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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO N.º 6

EM 19 DE MAIO DE 1908

Presidencia do Exmo. Sr. Conselheiro Antonio de Azevedo Castello Branco

Secretarios - os Dignos Pares

Luiz de Mello Bandeira Coelho
Marquez de Sousa Holstein

SUMMARIO. - Leitura e approvação da acta. Expediente. - A Camara autoriza o Digno Par Seabra de Lacerda a ir depor ao Juizo de Instrucção Criminal. - O Digno Par Teixeira de Sousa apresenta um requerimento em que pede documentos. - Tem segunda leitura uma proposta, do Digno Par Sebastião Baracho sobre administração financeira, sendo tambem lida outra sobre a frequencia das sessões e um requerimento acêrca da adjudicação do Theatro de S. Carlos. Tem o destino devido e é admittida á discussão a proposta. - São autorizados dois Dignos Pares a accumulações das funcções legislativas com outras. - Trocam-se explicações entre o Sr. Presidente e o Digno Par Sebastião Baracho acêrca da duração das sessões. - O Sr. Marquez de Sousa Holstein participa a constituição da commissão de verificação de poderes e requer que dois Dignos Pares lhe sejam aggregados, o que é approvado. - O Digno Par Dias Costa manda para a mesa um projecto de lei para conceder uma pensão á viuva e filha do general Eduardo Galhardo. Fica para segunda leitura. - O Digno Par João Arroyo renova a iniciativa do seu projecto de lei relativo aos cargos palatinos e faz considerações de ordem politica.

Na ordem do dia lê-se o projecto de resposta ao Discurso da Coroa. - Usa da palavra o Digno Par Sebastião Baracho, justificando a sua moção de ordem, e ficando o Digno Par com a palavra para a sessão seguinte. - O Digno Par Conde de Sabugosa fala sobre o projecto de reorganização dos quadros palatinos. Segue-se o Digno Par João Arroyo, que responde áquelle Digno Par. - Os Dignos Pares Teixeira de Sousa e José de Azevedo falam sobre a crise do Douro.- O Sr. Presidente do Conselho refere-se ao mesmo assunto. - A sessão é encerrada, e designada a ordem do dia para a subsequente.

Sendo 2 horas e 30 minutos da tarde, o Sr. Presidente abriu a sessão.

Feita a chamada, verificou-se estarem presentes 36 Dignos Pares.

Lida a acta da sessão anterior, foi approvada sem discussão.

Mencionou-se o seguinte expediente:

Requerimento e documentos de Joaquim Telles de Vasconcellos, pedindo para tomar assento na Camara por direito hereditario.

Officio do Ministerio da Guerra, satisfazendo um pedido de requerimentos do Digno Par Sr. Teixeira de Sousa.

Officio do Juizo de Instrucção Criminal, solicitando permissão para o Digno Par Sr. José Vaz Correia Seabra de Lacerda, ir ali depor como testemunha.

O Sr. Presidente: - Consulta a Camara sobre se autoriza o Digno Par Sr. José Vaz Seabra de Lacerda a depor em juizo.

Consultada, a Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Teixeira de Sousa: - Envia para a mesa o requerimento seguinte:

«Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, sejam remettidos a esta Camara, com a maior urgencia, os seguintes documentos:

1.° Copia do processo de rescisão do contrato entre o Estado e a companhia arrendataria da Fabrica de Vidros da Marinha Grande;

2.° Copia de toda a correspondencia trocada entre o governador civil de Leiria e o Ministerio da Fazenda sobre assuntos que digam respeito á Marinha Grande, referida ao tempo decorrido de 1 de janeiro de 1907 até esta data;

3.° Copia da liquidação de partilha de lucros entre o Estado e a Companhia dos Tabacos, em consequencia do accordão do Tribunal Arbitral sobre o mesmo assunto, proferido em 1903;

4.° Nota do numero de homens que o Estado tenha em serviço de fiscalização em 31 de dezembro de 1907;

5.° Copia de quaesquer reclamações ao Governo, feitas pela Companhia dos Tabacos e a dos Fosforos.

Sala das sessões, em 19 de maio de 1908. = Teixeira de Sousa».

Foi lido e expedido.

O Sr. Presidente: - Vae ter segunda leitura a proposta apresentada na sessão passada pelo Digno Par o Sr. Dantas Baracho.

Leu-se na mesa e foi admittida á discussão.

O Sr. Sebastião Baracho: - Mando para a mesa a seguinte proposta:

A intitulada lei de salvação publica de 26 de fevereiro de 1892 impôs os mais pesados sacrificios aos prestamistas e funccionarios do Estado. E foi, porventura, attendendo a que tão extraordinarios e trituradores encargos só muito extraordinariamente podem ser exigidos, que o artigo 11.° da mencionada lei estatue:

Artigo 11.° As taxas fixadas nos artigos 1.°, 2.°, 3.°, 4.° e 9.° começarão a vigorar na data da publicação d'esta lei, e durarão até o fim do anno economico de 1892-1893.

Não obstante este terminante dispositivo, a lei expoliadora continuou integralmente vigorando, por intermedio de successivas renovações orçamentaes, sem que, pelo menos, os governantes conseguissem satisfazer o sadio preceito elementar de equilibrar o orçamento, dando, com esta grosseira falta,

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a prova cabal do que negativamente valem.

Na vigencia de tão depauperantes sacrificios, em logar de se praticar administração moral e economicamente austera, cultivou-se, ao invés, afixadamente, o compadrio e o nepotismo, a começar pelos improvisados catões que tiveram a iniciativa em medida tão insensata quanto contraproducente.

Sob a invocação do, por assim dizer anodino artigo 13.° da supracitada lei lançaram elles a publico, os Catões famosos, no periodo que decorreu de 3 de março a 31 de dezembro de 1892 nem menos de 114 decretos, se bem os contámos; e, bastantes d'elles, excedendo, com indiscutivel aumento de despesa, a autorização, nesse artigo contida, ainda até hoje não estão autenticados com o bill de indemnidade correspondente.

O actual Sr. Presidente do Conselho tem, como Ministro que foi da Marinha e Ultramar, nesse Gabinete, responsabilidades que seriam esmagadoras se entre nós, e com a tradicional vida airada governativa, conjugada com a proverbial brandura de costumes, commettimentos de semelhante jaez não recommendassem os seus autores para o exercicio dos mais elevados cargos publicos.

Na constancia, diga-se de passagem, de uma bem equilibrada lei de responsabilidade ministerial, os corollarios seriam muito diversos.

É indubitavelmente typico, entre os 114 decretos promulgados, o de 14 de agosto de 1892 criando o ruinoso almirantado, de irrisoria e espaventosa memoria, e estabelecendo, sem transição nem diminuição, no quadro do generalato da armada, o limite de idade, á sombra do qual o Sr. Presidente do Conselho medrou, com acceleramento da propria promoção.

No actual Ministerio, e em materia de desapego civico, só se avantaja, attento o caso sujeito, ao Sr. Conselheiro Ferreira do Amaral, o titular da pasta da Fazenda. Metamorfoseado prestidigitadoramente em 1899, sendo Ministro da Fazenda, de capitão archivado em general, fartamente remunerado, o Sr. Conselheiro Espregueira, metteu-se, com o decorrer do tempo, a ermitão, preconizando a economia, - a mais estricta e severa economia... para uso dos outros, que não para si, visto ter lampada em casa de Meca.

Com a queda do Ministerio Dias Ferreira, em 1893, e na successão dos outros gabinetes, até ao presente, inclusive, a situação financeira não melhorou, pela simples razão, que é axiomatica, de que só a boa politica pode produzir as boas finanças. E a politica cultivada, desde então, sem uma aberta sequer, representa a contradição absoluta do evolucionismo redemptor, o qual deve ter, por base, o mais amplo e fecundo exercicio da soberania nacional. Nella, nessa politica bastarda, prevalecem unica e exclusivamente, nos differentes ramos da publica administração, o safaro empirismo e a rotina chanternal, cujos deleterios effeitos não carecem, pela sua assinalada autenticidade, mais larga referencia.

Parallelamente com as ponderações expendidas, para considerar é tambem, como fruta do tempo, e fruta gafada, que os mais nedios orçamentivo os não são, na verdade, attingidos pela debilitante acção da lei de 26 de fevereiro de 1892. As pingues e illegaes accumulações, no serviço do Estado, e a nutriente compartilha em administrações a elle estranhas, collocam, em regra, os dirigentes politicos ao abrigo de quesquer privações. Nestas circunstancias, facil lhes é exhibir o seu desprendimento, não promovendo a revogação da flagelladora lei, na parte que cerceia os parcos, se não insufficientes, vencimentos dos servidores da nação.

A attender ha igualmente que bastaria a reducção em despesas superfluas, como as derivantes das obras arbitrarias nos paços regios, e de outras condescendencias, - permitta-se-nos o eufemismo - avultadamente caras, para com quem dá o pessimo e solitario exemplo de não pagar, ao menos, o tributo de rendimento a que estão sujeitos todos os outros empregados do Estado - bastaria, repetimos, as reducções nas despesas d'essa indole, para attenuar a insustentavel situação dos prestamistas do Erario, e para pôr termo ao regime precario e esbulhador a que se encontra submettido o funccionalismo.

De resto, o abaixo assinado leva empenhada, de longa data, insistente campanha parlamentar, com o objectivo moral, equitativo e justo de se resolver radicalmente esta questão, consoante ella merece, e sem prejuizo de equilibrio orçamental.

É positivamente por isso que nos insurgimos contra o paliativo de carimbo franquista, que denotava, juntamente com outras medidas de natureza similar, ter constituido a imprescindivel plataforma para a liquidação tumultuaria dos adeantamentos illegaes á Coroa, na importancia officialmente declarada de 771:715$700 réis, e para o aumento não menos desordenado de 160:000$000 réis annuaes na lista civil.

E mais nos arraigou, nesta crença, a maneira viciosa como foram applicados, conforme a seu tempo se reconhecerá, os orçamentaes decretos ditatoriaes de 29 de maio e de 29 de junho de 1907.

Posto isto, julga esta Camara opportuno, perante o que fica exposto e comprovado:

1.° Convidar o Governo a estabelecer o desejado equilibrio entre as receitas e despesas do Estado; e, simultaneamente, a trazer ao Parlamento, no mais curto prazo possivel, medidas attinentes a regular a situação do Thesouro para com os seus prestamistas internos, por modo que elles sejam attendidos nas suas bem fundadas revindicações, frequentemente por elles recordadas, desde que foram esbulhados do que honesta e legalmente lhes pertencia.

2.° Manifestar a urgica necessidade de que sejam revogadas todas as disposições da lei de salvação publica de 26 de fevereiro de 1892, concernentes a deducções, de qualquer especie, nos vencimentos dos funccionarios publicos.

3.° Como esclarecimento complementar do numero anterior, significar muito perentoriamente que não são admittidas, em holocausto ao inilludivel proveito do serviço publico, as accumulações de logares, a fim de que não subsista o morbido pretexto da accumulação de estipendios, a qual é expressamente prohibida, e, demais, indecorosa. = Sebastião Baracho.

Foi lida ainda a seguinte

PROPOSTA

Proponho que se dê integral cumprimento ao artigo 16.º do regimento, havendo sessão todos os dias que não forem santificados ou de grande gala na Côrte. = Sebastião Baracho.

E o seguinte

REQUERIMENTO

Requeiro que, pelo Ministerio do Reino, e concernentemente á exploração lyrica do Theatro de S. Carlos, me sejam enviados, com urgencia, os seguintes documentos:

1.° Copia de todo o expediente de secretaria acêrca da mesma exploração, designadamente das bases respeitantes ao respectivo, recente e mallogrado contrato com os concomitantes despachos, de 12 do corrente, do Sr. Presidente do Conselho e Ministro do Reino.

2 ° E attenta a declaração do Sr. Presidente do Conselho, na sessão da Camara electiva de 15 do corrente, copia da renuncia ou desistencia do ex-empresario José Paccini, do aludido contrato. = Sebastião Baracho.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Ferreira do Amaral): - Manda para a mesa o seguinte pedido de autorização:

«O Governo pede autorização á Camara dos Dignos Pares do Reino para que os Dignas Pares Srs. Alexandre Cabral Paes do Amaral, reitor da Universidade de Coimbra e José Joaquim Fernandes Vaz, lente da faculdade de direito da mesma Universidade, possam, querendo, interromper as funcções legislativas conforme a urgencia e necessidade da administração e do ensino da mesma Universidade.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 13 de maio de 1908. = Francisco Joaquim Ferreira do Amaral».

A Camara concedeu a autorização pedida.

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O Sr. Presidente: - Consulto a Camara sobre se admitte á discussão a proposta do Sr. Baracho.

A Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Sebastião Baracho: - Que resolução foi adoptada acêrca da minha proposta?

O Sr. Presidente: - Foi admittida á discussão.

Vou dar a palavra ao Digno Par o Sr. Marquez de Sousa Holstein, que a pediu por parte da commissão de verificação de poderes.

O Sr. Sebastião Baracho: - E quando é que V. Exa. me concede a palavra?

O Sr. Presidente: - Opportunamente darei a palavra a V. Exa.

O Sr. Sebastião Baracho: - E se não puder dar-me a palavra, estou inhibido de mandar para a mesa quaesquer papeis?

O Sr. Presidente: - Eu direi a V. Exa. quando ha opportunidade de enviar para a mesa esses papeis.

O Sr. Sebastião Baracho: - Segundo o artigo 48.° do regimento interno d'esta Camara, eu peço a V. Exa. que mande ler os artigos 16.°, 17.°, 18.°, 19.° e 20.° do mesmo regimento.

O Sr. Presidente: - O artigo 48.°, que V. Exa. cita, refere-se, ao final do discurso que se tenha proferido.

O Sr. Sebastião Baracho: - Eu peço perdão a V. Exa., mas cumpre-me o dever de pugnar pelos meus direitos.

