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É assim, Sr. Presidente, que eu sempre obrei como membro, que fui, da Camara dos Srs. Deputados, da qual tive a honra de fazer parte durante muito tempo. Quantas e quantas vezes fui vencido, e em muitas dellas persuadia-me que havia razão da minha parte! Confio ainda no systema representativo; e estou convencido que, tanto nesta como na outra casa do Parlamento, nunca reinou o espirito de facção (apoiados), e sempre me persuadi, que as suas resoluções são as mais justas.
Sr. Presidente, eu pela minha parte sinto bastante de discrepar do parecer da maioria da illustre commissão de guerra, e é na verdade para mim bastante incrivel, que na primeira discussão em que entro nesta Camara, eu esteja em opposição com cavalheiros tão respeitaveis, e aos quaes estou costumado a acatar desde a minha infancia, homens, cujos nomes estão stereotypados nas paginas mais illustres da historia da liberdade deste paiz; mas em compensação tenho um nome respeitavel em favor da minha opinião; esse nome, se bem que numericamente inferior aos outros, é comtudo igual em auctoridade.
Por consequencia, nesta questão e em outras, seguirei unicamente os dictames da minha consciencia, em vista das razões e argumentos que se apresentarem sem me importarem nomes.
Sr. Presidente, esta questão, apesar de parecer velha, apesar de ser sediça por ter vindo differentes vezes á téla da discussão, não julgo, com tudo, que esteja ainda sufficientemente esclarecida, para que sobre ella possa a Camara pronunciar o seu voto com perfeito conhecimento de causa; e eu vou explicar os motivos em que me fundo.
Sr. Presidente, este projecto, que veio da Camara dos Srs. Deputados, tem o aspecto de querer unicamente embaraçar que continuem certas preterições que teem tido logar para com alguns Officiaes do Exercito, visto que elles seguiram certa e determinada politica; porém, Sr. Presidente, se fossem sómente essas as preterições que ha no Exercito, podia então dizer-se que o projecto, tal como está elaborado, satisfazia ao seu fim. Ha, porém, Sr. Presidente, outras preterições, e essas não são consignadas neste projecto. A illustre commissão de guerra, nos seus considerandos, apresentou uma, a que eu não posso deixar de alludir nesta occasião, é essa celebre promoção de 15 de Fevereiro de 1844, promoção contra a qual eu não deixaria de levantar a minha voz tíesta Camara, se por ventura o projecto que veio da outra casa fosse approvado na sua generalidade, ou se algum de seus artigos entrasse em discussão, eu necessariamente faria isso, visto que hoje todas as dissenções estão acalmadas, e ainda bem que o estão, porque ellas bastantes annos dilaceraram o seio da patria!
Sr. Presidente, essas promoções, feitas quasi tres annos depois d'uma certa revolução tendente a recompensar serviços praticados nella, nunca eu as podia approvar. Todos nós sabemos que houve uma sedição militar em 1844, na qual entraram varios corpos, e o chefe dessa sedição entendeu que devia premiar alguns dos sargentos que o acompanharam, e em consequencia disso promoveu-os a alferes; mas só os promoveu quasi no fim dessa mesma sedição, isto é, quando a causa estava perdida, e, em consequencia deter sido supplantada, elles ficaram todos fóra do Exercito. Passado algum tempo veio outra revolução, sustentando o mesmo pendão que a primeira, porém esta foi mais feliz, e em resultado disso subiu ao poder um Governo que entendeu devia recompensar aquelles individuos: mas como entendeu elle que devia recompensal-os? Prejudicando aquelles que tinham sido fieis ao Governo e á causa legitima, e que por conseguinte tinham cumprido com os seus deveres. Era então Ministro da Guerra o nobre Visconde de Sá da Bandeira, o qual julgou mal, quanto a mim, dever dar a estes individuos não só a patente, mas antiguidade superior aquella mesma, que pelo despacho revolucionario elles tinham lido; em consequencia disto foram promovidos esses taes e muitos outros, e até alguns contra as leis expressas, porque não tinham mesmo o posto de primeiro sargento: um delles já foi Governador de Moçambique, e está hoje Major!!
Estas preterições não são com relação aos Officiaes que pertencem ao partido progressista, nem para os que pertencem ao partido cartista; nesta Camara eu não conheço cartistas nem progressistas, para mim só ha justiça, e pela imparcialidade, é o terreno pelo qual só sei marchar, e não outro: é neste terreno que eu encaro a questão.
