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88 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

nistra; mas é tambem Bispo catholico, e, como tal, esforçar-se-ha quanto em si couber, para abraçar, seguir e ensinar a doutrina religiosa que a Igreja propõe á nossa crença, defendendo os seus direitos e prerogativas, combatendo o erro, onde elle exista e parta d'onde partir, como é proprio do seu caracter sacerdotal, e o exige a santidade do juramento que prestou ao tomar assento n'esta Camara.

Jurou ser obediente á religião catholica e ás leis do reino: diz-lhe a consciencia que tem preenchido, e em Deus confia que ha-de continuar a preencher os deveres a que se obrigou por esse juramento, o que não é impossivel, porque portuguez e catholico são dois nomes que andaram sempre unidos em nossos maiores, nos valentes soldados que, outr'ora, e felizmente ainda hoje, tanto sublimaram a patria com seus feitos brilhantes, e tão alto levantaram o prestigio do seu nome em toda a parte onde arvoraram o glorioso estandarte das quinas.

Não quer ser perjuro deante de Deus nem deante dos homens; por isso quando, por se esquecer o que todos os portuguezes devem á Igreja, se praticarem actos ou se estabelecerem medidas que firam a dignidade da mesma Igreja, offendam ou desacatem os seus direitos, nem um só momento hesitará no caminho a seguir, que outro não é senão o indicado por esta maxima: a Deus o que é de Deus, a Cesar o que a Cesar pertence, e no seio da representação nacional, fundada por uma Carta que reconhece a religião catholica como religião do reino, não emmudecerá ante questões que considere graves e vitaes para a Igreja e suas justas liberdades.

Grave, gravissima é a questão levantada na portaria de 15 de abril ultimo.

Não affecta somente um seminario ou uma diocese; affecta, por igual, todos os seminarios e dioceses do reino; não é questão que possa ter se por localizada ou adstricta a um ponto determinado, visto como prende e se concatena com as relações entre a Igreja e o Estado, dois poderes independentes, autonomos e ambos soberanos em sua esphera de acção.

Tem cada um d'elles suas leis, seu governo e sua jerarchia, com direito ao emprego dos meios necessarios para a realização do fim que se propõem: a distincção entre os dois poderes é materia indiscutivel.

Como sociedade perfeita, a Igreja, por direito proprio, ensina a fé e a moral, estabelece a disciplina propria, escolhe os seus ministros, designa e fixa as condições necessarias para a admissão aos differentes graus de ordem; rege-se, em summa, por leis suas, pelas leis da sua instituição divina.

Todos os catholicos, por mais elevada que seja a sua posição social, devem obediencia e sujeição á Igreja no que é espiritual e da sua competencia, assim como a Igreja, isto é, os seus ministros e fieis, devem obedecer ao Estado no que é temporal.

É claro que, exprimindo-se por esta forma, não perfilha nem podia perfilhar a opinião erronea dos que sustentam que a Igreja é uma sociedade particular, uma parte integrante e dependente do Estado, ou, por outros termos, uma Igreja nacional.

Não, não pode dizer-se isso da Igreja catholica, que é antes uma sociedade universal, constituindo e formando um só corpo com os fieis de todo o mundo; é a patria commum, onde todos os homens, todos os povos e todas as nações podem encontrar-se unidas pelos mesmos vinculos de fé e de caridade, sem todavia perderem o caracter particular que as distingue.

Comquanto distinctos, os dois poderes, nem por isso são inimigos, adversarios, ou alheios um ao outro, quer nos fins que se propõem, quer nos meios a empregar para a realização d'esses fins: vivem e podem coexistir em boa paz e na melhor harmonia, desde que evitem perturbações e conflictos, se auxiliem mutuamente, e se mantenha cada qual na esphera que lhe é propria, pertencendo ao Estado tudo o que diz respeito á objectivação do direito, ao desenvolvimento das condições do progresso social, á ordem, á segurança individual e publica; e á Igreja o que é attinente ás crenças, ao dogma, á moral e á disciplina propria.

A Igreja presta ao Estado o seu valioso concurso, advogando, defendendo e apostolizando o acatamento e obediencia ao principio da auctoridade e ás leis; o Estado presta á Igreja o auxilio de que ella carecer no preenchimento da sua missão civilizadora e santa.

O Estado protege; mas proteger não é deprimir, não é abater, não é escravizar, não é levantar estorvos ao funccionamento da Igreja no que é da sua competencia.

E, comtudo, tão humilhada, tão pertubada nas suas attribuições se encontra a Igreja entre nós, que nega a estranhar-se e, peor ainda, a considerar-se como abuso, como arbitrariedade, como violencia, como cruel despotismo, a pratica de um acto consentido, auctorizado, e não só auctorizado mas expressamente ordenado pelas leis canonicas, cuja força obrigatoria é reconhecida pelas proprias leis do Estado.

D'estas considerações geraes pode desde já inferir-se qual seja o seu modo de pensar, a sua opinião sobre a doutrina da portaria de 15 de abril proximo preterito.

Essa portaria foi publicada a proposito do procedimento seguido e adoptado por um seu illustre collega, por occasião de tristes, lamentaveis e alarmantes acontecimentos occorridos no seminario d'essa diocese.

Escusado é narrar agora em todas as suas minudencias esses factos lastimaveis, visto como, alem de serem conhecidos da Camara, attenta a notoriedade que desde logo tiveram, não carece de aprecial-os para o fim que pretende visar.

Propõe-se, e isso lhe basta, estudar, inquirir e expor principios.

Não se deterá, pois, na analyse e discussão dos considerandos da portaria de 1845: ha de fixar a sua attenção somente sobre as conclusões da mesma, e demonstrar que esta não constitue lei nova, não se baseia nem auctoriza em lei antiga, nem é d'ella a interpretação authentica e legitima. (Apoiados do Sr. Jacinto Candido).

No entretanto, e ainda com uma ligeira referencia aos mencionados factos, sempre dirá que um tal attentado, revestido, como foi, de circumstancias as mais aggravantes, não podia deixar de ser promptamente reprovado, reprimido e condemnado, impondo-se aos auctores e cumplices a indispensavel correcção.

Não havia, nem ha, prelado algum que, em semelhante conjunctura, não procedesse contra os delinquentes, sob pena de, não se conduzindo assim, trahir a sua missão, deixando esmagar em suas mãos a auctoridade de que é depositario, e acarretando sobre si a desconsideração e desprestigio, que affectam sempre os que, por fraqueza, negligente ou propositadamente, omittem o cumprimento de seus deveres mais imperiosos e mais importantes, especialmente que mais se destacam por seu valor, pelo seu alcance e significação. (Apoiados}.

Entre os diversissimos encargos e as obrigações, tão variadas como complexas, inherentes ao munus pastoral, nenhuma ha que mais preoccupe a attenção do Bispo do que a que se liga com a instrucção e educação dos aspirantes ao sacerdocio, que mais tarde, depois de alistados na sagrada milicia, hão de cooperar com elle na espinhosissima tarefa da salvação das almas.

No preenchimento dos outros deveres, como no ensino da palavra divina, na pregação das verdades do Evangelho, que é a suprema lei da paz, do amor, da caridade, do verdadeiro progresso e felicidade, pode o Bispo ser, e é, com effeito, auxiliado pelos parochos e demais presbyteros; mas o poder de ordenar, o poder de escolher os