SESSÃO DE 25 DE JANEIRO DE 1897 65
provincia de Angola, e que era preciso arranjar recursos. Disse mais s. exa. que .º sr. Gomes Coelho que tinha sido encarregado de estudar o monopolio do álcool lhe lera uma memoria a este respeito, e que mais tarde fôra essa memoria apresentada ao sr. commissario regio que, não se conformou com as idéas n'ella emittidas, promulgou o decreto do monopolio no Boletim official de Loanda.
Então tinha o illustre ministro da marinha perfeito conhecimento do que se passava em Angola!
O commissario regio publicou um decreto, e o sr. ministro da marinha, ou porque a opinião publica se impoz, ou por motivos ou rasões que não conheço, disse-lhe: - Suspenda o decreto.
Com que direito disse s. exa. ao commissario regio que suspendesse o decreto?
De duas, uma: ou sáe o sr. ministro da marinha, ou se demitte o commissario regio.
S. exa. disse que tinha inteira e completa confiança no commissario regio; o commissario regio é que não póde ter confiança no sr. ministro da marinha.
Portanto, ou um ou outro; mas, desgraçadamente, pelas declarações de s. exa., tudo parece indicar que se chegou a accordo.
Não póde ser!
Sr. presidente, nós estamos aqui recapitulando ou discutindo os actos de todos os ministros e, portanto, não se deve estranhar que eu deixe um bilhete de visita a cada um dos membros do governo.
E não se julgue que, por eu estar fallando alto, estou zangado; é este o meu habito, que, aliás, me não faz esquecer a deferencia que devo ter por s. exas.
Sr. presidente, na resposta ao discurso da corôa, a commissão entende que nós devemos folgar desde o primeiro paragrapho até ao ultimo; confesso, porém, que ha mais rasão para a gente se entristecer do que para folgar. Tenho de me referir ao nobre ministro da marinha, e, conjuntamente, ao meu amigo o sr. ministro dos negocios estrangeiros, ácerca da solução que teve o conflicto com a Allemanha.
Tencionava pedir ao sr. ministro dos negocios estrangeiros me facultasse o exame dos documentos referentes a esse assumpto; mas, vendo o que se passou na outra casa do parlamento, achei inutil pedil-os, porque se declarou ali que toda a negociação tinha sido verbal.
Esta questão, tem duas partes: uma externa e outra interna.
Diz a commissão:
"A camara folga de que o incidente das desagradaveis occorrencias que se deram em Lourenço Marques com o representante consular do imperio germanico, tenha terminado por fórma a satisfazer os melindres d'aquella nação, sem offensa do nosso decoro."
Sr. presidente, desde que o sr. ministro dos negocios estrangeiros declarou que as negociações foram verbaes, devo acredital-o; mas porque foram estas negociações verbaes sobre assumpto tão grave, como são os factos que occorreram em Lourenço Marques?
Não existem quaesquer documentos com relação a esses deploraveis acontecimentos?
Das duas uma. Ou o governo allemão foi tão exigente que abusou da sua força contra uma potencia fraca, o que me custa a acreditar, ou então houve precipitação da parte do governo em dar todas as satisfações, as mais humilhantes para uma nação, sem que tivesse chegado ao seu conhecimento o relatorio que o elucidasse de como os factos se passaram.
Sr. presidente, ou as auctoridades portuguezas cumpriram o seu dever e então a Allemanha não tinha o direito de exigir satisfações tão humilhantes, ou não cumpriram, e n'esse caso pergunto eu quem é que commetteu a falta e qual foi o castigo que recebeu por a haver commettido? Nada se sabe, sr. presidente, parece todavia que os funccionarios portuguezes, no conflicto que só deu, cumpriram o seu dever; se assim procederam, para que tal afan em satisfazer os melindres da Allemanha que, ao facto da verdade, não seria tão cruel nas suas exigencias?
É preciso que esta questão se esclareça, não basta que o governo diga que se apressou em dar as satisfações £ Allemanha.
As satisfações dão-se quando ha culpas, quando se tem commettido uma falta, mas sem nenhum motivo não se comprehendem. Discriminemos responsabilidades. Todos os governos têem um jornal no qual se dão o que se chama notas officiosas e o que appareceu na Gazeta da Allemanha do Norte foi o seguinte:
"Logo que os acontecimentos de 3 de dezembro foram conhecidos os jornaes mais considerados de Lisboa escreveram, que Portugal devia, no interesse da sua honra e da sua dignidade, dar uma satisfação á Allemanha, ainda que a Allemanha a não pedisse.
"Quanto ás responsabilidades que possam ter as auctoridades portuguezas neste negocio, são exclusivamente dos funccionarios locaes de Lourenço Marques."
Dão-se estes acontecimentos em Lourenço Marques, acontecimentos deploraveis, e a final não se sabe se houve falta do consul ou erro da parte das auctoridades locaes. O documento que citei attribue todo o mal aos funccionarios portuguezes e elogia os jornaes que aconselhavam uma prompta satisfação. Até aqui a questão interna, chegamos á externa.
O sr. ministro da marinha precipitadamente endossou a letra á vista ao seu collega dos negocios estrangeiros, dizendo: "Os meus homens em Lourenço Marques comprometteram-me, mas o collega dos estrangeiros componha as cousas com pouco desaire para nós".
O sr. ministro dos negocios estrangeiros corre para um lado, corre para outro; veiu de Villa Viçosa e arranjou o que pôde, não digo que fosse lisonjeiro para nós, e de toda esta negociação, que é gravissima, parecia que devia ficar algum vestigio, mas não ficou nada. Foi como o fumo das salvas que se deram em Lourenço Marques á bandeira allemã. Tudo desappareceu para nossa satisfação.
D'aqui a um seculo se quizerem saber porque demos uma satisfação á Allemanha não o poderão saber, porque não existem, documentos. Tudo foi verbal sobre assumpto tão grave, e se alguem quizer escrever este triste episodio irá buscar elementos aos archivos de Berlim.
O sr. Conde de Lagoaça: - Nem um telegramma? (Riso.}
O Orador: - Continúa a camara a folgar, porque diz a resposta ao discurso da corôa:
"A camara folga de que esteja restabelecida a ordem e assegurada a administração na India, e presta homenagem aos serviços feitos n'aquella colonia por Sua Alteza o senhor Infante D. Affonso."
Eu não tenho animosidade de qualidade alguma ao sr. Neves Ferreira, ou a qualquer dos outros commissarios régios, mas a camara deve estar lembrada de que no anno passado, quando aqui se discutiu a questão da India, eu disse algumas palavras talvez menos agradaveis para s. exa. O que admira, porém, é ver o governo prestar uma homenagem justissima a Sua Alteza o senhor Infante D. Affonso, e ver, a par d'esses elogios merecidos, o procedimento do commissario regio a seguir á saida de Sua Alteza da India. O commissario regio não tratou senão de desfazer tudo quanto o senhor D. Affonso fizera.
Deixando Sua Alteza o seu nome vinculado a uma amnistia, a essa amnistia seguiram-se os fuzilamentos. (Apoiados.)
O governo devia ter pensado n'isso, visto conhecer o commissario regio, e não devia ter collocado um principe da casa de Bragança n'esta deploravel situação.
Por um lado, o governo elogia os actos praticados por Sua Alteza durante a sua administração; exalta o seu pa-