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34 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Tambem não lhe faço nenhuma pergunta sobre a questão anglo-portugueza.

Sobre este ponto e sobre esse movimento quasi um sono, vibrante de enthusiasmo patriotico que vae no paiz, e sobretudo nas cidades de Lisboa e Porto, provocado pelo procedimento do governo inglez em relação a Portuga!. ...

O sr. Visconde de Moreira de Rey: - Pelo povo portuguez em relação á Inglaterra.

O Orador: - Sobre esse sympathico e generoso movimento, desejo chamar a especial attenção do governo, e dizer-lhe que, em presença d'essa espontanea e geral excitação da opinião, tem mais alguma cousa a fazer do que parece deprehender-se do seu programma.

Sr. presidente, as circumstancias são extraordinarias, e é preciso proceder em harmonia com ellas. A iniciativa particular póde muito, mas, a meu ver, o governo, tem obrigação de a secundar e dirigir.

Eu nem sequer pergunto ao governo o que elle tenciona fazer. Chamo só a sua attenção para este ponto, e aguardo os seus actos.

Tenho dito.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. ministro dos negocios estrangeiros.

O sr. Barjona de Freitas: - V. exa. não me inscreveu?

O sr. Presidente: - V. exa. já está inscripto.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): - Respondendo á pergunta do digno par o sr. Camara Leme, diz que o governo ha de sustentar, na questão das incompatibilidades, como em todas as outras, os principies que defendeu na opposição; sómente como o digno par sabe, a occasião não é opportuna, porque a maioria da commissão especial, que deu parecer sobre o projecto do sr. Camara Leme, mostrou-se hostil a esse projecto, e a maioria d'aquella commissão nasceu da maioria da camara, que é ainda a mesma.

Quanto ás declarações feitas pelo sr. José Luciano de Castro, tem a dizer que o governo as regista, não só como declarações pessoaes de s. exa., mas tambem do partido de que s. exa. é chefe.

O sr. José Luciano de Castro chamou a attenção do governo para o movimento patriotico que se está operando no paiz. O governo considera como um dos seus primeiros deveres, como disse o sr. ministro da justiça, proceder n'esta conjunctura com energia, prudencia e serenidade, conhecendo e assumindo todas as responsabilidades dos actos que haja de praticar.

(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Barjona de Freitas: - Que no grave incidente que deu motivo á queda do gabinete transacto, se misturára o seu nome por modo desagradavel, e que essa circumstancia o obrigava a usar da palavra porque, por mais alheado que se esteja dos bons principios, ainda ninguem negou aos homens publicos o direito de terem amor á verdade e á propria reputação.

No dia immediato áquelle em que se reuniu o conselho d'estado, para ser ouvido sobre o ultimatum do governo inglez publicaram-se supplementos a jornaes incitando o povo á revolta, e n'outros apresentava-se a lista dos conselheiros que haviam sido traidores á patria, dando-lhe a elle, orador, para este effeito, a honra do primeiro logar.

Que muitos dos seus amigos, sobresaltados pela gravidade excepcional do assumpto e pela accusação que lhe faziam, o procuraram para inquirir dos factos e defenderem o seu procedimento, que estes acreditavam dever ter sido conforme aos grandes interesses nacionaes; mas que os não poderá informar, porque lhe era defeso como conselheiro d'estado.

N'aquella occasião, porém, falla como par do reino, e, no uso pleno do seu direito, dá a sua opinião clara e definida sobre a resposta que devia ter o referido ultimatum.

Era notavel que funccionando seis conselheiros d'estado, e sendo secretas as suas sessões, cinco fossem apontado? como traidores.

Qual d'estes cinco seria o imprudente que revelou o segredo e denunciou a propria traição?

Tudo isto faz lembrar o caso do navio hespanhol, naufragado n'um banco da America, em que ía embarcado um bispo, o qual, no momento em que a tripulação estava em grande perigo, ajoelhou, levantou as mãos a Deus e fez a seguinte oração: Senhor, para não fatigar a vossa misericordia, deixae morrer os outros e salvae-me sómente a mim!

Ha horas funebres na vida de um paiz, em que a imaginação popular vê fluctuar em toda a parte a sombra de uma traição.

Não incriminava o povo porque comprehendia a dor nacional, em presença de um grande attentado; mas censurava os especuladores, se os houve, e lastimava os inconscientes que armara á popularidade, que, se em certos casos é uma força, se converte ás vezes em bagagem incommoda para os que têem de presidir aos destinos de uma nação.

Pela sua parte nunca fôra nem seria cortezão dos Reis; nunca foi nem será o cortezão do povo; apesar de saber de ha muito tempo que nas luctas politicas a escolha das armas pertence aos menos escrupulosos.

Não procura esconder nunca as suas opiniões, e diria isso com a sua franqueza habitual o que em seu entender se devia ter respondido ao ultimatum do ministro inglez.

Não se tratava n'aquelle momento de apreciar o modo como tinham sido dirigidas as negociações, ou de liquidar as responsabilidades do governo.

A questão era urgentissima e a resposta devia dar-se em poucas horas.

A primeira cousa a considerar era a situação do paiz, sob o ponto de vista dos nossos recursos militares, da defeza dos portos, do desenvolvimento da nossa marinha de guerra.

Era mister tambem indagar se podiamos contar com a alliança de uma terceira potencia que estivesse resolvida a dispensar-nos a sua intervenção efficaz.

Não seria elle, orador, quem viesse dizer ali a resposta que o governo daria a quem lhe fizesse estas perguntas.

N'estas circumstancias afigura-se-lhe que a unica resposta a dar ao ultimatum era annuir, em vista da intimação do governo inglez, a retirar as nossas forças dos postes occupados no paiz, cujo dominio nos era contestado; mas com a declaração expressa de que voltariamos a occupal-os no caso em que áquelle governo se não prestasse, em praso rasoavel, á resolução da questão pendente ácerca d'aquelles territorios, por qualquer dos meios admittidos em direito internacional.

Por esta fórma, nenhum soldado inglez pisaria o solo da patria, não cediamos qualquer porção de territorio, nem abandonavamos nenhum dos nossos territorios. Tudo se reduzia a desoccupar por algum tempo alguns postos militares, affirmando bem alto o nosso direito n'aquellas regiões.

Tirava-se assim pretexto para um acto de força ou de occupação violenta, habilitando ao mesmo tempo o governo inglez a entrar, mais desaffrontadamente da pressão da opinião publica do seu paiz, em caminho de pacifica solução.

Não ha duvida que o ultimatum do governo inglez foi uma affronta, tanto mais dolorosa quanto partiu de uma nação alliada de ha seculos.

Sentimos a offensa aos nossos brios, porque perante o sentimento de amor ao paiz não ha superiores nem inferiores: somos todos iguaes.

As differenças começam, porém, quando se trata de prescrutar o futuro da patria, mais ou menos longinquo, ou de prever as consequencias de qualquer procedimento.

Quando em 1870 se discutia no parlamento francez a