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116 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

O sr. Presidente: — Vou lá satisfazer os desejos do sr. ministro da fazenda.

A deputação que ámanhã, pelas duas horas da tarde, deverá apresentar a Sua Magestade o autographo do projecto de lei que a camara ha pouco votou, será composta dos seguintes dignos pares:

Marquez de Thomar.
Carlos Bento da Silva.
Conde do Casal Ribeiro.
Marquez de Ficalho.
Antonio de Serpa Pimentel.
Conde de Valbom.
Augusto Cesar Barjona de Freitas.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): — Estranhou que o sr. Hintze Ribeiro se houvesse esquecido de todos os factos parlamentares que se deram relativamente ao traçado do caminho de ferro da Beira, Baixa. Disse que elle, orador, tinha mantido sempre a mesma opinião quanto a dever seguir o traçado pela margem direita do Tejo, por lhe parecer mais conveniente, mesmo sob o ponto de vista da estratégia. Já em 1883 ha via emittido no parlamento esta opinião, que impressionara o sr. Fontes a ponto d’aquelle illustre estadista consultar a commissão de defeza, á qual fôra de parecer que o traçado pela margem direita seria militarmente de vantagem incontestavel.

Tomando conta da pasta das obras publicas, elle, orador, consultara tambem a referida commissão, que confirmara inteiramente a antiga consulta.

Via-se, pois, que o sr. Hintze Ribeiro não tinha rasão para insistir no traçado pela margem esquerda, e que se elle, orador, havia conseguido importantes modificações no traçado, em conformidade com as consultas a que se referira, sem novos encargos para o thesouro, tinha feito inquestionavelmente um serviço ao paiz, pelo qual não devia ser censurado.

Obtivera concessões por parte da companhia real dos caminhos de ferro portuguezes, não obstante as circumstancias difficeis em que os argumentos do digno par, na sessão de 1885, o haviam deixado collocado. Procurara entender-se com a companhia, que se obrigara a levar o caminho de ferro á Covilhã, e a desistir de qualquer garantia de juro pelos kilometros em que o percurso ía ser augmentado.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, eu vou ser breve porque desejo dar logar a que o sr. Hintze falle hoje ainda.

Entretanto eu não posso deixar de usar da palavra para reforçar a minha argumentação e demonstrar que as asserções do sr. ministro das obras publicas são todas inexactas.

Sr. presidente, tudo quanto disse o sr. ministro das obras publicas poderá ser muito bem dito, muito bem ideado, muito bem composto, mas tem o .defeito de não ser verdadeiro, de ser. um sophisma transparente.

Bem desfiado tudo quanto s. exa. disse, chega-se ao resultado immediato, palpavel e incontroverso de que houve precipitação, incoherericia e reconsideração por parte do sr. ministro das obras publicas, declarando letra morta as suas portarias, que pareciam ter muita vida.

Sr. presidente, esta questão tem sido sempre a mesma. A companhia sustentou sempre os seus interesses no mesmo terreno; a reluctancia que oppunha hontem é a mesma que oppõe hoje; disse sempre que para levar o caminho de; ferro pela margem direita do Tejo e pela Covilhã era mister que o governo prescindisse do tunnel de 926 metros na serra de Grardunha, e não obstante o sr. ministro publicou aquellas duas frisantissimas portarias mantendo o tunnel.

N’esta conjunctura, sendo a questão sempre a mesma, não se tendo dado circumstancia alguma, que transtorne ou mude a questão em si, como é que o sr. ministro muda de opinião e reconsidera?

É preciso que s. exa., clara, precisamente, sem rodeios nem evasivas, explique este reviramento, pois as rasões que deu no fundo, em si, não têem valor.

Pergunto á camara se em boa consciencia póde alguem acreditar que haja uma companhia que zele tão pouco os seus interesses e os dos accionistas, que, para levar o caminho pela margem direita do Tejo e pela Covilhã, o que lhe custa sommas enormes, peça em troca para compensação uma variante que lhe custa mais cara, como acaba de affirmar e demonstrar o sr. ministro das obras publicas?!

Se isto é inconcebivel, incrivel até, pergunto á camara em boa consciencia se se poderá acreditar que haja alguma companhia tão destituida de senso, que não só faça obras dispendiosissimas em troca de uma variante que lhe custa mais cara, mas que vá ainda construir essa variante sem garantia de juro, sem subvenção, deixando ainda o rendimento da linha para attenuar os encargos geraes do estado?!!!

Sr. presidente, isto é tão absurdo, tão incrivel, tão extraordinario, que ninguem, por mais pobre de espirito que seja, poderá acreditar ou acceitar. E a camara ouviu a exposição clara do sr. ministro.

Foi até o argumento capital do sr. ministro para justificar a sua reconsideração.

Foi esta a affirmação categorica que s. exa. fez com toda a intimativa.

Ninguem, ninguem póde acreditar que haja direcção alguma que descure por tal fórma os interesses da companhia que dirige!

Se tal succedesse, os accionistas gritariam, protestariam, e fariam ir pelos ares a direcção como ella estava fazendo aos interesses e haveres da sociedade.

Sr. presidente, insisto n’isto, porque é um absurdo, de tal ordem, que não se acredita que haja um ministro que o affirme ao parlamento sob sua palavra.

Por isso novamente pergunto á camara se em boa consciencia ella está convencida que haja uma companhia que venha pedir em troca de uma concessão valiosissima uma variante em que ella é prejudicada, uma variante que lhe custa mais cara, segundo a demonstração do ministro, e que, apesar disso, se obrigue ainda a construir essa variante de graça?!!!

O sr. ministro n’uma d’estas sessões voltava-se para mim e dizia:

«O digno par não acredita o que digo e affirmo. A varriante é mais cara, e não obstante eu obtive tudo de graça.»

Não acredito, não posso acreditar, não o acredita a camara, não acredita v. exa. mesmo, não acredita ninguem por mais destituido de senso que seja, um similhante absurdo.

Sr. presidente, é materia corrente, que um argumento quando prova de mais, não prova nada.

Eis-aqui a que está reduzido o argumento capital do sr. Navarro. Eu desejava acreditar piamente nas palavras do sr. ministro, mas pelo que toca a esta asserção é impossivel, porque daria um triste documento da minha intelligencia. O sr. ministro é muito sophista, e, apresenta a argumentação do seu adversario como lhe convem, e não como ella é, tira conclusões erradas, faz affirmativas inexactas, e por isso é mister muita cautela com elle.

E tanto é verdade esta minha apreciação, que estando o sr. ministro na mais deploravel situação, tem chegado a convencer a camara, que obteve com a sua reconsideração valiosas concessões da companhia, e que fez um alto serviço ao paiz. Felizmente eu, sem rodeios nem evasivas mostrei o que significavam essas concessões, e hoje a camara deve estar convencida do contrario; que o sr. ministro o que fez foi favor á companhia.