O Sr. Presidente: - Vou ler o que diz o artigo 35.°

(Leu).

O Sr. Sebastião Baracho: - O meu desejo é que V. Exa. respeite o artigo 35.°

O Sr. Presidente (depois de ler): - Como V. Exa. vê, a proposta tem de ser enviada a uma commissão.

O Sr. Sebastião Baracho: - E se eu não estiver de acordo em que a proposta vá á commissão?

O Sr. Presidente: - Mas eu limitei-me a dizer que a proposta estava admittida á discussão, e não disse que ella fosse remettida a qualquer commissão.

O Sr. Sebastião Baracho: - Muito bem; mas em todo o caso peço a V. Exa. que mande ler os artigos 16.º, 17.º 18.º 19.º e 20.º do regimento.

O Sr. Secretario lê os artigos citados).

O Sr. Sebastião Baracho: - Estes artigos não teem sido respeitados.

V. Exa. tem permittido que usem da palavra alguns Dignos Pares, ultrapassando a hora que está marcada para assuntos a tratar antes da ordem do dia, e as sessões não teem durado tres horas.

Eu por mim tenho pedido a palavra todos os dias e tem-me sido por vezes recusada, ou tem-me sido medida dozimetricamente. (Riso).

Peço a palavra tambem hoje.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito.

O Sr. Marquez de Sousa Holstein: - Pedi a palavra, por parte da commissão de verificação de poderes, para participar que essa commissão se acha installada, tendo escolhido para presidente o Digno Par Antonio Emilio de Sá Brandão, e a mim para secretario.

Já que estou com a palavra, peço a V. Exa. que se digne consultar a Camara sobre se permitte que sejam aggregados á mesma commissão os Dignos Pares Julio de Vilhena e Pimentel Pinto.

Consultada, a Camara deliberou affirmativamente.

O Sr. Dias Costa: - Pedi a palavra para apresentar um projecto de lei, que passo a ler.

(Leu).

Sr. Presidente: como se trata de pagar uma divida de honra, não pode haver hesitações; todavia, prevenindo a objecção de que a approvação d'este projecto contende com a questão financeira, eu devo observar que o Sr. general Galhardo percebia uma pensão de 800$000 réis, e por consequencia da approvação d'este projecto resultará apenas para o Estado um encargo annual e temporario de 400$000 réis.

Estou convencido, Sr. Presidente, que a Camara, que tão brilhantemente commemorou as victorias dos nossos soldados em Africa, não regateará a recompensa por serviços publicos tão valiosos e relevantes.

Mando o meu projecto para a mesa.

Foi lido o seguinte

PROJECTO DE LEI

«Artigo 1.° É concedida a D. Carlota Candida Waddington de Brito Galhardo e a D. Eduarda Carlota de Brito Galhardo, viuva e filha do general de brigada Eduardo Augusto Rodrigues Galhardo, a pensão annual de 1:200$000 réis, que lhes deverá ser paga sem deducção alguma, desde o dia do fallecimento do referido official.

§ unico. Á viuva pertencerá metade da pensão e a outra metade á filha.

Art. 2.° A pensão é vitalicia e durará para a viuva e filha, emquanto aquella se conservar no estado actual e esta for solteira.

Art. 3.° A parte da pensão correspondente á viuva, ou á filha, cessará por effeito do seu fallecimento.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Dignos Pares do Reino, em 19 de maio de 1908. = Francisco Maria da Cunha = Julio de Vilhena = Manuel Raphael Gorjão = Antonio Eduardo Villaça = Antonio Teixeira de Sousa = Luciano Monteiro = Antonio Candido = Frederico Ressano Garcia = Luiz Augusto Pimentel Pinto = José Estevam de Moraes Sarmento = Francisco Felisberto Dias Costa».

O Sr. Presidente: - Este projecto fica na mesa para segunda leitura.

As propostas que foram apresentadas pelo Digno Par Sr. Baracho terão o seguimento devido, bem como o requerimento.

O Sr. João Arroyo: - Se ha momentos na nossa historia em que seja necessario dizer clara e firmemente ao país qual o caminho a seguir, um d'elles é por certo este em que tem a honra de falar.

O país levanta-se de uma enorme commoção e está ainda muito longe de se encontrar em situação de tranquillidade, de normalidade.

As tempestades politicas são como as tempestades cosmicas: deixam por longo tempo, no cerebro de todos os que collaboraram nellas ou as presencearam attonitos, uma funda impressão.

Por certo o momento agudo passou; mas da mesma maneira que, quando passa uma tempestade na terra, não é immediato o restabelecimento da tranquillidade na natureza, assim tambem não nos encontramos ainda na normalidade intellectual indispensavel ao estudo e á resolução dos grandes problemas politicos.

Reportando-se ao que se passava no Parlamento quando foram encerrados os seus trabalhos em 1907, affirma que não havia motivos para julgar-se a atmosphera parlamentar incompativel com a marcha governativa do Ministerio de então.

Todavia, as Camaras foram encerradas e, successivamente, a administração publica tomou um caracter de conservantismo exagerado, modificando-se a legislação sobre liberdade de imprensa, de forma a não ser melhor

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a situação criada á imprensa portuguesa do que a situação da imprensa na Russia.

Tão longe foi levado o olvido das normas que devem presidir á regular administração do Estado que, no fim do mês de janeiro, se decretaram medidas repressivas até o ponto de deixarem de ser respeitadas as immunidades parlamentares.

Quando estalou a catastrophe de fevereiro, a impressão não foi só de espanto, foi da mais absoluta reprovação pelo attentado, porque, se uma opposição ou um partido se nobilitam armando uma revolução tendente a vencer a tyrannia, nada pode desculpar o attentado individual, ainda que seja contra a vida do mais modesto cidadão.

A critica não pode deixar de ser impiedosa para o delicto que, de repente, fez tombar na sepultura um homem na plena força da sua virilidade e um adolescente no arrebol da existencia; mas é indispensavel não confundir esse attentado horroroso com o insupportavel regimen que então se estabelecera: com o poder pessoal, a desvirtuação e o esquecimento das garantias mais sagradas contidas na Carta Constitucional, quer sobre a prisão sem culpa formada, quer sobre a liberdade de imprensa, quer sobre a saida do poder real para fora da orbita estricta que lhe está marcada, quer, emfim, á suppressão do Parlamento pelo arbitrio dos governantes.

Essa transformação do regimen constitucional português num regimen turco de governação é que não podia ser. Não então, e não hoje.

Endereça os seus cumprimentos aos homens que hoje occupam os Conselhos da Coroa. Vê ali dois amigos pessoaes, o Sr. Ministro da Justiça e o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; vê ali tres dos mais illustres officiaes militares do nosso país, o Sr. Presidente do Conselho, o Sr. Ministro da Guerra e o Sr. Ministro da Marinha, sem falar no Sr. Espregueira, que, embora seja official general do exercito, é pela sua qualidade de financeiro que mais se tem evidenciado.

Nestes cumprimentos não pode deixar de referir-se ao Sr. Calvet de Magalhães, que sempre tem sido um funccionario muito distincto.

Ao Sr. Presidente do Conselho fará uma referencia mais particular.

S. Exa. preside a um Governo semelhante aos que antigamente se chamavam Governos de comadres ou nephelibaticos e ao qual, criticando-lhe os actos, é preciso distribuir as responsabilidades. D'antes, o carro do Estado era apenas governado pelo chefe do Governo; mas agora as cousas mudaram. Ha atrelados a esse carro os dois partidos rotativos, e quem manda já não é o cocheiro, mas o gado. (Riso).

Para sua defesa parlamentar o Sr. Presidente do Conselho tem adoptado um truc que elle, orador, não pode deixar de considerar efficaz: é o declarar que não quer ser tolerado e que quando o não quiserem se irá embora.

Elle, orador, aconselha porem o Sr. Presidente do Conselho a ser um pouco mais parcimonioso no uso d'esse truc, visto que pode acontecer que S. Exa., querendo ir-se embora, não tenha tempo de aproximar-se da porta, porque, quando menos o imagine, já esteja fora d'ella.

Vae expor resumidamente á Camara aquillo que entende dever ser e caminho politico a seguir na conjuntura actual.

A vida do mais humilde cidadão português é tão respeitavel e sagrada como a do Chefe do Estado; por isso não pode deixar de vir pedir ao Sr. Presidente do Conselho que considere o facto das forças militares e policiaes assassinarem pessoas indefesas, levando assim a dor e a miseria ás portas de muitas familias.

Esse facto não pode deixar de ser base de uma grande transformação das forças policiaes de Lisboa.

Á frente da guarda municipal tem S. Exa. um dos mais distinctos officiaes do exercito. Chame-o S. Exa., ouça-o e, de uma vez para sempre, reduza os corpos policiaes da capital a alguma cousa que seja uma garantia para os cidadãos e não uma força selvagem e assassina contra elles voltada.

Elle, orador, não tem uma confiança cega naquillo a que se chama reformas constitucionaes; sempre que o Poder quiser, saltará por cima de todas as garantias.

A esse proposito, elle, orador, aproveita o ensejo para renovar a iniciativa do projecto de lei sobre cargos palatinos, que apresentara na ultima sessão e que não attinge quaesquer personalidades, mas apenas estabelece principios.

(O Sr. Conde de Sabugosa pede a palavra).

Deseja que a politica seja apenas para os politicos.

Em materia eleitoral é absolutamente indispensavel voltar ao regimen dos circulos uninominaes e acabar com os escrutinios de lista, que teem sido a base dos maiores abusos e deturpações do sistema eleitoral.

De resto, cada um dos homens que occupam as cadeiras do Governo tem de proseguir integerrimamente no desenvolvimento do seu programma governativo. O Sr. Ministro do Reino, atacando de face o problema da instrucção primaria; o Sr. Ministro da Justiça, occupando-se sem demora da legislação relativa á instrucção criminal, á defesa dos direitos individuaes do cidadão no que respeita á prisão sem culpa formada e ainda da legislação de 13 de fevereiro, pondo-a ao alcance dos verdadeiros principios de humanidade e justiça; o Sr. Ministro da Fazenda, não cuidando de aumentar os impostos, mas procurando obter o acrescimo d'essa receita por um melhor processo de cobrança e fazendo ao mesmo tempo a revisão das pautas, de sorte que, sem perder de vista o espirito proteccionista, tenha em attenção os interesses do consumidor; o Sr. Ministro da Marinha, estudando o problema da nossa marinha militar, de forma a que possamos ter o necessario para a instrucção naval e, principalmente, para o serviço colonial; o Sr. Ministro das Obras Publicas, tratando do problema da nossa viação ordinaria, que representa um capital posto em perigo, porque se tem tratado quasi exclusivamente da construcção de novas vias ordinarias, desprezando a conservação das já construidas; finalmente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, negociando tratados de commercio, fundados no regimen das pautas minimas e que assegurem uma facil collocação aos productos nacionaes.

O Sr. Presidente: - Terminou a hora de se passar á ordem do dia. Se V. Exa. quer eu reservo-lhe a palavra para a sessão seguinte.

O Orador: - Pedia a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que eu continue no uso da palavra. Em poucos minutos terminarei o meu discurso.

Consultada, a Camara resolve affirmativamente.

O Orador: - Agradece a annuencia da Camara ao seu pedido e promette não abusar, pois a Camara sabe que não costuma fazer longos discursos.

Para ser levada a effeito esta obra politica com que forças conta o novo Rei?

A apoiá-lo na sua difficil missão estão os dois partidos historicos, o regenerador e o progressista.

Mas é preciso ver que esses dois partidos se acham no mais absoluto descalabro, falhos de vitalidade, porque já veem morrendo de ha longos annos. Nos ultimos tempos da nossa vida politica esses partidos mostraram que valem aquillo que vale a força do poder: muito, sobraçando as pastas ministeriaes; nada, quando as abandonam. Para chegar a esta conclusão nada mais é preciso fazer do que o relato do que foi a acção d'esses parti-

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dos na vigencia da administração regeneradora-liberal.

Não ha duvida que á volta do novo Monarcha se criou uma atmosphera de sympathia rara.

D. Manuel é novo, é um adolescente que teve a vantagem de não ter sido educado propositadamente para o cargo de Rei.

É intelligente e tem a natural ambição dos que começam.

Aquelles que com tanto calor apoiam os successivos actos de dedicação a El-Rei, recommenda elle, orador, pas trop de zéle, sob pena de verem perdida a sua obra.

A primeira obrigação a que, acima de tudo, D. Manuel deve attender, é ser amante do seu país.

É preciso que lhe queira bem e que lhe queira muito; que o seu coração bata com o do país; que, numa palavra, acima de tudo seja um bom português, como Eduardo VII é um bom e o primeiro gentleman inglês.

Em segundo logar é necessario que sacrifique todo o seu tempo, todo o seu cerebro e, se for preciso, toda a sua vida, para defender a liberdade e as nossas instituições constitucionaes.

Conta-se que D. Manuel I, o Venturoso, ao subir ao throno, concentrara o seu ideal politico na figura de D. João II, que com braço herculeo subjugara para sempre as tentativas feudaes da nobreza nacional e continuara a serie dos descobrimentos maritimos que haviam de levar o nome português ao Cabo da Boa Esperança e mais tarde ao Oriente.

E embora a figura de D. Manuel I nunca pudesse igualar o grande vulto politico de D. João II, o certo é que elle soube intelligentemente proseguir na obra do seu predecessor.

Emquanto as naus portuguesas aproavam ao Oriente, lançava elle nos saraus esplendorosos do Paço da Ribeira, que bem podem comparar-se na pompa e na indole artistica aos das Côrtes dos Medieis e dos Valois, os fundamentos da nossa arte dramatica e musical.

Ao novo Monarcha cabe certamente outro ideal politico, em satisfação do qual Elle deve sacrificar todos os minutos livres da sua afadigosa vida.

Esse ideal politico não é, nas exigencias actuaes, o vulto de D. João II, mas singelamente o de D. Pedro V. (Vozes: - Muito bem).

