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16 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Se o meu collega estivesse presente, responderia ao digno par com a lucidez, clareza e intelligencia de que é dotado; mas como elle não está agora aqui, direi a s. exa. que attenda a que no verdor dos annos, com o enthusias-mo de certas idéas, escreve-se muita cousa que depois se não prooura levar á execução, porque as idéas mudam com a idade, e com o maior conhecimento das cousas.

Temos muitos exemplos d'esses. Não ha nenhum homem publico neste paiz nem em parte alguma que possa dizer-se d'elle, que foi sempre coherente. Pois nós que temos vivido já largo tempo sobre a terra, que conhecemos a nossa historia contemporanea, que temos sido actores n'esta scena, não temos visto as opiniões mudarem conforme as idades dos individuos, conforme a marcha dos acontecimentos em certas epochas, conforme as occasiões e as opportunidades? Pois não sabem todos que em Coimbra, quando ali se frequenta a universidade, e por consequencia se está no verdor dos annos, as idéas são differentes das que mais tarde se professam? Eu vi em 1848, quando foi a proclamação da republica em França, que não havia em Coimbra nenhum estudante que não fosse republicano; todos que ali estudavam n'aquella epocha têem depois figurado, mais ou menos na vida publica; uns têem chegado a formar parte do governo, outros teem entrado na composição das duas casas do parlamento, etc.; e comtudo nenhum veiu ainda sustentar aqui as idéas que tinha então.

Portanto, se formos agora avaliar as opiniões e os actos dos individuos pelo que elles escreveram ha doze, quinze ou vinte annos, então não temos tempo para outra cousa, estamos constantemente a lançar recriminações, a fazer comparações e a atacar aquillo que não está em discussão. O que devemos fazer hoje não é tratar do que se escreveu ha alguns annos, mas examinar se os actos d'esse homem, como membro do governo, correspondem á expectativa do paiz, e para isso é que eu chamo a attenção do digno par.

Sr. presidente, o amor á independencia nacional está no coração de nós todos; e se isto é uma cousa natural e muito sabida, para que é gastar tempo a fallar sobre aquillo em que não póde caber duvida?! Pois que! Nós podemos admittir que se duvide da existencia de uma monarchia de sete seculos, e que entre nós portuguezes haja alguem que abrigue em seu peito outro sentimento que não ssteja conforme com o da nossa nacionalidade? Não creio; e por consequencia digo apenas sobre o assumpto, que se por ventura no discurso da corôa se fallou no fortalecimento da independencia nacional, é como querendo unicamente dizer que esta se fortalecerá por meio de medidas as mais adequadas para bem do paiz. Não é de certo porque se entenda que a independencia do nosso paiz esteja correndo o mais pequeno risco. Se corresse algum risco, estou seguro que não haveria senão um sentimento unico, inteiramente uniforme entre todos os filhos d'esta terra, para nos abraçarmos em volta do estandarte portuguez, da bandeira nacional, que todos procurariamos e saberiamos defender á custa das nossas fortunas e de nossas proprias vidas.

Sr. presidente, o digno par notou tambem não se ter fallado no discurso da corôa das propostas que se dizem feitas da parte da nação vizinha com relação á candidatura de El-Rei o Senhor D. Fernando. Este negocio, sr. presidente, foi tratado perfeitamente em particular; não é o que se chama um acto do governo. Houve uma participação extra-official, creio eu, com relação aos desejos manifestados na nação vizinha de que eifectivamente fosse aceita por Sua Magestade o Senhor D. Fernando a proposta para a sua candidatura ao throno e corôa de Hespanha. Isto foi porem, para assim dizer, completamente estranho ao governo, á administração d'este paiz, pois que apesar da elevada posição que o Senhor D. Fernando occupa, comtudo o que é verdade é que Sua Magestade não faz hoje parte da governação publica, e eis-aqui a rasão porque no discurso da corôa se não encontra referencia alguma a esse acontecimento.

