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4 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

a situação criada á imprensa portuguesa do que a situação da imprensa na Russia.

Tão longe foi levado o olvido das normas que devem presidir á regular administração do Estado que, no fim do mês de janeiro, se decretaram medidas repressivas até o ponto de deixarem de ser respeitadas as immunidades parlamentares.

Quando estalou a catastrophe de fevereiro, a impressão não foi só de espanto, foi da mais absoluta reprovação pelo attentado, porque, se uma opposição ou um partido se nobilitam armando uma revolução tendente a vencer a tyrannia, nada pode desculpar o attentado individual, ainda que seja contra a vida do mais modesto cidadão.

A critica não pode deixar de ser impiedosa para o delicto que, de repente, fez tombar na sepultura um homem na plena força da sua virilidade e um adolescente no arrebol da existencia; mas é indispensavel não confundir esse attentado horroroso com o insupportavel regimen que então se estabelecera: com o poder pessoal, a desvirtuação e o esquecimento das garantias mais sagradas contidas na Carta Constitucional, quer sobre a prisão sem culpa formada, quer sobre a liberdade de imprensa, quer sobre a saida do poder real para fora da orbita estricta que lhe está marcada, quer, emfim, á suppressão do Parlamento pelo arbitrio dos governantes.

Essa transformação do regimen constitucional português num regimen turco de governação é que não podia ser. Não então, e não hoje.

Endereça os seus cumprimentos aos homens que hoje occupam os Conselhos da Coroa. Vê ali dois amigos pessoaes, o Sr. Ministro da Justiça e o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; vê ali tres dos mais illustres officiaes militares do nosso país, o Sr. Presidente do Conselho, o Sr. Ministro da Guerra e o Sr. Ministro da Marinha, sem falar no Sr. Espregueira, que, embora seja official general do exercito, é pela sua qualidade de financeiro que mais se tem evidenciado.

Nestes cumprimentos não pode deixar de referir-se ao Sr. Calvet de Magalhães, que sempre tem sido um funccionario muito distincto.

Ao Sr. Presidente do Conselho fará uma referencia mais particular.

S. Exa. preside a um Governo semelhante aos que antigamente se chamavam Governos de comadres ou nephelibaticos e ao qual, criticando-lhe os actos, é preciso distribuir as responsabilidades. D'antes, o carro do Estado era apenas governado pelo chefe do Governo; mas agora as cousas mudaram. Ha atrelados a esse carro os dois partidos rotativos, e quem manda já não é o cocheiro, mas o gado. (Riso).

Para sua defesa parlamentar o Sr. Presidente do Conselho tem adoptado um truc que elle, orador, não pode deixar de considerar efficaz: é o declarar que não quer ser tolerado e que quando o não quiserem se irá embora.

Elle, orador, aconselha porem o Sr. Presidente do Conselho a ser um pouco mais parcimonioso no uso d'esse truc, visto que pode acontecer que S. Exa., querendo ir-se embora, não tenha tempo de aproximar-se da porta, porque, quando menos o imagine, já esteja fora d'ella.

Vae expor resumidamente á Camara aquillo que entende dever ser e caminho politico a seguir na conjuntura actual.

A vida do mais humilde cidadão português é tão respeitavel e sagrada como a do Chefe do Estado; por isso não pode deixar de vir pedir ao Sr. Presidente do Conselho que considere o facto das forças militares e policiaes assassinarem pessoas indefesas, levando assim a dor e a miseria ás portas de muitas familias.

Esse facto não pode deixar de ser base de uma grande transformação das forças policiaes de Lisboa.

Á frente da guarda municipal tem S. Exa. um dos mais distinctos officiaes do exercito. Chame-o S. Exa., ouça-o e, de uma vez para sempre, reduza os corpos policiaes da capital a alguma cousa que seja uma garantia para os cidadãos e não uma força selvagem e assassina contra elles voltada.

Elle, orador, não tem uma confiança cega naquillo a que se chama reformas constitucionaes; sempre que o Poder quiser, saltará por cima de todas as garantias.

A esse proposito, elle, orador, aproveita o ensejo para renovar a iniciativa do projecto de lei sobre cargos palatinos, que apresentara na ultima sessão e que não attinge quaesquer personalidades, mas apenas estabelece principios.

(O Sr. Conde de Sabugosa pede a palavra).

Deseja que a politica seja apenas para os politicos.

Em materia eleitoral é absolutamente indispensavel voltar ao regimen dos circulos uninominaes e acabar com os escrutinios de lista, que teem sido a base dos maiores abusos e deturpações do sistema eleitoral.

De resto, cada um dos homens que occupam as cadeiras do Governo tem de proseguir integerrimamente no desenvolvimento do seu programma governativo. O Sr. Ministro do Reino, atacando de face o problema da instrucção primaria; o Sr. Ministro da Justiça, occupando-se sem demora da legislação relativa á instrucção criminal, á defesa dos direitos individuaes do cidadão no que respeita á prisão sem culpa formada e ainda da legislação de 13 de fevereiro, pondo-a ao alcance dos verdadeiros principios de humanidade e justiça; o Sr. Ministro da Fazenda, não cuidando de aumentar os impostos, mas procurando obter o acrescimo d'essa receita por um melhor processo de cobrança e fazendo ao mesmo tempo a revisão das pautas, de sorte que, sem perder de vista o espirito proteccionista, tenha em attenção os interesses do consumidor; o Sr. Ministro da Marinha, estudando o problema da nossa marinha militar, de forma a que possamos ter o necessario para a instrucção naval e, principalmente, para o serviço colonial; o Sr. Ministro das Obras Publicas, tratando do problema da nossa viação ordinaria, que representa um capital posto em perigo, porque se tem tratado quasi exclusivamente da construcção de novas vias ordinarias, desprezando a conservação das já construidas; finalmente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, negociando tratados de commercio, fundados no regimen das pautas minimas e que assegurem uma facil collocação aos productos nacionaes.

O Sr. Presidente: - Terminou a hora de se passar á ordem do dia. Se V. Exa. quer eu reservo-lhe a palavra para a sessão seguinte.

O Orador: - Pedia a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que eu continue no uso da palavra. Em poucos minutos terminarei o meu discurso.

Consultada, a Camara resolve affirmativamente.

O Orador: - Agradece a annuencia da Camara ao seu pedido e promette não abusar, pois a Camara sabe que não costuma fazer longos discursos.

Para ser levada a effeito esta obra politica com que forças conta o novo Rei?

A apoiá-lo na sua difficil missão estão os dois partidos historicos, o regenerador e o progressista.

Mas é preciso ver que esses dois partidos se acham no mais absoluto descalabro, falhos de vitalidade, porque já veem morrendo de ha longos annos. Nos ultimos tempos da nossa vida politica esses partidos mostraram que valem aquillo que vale a força do poder: muito, sobraçando as pastas ministeriaes; nada, quando as abandonam. Para chegar a esta conclusão nada mais é preciso fazer do que o relato do que foi a acção d'esses parti-