(O discurso do Digno Par publicar-se-ha na integra quando S. Exa. se dignar devolver as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia.

ORDEM DO DIA

É lido na mesa o parecer n.° l, relativo ao projecto de resposta ao Discurso da Coroa.

É do teor seguinte:

Dignos Pares do Reino e Senhores Deputados da Nação Portuguesa. - O mesmo sentimento humano e civico une a todos neste momento e neste recinto - a dor que revive do transito crudelissimo de meu Pae e Irmão, do nosso Rei e Principe.

Não me cabe tecer louvor á memoria do Monarcha extincto, nem tão pouco á esperança posta em Aquelle que lhe herdaria tradições e nome. Invoco esse passo tremendo de martyrio neste primeiro encontro da Coroa e do Parlamento, como sinal de alliança que empenhe a todos na paz e no progresso da nacionalidade.

Sobre o doloroso transe convergiram as sympathias dos Chefes de Estado, das corporações, da imprensa de todo o mundo civilizado, num brado unisono de humanidade e justiça. Do coração maguado do país brotou o protesto de lealismo e devoção á Familia Real e ás Instituições que refirmou as tradições antigas da união do Povo e do Rei. Seja esta agora que, congregando as energias de todos, num esforço supremo, nos avigore para suster o peso das responsabilidades do poder e dos destinos do país.

Essa nunca vista fatalidade fez-me subir ao throno no cumprimento de um dever dynastico e nacional. Da missão, tenho fé em Deus e em vós, representantes da nação, que bem sairei; tenho fé de que concorrerei comvosco para a felicidade do reino, a que toda a Minha vida e acção estão, d'ora avante, inteiramente devotadas. Buscarei inspirar-Me no exemplo dos imperantes que são para gloria da Monarchia e bem das nações, lição viva na arte de reinar; e reinarei, protesto-o, como manda a lei.

Vivemos na paz e amizade das Potencias, que ha bem pouco ainda nos enviaram Principes e missões a tomar parte em nossas dores e infortunio; da Inglaterra, nação alliada, e da Espanha, vizinha e amiga, nos visitaram tambem representantes de suas esquadras. No Brasil, nação irmã, as manifestações attingiram quasi a grandeza de um luto nacional. A todas agradecemos de coração bom reconhecido tão significativos testemunhos.

Tudo nos permitte affirmar que é segura a situação de Portugal na politica externa. Como demonstração da cordialidade d'essas relações, sempre que as circunstancias o teem permittido, com muitas assinámos tratados de arbitragem. E na defesa d'este elevado principio, como norma internacional, se empenhou a nossa representação diplomatica perante o Congresso da Haya.

Senhor. - A Camara dos Pares associa-se, commovidamente, á dor que alanceou o coração de Vossa Majestade pela perda de Seus Augustos Pae e Irmão, Sua Majestade El-Rei o Sr. D. Carlos I e Sua Alteza Real o Principe D. Luis Filipe, e lavra o seu protesto de profunda indignação contra o execravel attentado de que foram victimas.

Esse passo tremendo de martyrio que Vossa Majestade invocou deu ensejo a que a Nação pudesse demonstrar, por inequivocos testemunhos, como é firme a união do Rei o do Povo.

A Camara dos Pares tem fé em que Vossa Majestade, chamado ao Throno no cumprimento de um dever indeclinavel, justificará no decurso do seu reinado as esperanças que os inicios d'elle tem despertado, e reinará sempre - consoante solemnemente protestou - como manda a Lei.

Foi lenitivo á dor que punge esta Camara o saber que as Potencias e entre ellas a Gran-Bretanha, nossa alliada, a Espanha, vizinha e amiga, e o Brasil, nação irmã, tomaram parte no luto nacional, compartilhando com effusiva solidariedade o nosso pesar.

A affirmação de que é segura a situação do Portugal na politica externa foi, como não podia deixar de ser, em extremo grata a esta Camara. No cumprimento de um dever constitucional dará a Camara toda a sua attenção ás convenções internacionaes que, antes de ratificadas, teem de lhe ser submettidas.

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Outras convenções de caracter internacional, pendentes ainda de sancção parlamentar, demandam a vossa attenção, para que não permaneçam por mais tempo sem ratificação, se d'ella as julgardes merecedoras.

Pelo que respeita ao intercambio mercantil, cumpre assentar na base segura da nossa politica commercial externa.

No tocante á politica interna, transpôs-se uma crise que importa liquidar; promulgaram-se providencias de caracter legislativo, algumas das quaes o Meu Governo entendeu, no uso das suas faculdades, dever sem demora abrogar, restabelecendo a normalidade dos direitos individuaes; outras a esta legitima estancia serão sujeitas; o vosso livre exame discriminará o que nessa decretação de caracter ditatorial mereça ou careça conservar-se como lei.

Outra obra de momento e de futuro se impõe: a revisão da Carta Constitucional. O codigo organico de uma nacionalidade tem de passar por estes estadios de correcção, graus successivos de adaptação ás necessidades e aspirações do país. Julga o Meu Governo traduzir um sentimento imperioso no animo dos cidadãos portugueses proclamando a opportunidade de introduzir modificações convenientes nas normas que regulam o exercicio do poder, e determinando-se a forma mais adequada ao funccionamento estavel e harmonico da vida publica. A vós pertence iniciar essa reforma, seleccionando os artigos que tenham de submetter-se ás deliberações das Côrtes Constituintes. E d'aqui deriva para o Parlamento outra pesada tarefa: uma lei eleitoral que inaugure a formação da Camara successora e fixe qual, o systema distributivo do suffragio que o Parlamento prefere para a expressão fiel e integral da representação collectiva da nação.

Eis os pontos cardiaes do trabalho parlamentar que poderão condensar-se neste objectivo: lançar com segurança e exito as bases politicas do novo reinado.

Tem procurado o Meu Governo cumprir escrupulosamente os preceitos legaes: e assim, na epoca prefixada, se realizaram as eleições geraes dos Senhores Deputados da Nação, com plena liberdade em todo o país e absoluta ordem, apenas perturbada em algumas assembleias da capital por incidentes cujas dolorosas consequencias profundamente lamentamos.

Na mesma orientação governativa não faltarão, no prazo regulamentar, as propostas de lei de obrigação, constitucional.

Pelo orçamento geral do Estado conhecereis a situação da Fazenda Nacional e os recursos de que dispõe o Thesouro para occorrer aos encargos dos serviços publicos.

Nos ultimos tempos uma certa perturbação se produziu no movimento commercial e economico do país, notando-se ao mesmo tempo depressão na cotação de fundos publicos e de titulos de algumas sociedades de credito, de par com o aggravamento do agio do ouro. Cessará por certo em breve esse periodo de desconfiança, pelo reconhecimento dos elevados recursos do país e pontualidade com que satisfaz a seus compromissos.

Empenha-se o Meu Governo em que a Nação prosiga no seu desenvolvimento material e economico, e para o conseguir vos proporá differentes providencias tendentes a melhorar as condições do Thesouro, sem novos gravames para o contribuinte, procurando simplificar os serviços de lançamento e arrecadação dos impostos, de que deverá resultar diminuição de despesa.

Com o mesmo intuito vos serão apresentadas as bases de um novo contrato com o Banco de Portugal, que permittirá reduzir os gastos do Estado sem prejuizo dos legitimos interesses d'aquelle estabelecimento de credito, que merece os nossos maiores louvores pelo modo como tem auxiliado o Thesouro nas suas crises financeiras.

Prepara igualmente o Governo o meio de converter a

Igualmente a Camara porá o maximo empenho em cooperar para que na nossa politica commercial externa se accorde em base segura, e que no tocante á politica interna se liquide, como importa, a crise que se transpôs, discriminando se, designadamente, entre as providencias decretadas sem concurso das Côrtes, as que mereçam ser convertidas em leis.

A revisão constitucional e a reforma eleitoral merecerão á Camara dos Pares a mais seria ponderação, e nesse empenho procurará ella concorrer para lançar com segurança e exito as bases politicas do novo reinado.

Compraz-se esta Camara em reconhecer que o Governo tem procurado cumprir os preceitos legaes e em saber que, nesse intuito, apresentará ás Côrtes, dentro do prazo competente, as propostas constitucionaes.

A Camara, ao passo que estimou ter conhecimento de que as eleições geraes se realizaram na epoca prefixada, com ordem e liberdade, lamenta com todos, como Vossa Majestade bem o reconheceu, os dolorosos incidentes que perturbaram algumas das assembleias da capital.

Ao exame do orçamento geral do Estado dedicará esta Camara a mais escrupulosa attenção, designadamente no intuito de acertar qual seja a situação da Fazenda, e de poder avaliar os recursos do Thesouro, e faz votos para que dentro em pouco se encerre o periodo de desconfiança produzido ultimamente no movimento commercial e economico do país, votos que o conhecimento dos recursos nacionaes e do pontual cumprimento dos nossos compromissos por certo confirmará.

O desenvolvimento material e economico da nação, sobretudo sem recorrer a novos gravames tributarios, é assunto que a todos muito deve preoccupar, e assim as providencias que nesse intuito o Governo projecta apresentar e a qua Vossa Majestade individualmente se refere, taes como, principalmente, a simplificação dos serviços tributarios com diminuição de despesa, as bases do novo contrato com o Banco de Portugal sem prejuizo dos seus legitimos interesses, a conversão da nossa antiga divida fundada a cargo da Junta do Credito Publico, a facilitação do pagamento de juros da divida externa no país, a reforma pautal, e a interpretação da lei de contabilidade publica merecerão a mais solicita attenção por parte d'esta Camara.

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nossa antiga divida fundada interna, a cargo da Junta do Credito Publico, por forma a reduzir a grande desproporção entre o nominal e o seu valor effectivo, de que provem suppor-se serem muito maiores, do que na realidade são, os encargos que pesam por esse motivo sobre o Thesouro Nacional.

Para facilitar a vinda e a permanencia no país de estrangeiros, tornando conhecidas e apreciaras as nossas excellentes condições climatericas e as bellezas naturaes, renovará o Governo a iniciativa de propostas anteriormente submettidas á deliberação das Côrtes, introduzindo-lhes ligeiras modificações resultantes de um mais profundo exame do assunto, que, como sabeis, merece hoje a maxima attenção de muitas nações.

É certo que uma grande parte da nossa divida externa está hoje na posse de nacionaes, que são obrigados a mandar cobrar os juros nas agencias financiaes do Thesouro. Para facilitar o pagamento no país, sem novos encargos, promovendo-se ao mesmo tempo ainda mais a acquisição por nacionaes dos nossos fundos externos, o Governo vos proporá providencia que julga benefica para o agio do ouro.

A pauta geral das alfandegas carece de profundas modificações, como modernamente é reconhecido; e para esse fim submetterá o Governo ao vosso exame e deliberação o trabalho preparado por uma commissão especial que foi incumbida d'esse melindroso assunto, e servirá de base para as resoluções que tomardes a semelhante respeito. Tanto o commercio como as industrias nacionaes são interessadas em que se realize em curto prazo tão necessaria reforma, urgentemente reclamada por todos os motivos.

A ultima lei de contabilidade publica carece, para sua mais pronta e cabal execução regulamentar, de algumas disposições interpretativas; para esse fim vos será apresentada a conveniente proposta. Assegurar-se-ha por essa forma mais completamente o cumprimento rigoroso de todas as disposições legaes para a justa applicação dos dinheiros publicos ás despesas legalmente votadas.

Outras providencias mais vos serão lembradas, todas tendentes a melhorar a nossa situação economica, e assegurar o equilibrio das despesas com as receitas publicas.

Afora essas propostas, o Meu Governo vos apresentará outras que julga convenientes.

Assim, podereis apreciar as bases de uma reforma policial tendente a conferir ao corpo de segurança publica os meios materiaes e organização necessaria para o cumprimento efficaz da sua missão protectora e defensiva.

Propostas sobre materia civil e criminal, entre as quaes se destacam, pelo seu caracter social, as de protecção a menores e mulheres, serão sujeitas á vossa apreciação.

O exercito de terra e mar merece-nos a maior attenção como glorioso instrumento da defesa e conservação do reino, a quem o País e a Coroa devem hoje como sempre os mais relevantes serviços, dignos de todo o elogio que d'elles se faça. As victorias ultimas mais uma vez fizeram rebrilhar o valor e firmeza dos nossos soldados e marinheiros, para honra sua e da Patria, que os cobriu de acclamações.

O Supremo Conselho de Defesa Nacional está estudando um projecto de reorganização geral; e, alem d'essa, outras providencias, que teem em vista melhorar as condições da defesa do país, vos serão presentes.

Propostas referentes ao regulamento disciplinar, instrucção e administração navaes serão submettidas á vossa consideração; e ainda aquellas que importam á regulamentação da marinha mercante, que tanto carece desenvolver-se, e á protecção da industria piscatoria, de interesse geral e favorecedora de uma classe tão prestante e laboriosa. Outras, versando as questões mais momentosas do imperio colonial, padrão das nossas glorias, fonte de riquezas, e

As propostas acêrca da reforma policial e de protecção a menores e mulheres serão apreciadas por esta Camara com a devida circunspecção.

Reconhece esta Camara que o exercito de terra e mar, ao qual a Patria tanto deve, é digno, da maior consideração das Côrtes. E aproveita o ensejo de o felicitar e de felicitar o País pelas ultimas victorias alcançadas em duras refregas.

Norteada por aquelle sentimento, esta Camara estudará accuradamente as propostas que lhe forem submettidas, e que tenham por fim aperfeiçoar as nossas instituições militares.

A Camara apreciará devidamente as propostas relativas á instrucção e á administração navaes, á marinha mercante e á industria piscatoria.

As providencias relativas ao nosso imperio colonial, que tamanho e tão grandioso papel representa na nossa vida nacional e independente, serão versadas pela Camara com o cuidado que a todos inspiram e merecem.

