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CAMARA DOS DIGNOS PARES,

Sessão de 18 de Janeiro de 1849. Presidiu — O Sr. D. de Palmella. Secretarios — Os Sr.s Simões Margiochi V. de Gouvêa.

(Summario — Correspondência — Ordem do dia, leitura de Pareceres — Intercalou-se o testimunho dado pelo Sr. Silva Carvalho sobre concorrencia do Sr. D. de Palmella em Ministerio, que procedessem a operações mixtas, testimunho a que o Sr. Ministro da Marinha em outra Sessão se referira — Seguiu a Ordem do dia com a discussão do Parecer sobre as alterações feitas pela Camara dos Sr.s Deputados na Proposição de Lei providenciando a respeito da Camara do« D. Pares em Tribunal de Justiça.)

Aberta a Sessão pelas duas horas da tarde, estando presentes 32 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão — Compareceu o Sr. Presidente do Conselho de Ministros. Mencionou-te a seguinte

correspondencia.

1.° Um officio do Ministerio da Marinha e Ultramar, satisfazendo ao Requerimento do Sr. C. de Lumiares feito em Sessão de 8 do corrente (Vid. pag. 53, col." 4.ª)

Remetteu-se para a Secretaria.

2.° Outro officio da Commissão Administrativa do Hospital Real de S. José, remettendo, para serem distribuidos pelos D. Pares, 60 exemplares da conta da gerencia do mesmo Hospital, relativa ao anno economico de 1847 a 1848.

Foram distribuidos.

O Sr. Secretario V. de Gouvêa — Está sobre a Mesa uma Representação dos Amanuenses de 1.* e 2.º Classe das Secretarias de Estado, sobre uma Proposição de Lei dirigida a esta Camara pela da dos Sr.s Deputados, relativa á distribuição dos emolumentos das mesmas Secretarias.

O Sr. Presidente — Esta Representação foi-me entregue por uma deputação que enviaram os interessados, pedindo-me que eu a apresentasse na Camara. "Vai pois á Commissão respectiva, que tem pendente esse objecto.

Remetteu-se á Commissão de Legislação.

ordem do dia.

Leituras de Pareceres. O Sr. Serpa Machado — Passo a lêr o seguinte: A Commissão que na Sessão preterita foi encarregada de propôr o methodo da redacção, e publicação das Sessões quotidianas desta Camara, e do seu processo nas differentes Secções da Secretaria, e que novamente foi instalada por voto desta Camara para interpor o seu parecer sobre a Proposta do D. Par V. de Sá, que indica outro methodo de redacção e de publicação conforme a pratica de outros Paizes; julga conveniente que a Mesa da Presidencia desta Camara, ou os seus Membros, tomem parte nos trabalhos desta Commissão, aggregando-se a ella, para de commum accôrdo se tractar da possibilidade e preferencia deste outro methodo, differente daquelle que foi adoptado e approvado por esta Camara, e se acha em effectiva execução; e para estes effeitos e maior acerto, a Commissão solicita da Camara a aggregação e coadjuvação da Mesa da Presidencia. Sala da Commissão, em 18 de Janeiro de 1849. — V. de Laborim — B. de Chancelleiros = M. de Serpa Machado, Relator = R. da Fonseca Magalhães = C. de Lavradio =: V. de Benagazil.

O Sr. V. de Laborim — (Sobre a ordem) Sr. Presidente, isto, rigorosamente fallando, não é um Parecer, é um Requerimento que faz a Commissão, a qual espera que lhe seja agora deferido.

Deferiu-se-lhe.

O Sr. Presidente — Peço licença a fim de provocar uma explicação antes de começar-se a discutir o Parecer dado para Ordem do dia; e se a Camara consente fa-lo-hei sem deixar a Cadeira. (Apoiados.)

