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38 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Já sou bastante velho paxá conhecer os homens e os partidos do meu paiz. Creia s. exa. que nunca me illudi a esse respeito.

Referiu-se tambem o digno par a uma petição de aggravo que ha dias foi publicada na Marselheza, petição de aggravo em. que se faziam graves allusões injuriosas ao chefe do estado, e, lamentou que o mesmo jornal não tivesse sido apprehendido nessa occasião, como já o fôra por outra vez.

Digo francamente a s. exa. que tambem lamentei que o numero da Marselheza que trouxe aquella petição de aggravo, não tivesse sido apprehendido desde que foi apregoado e publicado na rua; porque eu mantenho o direito de apprehensão, como o estabelece o codigo administrativo, e que já appliquei de outra vez que estive no ministerio, com relação a um jornal que se publicou em Braga, facto pelo qual fui então increpado pelos amigos do digno par.

Repito, mantenho o direito de apprehensão na rua para os casos em que os jornaes provoquem a desordem, instiguem á revolução ou ataquem injuriosamente as instituições.

Não duvido, em taes circumstancias, usar d'esse direito, como aconteceu em relação ao jornal de Braga.

Mas o que é notavel é que os amigos politicos do digno par me accusaram então acerbamente pelo que fiz, e agora me provocam e incitam a fazer o que então não queriam, que tivesse feito!

Mudaram, de opinião. Folgo com isso.

Mas, com toda a lealdade declaro á s. exa.: lamento que não tivesse sido apprehendido o supplemento da Marselheza; porém a culpa não foi minha nem das auctoridades a quem está incumbido esse serviço.

As minhas ordens sobre tal assumpto são geraes e permanentes; desnecessario era renoval-as.

Mas não foi apprehendido o supplemento de que se trata, por isso mesmo que, sendo supplemento, a sua publicação era imprevista. Se a policia o soubesse a tempo, o jornal teria sido apprehendido.

Mas o governo cumpriu o seu dever e o ministerio publico já requereu o procedimento criminal competente. Creia s. exa. que nem a corôa, nem as instituições, riem a ordem publica hão de ficar sem o merecido desaggravo.

Concluindo, direi a s. exa. que eu não espero a sua confiança nas questões de administração, nem a solicito; mas desejo o seu concurso para as questões de ordem publica. E faço toda a justiça ao digno par o sr. Hintze Ribeiro esperando que n'essas questões dará toda a forca ao governo.

Pela minha parte não hesitarei, sempre que assim seja preciso, para manter a ordem publica e o respeito pelas instituições, em preterir quaesquer formalidades legaes, e proceder energicamente. Mas só n'esses casos. Virei depois pedir ao parlamento um bill de indemnidade.

Parece-me que estas palavras poderão servir ao digno par de caução, ou de fiança, sobre o meu procedimento futuro.

Tenho concluido.

O sr. Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro: - Sr. presidente, eu quizera dar-me por satisfeito com as explicações do nobre presidente do conselho; sinceramente o desejava, no interesse das instituições, no interesse da causa publica. Infelizmente, porém, não nos entendemos sobre o melhor caminho a seguir no proposito, que nos é commum.

De certo provém isto da diversidade de escolas: eu sou conservador; s. exa. representa o partido monarchico avançado.

Sr. presidente, em questões de ordem publica, eu não faço politica; e s. exa. que arguiu a situação, a que eu tive a honra de presidir, de ter saído fóra das normas legaes, tambem em questões de ordem se mostra disposto a sair da legalidade.

Por isso devo dizer ao sr. presidente do conselho que, sem embargo da nossa diversidade de escolas, existe em nós a conformidade de sentir.

Prova-o a declaração de s. exa., de que para manter a ordem publica e o respeito pelas instituições, não hesitaria em infringir a lei, vindo depois pedir um bill de indemnidade.

Essa é que é a doutrina de um homem de governo.

Mas então não venha s. exa. argumentar com a diversidade das escolas politicas, para tirar d'ahi a conclusão de que eu, quando estou no governo, encontro-me sempre fóra da lei, e s. exa. está sempre dentro da legalidade.

S. exa., pelas obrigações do seu cargo e pelas exigencias da sua posição, não póde argumentar com a questão da diversidade de escolas, e não póde pelo presente, que é grave, nem pelo passado, que ainda é bastante recente para mostrar aos olhos de todos, n'uma historia bem frisante, quantas vezes s. exa., empunhando o mando supremo, recorreu a uma dictadura larga e nem sempre justificada.

Pois não diz s. exa. que está disposto, quando o seu dever não só lh'o aconselhar, mas até lho impozer, a sair fóra da lei - embora s. exa. diga que mais tarde dará conta dos seus actos ao parlamento - nas questões graves de ordem publica?

Pois s. exa. diz isto e consente que se chame liberdade á ousadia nas affirmações as mais graves, aã mais contrarias a tudo quanto é decoro e respeito devido ás instituições do paiz?

Pois s. exa. não comprehende que seja isto uma questão de ordem publica, que acima de tudo se impõe, d'aquellas que estão superiores ao acatamento da propria lei?

Como é que s. exa. entende a guarda e a defeza das instituições?

O que é que s. exa. reputa ser uma questão de ordem publica?

Pelo que toca á resposta que s. exa. me deu, tambem a não comprehendo, e desejarei muito comprehender.

O sr. presidente do conselho, sobre o ponto a que me referi, disse apenas que, pelo relatorio official que recebeu, reconhecera que não houve crime algum praticado pelos professores das escolas superiores do reino, pois que elles se tinham limitado a expender as suas opiniões n'um comicio. Folgo que assim seja.

Mas então paira que é que s. exa. consultou a procuradoria, geral da corôa?

Não comprehendo.

Se s. exa. se mantivesse perplexo, duvidoso e apprehensivo ácerca de um minucioso relatorio dos factos, hesitando sobre se delles resultava ou não um crime a punir ou uma circumstancia que demandasse repressão, então entendia eu que s. exa. consultasse a procuradoria geral da corôa, os homens de lei, os advogados do governo; mas se s. exa. de ante mão, antes de. consultar essa estação official sabia que não houve crime algum, nem transgressão das leis do paiz, que podésse dar logar a uma punição ou a uma repressão, para que foi a consulta?

Segundo o meu credo politico, eu digo que o facto constitue um abuso e um aggravo ás instituições, e digo diante de todo o mundo, com toda a coragem e hombridade, que entendo ser esse abuso digno de repressão a bem do paiz.

Mas se não houve crime, não se comprehende a resposta de s. exa.; não se comprehende a rasão por que s. exa. foi consultar a procuradoria geral da corôa.