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penhor da nossa independencia, constituirão alvitres de fomento agricola, industrial e ferro-viario, e regularão o trabalho indigena e a emigração de trabalhadores.

Por igual na metropole, convindo attender ás necessidades de circulação e producção, o Meu Governo vos proporá os meios efficazes para a conclusão da rede de estradas, attendendo tambem á conservação e reparação das existentes, e remodelando e reorganizando os serviços da agricultura e da industria, fontes principalissimas da riqueza.

Dignos Pares do Reino e Senhores Deputados da Nação Portuguesa:

A vida dos Parlamentos reside, por sua natureza, no embate e discussão de opiniões diversas; pois tudo quanto pode estremar homens, desde a classe social até a paixão dos credos politicos, nelles encontra voz e defesa.

A finalidade parlamentar consiste em compor todas essas forças em uma só resultante - as conveniencias publicas; ganhará o país em que todos entendam lutar por se excederem uns aos outros na promoção das resoluções mais acertadas ao beneficio da vida nacional.

Subordinado tudo ao conseguimento do bem immediato da Patria, bella e duradoura será a obra do Parlamento - essa a que o país e o Chefe do Estado confiadamente esperam d'esta Alta Assembleia.

É crença tradicional, e incentivo foi ella para a grandeza dos nossos maiores e para a constancia de animo revelada nas epocas mais attribuladas, que a Providencia vela pelos destinos do país. Que no nosso coração de Patriotas se avive, mais que nunca, a fé no futuro de Portugal! Nesse alevantado sentimento se estreitam o Rei e o Povo Português.

Está aberta a sessão.

O desenvolvimento da circulação e da producção, e por isso a reparação dos meios de communicação e os serviços agricolas e industriaes serão particularmente estudados por occasião do exame das propostas a tal respeito apresentadas.

A camara dos Pares. Senhor, conscia das graves responsabilidades que lhe impõe a hora presente, e certa de que só a livre discussão, a tolerancia reciproca e a imparcialidade na deliberação, podem concorrer para o bem da nação, fará o maximo esforço para da sua parte corresponder á confiança de Vossa Majestade e do país, e espera, com o auxilio da Divina Providencia, que isso alcançará, estreitando-se assim, em elevado sentimento, o Rei e o Povo:

Antonio de Azevedo Castello Branco = Julio de Vilhena = Francisco Antonio da Veiga Beirão (relator).

O Sr. Sebastião Baracho: - Sr. Presidente: Desejo que V. Exa. me diga quaes são os assuntos que estão dados para ordem do dia, e igualmente desejo que se digne indicar-me a hora a que finda a sessão.

O Sr. Presidente: - Para ordem do dia está dada, alem da resposta ao Discurso da Coroa, a eleição de commissões. A sessão termina ás 5 1/2 horas.

O Orador: - Pela resposta de V. Exa. reconhece-se que, para discussão, apenas ha a resposta ao Discurso da Coroa, cujo debate costuma ser prolongado nos países que melhor cultivam o parlamentarismo.

Entre nós, succedia outro tanto nos tempos aureos da luta dos partidos com programmas definidos, com aspirações que se entrechocavam. Depois caiu em desuso o cultivo d'esta doutrina fiscalizadora dos actos ministeriaes, sem que pela minha parte me deixasse envolver na onda com que foram açoitadas as boas praxes do constitucionalismo.

Em 1906, parecia terem resurgidoas antigas praticas que, por tanto tempo, estiveram nocivamente postas de parte. Com effeito, a discussão sobre a resposta ao Discurso da Coroa, nesse anno, iniciou-se, nesta casa, em 6 de novembro, para terminar depois de vinte sessões uteis, em 4 de dezembro do mesmo anno. Os quatro anteriores diplomas da mesma indole nem sequer foram apresentados a debate.

O relaxismo dominante relegara-os para o limbo das commissões. A resposta ao Discurso da Coroa, em 1907, foi liquidada na sessão de 29 de janeiro do mesmo anno, e ainda sobrou tempo para se passar a outra ordem do dia.

Desnecessario seria recordar que eu, nessa epoca, não frequentava o Parlamento, porque, se o frequentasse, o debate seguramente se teria prolongado por muito mais tempo.

O resultado das complacencias parlamentares de 1907 para com o Governo da epoca, é conhecido pelo seu tragico desfecho. Nem outra solução era de esperar do incestuoso e espurio con nubio, então vigorante, de tão tristes recordações.

Mas, Sr. Presidente, facilimo seria, até com vantagem para o País, que a controversia fosse essencialmente limitada na questão sujeita. Bastaria para isso que os governos amoldassem os seus actos pelas leis vigentes, e os identificassem com o sentir nacional. Succede, porem, isso com o Ministerio actual? Não.

O Sr. Conselheiro Ferreira do Amaral desperdiçou o melhor ensejo de toda a sua vida para prestar um assignalado serviço á Nação. Para isso, seria sufficiente que, em logar de se identificar com os erros rotativos, d'elles se tivesse afastado, organizando um gabinete, que trilhasse por senda muito diversa da que tem percorrido o actual.

A sua marcha vacillante e tortuosa traz-me á memoria a apostrofe do rhetorico atheniense:

« - Como o cipreste, ó Phocion, tu és esguio e triste, e não produzes frutos!...»

Parafraseando-a, direi do Ministerio actual: - Como o cipreste, tu és sinistro e triste, e produzes maus frutos! ...

E se alguma duvida houvesse a tal respeito, bastaria lançar a vista pelo diploma que se discute, cuja nulla feição é manifesta.

Nuns pontos é vago e dubio; e noutros essencialmente omisso.

É omisso quando se abstem de fazer referencias á necessidade inilludivel de uma lei de responsabilidade ministerial; á urgencia de revogar a lei scelerada de imprensa, de 14 de abril de 1907; e á indispensabilidade de punir severamente os pretorianos assassinos de 5 de abril derradeiro.

Consoante é notorio, a concentração franco-progressista teve, por uma das suas iniciaes escoras, o compromisso de

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dotar o país com uma lei de responsabilidade ministerial. A proposta correspondente teve parecer, e foi mandada para a mesa, nesta casa do Parlamento.

Não se tornou, porem, em realidade, porque semelhante acto não convinha ao ditador que estava desabrochando, segundo previam todos aquelles em que a miopia não fazia estragos, profundos.

Na concentração em que pontifica, na actualidade, o Sr. Presidente do Conselho, figura tambem a phalange progressista. Mas, nem por isso se faz allusão alguma, na fala do Throno, á conveniencia de uma lei de responsabilidade ministerial; e todavia nunca a sua falta se fez sentir tanto como na actualidade, em que os Ministros absorvem todos os poderes, em que o arbitrio e a violencia são de todos os momentos.

Com a conservação da abominavel lei de imprensa dão-se identicas anomalias. Os mais verbosos é loquazes rotativos juraram aos seus deuses, combatendo aquelle monstro, que elle seria destruido logo que elles tivessem acção preponderante no Governo do País.

Ahi se ostentam agora, enlaçados no Sr. Presidente do Conselho, e todos elles não só não pensam sequer em pulverizar o aborto, outrora alvo das suas iras, mas aproveitam-no até para amordaçar os adversarios, sem escrupulos de maior. Conforme se observa, a moral concentrada não prima por meticulosa, nem tão pouco por honesta.

Quanto ao castigo que tem de ser imposto aos janizaros policiaes, militares e civis, o silencio da fala do Throno, não é menos significativo do que o que se manteve nos outros dois pontos que já versei.

Recapitulemos em poucas palavras o occorrido:

Nas assembleias de Santos, Alcantara e Santa Justa os eleitores foram maltratados pela policia, provocadora e desordeira.

Dos crimes commettidos resultaram quatorze mortes e cerca de cem feridos.

Da policia nenhum dos seus agentes teve a mais minima beliscadura. Em Santa Justa a matança prolongou-se por tres horas, e teve a mais cruel e covarde exteriorização.

Já o disse aqui, e repito-o agora, nem o Sr. governador civil, nem o commandante da guarda municipal intervieram para pôr termo á chacina.

O Sr. commandante da 1.ª divisão militar só tarde, e depois de prostrados cinco dos seus soldados, deu acordo de si, substituindo a policia assassina por uma força de linha, do exercito, a qual se conduziu correcta e dignamente.

A intervenção do Sr. Presidente do Conselho mais aggravou a situação, porque a sua acção resultou da peregrina nota officiosa em que procurava irresponsabilizar os assassinos, sem ter uma palavra de lastima e de sentimento pelas victimas d'elles.

Com respeito á ordem geral n.° 3 da guarda municipal, de 14 de fevereiro de 1894, - áquella cruelmente famosa disposição que manda fazer as pontarias ao centro do alvo para que se poupem as munições, - o Sr. Presidente do Conselho não é mais avisado e prudente do que o foi com a nota officiosa.

A sua puerilidade em affirmar que a ordem draconiana não tem sido recordada nos ultimos tempos, prova apenas que ella está bem na memoria dos seus executores, como de facto as occorrencias hodiernas comprovam. Se ella estivesse em desuso, é que seria recordada a sua observancia. É elementar.

A ordem, porem, tem de ser cancelada em preito aos principios humanitarios, em homenagem á dignidade militar.

O Sr. Presidente do Conselho assegurou que está um general encarregado de proceder á syndicancia apuradora das responsabilidades de cada um nos factos occorridos. Esse inquerito prolonga-se já preguiçosamente, por mais de um mês! Convem que o Sr. Presidente do Conselho não abuse, por semelhante forma, da paciencia publica.

Á cidade de Lisboa tem de ser dada reparação condigna pelo barbaro attentado de que foi alvo. O exercito, que briosamente se conduz, possue igual direito a que se lhe proporcione a satisfação que merece.

Não creia o Sr. Presidente do Conselho que é possivel, mais uma vez, fazer valer a impunidade para com a policia criminosa, civil e militar.

Se o Sr. Presidente do Conselho alimenta tão estranha pretensão, labora num completo engano. D'aqui lh'o asseguro muito perentoriamente, para que não tenha futuras surpresas, quando o reptar e o chamar a contas, por cumplicidade inilludivel nos assassinios do povo paciente da capital.

Em Italia deram-se feitos similares aos succedidos aqui, e tambem no começo de abril. Lá, a força publica só appellou para os meios extremos, depois das previas advertencias regulamentares, depois de trinta e um dos seus serem alvejados pelos projecteis dos amotinados.

Dois dias depois, em 3 de abril, o Presidente do Conselho italiano dava conta ao Parlamento do succedido, servindo-se para tal fim de um relatorio, elaborado, não por um funccionario dependente do Governo, mas por um empregado superior da Camara Municipal de Roma.

Aprenda o Sr. Presidente do Conselho com exemplos d'esta natureza, e procure amoldar por elles os seus actos, a todos fazendo justiça, como lhe cumpre.

Nessa orientação tente cultivar a coherencia que lhe tem faltado até agora, a ponto de me ser licito assegurar que, se o Governo tivesse de ter representação no Zodiaco, nenhum dos doze signos, nelle existentes, lhe poderia aproveitar. Teria de ser criado um novo signo, o qual seria o do camaleão.

Sr. Presidente: citei as omissões da resposta ao Discurso da Coroa, que mais escandalizam sem duvida, os espiritos liberaes.

No decorrer do debate, outras muitas salientarei, como de resto se reconhecerá desde já, pela leitura que passo a fazer da minha

MOÇÃO DE ORDEM

A contar do encerramento tumultuario da ultima sessão legislativa, em 10 de maio de 1907, precipitaram-se os acontecimentos, que liquidaram violentamente o anterior reinado, como o abaixo assinado ha longo tempo previa, consoante consta das chronicas parlamentares e para os quaes insistentemente chamara debalde a attenção governativa.

O movimento de retrocesso, que se iniciara em 1886 com a derogação do Codigo Administrativo, de 6 de maio de 1878, mais se accentuou depois de 31 de janeiro de 1891.

Ao mallogro da tentativa revolucionaria de então, cuja genesis se encontra na derrocada em que se sobrelevam, na politica externa, o ultimatum de 1890, e na politica interna, a descambada financeira, com a correspondente bancarrota, alguns meses depois a esse mallogro, repetimos, succedeu-se o transformismo dos processos liberais de administração, até ali correntios em asphyxiantes expedientes de dominio absorventemente autoritario e centralizador.

Foram os dirigentes que falliram; e, demais, fraudulentamente. Pois foi aos dirigidos, aos eternos explorados, que foi imposta a mais rigorosa interdição. Os que, pelos seus erros e crimes politicos, deviam ser sujeitos á mais severa tutela, dimanante da soberania nacional, abusaram pharisaicamente da força derivativa do poder, para se arvorarem em arbitrarios tutores, cuja incapacidade se tem exuberantemente patenteado, nos ultimos annos, e corre parelhas com a audacia insciente com que dissiparam o patrimonio constitucional legado pelos nossos maiores, e por elles estabelecido á custa dos mais patrioticos sacrificios.

Conscios da sua incompetencia, como homens publicos, usaram e abusaram da ditadura, umas vezes disfarçada sob os andrajos das autorizações parlamentares, outras vezes ostentando feição desfaçada e impudente, e sempre, empregada como anteparo das pugnas no Parlamento, as quaes nunca foram apanagio da insignificancia e do obscurantismo.

D'este estado morbido derivaram as leis de excepção, que exautoram e esmagam, com o concomitante engrandecimento ao poder real, que deprime e envilece, e tem especialmente em mim transformar o cidadão dignamente aprumado e altivo, em vassallo domesticado, sem iniciativa nem acção, viril.

Resvalando por esta pendente, que devia inevitavelmente conduzir ao fundo do preci-

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picio, estava, sem a menor duvida, indicada, para apressar a desamparada queda, uma lei eleitoral, em que o suffragio honesto, expressado honestamente, fosse calcado pela fraude exercida na mais larga escala, com superintendencia no Ministerio do Reino, arvorado em feira franca para captação de venaes, - em pelourinho e azorrague para os recalcitrantes e refratatios á intimidação e ao compadrio.