Sr. presidente, eu não vejo que na oração do digno par houvesse outros reparos que exijam uma resposta por parte do governo; mas como a discussão está apenas encetada, se posteriormente se notar alguma cousa mais, tornarei a pedir a palavra, ou qualquer dos meus collegas no ministerio o fará com o intuito sempre de satisfazermos a quaesquer explicações pedidas, e de defendermos os actos do governo de que muito me honro de fazer parte.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Eu sinto na realidade que haja uma tão notavel e profunda divergencia entre mim e o sr. ministro que acabou de fallar.

O sr. ministro disse que no discurso da corôa não se tinha alludido á reforma parlamentar, porque a actual sessão legislativa não póde ser extensa.

Ora, sr. presidente, quanto a mim entendo que a rasão não satisfaz, porque effectivamente não vejo cousa de maior urgencia, e esta é a causa da minha divergencia do governo. A primeira de todas as reformas devia ser a reforma parlamentar, e particularmente com relação a esta camara eu entendo que a reforma lhe deve assegurar a maior independencia, sendo os seus membros eleitos como acontece na Belgica, differindo dos membros da outra camara só na idade e fortuna. É necessario que, tanto n'uma como noutra camara, aquelles que forem empregados, sendo eleitos deixem de exercer emprego durante a legislatura e mais um anno querendo-se que os membros d'esta camara sejam vitalicios e não electivos, para conservar a sua independencia, é necessario que não possam ser empregados, e dar-se-lhes commissões rendosas ou honras, mas isto é impossivel que se possa exigir de qualquer pessoa, membro da camara alta, por toda a sua vida. O que se póde porem exigir e que durante o tempo da legislatura e mais um anno depois não exerçam empregos nem qualquer commissão retribuida. Este é o modo como eu entendo que o parlamento deve ser reformado, tudo mais não é reforma parlamentar e continuará a mesma dependencia das camaras. A Belgica que é o paiz mais bem administrado, tem o seu parlamento constituido d'este modo.

Quanto á descentralisação tambem entendo que deve ter a maior latitude que seja possivel, estabelecendo-se nos diversos municipios um conselho municipal electivo para que auctorise as despezas e obras publicas do municipio, porque entendo que todas as despezas municipaes, e os emprestimos para a construcção de estradas devem ser approvadas por um conselho municipal d'esta natureza.

Sr. presidente, eu sinto que a resposta que o sr. ministro da fazenda teve a bondade de me dar em defeza do seu. collega da marinha se limitasse a dizer que foi no verdor dos annos que elle escreveu o que eu acabei ha pouco de ler á camara. Pois um homem que é chamado para ministro da corôa, e só ha poucos annos tinha aquellas opiniões, póde dizer-se que estava no verdor dos annos? A sua opinião particular podia ser esta ou aquella, mas a sua opinião como homem do governo deve ser conforme com a opinião do paiz, do parlamento e do rei.

Disse tambem s. exa. que = os rapazes são republicanos =, mas eu não vejo que os vão buscar para ministros; uma cousa é a opinião do homem particular, outra é a de um ministro d'estado que está sujeito a que d'ella se tirem os corollarios que naturalmente se deduzem.

O sr. Relello da Silva: - Sr. presidente, pedi a palavra para declarar a v. exa. e á camara que tanto os meus amigos como eu estamos resolvidos a approvar o projecto de resposta ao discurso da corôa, e approvâmo-lo porque não faz emittir á camara nenhuma opinião decisiva sobre as questões pendentes, que ficam todas reservadas para serem examinadas e discutidas em occasião opportuna, e portanto consideramos este documento como um mero comprimento á corôa, ao qual nos associâmos.

Emquanto ás differentes e gravissimas questões suscitadas, umas antes e outras depois da dissolução da camara electiva, nós reservâmos a nossa opinião para quando se