St. Presidente, se eu fosse encarar a questão pelo lado politico difficil seria o meu voto, porque não sympathiso com a causa que deu logar á maioria das preterições.
Mas estas injustiças onde é que estão ellas consideradas no projecto? Não as vejo de fórma alguma, e entretanto eu fallei só das que me lembrou; mas quantas mais haverá, quantas mais injustiças se terão feito por motivos politicos, em differentes épocas, com differentes Governos, nesta serie de revoluções? Todavia tambem é certo que todos os Governos mais ou menos teem procurado, pelos meios ao seu alcance quanto seja possivel indemnisar e tornar monos sensiveis estes males; forçoso é dizer que o Governo presidido pelo Sr. Duque de Saldanha quiz ver se o mal que este tinha causado como revolucionario se remediava depois, estando S. Ei." Ministro de Sua Magestade a Rainha a Senhora D. MARIA II, e nisso coube grande gloria ao Digno Par o Sr. Visconde da Luz, que foi S. Ex.ª que teve fama no Exercito de ter aconselhado ao nobre Marechal que mudasse de caminho, que não seguisse os impulsos do seu coração para premiar só os que o tinham ajudado, e mesmo os seus amigos posthumos que o não tinham acompanhado, mas que queriam gosar as legitimas consequencias do triumpho de S. Ex.» (O Sr. Visconde d'Athoguia — Peço a palavra).
Digo, pois, que o Ministerio presidido pelo nobre Duque de Saldanha já fez muito, e eu que tomei a iniciativa na outra Camara ácerca desta questão, fui levado unicamente pelo desejo de fazer com que os males que se tinham causado não fossem tão grandes, como via que estavam sendo. Mas o que é certo tambem é que o nobre Marechal querendo fazer um bem foi causar um mal até certo ponto; por quanto, querendo indemnisar muitos Officiaes que tinham sido prejudicados em promnoçães anteriores, e não sendo uma medida completa, mas parcial e mesquinha em relação ao numero, foi causar novas preterições, e foi tornar este objecto mais grave, mais embaraçado, e mais odioso, pois que, alem das preterições dos revolucionarios pelos fieis, foi preterir os revolucionarios pequenos pelos grandes; pois a questão não é daquelles que se revolucionaram uma ou duas vezes, a questão é daquelles que se revolucionaram tres, quatro e cinco vezes; o mal não foi revolucionar-se qualquer uma vez, o que fez mal foi o não se revolucionar mais vezes, pois eu conheço alguns que se revolucionaram tres e quatro vezes, e estão remunerados: revolucionaram-se com Miguel Augusto, revolucionaram-se com o Sr. Conde de Bomfim, revolucionaram-se com a Junta do Porto, e ultimamente com o Sr. Duque de Saldanha, e estão de tudo indemnisados e recompensados; agora aquelles que se revolucionaram uma vez só, esses estão prejudicados. Isto é uma justiça que eu não posso comprehender, o contra a qual me hei de sempre pronunciar; bem sei que os differentes Ministros, depois de entrarem na orbita legal, teem querido fazer com que estes males diminuam, mas ainda nenhum foi tão longe que acabasse com todas ás irregularidades de que esta medida tambem traz a sua origem, pois que se os Governos tivessem feito o que deviam não seria necessario vir agora aqui esta questão, pois tudo isto estava nas attribuições do executivo (O Sr. Conde do Bomfim — Apoiado). Pois o Governo póde indemnisar vinte e trinta Officiaes, e não póde indemnisar sessenta ou oitenta? (apoiados). A culpa é do Governo; queixem-se do Sr. Couceiro e do Sr. Visconde de Sá (apoiados). Eu estou que se hoje se apresentasse afrente do Governo um homem energico, que comprehendesse o seu dever, seria elle o primeiro a tomar iniciativa n'uma medida destas, não trazendo-a ao Parlamento; mas fazendo por si mesmo justiça a quem a ella tivesse direito, porque ha muitas preterições que não sé deram por motivos politicos, mas todos querem que a sua preterição seja como tal considerada (O Sr. Visconde da Luz — Apoiado, apoiado). A isso é que o Governo devia olhar tambem.