O decreto ditatorial de 8 de agosto de 1901 preencheu completamente essa lacuna, e deu vida e realce ao rotativismo, em cuja anterior vigencia a fiscalização parlamentar apenas foi exercida por um ou outro isolado das duas facções conhecidas, que pomposamente se denominavam partidos, mas que na verdade não passavam de oligarchias, cuja feição parasitariamente alimenticia lhes proporcionava inscrição garantida nas parcerias, mutualidades e cooperativas mais substanciosamente preponderantes.

O absolutismo bastardo, com os seus perniciosos effeitos, exhibiu-se então em toda a sua pujança, e desde janeiro de 1902 foi por mim verberado persistentemente. Ás minhas desinteressadas e insistentes advertencias, correspondiam, com mais intensidade, as manifestações rotativas, concretizadas no desbarato da Fazenda Publica, no cultivo affixado do nepotismo, no esmagamento das liberdades individuaes, nos latrocinios da Azambuja, por occasião das eleições de 12 de fevereiro de 1905, e nos do Peral, a 29 de abril de 1906, commemorando com este ultimo feito, tão pouco harmonico com a probidade e a decencia politicas, a outorga da Carta Constitucional da Monarchia

Esse caracteristico ataque á genuinidade eleitoral produziu o 4 de maio, cuja truculenta expansão, motivada pela impune selvajaria policial, forneceu a materia prima para o advento do franquismo, em 19 do ultimo citado mês, com a sua ingenita e irritante obcecação, do posso, quero e mando, com o seu liberalismo hypo rita, com a sua tão ostentosa quanto refalsada moralidade, indubitavelmente de contrabando. Era fatal.

A deslisar d'esta data, que já se tornara famosa, por a ter celebrizado, em 1870, o marechal Saldanha, o viver nacional foi abalado e sacudido em todos os sentidos. A inço herencia messianica pronunciava-se, por assim dizer, ininterruptamente, ao ponto de, na sessão d'esta Camara de 10 de outubro de 1906, a cinco meses escassos do inicio ministerial, eu collocar em destaque a indole paradoxal do supposto redemptor franquista, nestes termos claros:

Na opposição esfalfou-se o Sr. Presidente do Conselho para passar por liberal. Pela parte que, me respeita, nunca o acreditei. Supponho, sim, que S. Exa. conhece o dito de Tal leyrand:

- Não são os ventos que mudam, são as ventoinhas.

Ora eu não quero attribuir-lhe o papel de aquilão. Não desejo que se constipe. Em ventoinha está e em ventoinha continuará, «não admirando que em breve torne a usar da ditadura». Em tal caso, abram todos os seus guarda-chuvas, que a tormenta será desencadeada. Emigre quem, puder.

E é por isto tudo que eu, mais uma vez, prevejo para breve a liquidação, com a fallencia do existente, que, será completa e, quiçá, fraudulenta.

Norteando para a ditadura fora do Parlamento, dentro d'elle a ia preparatoriamente exercendo o chefe franquista, concentrado para a cultura d'essa fundamental prepotencia, com a facção progressista, e auferindo para o mesmo effeito, a benevolencia dos regeneradores, confessada pelo proprio chefe d'esse grupo, Hintze Ribeiro, seguidamente ao encerramento violento das Côrtes, em 10 de maio de 1907.

Na constancia d'este mephitico conubio tentou-se reformar o regimento d'esta Camara, no intuito de a diminuir na sua acção, reduzindo-a a docil e maleavel instrumento do executivo. Contra semelhante attentado protestei nas sessões de 7 e 8 de janeiro do anno preterito, interrompendo a frequencia d'esta casa pelas razões adduzidas nessas mesmas sessões. Ao terminar os reparos correspondentes, explanados na sessão do dia 7, pronunciei estas precisas palavras:

Com a reforma do regimento, no sentido indubitavelmente aviltante que o Governo pretende, destroe se o ultimo baluarte sensato, liberal, que restava no nosso organismo representativo.

Pelo encerramento de mais esta valvula de expansibilidade, só resta o appello para a revolução, nacional, violenta.

É de todos os tempos. É a historia de todos os países.

Mais cedo ou mais tarde lá se chegará; e antes mais cedo - tudo o indica - do que mais tarde.

Os fados hão de cumprir-se.

É inevitavel.

Na sessão do dia 8, pus termo, por este modo, ás minhas ponderações:

Hoje, como hontem, concluirei as minhas observações, chamando mais uma vez a attenção do país para o caminho perigoso, de impenitente e despotico autoritarismo, trilhado pelo Governo.

O absolutismo bastardo que de dia para dia mais se affirma, exautorando-nos, conduz-nos á asphyxia.

Contra as prepotencias que se dão tão variadas e persistentes, a, historia só indica um remedio: - o appello redemptor para a revolução nacional armada.

Poderia o reviramento completo, no exercicio e nos costumes governativos, suspender a derrocada?

Hontem respondi em português. Hoje faço-o em latim:

«Quos vult perdere Jupiter dementat prius».

Não obstante o regimento d'esta Camara não ter experimentado alteração alguma a situação agravava-se pouco depois, não sendo attendidos os meus vaticinios e predições, cujo cumprimento se verificou, nas suas differentes fases até o seu tragico desfecho, em menos de treze meses. A lei de responsabilidade ministerial, que a despeito dos seus defeitos originarios, podia ter serviço de travão aos desmandos do sectarismo dominante, não passou de proposta, que ficou enterrada nesta casa, com parecer da commissão respectiva e mandada para a mesa num dos ultimos dias de dezembro de 1906. Os preconcebidos projectos ditatoraes do Governo obstaram a que ella entrasse em discussão

A ditadura, a sinistra e macabra ditadura, que se prolongou desde 10 de maio de 1907 a 31 de janeiro de 1908, constitue ferrête indelevel na historia patria, qualquer que seja o aspecto por que for apreciada.

No seu tem geral não contem uma medida unica de valor, que tal nome mereça. Não moralizou, nem enalteceu a nação. Terrorizou-a e deprimia-a descaroavelmente, tudo anarchizando Provocou, ou antes, fomentou a intervenção externa, deslocando inhabil e anti-patrioticamente, para a imprensa estrangeira, a apreciação aviltante das questões internas mais melindrosas. Pelo mesmo conducto, expôs á animadversão mundial os homens mais graduados do rotavismo, alguns d'elles companheiros, em Ministerios precedentes, do maioral da seita franquista, que não vacillara, pouco antes em lhes acceitar as condescendencias, e de quem elle solitara o amparo com que medrou e adquiriu forças para sequentemente os fustigar com a maxima crueldade, malsinando-lhes as taras que lhes attribuia.

Desgraçadamente fez escola este negregado processo de ajuste de contas, mais ou menos inconfessaveis, e no seu exercicio funesto se exhibiram numerosos politicos de vario matiz, e até o Chefe do Estado foi colhido na avariada engrenagem, que a tudo e a todos desconceituava, arrastando o país pela via mais escabro. Neste verdadeiro Calvario, esteve crucificado o credito da Nação, durante meses que pareciam interminaveis. Doloroso é consigná-lo; mas é um facto de triste notoriedade universal, como não menos dolorosa e triste é a pertinacia doentia com que as proclamava especulativamente, e ainda se proclama, que só a forma monarchica de Governo pode conservar a autonomia nacional, quando esta, consoante ternos sustentado aqui, neste mesmo logar, é funcção exclusiva da nossa vontade, e do juizo, criterio e sensatez com que nos conduzirmos.

Por seu turno, o terror, com as associadas e odiosas pavorosas, como a dos 21, e as prisões em massa, em semeado a esmo, sem passar, porventura, pela mente dos opressores o adequado conceito do genial Victor Hugo:

Quando um poço não resiste a quem o esmaga e mais fraco do que uma criança, ou de que um, imbecil.

«A declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão», proclamados pela assembleia constituinte em 1789, e actualmente collados em todos os edificios publicos de França, fornece lição proveitosa, muito para ser meditada, nos seus tres seguintes artigos:

Art. 25.º A soberania reside no povo. É una, indivisviel, imprescritivel e inalienavel.

Art. 27.º Todo o individuo que usurpara soberania será immediatamente submettido á morte pelos homens livras.

Art. 35.º Quando o Governo viola os direitos do povo, a insurreição é, para o povo, e para cada porção de povo, o mais sagrado direito e o mais indispensavel dever.

De resto, a Carta Constitucional estatue:

Art. 113.º Todos os portugueses são obrigados a pegar em armas para sustentar a independencia e integridade do reino, e defendê-lo de seus inimigos externos e «internos».

Pela sua parte, o § 1.° da artigo 145.° da mesma Carta determina:

Nenhum cidadão pode ser obrigado a fazer ou deixar fazer alguma cousa senão em virtude da lei.

Analysando-a, ainda sob outro prisma, a dictadura foi fertil no suborno, na corrupção e no esbanjamento, conforme o demonstram algumas das suas disposições mais caracteristicas, attingindo até á liquidação subversiva de 771:715$700 réis de adeantamentos illegaes á Coroa, cuja dotação não menos tumultuariamente foi aumentada pelo mesmo decreto liquidatario de 30 de agosto de 1907, posteriormente revogado, em 160:000$000 réis annuaes, com detrimento do artigo 80.° da Carta Constitucional, da lei dotal de 28 de junho de 1890 e dos mais elementares preceitos de moralidade e de compostura.

Sob o seu significado despotico - seja-nos licito insistir - ella difficilmente encontra confronto, mesmo nas epocas remotas em que a tyrannia era attributo inherente aos Chefes de Estado, em todo o ponto alheados da civilização e do progresso. O decreto de 31 de

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janeiro de 1908, entregando ao arbitrio do Governo a honra e a liberdade dos cidadãos foi o remate das loucas medidas liberticidas implantadoras da, escravidão, entre nós, em plenos seculo XX É perversamente typico, na sua especialidade terrorista.

A elle se seguiram, como corollario, em 1 de fevereiro, os tragicos successos que de terminaram a ascensão ao poder do actua gabinete, em 4 do mesmo mês, e cujo programma, na verdade recommendavel, par; occasião tal, era assim enunciado: - legalidade e acalmação.

Mas como é que o concentrado Ministerio vigorante tem acalmado?

Pela forma mais insufficiente, original e até, condemnavel, senão criminosa.

É certo que, na sua estreia, abriu as portas das prisões a bastantes perseguidos, que ali cruelmente jazeram incommunicaveis dias e dias, por muito presarem a Liberdade, - por atacarem de frente os crimes nefandos da dictadura.

Mas nem todos os sacrificados, na ara da Patria receberam a reparação a que tinham jus. A primeira amnistia, decretada em 12 de fevereiro, tem tanto de mesquinha, como de inhabil. As genuinas conveniencias sociaes politicas, de verdadeira justiça, impunham lhe, pelo contrario, a feição mais latitudinaria. Pois, nem com o segundo acto de clemencia, de 8 de maio corrente, se alvejou esse objectivo. Como a primeira, a segunda amnistia é acanhada e rachitica. Mantem politica e socialmente o virus bramanico, que agrupa desigualmente, por castas, o que deveria, sem discrepancias, nivelar-se, em proveito da paz e ordem publicas, e em homenagem á igualdade perante a lei e ás superiores conveniencias da Nação.

De resto, o Governo já anteriormente tinha attestado a sua myopia politica, abstendo-se de fazer referencia alguma, no Discurso da Coroa, á necessidade de uma ponderada lei de responsabilidade ministerial, e á urgencia de se reformar a iniqua lei da emissão do pensamento, cujo aniquilamento tinha sido jurado, quando da sua discussão, pelos garrulos paladinos, hoje concentrados. Evidentemente, as boas graças ministeriaes não estão reservadas para os que officiam no tabernaculo da Liberdade e do Progresso.

É profundamente deploravel semelhante procedimento, tanto mais se o cotejarmos com o havido para com os apregoados fomentadores de intentonas para restauração do norteamento retrogrado que nos transportou, pelo mais curto caminho, ao macabro 1 de fevereiro.

Para com os que pugnam pela Liberdade e pelo legalismo, a mais injusta e descaridosa severidade; para com os indigitados pretenderes a resuscitarem os dolosos expedientes que despenham irremediavelmente na escravidão, na revolta e no assasinio politico, a mais intensiva generosidade e a mais paternal indulgencia. Não faz sentido.

Acalmar não é pactuar, e muito menos fuzilar; e, todavia, o Governo tem pactuado e fuzilado em abundancia. Parece mesmo que não sabe fazer outra cousa.

Com effeito, cultiva os antigos erros que arrastaram ao desabamento do anterior reinado, servindo-lhe de traço de união o decreto eleitoral, cuja consagrada qualificação de ignobil, syntheticamente o define, e o reputa nos necessarios termos para ser estrondosamente repudiado.

Em logar d'isto, foi carinhosamente acolhido, com detrimento da Constituição, mediante o decreto dissolutorio da Camara electiva, em que foi patentemente postergado o § 4.° do artigo 74.º da Carta, fortalecido pelo § 2.° do artigo 6.° do terceiro Acto Addicional de 3 de abril de 1896, e que o § 2.° do artigo 7.° do segundo Acto Addicional de 24 de julho de 1885 tinha alterado. A este respeito não pode levantar se a mais pequena duvida O § 4.° do artigo 74.° retro citado estabelece:

Prorogando ou adiando as Côrtes Geraes, dissolvendo a Camara dos Deputados, nos casos em que o exigir a salvação do Estado, convocando immediatamente outra que a substitua.

É esta uma das attribuições do poder moderador, exercida com a responsabilidade dos Ministros de Estado, segundo o estatuido no artigo 6.° do terceiro Acto Addicional supra referido.

E foi, porventura, salvo o Estado com a dissolução de 27 de fevereiro?

