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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 17

vastas regiões coloniaes no continente negro, não podia deixar de chamar a attenção publica para este subito e energico interesse da Europa pelas explorações africanas, que, assignalando um fim civilisador, compendiava, não obstante, todas as questões economicas e politicas que podem favorecer ou comprometter seriamente os grandes interesses da nossa terra.

Todos aqui pensâmos, sr. presidente, e todos estamos n'esse accordo, que não podemos isolar-nos deste movimento, quer elle tenha por objecto um proposito de interessado e cavalheiroso de civilisação, quer elle leve em mira as utilidades praticas e immediatas do alargamento do commercio e do progresso das industrias, pela procura de novos mercados de consumo e de extracção de materias primeiras.

No primeiro caso porque desmentiriamos as nossas tradições de primeiros civilisadores da Africa, e no segundo porque arriscariamos gravemente os nossos interesses coloniaes.

E a nação não quer nem o desaire da primeira hypothese nem a imprevidencia da segunda.

Sob a influencia estas idéas organisou-se a sociedade geographica de Lisboa, que está ha muito em correspondencia e convivio com as suas similhantes da Europa e da America, e trabalha activamente na propaganda dos conhecimentos geographicos é na acquisição de adhesões para esta grande obra de civilisação: estimulando d'esta arte as vocações para a continuação das explorações africanas, que começámos ha quatro seculos.

E foi ainda sob o imperio d'este pensamento que o governo a que v. exa. presidiu, ajudado dos conselhos e trabalhos da commissão central permanente de geographia, e só da cooperação d'esta corporação official, organisou e armou a primeira expedição scientifica-econoinico-politica, que em nossos dias partiu das nossas praias para os sertões de Africa. Idéa do governo que nos precedeu e nomeadamente do illustre ministro e meu amigo, o sr. João de Andrade Corvo, homem eminente, cuja elevada esphera intellectual e altos dotes de homem d'estado e de sciencia são incontestaveis e incontestados; (Apoiados.) mas idéa que apenas encontrámos iniciada, quando entrámos no governo, pela proposta de s. exa. ás côrtes sobre o credito destinado a subsidiar a expedição, proposta que estava sem seguimento na camara dos senhores deputados e de que promovemos a approvação nas duas casas do parlamento. É a lei que resultou d'esta proposta, datada de 12 de abril de 1877, que já tem a minha referenda e a do meu collega da fazenda, o sr. Carlos Bento, o primeiro acto official publico relativo á expedição de 1877. D'ahi por diante todos os trabalhos da sua organisação, do seu equipamento e das suas instrucções, caminharam sob o impulso do governo a que v. exa. presidiu, que fez partir a expedição e deu em nome da patria o abraço de despedida aos expedicionarios.

Offereceram-se para esta arriscada empreza alguns moços resolutos - poucos, muito poucos-, e os tres que entre os candidatos foram escolhidos pelo governo, por mim representado nas conferencias da commissão central permanente de geographia, a que sempre presidi, os srs. Serpa Pinto, Capello e Ivens, houveram-se com aquelle desinteresse e com aquella abnegação que caracterisaram sempre as grandes dedicações patrioticas, as altas virtudes publicas e privadas.

Não pediram dinheiro, não pediram honras, não pediram cousa alguma d'essas que poderiam lisonjear a cubiça ou a vaidade de almas vulgares. Lembraram apenas a protecção ás suas familias, no caso de morte, e um posto de distincção na sua carreira militar, no caso da expedição ter um exito glorioso.

O governo prometteu-lhes pela minha voz, e em portaria expedida á commissão central permanente de geographia, de 18 de maio de 1877, documento que foi publico e corre impresso, que proporia ás côrtes a satisfação dos seus desejos nas condições declaradas.

A promessa foi publica, e não levantou o clamor de ninguem. Pois era então a occasião de reparar em que a recompensa promettida aggravava os direitos de terceiro. Mas não; ninguem se lembrou então de acudir pela defeza da sua antiguidade. É que toda a gente viu e sentiu que um posto de distincção, que as leis e a consciencia de todos os povos concedem a um assignalado feito de armas no campo de batalha, cujo perigo quasi sempre passa rapido, não era demasiada remuneração para memorar a grande é rarissima coragem, tenaz, persistente por dias, por mezes e por annos, de affrontar todos os perigos, de combater com os homens, com as feras, com os elementos e com as privações de toda a natureza.

E hoje disputa-se o premio a estas qualidades! Eu pasmo, sr. presidente, de ver agora tão tardiamente pôr em duvida a rasão e a justiça do cumprimento da promessa! E não faço estes reparos ao governo, porque bem sabemos todos que era outro o seu sentimento, como aqui nos mostrou pelas suas palavras e pelos seus actos, e agrada-me sinceramente dar-lhe este testemunho.

Quererão pôr em duvida a gloria da expedição, condição do pedido e da promessa? Não podem. Qualquer, que seja o valor economico, politico ou scientifico dos trabalhos dos exploradores, e eu creio que é grande, nós os portuguezes é que não podemos admittir essa excepção.

Já lhes fizemos a apotheose por todas as fórmas de manifestação solemne usadas nas, sociedades modernas, nas praças, nas ruas, nos salões, na imprensa e na tribuna. Por toda a parte os temos acclamado benemeritos da patria. É tarde para recuar na devida recompensa.

Sr. presidente, deixando aqui registadas nos annaes parlamentares estas palavras, que serão as ultimas que tenciono proferir em publico ou em particular sobre a expedição africana de 1877, tenho satisfeito o meu fim. Agora só me resta congratular-me com o paiz, com v. exa., com a commissão central permanente de geographia, com os nossos collegas no governo, e com os illustres ministros nossos antecessores, pelo feliz exito da expedição que elles projectaram e nós realisámos, e que podemos apontar ao mundo, graças á, coragem e dedicação civica dos expedicionarios, como exemplo da energia, da constancia e do patriotismo do caracter portuguez.

E, finalmente, congratular-me tambem com os illustres expedicionarios, e de todo o coração, pelos ver restituidos á patria sãos e salvos, e affirmar-lhes do alto d'esta tribuna que lhes dou de boamente n'este projecto a medalha de oiro, já que lhes não posso dar o posto que lhes é devido.

Vozes: - Muito bem.

Q sr. Presidente: - Está extincta a inscripção. Vae votar-se o projecto na generalidade. Os dignos pares que o approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Está approvado. Vae passar-se á especialidade.

O sr. secretario, visconde de Soares Franco, leu o artigo 1.º

Q sr. presidente: - Está em discussão. Tem a palavra o digno par o sr. Corvo.

O sr. Andrade Corvo: - Sr. presidente, não venho impugnar o projecto, venho antes lembrar a historia d'elle ao governo, e alem d'isso agradecer as palavras benrevolas do meu amigo e collega o sr. Mello Gouveia, e confirmar tudo quanto s. exa. disse, pelo que o governo que v. exa. presidiu merece os maiores louvores. (Apoiados.)

A historia é curta, mas é instructiva, como disse já o digno par que me precedeu. Houve alguns individuos que emprehenderam fazer uma viagem scientifica no interior do continente africano e nos collocaram a par de outras nações que, não tendo possessões na Africa, têem tambem en-