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54 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

conservar, mas o que é preciso, é que o desejo de evitar conflictos internacionaes, o não obrigue a praticar actos menos airosos.

Eu não sei de cousa alguma, a este respeito, pela qual o governo mereça censura; mas ouvi fallar no apresamento de um navio portuguez pelas forças inglezas e tomarem-no injustamente como incurso no trafico da escravatura. Não sei o fundamento que tenha esta noticia e por isso não posso pedir ainda a responsabilidade ao governo, por que não tenho esclarecimentos. Só posso alludir a um documento que, ainda que não é authentico, tem comtudo uma certa importancia.

Refiro-me a uma carta do sr. Thomás Ribeiro, que é honrem, a todos os respeitos, de ponderação para o partido regnerador, e que até se dizia que devia substituir o sr. Barjona de Freitas; porque, como todos sabem, a saida d'este cavalheiro estava annunciada havia muito tempo, e era o sr. Thomás Ribeiro um dos indigitados para ministro da justiça.

Vi, como disse, uma carta, na qual se dizia, com relação á Inglaterra, que o governo não sabia fazer respeitar a nossa bandeira. A carta está escripta em um estylo poético e nebuloso, e por isso fica envolvido tudo em mysterio; a não vir o seu auctor, que tem voz no parlamento, explical-a.

O que é certo, porem, é que com a Hespanha e com a curia romana, os factos auctorisam a suppormos que não fazemos bom papel. Ha um documento authentico e verdadeiro, do sr. Fernandez de los Rios, que fora ministro nesta côrte, do rei Amadeu, e que foi mandado sair de Portugal de um modo pouco proprio, em relação á hospitalidade que devemos dar aos refugiados. E note-se que elle não era refugiado, como expoz na sua carta, era um homem que o seu governo desterrara para Portugal!

Nós como nação independente podemos dar abrigo aos refugiados, isto admitte-se, e deve mesmo ser assim5 mas que o governo hespanhol considere este paiz como um presidio para onde possa desterrar os individuos que o incommodam, contra isto é que se deve protestar, e que individuos que vêem com este caracter sejam como taes mandados sair por ordem ou a requisição do governo de Hespanha é que é incompativel com a dignidade nacional. Era preciso que os motivos fossem minto fortes, para que os srs. ministros dos negocios estrangeiros e do reino consentissem ou concordassem em similhante procedimento.

Pelo que diz respeito á curia romana, nunca representámos tão triste papel como aquelle que temos feito ultimamente. Não posso attribuir a culpa ao actual sr. ministro da justiça, mas sim ao governo.

Foi apresentado arcebispo de Goa um sacerdote a todos os respeitos muito digno, e, facto unico na historia portugueza, a corôa desistiu da apresentação que tinha feito, naturalmente para satisfazer a curia e apresentou um outro sacerdote.

Em todo o caso é uma posição difficil e humilhante para o individuo que foi apresentado, e esta humilhação não é só para o individuo, mas recae sobre o paiz.

Pelo que respeita ao arcebispo de Goa, é caso para se poder dizer, feliz desgraça, pois que a substituição foi muito digna. Não digo isto por mero cumprimento, mas por convicção, pois conheço quanto é respeitavel o actual primaz do oriente e o quanto é bondoso e excellente o seu caracter, pois me honro com a sua amisade desde os bancos da universidade, ao passo que o outro cavalheiro a que me refiro nem de leve o conheço.

Não se trata porem de ter sido bem ou mal substituido, mas da humilhação por que o apresentado passa sem causa justificada, e a corôa com elle.

Se existem motivos para a recusa, digam-se, apresentem-se e fundamentem-se, mas não se colloque o individuo em uma posição embaraçosa, conservando-lhe o uso de um Dom de favor, o que me faz lembrar, apesar de estarmos n'uma epocha de excellencias, o que dizia quando lhe foi offerecida uma mitra o celebre frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo, quando estavam interrompidas as relações com Roma; recusou dizendo que "não queria ficar bispo inherva; nem ter um Dom de favor, que o tornava ridiculo".

Ainda não foi provido o bispo eleito do Algarve, cuja confirmação se acha pendente da curia ha muito tempo, com grave desdouro do governo.

Estará condemnado o Algarve a ficar sem bispo? Póde conservar-se dignamente em uma posição indefinida uma distincta illustração, como é o sr. D. Antonio Ayres de Gouveia? Não póde ser.

Isto só se faz por humilhação pouco digna para com a curia romana. A dignidade do paiz não póde consentir a prolongacão d'este estado de cousas.

Com a curia romana é necessario ser sincero e franco, cumprindo integralmente os nossos deveres para com ella, mas sem prescindir de forma alguma dos nossos direitos. Se existem motivos para se não darem as confirmações, exponham-se francamente ao governo, mas não se mantenha esta posição, que é humilhante para os apresentados, não menos humilhante para o paiz, e particularmente prejudicial para as dioceses, que estão sem o seu pastor. Se os motivos allegados pela curia são attendiveis, reconheça-se a verdade dos factos, mas communique-se ao publico e aos interessados para sairem de uma posição dubia e falsa; v. exa. e a camara admirar-se-hão se eu lhes disser, e comtudo é uma verdade, que até hoje o sr. Nápoles ainda não recebeu participação de que a corôa tinha desistido da sua apresentação para arcebispo de Goa, apesar de lá estar já outro confirmado e governando o arcebispado.

Sr. presidente, chegou um momento de eu poder dizer alguma cousa agradavel ao governo, e como são rarissimos os ensejos que elle me fornece para o fazer, permitta-se-me que eu aproveite este.

Eu louvo o sr. ministro da fazenda pelas providencias que adoptou por occasião da crise que atravessou o paiz, e não lhe faço a menor censura sobre a fornia. Todas as formas tem perigos, e o optar-se por uma ou por outra só o póde avaliar quem se acha nas circumstancias criticas. Poderiam as letras estrangeiras ter sido isentas do praso; mas, já digo, não censuro o governo pela forma, nem o condemno por não ter feito excepção, e comtudo ninguem melhor do que eu póde avaliar os embaraços que isso produz, pois que me achava então em Paris, tinha creditos que immediatamente se acharam suspensos; por consequencia reconheci o perigo de uma tal situação.

Eu, porém, sr. presidente, sou mais pelas leis geraes do que pela excepção, e a prova é que effectivamente não teve grande influencia aquelle facto, porque facilmente se achou capital no estrangeiro. O curso forçado das notas não se decretou; mas podia ser preciso decretar-se, e se fosse preciso havia de se fazer para dilatar por mais tempo a corrida aos bancos. O que se ha de fazer nestas occasiões? Não se póde legislar para factos excepcionaes. Havia um frade bernardo (e permitta-me a camara que eu faça esta digressão amena n'uma materia tão arida), que quando lhe perguntavam porque andava pensativo, respondia que pensava nos casos imprevistos; ora não se querendo que o governo ande tambem a procurar solução antecipada para casos imprevistos, havemos de contentar-nos com as medidas que tomou, e pela minha parte não tenho duvida em o louvar pelas disposições que tomou, e póde contar com o meu voto franco e sincero quando se apresentar o bill de indemnidade.

Sr. presidente, com relação ao caminho de ferro estou de accordo em parte com o governo, mesmo porque a proposta para o caminho de ferro da Beira Alta vem hoje ao parlamento nos termos em que eu aqui a apresentei em substituição á do sr. Cardoso Avelino em 1875.