Ninguem o poderá assegurar em boa razão. Os mais elementares preceitos de seriedade no poder, se não a salvação publica, impunham a conservação da Camara transacta que deveria reunir e funccionar, com o primordial objecto de poupar ao novo reinado a sua inauguração parlamentar com uma Camara que de electiva só tem o nome, com uma Camara escandalosamente manipulada no Ministerio da Reino, como o foram toda as precedentes e oriundas da mesma fabrica.

Na vigencia de semelhantes processos, regime parlamentar não vae alem de uma desastrada mystificação. O Parlamento, que deveria engendrar os Governos, é por este engendrado, a seu gosto, talante e capricho A soberania popular, base de toda a nação que se preze, não passa de um devaneio e de um mytho.

É concebivel que uma situação d'estas tenha existencia que não seja ephemera, perante as necessidades da epoca, e a indispensabilidade da collaboração de todas as forças vivas nacionaes, na administração dos nego dos publicos? Nem o optimismo proverbia do classico Dr. Pangloss pode, responder affirmativamente a esta interrogação.

É certo que, para os mais repugnantes attentados, a Historia nos fornece precedentes. Assim, Francisco I da França, cujo feitio voluntarioso não conhecia escrupulos, affirmou, em circunstancias para elle difficeis:

- O meu ardente amor patrio faz com que eu ache honestas e justas todas as cousas.

Dentro d'esta formula acomo laticia cabem todos os desmandos, todas as violencias, todos os crimes. Mas, por muito concentrado que seja, e é, rotativamente falando, o actual Governo, não se me afigura asado o momento para que elle se intevre nos cynicos antecedentes transmittidos pelo seculo XVI.

De resto, no seculo XX que vae decorrendo, e sob o ponto restricto de fraudulentas manobras eleitoraes, a França ainda nos fornece esta licenciosa e dementada receita de facil fabrico de Deputados:

Quand on tient les urnes, on tient tout.

Foi seguramente consideração identica que levou o Governo a perfilhar, com especial carinho, o decreto eleitoral de 8 de agosto de 1901, em cuja execução assinalou, demais, o tradicional impudor rotativo-franquista, celebrando acordos deprimentes entre as varias oligarchias monarchicas, apropriando-se deshonestamente de minorias, que só ás opposições competia disputar, e aventurando-se, para esse fim, a desdobramentos, cuja burla evidente, na sua essencia e na sua exteriorização. Depois d'isto e dos cortes nos recenseamentos, representando só em Lisboa a exclusão de 5:000 a 6:000 eleitores republicanos, não se pode ir mais alem na manigancia eleitoral.

Sempre mantivemos estes principios, sempre os sustentámos nesta mesma tribuna. O appello mais uma vez posto em destaque, pelos poderes publicos, para tão corrosivos embustes, determina a renovação dos nossos protestos, mormente por os derradeiros ataques ao decoro e ás mais elementares conveniencias sociaes partirem de quem se propunha a remediar erros inveterados, que de longe veem, segundo o reconhecia o fallecido Rei D. Carlos, na sua celebre e celebrada epistola de 16 de maio de 1906, dirigida a Hintze Ribeiro.

Em logar de uma eleição honrada, autentica, realizou-se uma sangrenta escamoteação, sem que os pretorianos assassinos tivessem a mais ligeira arranhadura. Na capital do reino, em Lisboa, correu o sangue generoso de cidadãos obscuros, é certo, mas nem por isso menos zelosos na sustentação dos seus direitos, e que legitima e pertinazmente, com sacrificio da propria vida, contrariaram as exautorantes trapalhices consentidas, se não insinuadas, pelos governantes e grosseiramente executadas pelos seus amoucos. Nem outras podem ser as apprehensões dos caracteres de bom quilate, perante a impunidade, ou pouco menos, dos traficantes, exhibidos em tão repugnantes sortes de prestidigitação - dos criminosos, que, por triste ironia, intitulados agentes da ordem publica, promoveram a desordem e ceifaram covardemente existencias, não poupando, na sua febre de carnificinia cannibal, os cidadãos inermes, os proprios camaradas militares, e até os menores, completamente estranhos ás pugnas politicas. Em Roma, cujos tumultos quasi coincidiram com os de cá, o procedimento do Governo e da policia foi muito differente. Ali não se conhecem o medo e o associado regime do terror, no poder. Respeitam-se a lei e a vida do proximo.

A complacencia ministerial ainda com maior intensidade se fez sentir, ulteriormente á eleição, para com a escoria social, composta na sua maioria de garotos e vadios, os quaes conspurcaram livremente a cidade durante vinte e quatro horas, e cujo apparecimento a lume tresandava a policia - a vil expediente policial. A armadilha, porem, não surtiu effeito. Apesar de incitados até ao rubro pela matança da vespera, os republicanos - faça-se-lhes a devida justiça - abstiveram-se de compartilhar de tal manifestação. Assisadamente se evidenciaram, e procederam como quem dispõe da força, e, portanto, como a quem a ordem preferentemente aproveita. Proseguiram na orientação que exuberantemente tinham patenteado no comicio de 29 de março de 1908, em Lisboa, e que, de resto, affirmaram em todas as operações de propaganda, preliminares do acto eleitoral.

O engodo policial apenas colheu na rede, em virtude das rusgas subsequentes, bastos incautos, cujo noctambulismo os irmanou, na provisoria moradia em recinto fortificado, com o refugo e escomalho das alfurjas e congostas, cavilosamente aproveitados para enxovalho da cidade e dos seus dignos habitantes.

Nem como derivativo, á Alcibiades, pode tão pouco ter cotação. O effeito que d'elle se esperava, se alguem o esperava, para desnortear a opinião publica, foi contraproducente. Causou naturalmente nauseas que tão levianamente se tripudiasse sobre os cadaveres dos que na vespera tinham sido ardilosamente fuzilados pelos carrascos de officio, disfarçados em pacatos agentes policiaes, civis e militares. O habito não faz o monge, é da sabedoria das nações.

Aos barbaros morticinios do dia 5 e ás permittidas arruaças do dia 6, seguiu-se a tragedia da madrugada de 8, nas adjacencias do quartel da cavallaria da guarda municipal em Alcantara. Nella perdeu a vida um soldado d'aquelle corpo e outro ficou gravemente ferido, sendo autor do crime um agente e policia preventiva, um espião, que, pouco depois naquella qualidade se denunciava ao juiz de instrucção criminal.

A despeito d'isso, esta autoridade, integrando-se com as deploraveis tradições do

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12 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

repugnante e odioso cargo que exerce, determinou prisões e conservou incommunicaveis, por quarenta, e oito longas horas, oito individuos, cuja innocencia lhe não podia offerecer a menor duvida, e, tanto assim, que nem sequer foram interrogados Quem lhe mereceu preferente e especial attenção foi o assassino, que, installado commodamente no Governo Civil, se permittia convocar, decorridos tres dias, os reporters de varios jornaes, com quem desabafou as suas lamuriosas maguas.

Apurou-se que, tanto o aggressor como os aggredidos, exerciam a espionagem. Aquelle, por dever da sua desprezivel profissão, e os outros dois arvorados vergonhosamente em espias amadores, com o objectivo de preservarem o seu commandante de esquadrão, de ataques que elle receava. Como tudo isto é exautorante!...

Nestas manifestações de inilludivel decadencia, que precederam, em todas as epocas, as estrondosas tempestades, a imprensa periodica trouxe apropriadamente á supuração a famosa ordem geral n.° 3 das guardas municipaes, de 14 de fevereiro de 1894, que autentica o mais truculento espirito de corporação, e de que destacamos este, entre outros, lapidar dispositivo:

Que, esgotados os meios suasorios e quando as forças de infantaria, reconhecida a ineficacia da arma branca, tenham de recorrer ao fogo, as pontarias «sejam mandadas fazer ao centro do alvo», para que as munições não sejam perdidas e fiquem bem evidenciados os funestos resultados da desobediencia.

Lê-se, e não se acredita, que se chegasse a este extremo de crueza, para não dizer de crueldade. De longa data, e designadamente na sessão de 8 de novembro de 1904, eu insisto, nesta Camara, pela transformação, sem aumento de despesa, da guarda municipal em guarda civil, o que seria de vantagem incontestavel, para o serviço publico, policial e do exercito.

As hodiernas aventuras, em que essa corporação tristemente se celebrizou, preconisam e tornam opportuna uma tão salubrizadora medida, que - desnecessario seria lembrá-lo - deve ser acompanhada da escrupulosa depuração, que adequadamente se lhe impõe, perante o estado putrido verificado no seu degenerado organismo.

Associadamente e consoante tambem tenho sustentado com pertinacia, torna-se indispensavel o radical transformismo: - da policia civil, por maneira a que deixe de ser, como é, um instrumento de oppressão, para se converter em apoio e protecção dos cidadãos, como deve ser; e, bem assim, do juizo de instrucção criminal, a fim de que d'elle sejam expurgadas as degradantes funcções da policia preventiva, com a completa destruição da correspondente Bastilha, feudal e deshumana, para nelle exclusivamente pontificar a Justiça, limpida e recta, encarnada na Themis purificadora que a mythologia grega celebra, e todos os paises civilizados acatam e cultivam.

A promiscuidade vigorante de attribuições do juizo de instrucção tem, não ha duvida, de ser extinguida sem delongas. Os factos delictuosos a que nos temos referido, aggravados com as devassas e as buscas violentas e vexatorias, praticadas em 9 de abril, e, tendo por alvo dois centros republicanos, evidenciam o insano intento de macular um partido, obedecendo-se para isso á torpe especulação de desorientar a opinião publica. O mesmo gafado proposito resalta do monstruoso procedimento havido em 30 do citado mês, para com os cidadãos Macedo Bragança e Mendes de Almeida, e que, de resto, attesta, sem objecção razoavel, que é urgente, repetimos, arrasar a Bastilha, queimando toda a fetida e pestilenta legislação que a escora, e cujos dirigentes, no seu nefasto exercicio, podem mudar de nome e teem mudado, mas não mudam nem podem mudar de rumo, nem de processos. Delenda Bastilha!...

Esses artificios, porem, longe de alliviarem, mais compromettem o Governo, cuja obvia cumplicidade na matança eleitoral de 5 de abril, apparece em relevo na nota officiosa, elaborada nesse mesmo dia sem escrupulosa inquirição previa, sem uma palavra sequer de lastima e de condolencia para com as despreoccupadas victimas da janizara chacina, levada desalmadamente á realidade pelos suppostos agentes da ordem.

Simultaneamente ella, a nota descaridosa e pungente, visava a cobrir e a irresponsabilizar os mamelucos policiaes, militares e civis, incitando-os, portanto, indirectamente, a futuras empresas e façanhas repulsiva e repugnantemente sanguinarias, com a sequente e profanadora sequestrarão, em uso, dos cadaveres dos cidadãos immolados.

Debalde se recorre - podem crê-lo - a tão tortuosos e perfidos expedientes. Para o doloroso sentimento, emanante dos sangrentos successos do lancinantemente memoravel dia 5, e de todas as successivas façanhas arbitrariamente praticadas, sob pretexto da conservação da ordem publica, só ha lenitivo na justa punição dos reus confessos e mais delinquentes, a começar pelos membros do Ministerio, mormente do Sr. Presidente do Conselho, cujas responsabilidades, na questão sujeita, se avantajam ás dos seus collegas, especialmente depois de ter referendado, com o Sr. Ministro da Fazenda, o abominavel decreto de 23 de abril de 1908, que estabelece a devassa e a espionagem permanentes para com as habitações e os habitantes do municipio de Lisboa.

Á falta de instrumento legal mais apropriado, como seria uma lei de responsabilidade ministerial, digna d'essa denominação, tem o chefe do gabinete de ser chamado aqui, nesta casa, mais uma vez, á autoria, por modo que não possa haver a menor illusão, acêrca de como S. Exa. conjuga os verbos legalizar e acalmar, que constituiam toda a sua bagagem, em materia de programma politico, no seu advento ministerial.

O Sr. Presidente do Conselho não previu, o que a poucos é dado, mas nem mesmo aproveitou com as lições da historia, o que está ao alcance dos simples mortaes.

Na sua Sciencia Social, Herbert Spencer certifica:

É sempre assim. Pode-se predizer, sem perigo de errar, que os resultados que se esperam de uma lei são excedidos, em muito, pelos que se não esperam.

Com o decreto eleitoral de 8 de agosto de 1901, succedeu exactamente o que assegura o grande observador e philosopho britannico.

Pela sua applicação, não liquidou, esse diploma, politicamente, o franquismo; nem diminuiu o vehemente impulso republicano, vedando o Parlamento aos representantes d'esse partido: nem tão pouco se conseguia mitigar os achaques de que enferma a monarchia. Nada d'isso.

O que devia ser um commodo bordão de amparo das instituições, e dos rotativos e consortes que, mais ou menos interesseiramente as acolitam, transformou-se, com o uso, no mais potente ariête, demolidor de umas e dos outros. Não resta duvida de que os resultados imprevistos do execrando decreto excedem, em muito, os resultados previstos. Este juizo conceituoso poderia ter-se formado, mesmo antes da ultima experiencia, que a todas as anteriores se sobrelevou em alcavalas, traiçoeiramente ensopadas em sangue innocente e nobre de portugueses.

