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SESSÃO N.° 3 DE 9 DE FEVEREIRO DE 1906 21

vinhos, que teem a justificada fama de serem os melhores vinhos licorosos do mundo, só vendem para as tabernas e para aguardente por preço vil, pela barra do Porto exporta-se vinho em grande parte produzido em outras regiões, sem nenhuma das grandes qualidades do vinho do Douro. Tem-se feito esta affirmação na imprensa, nas reuniões havidas na Regua, em Alijó e no Porto, e é a base de um notavel trabalho publicado pela commissão executiva dos lavradores do concelho da Regua, com o titulo - Questão duriense - em que o problema do Douro é largamente debatido.

A affirmação aqui feita não poderá dizer-se que é prejudicial ao credito dos vinhos do Porto.

Nem o Governo viu n'isso inconveniente.

Ha poucos dias o Correio da Noite, orgão officioso do Governo, em um artigo que teve por titulo - Douro - dizia:

"Depois, como se esta serie de calamidades naturaes não fosse já por si bastante, juntou-se-lhe ainda um outro grande inimigo: a concorrencia desleal do commercio, a exportação de marcas privilegiadas do Douro applicadas aos vinhos de outras procedencias, e, para mais, lotados com alcool industrial, que, alem dos seus inconvenientes hygienicos, não liga chimicamente com o vinho, o que tudo redundava em descredito para aquelle tão justamente afamado producto da nossa industria, valorizado por uma tradição duas vezes secular.

O Sr. Presidente do Conselho, posto ao corrente das resoluções do commercio da Regua (restricção da barra do Porto á exportação, como vinhos licorosos, dos vinhos do Douro) approvou-as immediatamente, porque o seu alto espirito prediz bem quanto ellas teriam, ao mesmo tempo, de decoroso e de vantajoso para o paiz".

Já quando se instituiu a Real Companhia Vinicola do Norte de Portugal, nos comicios, na imprensa, em representações dirigidas aos poderes publicos, em discursos no Parlamento, repetidas vezes se fez a affirmação de que era preciso, indispensavel para o credito dos vinhos do Porto e para a manutenção dos seus mercados, que a marca de procedencia viesse evitar que, como de vinho do Porto e do Douro, se exportasse o que do Douro só tinha o nome.

Todavia, o assumpto é muito melindroso, devendo por isso somente ser apontado. Affirma-se que, nas 60:000 pipas de vinho licoroso que em cada anno são exportadas pela barra do Porto, não vão mais de 20:000 pipas de vinho do Douro. Não tenho elementos que me levem a este calculo com segurança. Esta affirmação foi feita, som contestação, pelo Sr. Alfredo. Pessanha. Correu mundo, em artigos de um dos mais lidos jornaes do norte do paiz, em monographia profusamente distribuida, e ninguem a contestou. Que é produzido no sul do paiz a maior parte do vinho exportado como licoroso pela barra do Porto, é uma verdade incontroversa. Nem é possivel occultal-a, nem mesmo podia ser occultada. Se isso não fora um facto, não havia motivo para o Douro reclamar, não havia justificação possivel para o Douro pedir que lhe defendam o que é seu. Não contestamos o direito dos que em Villa Nova de Gaia fazem lotação com vinhos do sul, e os exportam como vinho do Douro.

A lei de 7 de dezembro de 1865, que abriu a barra do Porto á exportação de todos os vinhos produzidos em territorio portuguez, legalizou lhes o proceder, sem que possam ser accusados de fraude, o que não impede que no Douro se reconheça a sua legitimidade em pedir que lhe revoguem uma lei que o asphyxia e que fere profundamente a economia geral do paiz.

É exacto. Aos vinhos do Porto baixos se deve em grande parte o descalabro em que vae a exportação. O mercado para os vinhos do Porto somente poderia manter-se quando elles vencessem toda a concorrencia pela sua superior e inigualavel qualidade, que exclusivamente se encontrava no vinho produzido na região duriense, O vinho do Porto, como é o da menor parte da exportação actual, faz-se de todo o vinho, do Alemtejo ou de Leiria, de Torres ou do Algarve, de Tarragona ou de Valencia, com vinhos italianos ou argelinos.

Desde que o vinho do Porto deixou de ser o primoroso vinho da região do Douro, para ser um vinho sem qualidade, tinto ou branco, e aguardentado, o mercado havia de reduzir-se necessariamente, por duas ordens de razões: l.ª, porque seria proscripto como um producto ordinario; 2.ª, porque o consumidor d'estes vinhos, em que a arte substitui a qualidade, procuraria os mais baratos, e, por mais baratos que os nossos sejam, não poderão descer ao preço baixo dos vinhos hespanhoes. Poderão dizer-nos que os mercados não recebem os vinhos bons e, por isso mesmo, caros. Tenho ouvido fazer esta affirmação, mas não me convenceu. Sempre que no Douro ainda apparecia algum vinho velho, de frasqueira, elle era vendido por preços elevados, de 500$000 a 1:000$0000 réis por pipa.

Quando em 1892, ligado ao negocio da prata, foram compradas no Douro cêrca de 16:000 pipas de vinho enviadas para as docas de Londres, ali os vinhos de qualidade foram desde logo vendidos por alto preço. Ficaram por muito tempo os vinhos baixos, de duvidosa qualidade, por signal que estes ultimos não tinham sido comprados a lavradores.

Os relatorios consulares incluem repetidas vezes o conselho ao commercio de que exportem vinhos do Douro, generosos e authenticos, que conquistem e mantenham o mercado pela sua inimitavel qualidade. É preciso preparar vinhos do Porto de segunda ordem, para preços compativeis com as exigencias de certos mercados? Creio bem que assim é; mas as terras altas da região duriense produzem esse vinho, de boa qualidade, em quantidade sufficiente, e por preços que ainda deixam larga margem de lucros aos negociantes.

Em Inglaterra, que é o principal mercado dos vinhos do Porto, pensa se que o vinho do Porto é o produzido na região do Douro. É preciso que os factos não abalem essa convicção, fazendo a prova de que por lei o vinho do Porto é produzido na região duriense.

Tenhamos sempre presente a sentença do tribunal de Dublin, pronunciada em março de 1905, salvo erro. Tratava se da queixa apresentada contra quem ao auctor vendera Porto, quando é certo esse vinho fôra adquirido pelo accusado como Tarragona-Porto. O julgador, apoiando-se na prova testemunhal, no parecer de peritos, no que a respeito de vinho do Porto vem em diversas publicações inglezas, declara que "por todos estes fundamentos tinha chegado á conclusão de que a palava - Porto - applicada a vinhos, e empregada sem outras palavras qualificativas, ou explicativas, era só applicavel a vinhos produzidos em Portugal e na região do Douro, e quando applicada a outros quaesquer vinhos constituia uma expressão commercial fraudulenta em face da lei".

E, todavia, o nosso commercio de vinhos do Porto, que sae para fora da região do Douro, arrisca-se a grandes desgostos. Já vimos o que succedeu e poderá acontecer em Inglaterra; vejamos agora o que poderá dar-se no Brasil, onde, recentemente, se publicou uma providencia destinada a prohibir a importação de qualquer producto no mercado com falsa indicação de procedencia.

Esse documento foi passado ao conhecimento do nosso paiz pelo importante jornal de Lisboa, a Epoca, a que, com tanta solicitude, promove e approximação politica e economica de Portugal com o Brazil.