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2 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Todos nós estamos habituados a ver a imparcialidade com que V.Exª. preside ás sessões.

Já tive a honra de tê-lo por Presidente na camara dos Senhores Deputados nas sessões de 1891, 1892 e 1893, e foi tão notavel a maneira como V.Ex.ª presidiu que, ao terminar o seu mandato, nos reunimos, os Deputados de todas as parcialidades politicas, em um jantar que lhe offerecemos em testemunho da nossa admiração e da muita dedicação pela sua pessoa e pela maneira correcta, elevada e imparcial como V. Ex.ª se mantivera naquelle honroso cargo.

Este jantar, da mais intima cordialidade, realizou-se n'um hotel que então existia no edificio onde hoje estão installados os Armazens do Chiado.

Todos nós estavamos honrados pela maneira como V. Ex.ª presidiu, e, fiado nos precedentes de V. Ex.ª, na maneira digna como V. Ex.ª tem desempenhado todas as importantes commissões de serviço de que tem sido encarregado, por isso me honro de dirigir a V. Ex.ª estas sinceras felicitações, que são ao mesmo tempo filhas da profunda convicção que tenho das qualidades elevadas do seu caracter e pelo bem como V. Exa. tem sempre procedido em todos os actos da sua longa vida publica.

Folgo de fazer justiça a um dos homens de mais prestigio que militam na politica do nosso país.

Agora permitta-me tambem V. Ex.ª que eu me dirija ao Governo, felicitando o Sr. Presidente do Conselho e todos os seus illustre collegas, pela maneira como S. Ex.ªs teem governado o país neste curto periodo de tres meses e meio, que já dura a sua gerencia.

O Sr. Presidente do Conselho foi investido nas suas altas funcções depois da pungente tragedia de 1 de fevereiro, em que o país estava anarchizado, em que os espiritos estavam exaltados, em que sobre a nação pesava uma atmosphera de chumbo, em que todos receavam pelo seu futuro, em que o desnorteamento era geral e em que a irritação de todos não tinha limites.

Foi com o país neste estado, em que os cidadãos mais pacificos, mais ordeireiros, mais correctos em todos os actos da sua vida se sentiam em tal estado de irritação, que nem eles proprios sabiam o caminho que deveriam trilhar no dia seguinte, que V. Ex.ª, Sr. Presidente do Conselho, e os seus collegas, foram investidos nas altas funcções governativas.

Foi um enorme serviço patriotico que V. Ex.ªs vieram prestar á nação, pondo de parte a commodidade das suas pessoas, a sua tranquillidade e o seu socego, para accederem ao appello do país, ,que necessitava de acalmação, de paz e de tranquillidade.

E de tal modo V. Ex.ªS se teem havido, que em poucos dias, para não dizer em poucas horas, o país adquiriu a sua serenidade habitual. O socego voltou aos eepiritos e a confiança renasceu na alma popular.

S. ExªS. teem governado com economia, teem administrado com parcimonia os haveres da nação, teem cumprido as leis do reino e teem facultado aos cidadãos portugueses as liberdades que lhes são devidas.

Desejo muito que o Governo governe com a lei, que seja applicada a lei a todos, seja a quem for, que dê aos cidadãos portugueses todas as liberdades que as leis consignam, mas tambem quero que nem Governo nem governados ultrapassem os direitos que a lei concede.

A lei é uma garantia para todos os cidadãos portugueses e é conveniente que todos saibam que dentro da lei teem mantidas as suas garantias e regalias; fora d!ella não.

Para que um país possa trabalhar, prosperar e desenvolver-se é necessario paz, socego e tranquillidade, e isso só lhe pode ser dado por um Governo liberal que cumpra as leis, mas que ao mesmo tempo seja energico para reprimir os que abusarem das liberdades que se lhes concederem, e pretenderem levar a anarchia aos espiritos. O que é necessario é que o país não viva num sobresalto continuo, agitado por meia duzia de discolos, ambiciosos, irrequietos e demagogos. Não pode permittir-se que meia duzia de ambiciosos tragam o país sobresaltado, o país que quer trabalhar, progredir e desenvolver-se. O que não pode ser é que meia duzia de discolos causem a perturbação de cinco milhões de habitantes.

Isso não. Liberdade sim; anarchia nunca.

Seja o Governo o primeiro a acatar a lei e depois não consinta que ninguem, seja quem for, esteja fora d'ella. Assim todos os cidadãos lhe darão a força necessaria para governar, todos os homens que amam a ordem estarão a seu lado para lhe dar coragem a fim de esmagar os discolos.

O Governo fez umas eleições que, no meu entender, foram as mais liberaes que conheço.

Podem dizer o contrario, mas esta é a verdade, porque por ellas os diversos agrupamentos trouxeram ás Camaras os Deputados que as suas forças lhe permittiam e até os que não lhe permittiam.

Houve neste ponto liberdade demasiada, mas quero dizer que o Governo não obstou a que cada agrupamento, fizesse eleger os seus amigos. O periodo eleitoral correu em todo o país com a maior tranquillidade.

Somente se deram os lamentaveis acontecimentos de Lisboa, com que todos nós ficámos compungidos, mas não se deram por culpa do Governo, nem da guarda municipal, nem da policia, porque eu não acredito que haja officiaes portugueses, que são illustrados, patriotas, humanos, sensatos, justos, que todos teem um coração magnanimo, bem formado, tão sensivel como o de nós todos, que mandassem atirar ao povo sem haver razão poderosa para isso. Pode alguem de bom senso acreditar que a guarda municipal, ou mesmo a policia, dispare as suas armas sobre o povo sem um motivo forte, imperioso que a isso fosse obrigada?

Eu não acredito, nem ninguem de juizo, de reflexão e de criterio acredita em tal, a não ser que tivesse recebido ordens para assim proceder.

Agora pergunto eu: se qualquer de nós, commandando uma força a visse desrespeitada, aggredida, insultada, em risco de ser envolvida e desarmada, não sendo obedecida nas ordens que desse, pergunto : quem podia conter os animos tanto dos offciaes como dos soldados, para se não desaffrontarem e não se defenderem?!

Quem ha ahi com animo tão sereno, que commandando uma força incumbida de manter a ordem, e vendo a força do seu commando desrespeitada e ainda por cima aggredida, se não defenda com a energia correspondente á aggressão?

Tem-se dito que da varanda da igreja de S. Domingos a guarda municipal atirou sobre o povo.

Isto não pode ser verdade, e, se fosse, se a força publica sem motivo impe-riofo, sem ser em legitima defesa, procedesse de tal modo merecia a minha completa reprovação, porque a tropa só deve atirar em ultimo recurso e unicamente para se defender.

Os officiaes dá guarda municipal e da policia não são nenhuns canibaes, não são nenhumas feras. Os officiaes são homens illustrados, saidos das escolas como nós, convivendo com pessoas de sociedade; teem um coração bem formado, são humanos, civilizados e não iriam atirar sobre o povo, inerme, desarmado, só pelo prazer de matar.

Em que cabeça de juizo se mette tal absurdo? Ha só uma hypothese em que isso se poderia dar. E se tivesse recebido ordem positiva e terminante para atirar sobre o povo ao mais leve pretexto.

E ainda assim haveria muito official que só com grande difficuldade obedeceria. Á minha razão repugna acreditar que haja quem de boa mente atire sobre o seu semelhante como a feras. A vida do mais simples homem do povo deve ser tão sagrada, tão respeitada, como a do homem da mais elevada posição social. Mas se, contra a