Em uma das ultimas Sessões foi dito por um dos Ministros da Corôa, que em todos os Ministérios tinha havido operações mixtas, e que mesmo nos Ministérios de que eu tivera a honra de ser Membro as tinha havido: desde logo pedi ao Sr. Ministro que citasse quaes tinham sido, o que não fez então, e referiu-se ao Sr. José da Silva Carvalho, que era o Ministro das Finanças: por tanto peço licença á Camara para invocar o testimunho do D. Par, o qual certificará, que não era exacta a asserção do Sr. Ministro, referindo se a épocas anteriores a 1846 nos Ministérios de que fiz parte com o mesmo D. Par. (Apoiados.) Agora em relação a 1846, com certeza as não houve como eu já declarei, e no que o Sr. Ministro conveio.

O Sr. Silva Carvalho — Parece-me que houve alguma equivocação da parte do Sr. Ministro, quando asseverou que V. Ex.ª tinha feito operações mixtas no tempo, em que estivemos no Ministerio. Eu sinto que o estado de minha saude não permittisse demorar-me na Camara, quando isso se passou, porque logo diria o que vou dizer agora.

Eu fiquei no Ministerio depois da morte do Imperador, e nesse Ministerio servi com V. Ex.ª até aos fins de Abril de 1835; tornei a entrar sendo V. Ex.ª primeiro Ministro, em Julho desse anno, e fomos Ministros até meados de Novembro, sahindo então todo o Ministerio por causa de uma especie de revolução dos Officiaes de um Regimento, que estava em Campo de Ourique. Não houveram operações mixtas em nenhuma destas épocas, nem disso havia necessidade, porque os pagamentos se faziam em dia (O Sr. Presidente — Apoiado): não é por tanto exacto que V. Ex.ª fizesse operações mixtas.

Eu é que fiz operações financeiras depois, quando em Abril de 1836 entrei pela terceira vez no Ministerio; mas taes operações senão podem chamar mixtas no sentido daquellas, que depois de Setembro de 1836 se fizeram e continuaram. (O Sr. Presidente — Apoiado.) Elias foram mais emparelhamentos de dinheiro com papeis sem juro, do que outra couza. Quando entrei pela terceira vez no Ministerio em Abril de 1836, estavam os pagamentos atrazados, as Alfandegas empenhadas até ao fim de Maio seguinte, e eu sem meios alguns para fazer face ás despezas correntes: então pedi aos meus amigos 65:000000 de réis, e aos Contractadores do Tabaco 34, que m'os emprestaram, e com estes 99 paguei umas Letras que tinham ficado por satisfazer; paguei o resto da mezada de Março, que se devia á Rainha; paguei á Imperatriz 20:000000 de réis, que se lhe de viam; paguei o pret de Abril; e paguei á Guarda Municipal: fiquei novamente sem recursos, e então recorri a um modo de os alcançar por meio de operações, que senão podem chamar mixtas, nem classificar na ordem daquellas, que depois se fizeram e continuaram desde Setembro. -

Sahi com um Decreto em Abril, e por meio delle convidei os credores da divida corrente a emparelhar, com a quantia que se lhes devesse, uma igual em dinheiro, e assim fui fazendo successivamente por dois Decretos mais, de maneira que levantei 300:000000 de réis, dando pelos 600:000$000 Escriptos do Thesouro sem juro a vencer em Novembro desse anno e em Março do seguinte, para entrarem no pagamento de direitos das Alfandegas desde Março de 1837 em diante.

Concluo por dizer, que nem no Ministerio de V. Ex.ª se fizeram operações mixtas, nem aquellas que eu depois fiz podem ter o nome, que se lhes dá e é applicado ás que depois se fizeram.

O Sr. Presidente — Tomei a liberdade de tomar tempo á Camara com este objecto, porque varios Periódicos teem reproduzido a asserção do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros e da Marinha, sem accrescentarem o pedido de explicação, que J immediatamente lhe fiz.

Seguiu a

ordem do dia.

