SESSÃO DE 25 DE JANEIRO DE 1897 61
É esta a rasão por que o governo não tem promulgado 1 lei alguma util e benefica. É por isso tambem que tendo exercido durante dois annos, ou para melhor dizer durante todo o tempo que tem governado, uma dictadura absoluta, despotica, arbitraria e prepotente como jamais houve em Portugal, não fez reforma alguma das que o paiz carece para vencer as difficuldades que o cercam, mas occupou-se em decretar reformas inuteis, desnecessarias e altamente despendiosas e que tem acarretado gravissimas consequencias.
Sr. presidente, não sou politico, não faço da politica profissão, não tenho nenhuma pretensão, nem espero nada da politica, não tenho aspirações a ser ministro, e devo declarar bem alto que não desejo ser ministro, e faço esta declaração porque se espalhou o boato, e alguns jornaes chegaram a publicar, que eu faria parte do ministerio que succedesse a esta situação. Sr. presidente, declaro solemnemente á camara e ao paiz que não quero ser ministro, não porque eu desdenhe das honras d'esse alto cargo, mas porque me não sinto com forças nem competencia e aptidões para exercel-o, sobretudo na presente conjunctura. Dito isto, sr. presidente, fico mais á vontade para proseguir no que tenho a dizer. Não sou politico, mas interesso-me pelas cousas publicas porque me corre esse dever na qualidade de membro d'esta camara, e porque como contribuinte que sou dos que não concorrem com menor quantia para as despezas do estado, tenho o direito de vigiar os actos do governo. Tenho seguido, pois, passo a passo a marcha governativa e, com profundo pezar o digo á camara, receio muito que por este andar caminhemos para uma grande catastrophe, ou para uma nova bancarota que póde trazer senão a perda da nossa independencia, pelo menos a das nossas melhores colonias.
Sr. presidente, o regimen economico e financeiro de que o governo faz tanto alarde no discurso da corôa está em completa antinomia e discordancia com as doutrinas dos melhores economistas.
A sciencia economica tem duas ou tres escolas, mas ha certos pontos em que todos os economistas, pelo menos aquelles de que tenho conhecimento, estão de accordo.
Poderia citar muitos, mas para não cansar a camara citarei apenas dois ou tres e porei em confronto os preceitos que elles estabelecem com os actos do governo para demonstrar quanto é errada e nociva a sua administração. Estão inscriptos outros oradores que hão de tratar esta questão mais proficientemente do que eu e não quero privar a camara do prazer de os ouvir.
Garnier, nos seus Elementos de finanças, diz que em materia de imposto se deve preferir aquelle cuja cobrança e fiscalisação seja menos dispendiosa, a fim de que o dinheiro do contribuinte entre na sua quasi totalidade nas arcas do thesouro para ser applicado, note bem a camara, em despezas uteis e indispensaveis.
Pois o governo, em vez de simplificar, tem complicado cada vez mais o systema tributario; assim é que para a cobrança e fiscalisação do imposto temos um verdadeiro exercito de empregados e guardas fiscaes que absorvem uma parte importante do imposto.
E quanto á applicação do producto que se colhe do imposto pensa a camara que o governo segue rigorosamente o preceito de Garnier, que o sr. ministro da fazenda devia ter sempre em vista não gastando senão o absolutamente indispensavel?
Não é assim. Tem gasto prodigamente sem lhe importar, sem querer saber se custa ao contribuinte pagar o imposto; e tem gasto não só prodigamente, como inutil, improficuamente.
Tambem Jean Baptiste Say diz que o melhor de todos os planos financeiros é gastar pouco, e o melhor de todo os impostos, o menor e que menos custe ao contribuinte pagar.
Pois, sr. presidente, o governo tem seguido exactamente a theoria contraria: gasta muito, loucamente, sem utilidade alguma, e gasta tanto que já as despezas publicas attingiram a cifra em que estavam antes da reducção dos juros; e temos os mesmos encargos que tinhamos antes da lei chamada de "salvação publica".
Ora, eis ahi o caminho que o governo trilha; veja v. exa. como elle segue á risca os preceitos economicos e as boas doutrinas.
E a respeito de saber se custa ou não custa ao contribuinte pagar, com isso é que elle absolutamente se não preoccupa: que pague e que gema, mas que pague.
Pois talvez chegue tempo em que elle não possa e não queira pagar.
O governo não attende sequer a que o imposto, quando ultrapassa o limite da moderação, produz effeitos negativos. Succedeu isto na Hollanda, na Inglaterra antes da reforma de Robert Peei e tem succedido em diversas nações.
Pensa o governo que o imposto é elestico, que póde gastar largamente, esbanjar, locupletar os amigos e que o contribuinte ha de pagar todas essas despezas, todos esses desperdicios, todos esses actos de má administração e de loucura?
Pois não é assim, engana-se.
Um outro economista, Victor Bounnet diz que algumas vezes o imposto custa mais do que produz e que o melhor caminho para chegar ao equilibrio financeiro é parar no caminho das despezas superfluas e improductivas e não lançar impostos que possam crear difficuldades ao augmento da riqueza publica, porque d'ahi surgem consequencias funestas, sendo uma d'ellas esgotar o manancial onde o estado vae haurir as suas receitas.
Mas o sr. presidente do conselho, importa-se pouco com isso.
Sr. presidente, lançar impostos a esmo e á toa sem um estudo previo, profundo e pausado, ácerca da incidencia d'esses impostos, sem maduramente pensar se elles vão affectar a materia collectavel e porventura destruil-a ou diminuil-a consideravelmente, é um gravissimo erro.
Alem d'isso, não se deve só recorrer ao imposto para obter o augmento da receita publica. O melhor meio de conseguir esse augmento é promover o desenvolvimento e prosperidade do commercio, da industria e da agricultura, é auxilial-as, quanto possivel seja, e não lhes lançar impostos que possam obstar ao seu desenvolvimento.
N'isto está tambem o melhor meio de obstar á emigração não só de braços mas de capitães, porque é preciso que o governo saiba, se o ignora ainda, que os capitaes têem emigrado porque não encontram aqui emprego seguro e remunerador, e porque não ha estabilidade, as leia fiscaes estão-se alterando constantemente e ninguem quer empregar nem na industria, nem na agricultura, nem no commercio capitães, com receio de que o fisco lhos venha cercear. Assim tem acontecido porque já chegámos a ponto de se lançar o imposto de rendimento ou de industria onde não ha nem rendimento nem lucros.
Existem companhias que tendo prejuizos, pagam imposto de industria como se tivessem lucros.
Sr. presidente, o que é certo é que, como disse na ultima sessão o meu illustre amigo e digno par o sr. D. Luiz da Camara Leme, o governo está agarrado ao poder como a ostra ao rochedo, não o quer largar por cousa nenhuma e tudo sacrifica a esse apego. Para esse fim tem lançado mão até da corrupção politica, que já está arvorada em principio de governo, tem gasto mal e indevidamente sommas enormes, emquanto que outras despezas necessarias e productivas para o paiz não se fazem.
As estradas estão abandonadas e arruinando-se constantemente. Temos bons marinheiros e bons officiaes de marinha, mas navios actualmente é que não ha, só agora se vão construir alguns; veremos depois o resultado.
O exercito é mal pago são mal remunerados os servi-