Não são licitas duas opiniões, nesta materia: - o actual Governo concentrado confunde-se, em todo o ponto, com os seus antecessores rotativos. Eis, num sucinto arrolamento, o que elle alem do que vae narrado, esquece, gafa e oblitera:

- A substituição, em Camara constituinte, da obsoleta Carta Constitucional, por uma Constituição emanada da soberania nacional, e nesta se identificando a vida politica do país;

- O derramamento da instrucção, em todos os seus ramos, mormente da instrucção primaria, preparando para o referendum popular das leis fundamentaes da Nação;

- O repudio de todos os decretos e leis de excepção, não esquecendo o de 23 de abril de 1908, que franqueia o lar domestico a repugnantes e permanentes pesquisas policiaes;

- O cultivo das mais amplas liberdades, publicas e individuaes, de pensamento e de consciencia, de reunião e de associação;

- A existencia de uma lei de responsabilidade dos Ministros, criminal e civil, por cujas apertadas malhas não possam esquivar-se a prestar estreitas contas aos seus legitimos julgadores, os Secretarios de Estado, autores de attentados contra as leis vigorantes;

- Uma lei eleitoral, em cuja applicação o suffragio universal seja proporcional e genuinamente expressado, devendo, perante as funestas lições colhidas, fazer-se o regresso da correlativa verificação de poderes, á propria assembleia eleita;

- A mais larga descentralização politica e administrativa, que nos resgate da humilhante, inepta e injusta tutela existente, a cujo abrigo é escandalosamente disfrutado o País, convertido em morgadio das oligarchias rotativas e congeneres;

- A extincção de todos os decretos, leis e outras quaesquer disposições, engrandecedores do poder real, os quaes aviventam e dão realce ao absolutismo bastardo predominante;

- A remodelação da policia civil, com a simultanea transformação, sem aumento de despesa, da guarda municipal em guarda civil, e com o aniquilamento, pronto e rapido, do feitio policial do juizo de instrucção, a começar pela derogação, sem demora, do decreto scelerado de 19 de setembro de 1902;

- A abolição do decreto ultra-reaccionario de 18 de abril de 1901, com reintegração da legislação anterior que extinguiu as ordens religiosas de nefastas recordações, e de não menos nefastos resultados hodiernos; e, bem assim, a revogação da lei de 21 julho de 1899, que autoriza o Governo a conceder licença regia para ordenação ecclesiastica aos cidadãos portugueses, graduados ou doutorados nas faculdades de rheologia ou direito canonico das Universidades pontificias de Roma;

- A iniciativa na nomeação de uma commissão de syndicancia parlamentar, por mim differentes vezes reclamada, cujos membros sejam recrutados em todos os partidos e facções, e cujo objecto teria a minuciosa investigação do que occorre ha annos nas secretarias do listado, a fim de se dar com sinceridade e proveito geral, integro cumprimento ao § 5.° do artigo 15.° da Carta Constitucional, o qual preceitua que, na morte do Rei ou vacancia do Throno, se institua exame da administração que acabou, e se reformem os abusos nella introduzidos;

- O registo civil obrigatorio de nascimentos, matrimonios e obitos;

- A separação das igrejas do Estado, acompanhada de leis complementares, em que este fique salvaguardado na sua neutralidade, isto é, em que se mantenham o pensamento e a consciencia livres, na sociedade livre;

- O acatamento, sem tergiversações, pelo habeas corpus, e a instrucção contraditoria dos processos criminaes, desde o seu inicio, com o emprego constante do jury, quer nos tribunaes collectivos, quer nos de um juiz unico,

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como precioso elemento de rectidão, redimindo-nos do sectarismo identificado com os julgadores profissionaes;

- A reforma da magistratura judiciaria consolidando-lhe a independencia, e estabelecendo, nesse proposito, o imprescindivel limite de idade;

- A transformação do systema penal, com a completa extincção da deshumana reclusa penitenciaria;

- A mais ampla amnistia para todos os crimes e delictos politicos, commettidos até 3 de janeiro, inclusive, de 1908;

- Alem da syndicancia de ordem geral, um inquerito especial, immediato, para apura mento de responsabilidades de toda a especie, motivadas pelos adeantamentos illegaes fazenda da Casa Real e a quaesquer funccionarios do Estado, apuramento que deve abranger todos os assuntos em que a Corôa auferiu, pelos diversos Ministerios, benesses de natureza varia, com violação indiscutivel das leis do reino;

- A abolição da lei de salvação publica de 26 de fevereiro de 1892, conforme as instancias parlamentares por mim realizadas com frequencia, e segundo o espirito e letra de propria lei, affirmada no seu artigo 11.°, qual estabelece que as legisladas espoliação de genero diverso, para reparar os rombos produzidos no Erario, por inveterados esbanjamentos em proveito de afilhados e nepotes, apenas vigorariam até o fim do anno economico de 1892-1893;

- A remodelação dos impostos, com suppressão dos de consumo e do de real de agua e a sua substituição pelo de rendimento, progressivo, incidindo sobre o capital nas sua varias producções;

- A reforma da contabilidade publica;

- A extincção dos monopolios existentes, á medida que possa legalmente effectivar-se tão sadia providencia, e o impedimento de futuros emprehendimento d'esses, de tão funesto resultados;

- A reforma das pautas, tendo em attenção em equitativas proporções, o recommendavel equilibrio dos interesses do consumidor, de trabalho e do capital;

- A remodelação dos serviços fiscaes, internos, com extincção da Inspecção Geral dos Impostos, e reunindo, num unico diploma as disposições a elles concernentes, como base fundamental de simplicidade, cohesão e harmonia para o desempenho de tão importante ramo da administração publica;

- A extincção do deficit orçamental, cuja persistencia mantem periclitante a situação financeira;

- A criação de um banco emissor do Estado, cujas condições fiduciarias preparem a convertibilidade da nota, em ouro, com o cambios ao par;

- A elaboração do orçamento do Estado por forma simples, nitida e sincera, deixando de ser o emmaranhado campo de acção da burocratica orçamentologia indigena e o repositorio de verbas não autorizadas por lei;

- A prohibição, sem admissão de subterfugios de especie alguma, da alienação de titulos da divida publica, na posse da Fazenda;

- A expurgação, alvejando os orçamentivoros de polpa, das accumulações de cargos e de vencimentos, em cujo disfruto elles medram, com prejuizo do serviço e do depauperado Thesouro;

- A excommunhão maior para com a plutocracia insaciavel, inexoravelmente exploradora e de intervenção assaz ruinosa nos negocios publicos;

- O preparo, mediante administração pautada, honesta e reformadora, da conversão, em consolidada, da, por assim dizer, fabulosa divida fluctuante, cuja cifra era em 30 de junho de 1906, no país 61.843:227$436 réis, e no estrangeiro 11.503:174$485 réis, perfazendo 73.346:401$921 réis, e attingindo em 31 de março de 1908, no país 61.733:250$357 réis, e no estrangeiro 14.283:951$505 réis, sommando 76.017:201$862 réis;

- Escrituração especial relativa ao producto do imposto de 2 por cento para a reforma dos officiaes do exercito,- imposto estabelecido pela lei de 22 de agosto de 1887, ampliado pela de 26 de julho de 1899, e cujo rendimento é desconhecido, por ser cobrado como receita geral do Estado, não podendo, em taes circunstancias, apreciar-se em quanto elle attenua a despesa do Erario, com os reformados;

- Elaboração do inventario dos bens da Corôa, immoveis e moveis, determinado pelo artigo 8.° da lei de 16 de julho de 1855, e a que se referem outras leis e diversas instancias e deliberações parlamentares; e bem assim, designação da importancia apurada, por dispensa ou reembolso dos direitos aduaneiros em proveito da Casa Real, desde 1 de janeiro de 1890 até a presente data;

- Abstenção absoluta dos creditos especiaes, ordinarios e extraordinarios, por parte do poder executivo, e cujo abuso tem chegado ao extremo de se dispor dos rendimentos publicos, improvisando-se para isso emissões que nunca se realizaram, de emprestimos que nunca foram collocados, como o autorizado pela lei de 30 de junho de 1903 para compra de material de guerra, e na importancia de 4.500:000$000 réis, subdivididos em cinco series;

- Discussão annual sem protelação admissivel, do orçamento do Estado; e, na observancia do § 10 ° do artigo 15.° da Carta Constitucional, fixação, tambem annualmente feita das forças de mar e terra, ordinarias e extraordinarias, no proposito de não ter nova edição a infracção que subsiste, a despeito de vehementes e repetidos protestos meus de serem o ultimo orçamento e leis constitucionaes correlativas parlamentarmente approvados, os referentes ao anno economico de 1904-1905;

- Dotação dos meios defensivos nacionaes por terra e por mar, amoldados pelas circunstancias do Thesouro, e attinentes a constituirem um solido penhor da independencia patria;

- Nesse mesmo intuito, reformar o exercito purificando-o, demais, de anomalias e de nullidades, algumas praticadas até em promoções de officiaes, e para elle transplantando regalias e immunidades, no disfruto dos officiaes de marinha;

- Revisão do Codigo de Justiça Militar e do regulamento disciplinar, comprehendendo entre as modificações a introduzir no primeiro, a abolição da pena de morte para o crimes, quaesquer que elles sejam, commettidos em tempo de paz;

- Inscrição annual, no orçamento do Ministerio da Guerra, do producto das remissões militares, e bem assim da sua applicação;

- Adopção de disposições similares ás constantes das dos dois ultimos articulados, tanto na legislação penal da armada, como no orçamento do Ministerio da Marinha e Ultramar;

- Na acquisição de material naval, ter presente que os magros recursos do Thesouro não nos permittem aspirações, se não phantasias, de possuirmos uma esquadra de combate no alto mar, devendo sensatamente imitar-nos, na escolta de navios, aos que melhor possam, pelo seu typo, cooperar efficazmente na defesa de Lisboa e das costas maritimas metropolitanas, e aos que mais uteis serviços coloniaes possam prestar;

- Obstar ao uso immoderado que se faz do artigo 15.° do Primeiro Acto Addicional de 1852, decretando-se providencias, algumas bem dispensaveis e muitas de assinalada gravidade, com menoscabo da interferencia parlamentar;

- Derogação, pura e simples, do decreto de 14 de novembro de 1901, respeitante á organização militar do ultramar;

- Regulamentação da mão de obra ultramarina, com equilibrio dos immutaveis factores nella a considerar, isto é, o espirito humanitario, os interesses geraes do Estado e os especiaes dos cultivadores, e ainda os da boa vizinhança para com as limitrophes regiões estrangeiras;

- Combater, nas suas raizes, a anarchia e a immoralidade coloniaes, onde ellas existem, e simultaneamente criar fontes de receita e criar e realizar economias, que nos desonerem ou pelo menos alliviem de encargos que esmagam, na actualidade, a metropole - assuntos estes de que, no decurso dos trabalhos parlamentares, se fará a explanação devida.

- Nessa marcação, preparar cautelosamente a descentralização de serviços, dando para isso iniciativa vivificadora a todos os cidadãos que sinceramente d'ella possam compartilhar em beneficio geral; e, parallelamente, fomentar a moralização dos costumes pelos bons exemplos officiaes, de que deve ser pedra angular a inexoravel punição de empregados relapsos e concussionarios;

- Reorganização das missões religiosas com suppressão do subsidio aos frades do Espirito Santo, dispensando-os de missionar nas provincias ultramarinas, onde, pelo que respeita a Angola, custaram em dinheiro - alem de outras pingues achegas - desde 1887-1888 a 1901-1902, a elevada somma de 540:880$000 réis, dos quaes 65 contos de réis naquelle ultimo exercicio;

- A mais absoluta parcimonia, no emprego de expedições militares metropolitanas, devendo ter-se em mim, quando d'ellas não possa prescindir-se, que o castigo de rebeldes e insubmissos é apenas um incidente na vida colonial, cuja consolidação, em proveito da civilização, do progresso e do Erario, só se adquire com a suasoria assimilação do indigena ás boas praticas dos preponderantes europeus;

- Regressão aos bons tempos da publicação regular e methodica dos Livros Brancos, os quaes habilitam o país, pelos seus representantes, a julgar da acção da nossa chancellaria na manutenção dos direitos nacionaes;

- Nesse norteamento saluberrimo, dar preferentemente a lume, com a possivel brevidade, e como para nós mais importantes, os documentos concernentes: - Ao convenio com os credores externos, de 14 de maio de 1902, do qual apenas foram trazidas a esta Camara, por instancias minhas, em 10 de janeiro de 1903, as duas notas diplomaticas, allemã e francesa, pelas quaes a fiscalização estrangeira, com os seus deprimentes e aviltantes attributos, ficou implantada entre nós; aos dois contratos dos tabacos, de que estão exclusivamente publicados, tambem por iniciativa minha, conforme consta da sessão d'esta casa, de 30 de agosto de 1905, dois telegrammas lapidares e duas notas famosas; á questão marroquina e adstricta conferencia de Algeciras; á derradeira conferencia da Haya; aos sanatorios da Madeira; ao conflicto niponico-chinês e concomitancias; á mão de obra colonial; e ao porto de Lisboa;

- Ainda com respeito ao porto da capital do reino, e da sua actual exploração, dar cumprimento integral á legislação vigente, pondo termo immediato ás ruinosas anormalidades commettidas na mesma exploração, para gaudio e lucro de nepotes e de apaniguados.

- Apuramento minucioso do que se tem gasto, por annos economicos, em contravenção do preceituado no artigo 4.° da lei de 16 de julho de 1855, confirmado pelo artigo 5.° da lei de 28 de junho 1890, com obras, mobiliario e illuminação dos Paços Reaes, desde 1 e janeiro de 1890 até a presente data.

- Largo fomento agrario, como poderosa alavanca do desenvolvimento economico, e designadamente resolução da questão vinico-

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14 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

la, amoldada por estes salutares preceitos: - intensa repressão da fraude, quer no país quer no estrangeiro; adopção da marca official da região productora, gratuita e obrigatoria; e prohibição absoluta do alcool industrial, na lotação dos vinhos.

- Impulso razoavel e methodico á viação accelerada, e restauração da arruinada viação ordinaria, consoante as leis vigorantes, emquanto uma sensata descentralização não delega nos povos, mais directamente interessados, esse benefico encargo;

- Dedicar attenção acrisolada e incessante ao problema operario, cuja honesta solução, melhorando a precaria existencia dos proletarios e desvalidos, constitue o timbre e a divisa das sociedades humanitariamente seleccionadas;

- Restricção ao indispensavel, se não prohibição, de comboios especiaes, ferro-viarios, em proveito de privilegiados, os quaes devem dar o exemplo da parcimonia, da correcção e da compostura, no dispendio dos haveres do Estado;

- E, emquanto não se verificam as reformas retro-enunciadas, a pronta regressão, como começo de vida politicamente decente, á legislação vigorante em 31 de dezembro de 1885, facilmente assimilavel ás necessidades occorrentes, e cuja preconização o abaixo assinado tem, com insistencia, feito, nomeadamente nas sessões d'esta Camara de 4 de junho de 1906 e de 10 de novembro d'esse mesmo anno.