Parecer n.º 96 sobre as alterações que no Projecto de Lei desta Camara, n.º 28 (1), convertido em Proposição de Lei, fez a Camara dos Srs. Deputados, estabelecendo certas providencias para quanto constituida a Camara dos Pares em Tribunal de Justiça. O Sr. C. de Lavradio — (Sobre a ordem.) Parece-me inutil que haja outra vez uma discussão sobre a generalidade deste Projecto, porque ella já teve logar quando approvámos o Projecto originario: por tanto parece-me, que a discussão devia versar unicamente sobre as emendas ou additamentos, que ao mesmo Projecto foram feitos na Camara dos Srs. Deputados Assim se resolveu.

O Sr. Presidente — Vai ler-se o Parecer. Parecer n.º 96.

A Commissão de Legislação examinou as Emendas feitas pela Camara dos Srs. Deputados ao Projecto de Lei» approvado por esta Camara, que em por objecto regular o modo da convocação, e o número dos Pares necessarios para julgar os Processos, que devem ser decididos na mesma Camara, constituida em Tribunal de Justiça; e a Commissão, reconhecendo a, urgente necessidade de adoptar as medidas indispensaveis para o prompto julgamento dos processos pendentes, é de parecer que as ditas Emendas comprehendidas no mesmo sejam approvadas, e o dito Projecto submettido á Sancção Real.

Sala da Commissão, em 16 de Janeiro de 1849. = V. de Laborim = Manoel Duarte Leitão — B. de Chancelleiros = V. da Granja = B. de Porto de Moz == José da Silva Carvalho.

O Sr. Presidente — Agora passa-se á especialidade de cada um dos artigos. Alterações feitas pela Camara dos Deputados, na

Proposição de Lei da Camara dos D. Pares do

Reino, de 19 de Junho do corrente anno, sobre

o número de Pares necessarios para a Camara

se constituir em Tribunal de Justiça.

Artigo 1.º A Camara dos Pares do Reino, constituida em Tribunal de Justiça Criminal, reune-se para exercer suas funcções judiciaes não sómente em quanto duram as Sessões da Camara dos Deputados, mas tambem depois do encerramento das Côrtes Geraes; ainda no caso de ter sido dissolvida a Camara dos Deputados.

Approvado sem discussão.

Art. 2.º A reunião da Camara dos Pares em Tribunal de Justiça, quando fóra do tempo das Sessões da Camara dos Deputados, não poderá ter logar sem preceder Decreto do Poder Executivo, ouvido o Conselho de Estado.

O Sr. C. de Lavradio — Sr. Presidente, não me pertence indagar quaes foram os motivos, que a Camara dos Sr.s Deputados teve para introduzir esta nova disposição no Projecto de Lei, que desta lhe foi enviado; mas parece-me que será permittido pedir eu á illustre Commissão de Legislação, (que desvaneça alguns dos meus escrupulos para eu saber como hei de votar. É ou não independente o Poder Judicial? Parece-me que a illustre Commissão me responderá que sim, porque é uma disposição que está consignada no artigo 118.° da Carta Constitucional. A Camara dos Pares constituida em Tribunal de Justiça pertence ou não ao Poder Judicial? Parece-me que tambem ninguem negará, que esta Camara assim constituida faz parte do Poder Judicial: sendo isto assim, uma das explicações, que pretendo da illustre Commissão, é a de qual o motivo porque deste Tribunal se ha de fazer uma excepção! Os Juizes de Primeira Instancia julgam sem ser convocados por Decreto; o mesmo tem logar para com as Relações, e o Supremo Tribunal de Justiça: desejarei pois saber qual o motivo desta excepção, porque deve haver algum, que tivesse levado a Camara dos Sr.s Deputados e a illustre Commissão

desta, a adoptarem similhante excepção, pois que ninguem póde negar que o fica sendo dos outros Tribunaes pertencentes ao Poder Judicial, excepção tanto mais notavel, quanto eu não posso deixar de considerar esta Camara como primeiro Tribunal deste Reino, quando reunida em Tribunal de Justiça (Apoiados).

