessão; devo, porém, dizer a s. exas. que eu não lh'a posso conceder sem previamente consultar a camara.

Os dignos pares que approvam que seja dada a palavra aos dignos pares que a pediram para antes de se encerrar a sessão tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Está prorogada a sessão.

Tem a palavra o digno par sr. Antonio Candido.

O sr. Antonio Candido: - Participo a v. exa. e á camara que se constituiu a commissão de resposta ao discurso da corôa.

Como relator, mando para a mesa o projecto de resposta ao discurso da corôa.

Leu-se na mesa e foi a imprimir.

O sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - Não posso responder ás considerações que acaba de apresentar o sr. presidente do conselho, em resposta ao digno par o sr. Jeronymo Pimentel, porque a hora e o regimento mo impedem, a não ser que v. exa. considere a sessão prorogada para todos os effeitos; mas, se isto não é assim, o regimento, prohibe que eu me refira ao sr. presidente do conselho, como era desejo meu, para vehemente verberar, não as expressões de s. exa., mas os factos que s. exa. está deixando praticar pelos seus delegados.

Reclamo tambem o inteiro cumprimento do regimento, que manda abrir as sessões ás duas horas. Se o sr. presidente do conselho estivesse no seu logar á hora indicada no regimento teriamos tempo para tratar d'estes assumptos.

Repito, pois, que reclamo da parte de v. exa. o inteiro cumprimento do regimento, para que isto se não repita.

Dito isto vou mandar para a mesa um projecto de lei.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

"Artigo 1.° São confirmadas e tornadas definitivas as concessões provisorias feitas por decreto de 21 de fevereiro de 1890 á associação protectora de meninas pobres, do uso de parte do convento do Santissimo Sacramento, d'esta cidade, igrejas e respectivas alfaias, de que está de posse, e á commissão administrativa do dispensario de creanças pobres, do uso de parte do convento de que tambem está de posse, para ali continuarem a funccionar, devendo reverter todos os seus bens aos proprios nacionaes, quando no todo ou em parte deixem de ter a applicação designada no referido decreto, cujas clausulas são mantidas.

"Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

"Sala das sessões, em 22 de junho de 1897. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Carlos Augusto Vellez Caldeira Castel-Branco."

Ficou sobre a mesa para segunda leitura.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. conde de Lagoaça.

O sr. Conde de Lagoaça: - Agradece as explicações do sr. ministro da marinha, mas vê-se obrigado a insistir nas considerações primitivamente apresentadas.

Como já deu a hora, aguarda ensejo opportuno para se referir mais desenvolvidamente a este assumpto.

(O discurso a que este extracto se refere será publicado na integra quando o digno par tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Como a camara concedeu auctorisação para fallarem unicamente os dignos pares que pediram a palavra para antes de se encerrar a sessão, dou por findos os trabalhos de hoje.

A primeira sessão terá logar quarta feira, 30 do corrente, e a ordem do dia será eleição de commissões.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e vinte minutos da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 22 de junho de 1897

Exmos. srs.: Marino João Franzini, Marquez da Graciosa; Condes, de Carnide, de Gouveia, de Lagoaça, de Magalhães, de Paraty; Viscondes, de Asseca, de Athouguia, da Silva Carvalho; Agostinho de Ornellas, Moraes Carvalho, Braamcamp Freire, Pereira de Miranda, Antonio de Azevedo, Antonio Candido, Sá Brandão, Serpa Pimentel, Telles de Vasconcellos, Arthur Hintze Ribeiro, Palmeirim, Vellez Caldeira, Cypriano Jardim, Sequeira Pinto, Hintze Ribeiro, Fernando Larcher, Margiochi, Barros Gomes, Jeronymo Pimentel, José Luciano de Castro, Abreu e Sousa, Rebello da Silva, Pimentel Pinto, Camara Leme. Luiz de Bivar, Mathias de Carvalho.

O redactor = Urbano de Castro.

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