Posto isto, a seu tempo, no decorrer dos debates parlamentares, comprovarei os meus assertos. Preceptivamente se confirmará então que foi, por processos e arremetidas ministeriaes de igual jaez, que se preparou a ruina e subversão do precedente reinado, ao qual a ditadura franquista deu o golpe de misericordia.

Neste momento, porem, e para concluir, limito-me a recordar, muito prudentemente:

- As mesmas causas produzem os mesmos effeitos. = Sebastião Baracho.

Lida a minha moção, notarei que o primeiro acto do Governo resulta do decreto de 5 de fevereiro que restituiu á liberdade bastantes presos politicos, e que franqueou a fronteira aos emigrados que no estrangeiro se tinham refugiado, para se furtarem á acção despotica da ditadura. Para sentir é apenas que o decreto não fosse de maior envergadura, tendo-se ampliado áquelles que, ainda hoje detidos, expiam o ter affirmado a sua repulsão pelos dirigentes que abusavam do poder, triturando a Lei e esmagando a Liberdade.

Outros decretos, e esses com a data de 27 de fevereiro ultimo, merecem tambem menção especial. Começarei por succintamente analysar o que dissolveu a Camara dos Deputados transacta, para se proceder á eleição que se verificou em 5 de abril.

As conveniencias mais elementares e os preceitos constitucionaes, constantes do § 4.° do artigo 74.° de, Carta Constitucional, impunham a conservação d'aquella Camara - até, pelo menos, ella produzir uma nova lei eleitoral que satisfizesse ás exigencias da rectidão e de probidade indiscutiveis na emissão do suffragio popular.

Em logar d'isso, recorreu-se á condemnada lei de 8 de agosto de 1901, cujo producto viciado e vicioso inaugura parlamentarmente o novo reinado. Se é assim que se pretende firmar a monarchia, pouco viverá quem não experimentar a mais completa desillusão. Não é com degenerados processos d'estes e concomitantes vivas e salamaleques que os thronos se consolidam. As instituições para viverem desaffrontadamente, carecem de se integrar com os mais escrupulosos ditames do legalismo e com o mais assinalado fervor pela Liberdade.

Não é respeitado quem o quer ser; mas simplesmente quem é respeitavel. É por isso, diga se de passagem, que a policia, a pretoriana e mercenaria policia indigena não é nem pode ser respeitada, porque não é em ponto algum respeitavel.

O Sr. Presidente do Conselho devia ter deixado ao suffragio livre a manipulação da Camara electiva, que seria muito differente da que S. Exa. engendrou.

Tudo deixa prever que os velhos partidos rotativos e congeneres estão feridos de morte. Se a actual Camara, proviesse de differente origem, autorizada pela sua genuinidade inatacavel, a agonia dos rotativos e consortes, não se prolongaria como se está prolongando, coma cumplicidade do Sr. Presidente do Conselho, e com prejuizo fundamental dos mais caros interesses da Nação.

O Sr. Presidente: - Como a hora está muito adeantada e o Digno Par Sr. Sebastião Baracho, naturalmente não conclue hoje o seu discurso...

O Sr. Sebastião Baracho: - Ainda hoje o iniciei.

O Sr. Presidente: - Perfeitamente de acordo; mas como o Digne Par não pode hoje concluir as suas considerações, e como ha oradores inscritos para antes de dar a hora, caso S. Exa. a isso se não opponha, poderia ficar com a palavra reservada para a proximo sessão.

O Sr. Sebastião Baracho: - Da melhor vontade.

(S. Exa. A não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Conde de Sabugosa.

O Sr. Conde de Sabugosa: - Agradeço a V. Exa. e á Camara a gentileza de que usaram para commigo, permittindo que pronuncie algumas palavras nesta altura da sessão. Serei muito breve no que tenho a dizer.

Ao entrar hoje nesta sala, estava o Digno Par o Sr. João Arroyo renovando a iniciativa de um projecto destinado, no dizer de S. Exa., á reorganização dos cargos palatinos.

Quando o Digno Par, o anno passado, enviou o seu projecto para a mesa, eu entendi que devia apresentar o meu protesto, não contra a iniciativa de S. Exa., porque ella é um direito que pertence aos membros d'esta Assembleia Legislativa: mas contra o que se me afigurou ser uma censura ou uma suspeição lançada sobre uma corporação, da qual tenho a honra de ser chefe.

A essa corporação pertenceram dignos ornamentos d'esta Camara, taes como: Duque de Saldanha, Fontes Pereira de Mello, Duque de Loulé, Cardeal Patriarcha e Duques de Palmella e da Terceira, e todos estes homens illustres souberam conciliar sempre as suas funcções na politica com os deveres que lhes acarretava o desempenho dos seus serviços no Paço.

Estabeleceu o Digno Par no seu projecto, que os cargos no Paço mudem com as situações politicas.

Eu disse o anno passado, e repito-o agora, que o systema proposto pelo Digno Par é exactamente aquelle que leva para o Paço as paixões politicas, porque os nomeados poderão muito bem deixar-se influenciar pelo modo de ver e de sentir dos partidos, ou das facções a que pertencem.

Disse o Digno Par que desejava que a politica fosse só para os politicos.

Eu entendo que a politica tem duas accepções; ou é o justo interesse pelo bom andamento dos negocios publicos, ou é o recurso a processos inconfessaveis, que se empregam para o conseguimento de fins, igualmente inconfessaveis.

A primeira politica todos nós podemos e devemos exercer, pois todo o cidadão, Par do Reino, Deputado, qualquer pessoa, emfim, com um cargo no Paço ou sem elle, se deve interessar pelo bem do país. A segunda ninguem a póde exercer, porque a intriga politica, aquella em que se empregam todos os meios, sejam elles quaes forem, para conseguir os seus fins, essa ninguem a deve exercer. (Apoiados).

O Digno Par Sr. Arroyo resalvou todas as personalidades, o que muito lhe agradeço em meu nome e em nome de todos os meus collegas. E faço votos para que, se o projecto de S. Exa. chegar a vigorar, o meu successor tenha a mesma isenção com que eu tenho sempre procedido no Paço. (Apoiados).

Quero ainda acrescentar que a politica, na baixa accepção da palavra, nunca entrou no Paço durante o reinado de El-Rei D. Carlos, nem em-

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SESSÃO N.° 6 DE 19 DE MAIO DE 1908 15

quanto eu lá estiver entrará no actual reinado, porque conheço bem o caracter do actual Soberano para affirmar que elle é inacessivel a intrigas de que o queiram rodear.

O Sr. João Arroyo: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Eu inscrevo o Digno Par.

Estão inscritos, antes de S. Exa., os Dignos Pares Teixeira de Sousa e José de Azevedo.

O Sr. Teixeira de Sousa: - Eu cedo da palavra. Falo depois.

O Sr. José de Azevedo: - Declaro tambem a V. Exa. que não tenho duvida em falar depois do Digno Par o Sr. João Arroyo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Digno Par o Sr. João Arroyo.

O Sr. João Arroyo: - Agradece a amabilidade dos seus collegas que desistiram da palavra e a benevolencia da Camara.

Vê-se obrigado a repetir a declaração que fez o anno passado, quando apresentou o projecto a que se referiu o Digno Par Sr. Conde de Sabugosa, declaração que, aliás, se inspirou na consideração que, em geral, tributa a todos os seus collegas, e, em especial, aos cavalheiros que exercem cargos palatinos.

Considera hoje, considerou hontem, considerará sempre um direito do Parlamento Português o discutir a organização da casa civil e militar de El Rei.

É um direito que lhe pertence, como representante do país, e de que não pode nem deve desapossar-se.

As palavras que então proferiu, forçoso é accentuá-lo, não continham, nem podiam conter, a mais pequena insinuação, a mais leve referencia pessoal a qualquer dos cavalheiros que exercem esses cargos.

Entendeu o Digno Par Sr. Conde de Sabugosa repetir este anno alguns dos argumentos com que, por algum tempo, entreteve a attenção da Camara o anno passado.

Elle, orador, sustenta o que então disse, mas se o Digno Par quiser versar mais desenvolvidamente o assunto, desde já se declara á disposição de S. Exa. para tal fim.

Nas suas palavras de hontem, como nas de hoje, como nas de ámanhã, se está a homenagem que tributa ás elevadas qualidades de S. Exa., encontra-se igualmente definido o direito que lhe assiste de explanar um thema, que é discutido e apreciado em todos os Parlamentos do mundo.

(O Digno Par não reviu).

O Sr. Teixeira de Sousa: - Sr. Presidente: pedi a palavra para tratar de um assunto de interesse local.

Recebi telegrammas do Douro no sentido de se acudir á situação angustiosa em que encontram os povos d'aquella região.

V. Exa., Sr. Presidente, conhece o assunto por isso que honrou com a sua presença uma reunião que ha poucos dias se realizou e á qual assistiram tambem alguns Dignos Pares, nossos collegas, e os Srs. Deputados eleitos por aquella provincia.

Nessa reunião deliberou-se que uma commissão, que era composta do meu amigo o Sr. José de Azevedo, do governador civil de Villa Real e de mim, procurasse o Sr. Ministro das Obras Publicas e expusesse a S. Exa. a situação afflictiva d'aquelles povos em virtude dos vinhos d'aquella região não terem venda.

Vae-se realizando a profecia que fiz nesta casa do Parlamento quando se discutiu o regime especial para os vinhos d'aquella região.

Ao mesmo tempo que se estabelecia aquelle regime, permittia-se a entrada em Villa Nova de Gaia de milhares de pipas de vinhos do sul, emquanto esses vinhos se vendem, os vinhos da região do Douro conservam-se nas adegas e o vinicultor não tem com que pagar ao operario, nem sequer com que comer.

A verdade é que naquella região nunca houve uma situação tão angustiada pela escassez de trabalho, aggravada pela carestia dos generos de primeira necessidade, em que figura o pão. A verdade é, Sr. Presidente, que naquella provincia ha fome.

Nós procurámos o Sr. Ministro das Obras Publicas, e S. Exa. reconheceu a justiça do nosso pedido e mostrou o maior desejo de concorrer tanto quanto pudesse para melhorar a precaria situação do Douro, para o que ia levar esse assunto ao primeiro Conselho de Ministros.

Nestas circunstancias, cumpro um dever apresentando ao Sr. Presidente do Conselho este meu pedido, a fim de attenuar quanto possivel a situação difficil em que se encontra o Douro, e isto com a maxima urgencia, para evitar maiores males e impedir perturbações de ordem publica, que seriam inevitaveis e causa de desgostos para o Governo.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Ferreira do Amaral): - Pedi a palavra para declarar ao Digno Par que o Sr. Ministro das Obras Publicas já me tinha, posto ao facto da reunião e do pedido a que S. Exa. se referiu.

Hoje deve reunir-se em minha casa o Conselho de Ministros, e o primeiro assunto que se ha de tratar, se não for o unico, é o que se refere á crise do Douro.

O Sr. José de Azevedo Castello Branco: - Podia desistir neste momento de usar da palavra, mas quero explicar a razão por que a pedi.

Quando me inscrevi, não sabia que o meu prezado amigo o Sr. Teixeira de Sousa, tinha pedido a palavra para antes de se encerrar a sessão, e ignorava o assunto para que o fizera, embora fosse de calcular que S. Exa. versaria uma questão que tanto interessa o País, especialmente no Parlamento os que representam os interesses de Villa Real e do Douro.

Nada tenho a acrescentar ao quadro esboçado pelo Sr. Teixeira de Sousa; a situação do Douro não se combate com evasivas, nem com remedios inefficazes; carece da intervenção directa e activa do Estado.

A crise do Douro, determinada por uma concorrencia invencivel, determinada por uma lei que foi prejudicial para essa região, está hoje aggravada pela carestia do pão, e por um espirito suspeitoso e cheio de medos pelo futuro.

Espero que o Governo se interessará por este assunto, não só por conveniencia sua, mas por dever e por sentimentos de caridade que não ficam mal aos Governos, e espero que procurará remedio pronto para uma crise que se me afigura dolorosa.

O Sr. Presidente: - A proximo sessão é ámanhã. Ordem do dia a continuação da que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram 5 horas e l5 minutos da tarde.

Dignos Pares presentes na sessão de 19 de maio de 1908

Exmos. Srs.: Antonio de Azevedo Castello Branco, Eduardo de Serpa Pimentel; Marquezes: de Avila e de Bolama, de Gouveia, de Pombal, de Sousa Holstein; Arcebispo de Calcedonia; Condes: do Bomfim, de Lagoaça, de Monsaraz, de Paraty, de Sabugosa, de Samodães, de Valenças, de Villar Sêco; Viscondes: de Asseca, de Tinalhas; Moraes Carvalho, Alexandre Cabral, Pereira de Miranda, Antonio Candido, Teixeira de Sousa, Campos Henriques, Hintze Ribeiro, Bernardo de Aguilar, Palmeirim, Vellez Caldeira, Eduardo

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16 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

José Coelho, Fernando Larcher, Matozo Santos, Veiga Beirão, Dias Costa, Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Ressano Garcia, Baptista de Andrade, Jacinto Candido, D. João de Alarcão, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, Gusmão, José de Azevedo, José Lobo do Amaral, José de Alpoim, Silveira Vianna, Julio de Vilhena, Luciano Monteiro, Rebello da Silva, Pimentel Pinto, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Affonso de Espregueira, Sebastião Telles, Sebastião Dantas Baracho e Wenceslau de Lima.

O Redactor,

FELIX ALVES PEREIRA.

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