Sr. Presidente, talvez tanto a outra Camara como a illustre Commissão desta, fossem procurar este principio, não direi á legislação franceza, mas a um uso ou antes abuso praticado em França: eu me explico. Em Fiança, nem na Carta do anno de 1814 nem na reformada do anno de 1830, nem ainda em Lei alguma posterior, se achava determinado o modo, porque devia ser feita a convocação e reunião da Camara dos Pares quando houvesse de ser constituida em Tribunal de Justiça: similhante omissão existe tambem em a nossa Carta Constitucional. Sendo porém necessario em França, pouco depois de promulgada a Carta, processar o Marechal Ney, e como o crime de que era accusado fosse da competencia da Camara dos Pares, e não houvesse regra nenhuma para a sua convocação como Tribunal de Justiça, uma Ordenança, ou Decreto do Rei mandou convocar a Camara em Tribunal, e outra Ordenança foi mais longe, porque estabeleceu a fórma de processo, ao que a Camara dos Pares, a qual pouco antes acabava de ser reformada, se sujeitou sem observação alguma, apesar dessa notoria illegalidade, e o mesmo fez a Camara dos Deputados; mas todos sabem qual era a subserviencia desta Camara. Passou este precedente, que não póde ser considerado como Lei, supposto fosse seguido em differentes occasiões, e direi toda a verdade — durante todo o regimen da Carta de 1814, e da reformada de 1830 mas pergunto eu aos illustres Jurisconsultos desta Camara — podia esta pratica constituir direito consuetudinario? Creio que não, porque ella era contrária á Lei fundamental do Estado: por tanto, se a illustre Commissão foi procurar esta disposição á legislação franceza, parece-me que se enganou, porque julgo ter provado sufficientemente, que nunca alli houve Lei a tal respeito, mas sim um costume, ou antes abuso, que é o que tem aqui tambem acontecido; e parece-me que posso hoje censurar essa determinação, porque já a Camara a censurou, confessando que não tinha procedido como convinha. Este mesmo Projecto é uma prova, de que ella quiz reformar a sua primeira deliberação: refiro-me ao Regimento interno desta Camara constituida em Tribunal de Justiça, no qual estabelecemos nada menos, do que a fórma do processo, o que de certo não podiamos fazer; mas fez-se, e levou-se a effeito, porque nem a Camara dos Sr.s Deputados lhe obstou, nem o Governo de Sua Magestade: com tudo, tinhamos nós direito para faze-lo, tinha alguem obrigação de se conformar com os actos, que praticámos sem que dimanassem de Lei? Parece-me que não.

Sr. Presidenta, eu não quero dizer mais nada sobre a materia, e desejo quanto antes ouvir as explicações dos illustres Jurisconsultos, que formam a Commissão de Legislação; mas em quanto não me convencerem não posso deixar de declarar, que estou disposto a votar contra esta nova disposição introduzida na Camara dos Sr.s Deputados.

Antes de me sentar lembrarei outra vez á Camara, e particularmente á Commissão incumbida deste trabalho, a necessidade que ha quanto antes de uma Lei, não em retalho como esta é, mas completa, e tão importante como é a que deve, regular o modo destes processos. Eu sei que isso está entregue ao cuidado de um Jurisconsulto, que o ha de considerar muito bem; mas tomo a liberdade de lhe lembrar, que o considere quanto antes.

O Sr. Duarte Leitão — Sr. Presidente, direi poucas palavras sobre este Additamento, que se fez na Camara dos Sr.s Deputados, ao Projecto que lhe foi remettido por esta Camara. A Commissão fundou-se, para o approvar, na consideração de que ha uma urgente necessidade de adoptar as medidas, que sejam necessarias para o julgamento dos processos, que estão pendentes nesta Camara; porque, no caso de se rejeitar este Additamento segue-se uma discussão longa e Commissão mixta, e por isso parece mais conveniente, que a Camara admitta a opinião da Camara dos Sr.s Deputados.

Fundou-se tambem a Commissão, em que esta opinião não é contraria aos principios constitucionaes, nem ás conveniencias publicas. Não quero desconhecer, que póde haver escrupulo neste ponto, e merecem toda a consideração as obser-

(1) Vid. Diar. de 1848 a pag. 861, col. 3.º, a sua ultima redacção.