Sr. Presidente, eu entendo que tudo quanto a este respeito se discuta é inutil, porque as leis actualmente existentes são sufficientes para que o Governo possa fazer justiça a quem a tiver; mas ha uma cousa muito notavel, e é que as preterições são constantes, e em vez de se dirigirem ao Governo vem sempre ás Côrtes, não direi a esta Camara, mas á outra: é ordinariamente tal a chusma de pretenções particulares, que alli a commissão de guerra, por assim dizer, não tem um momento de descanço; eu tive a honra de ser uma vez relator, e de outra vez secretario da commissão por differentes épocas, e lembro-me bem de que, durante qualquer das sessões, o movimento de requerimentos naquella commissão não andava por menos de trezentos a quatrocentos, porque não havia, por assim dizer, Official que não se julgasse preterido, e alguns allegando que já o eram por terceira ou quarta vez, querendo por isso indemnisações, melhoramentos de reformas, e tudo isto por verem que muitos á força de instancias e insistencias tinham conseguido o seu fim, e o caso é que ainda nesta legislatura se tem dado desses casos, e alguns até confesso que muito me tem maravilhado, porque tenho visto attendidas e reduzidas a lei preterições que sempre reputei inadmissíveis; o que prova que da parte do Corpo legislativo ha toda a tendencia de generosidade, mesmo fóra dos limites da justiça, quando se tracta de fazer bem. Não é, pois, de crer, que tendo-se até agora assim procedido se queira ser hoje demasiado restricto, antes entendo que se deve ser completo, já que essas restricções senão estabeleceram em quanto era tempo para excitar a allegação dos exemplos, e a comparação de circumstancias analogas, ou mesmo identicas. Parecia-me, pois, de uma grande conveniencia que hoje acabassemos com isto por meio de uma medida tão generica que fechasse a porta a todas estas pretenções, ao menos era este o meu desejo, e não ver todos os dias, por assim dizer, estarem as Camaras a discutirem ad hoc e ad hominem, de fórma que saem do Parlamento algumas Leis que parecem mais Decretos do executivo.
O passado, passado, é necessario seguir vida nova; e por isso eu quereria que se nomeasse uma commissão de inquerito que examinasse todas estas questões, que a ella concorressem todos os interessados, que ali expozessem as suas allegações, e que esta commissão viesse depois apresentar a esta Camara um trabalho que estivesse no caso de ser approvado por ella; isto é que eu acho que seria de grande vantagem, pelo menos eu assim o considero, principalmente em vista do proprio parecer da maioria da illustre commissão de guerra, e em vista do parecer dado pela minoria, representada pelo Sr. Conde de Bomfim, com cujas rasões na generalidade concordo, achando-o mil vezes bem escripto. Mas foi mesmo, Sr. Presidente, depois que eu vi estes documentos parlamentares que bem me convenci que esta medida em todo o caso não podia deixar de ser considerada deficiente, sendo então por isso mesmo preciso tornal-a o mais ampla possivel; mas o que eu não posso tambem de fórma alguma pensar é que esta Camara seja capaz de fechar as suas portas a quem quer que for que lhe venha pedir justiça. O que está feito está feito, e o que resta a fazer o que queremos é fazel-o do modo que melhor se acerte, e que evite estas leis sempre parciaes, cujo contexto é de ordinario o seguinte: — é auctorisado o Governo a melhorar a reforma de fulano; a indemnisar sicrano, etc...
O que é preciso attender bem relativamente a este projecto, é que os chefes das revoluções, quaesquer que elles tenham sido, e em geral os Officiaes que tem tide padrinho, tem sido indemnisados, e 03 que o não tem tido é que até agora o não foram. Sanccionemos pois o passado como silencio; e façamos a justiça que se nos reclamar, quando se demonstre que ella é fundamentada com o exemplo do nosso proceder anterior.
Os que são subordinados, que não fizeram senão obedecer não digo todos, porque muitos ha que foram por sua vontade, mas ha outros que foram certamente coagidos por, dever da sua posição os que não tiveram protecção nem valimento na região do Poder, com esses devemos nós ter toda a contemplação; nunca esperei que a Camara dos Dignos Pares a negasse, nem o espero; mas assim como não espero isto, tambem não espero que ella approve uma medida que não tenha um grande alcance, e que não vá cicatrizar por uma vez todas essas feridas.
O unico modo pois de nos livrarmos destes dois escolhos, um da negação completa de justiça, que importa dizer — não vos concedemos nada — o outro de tomar uma medida acanhada e mesquinha, que em vez de fazer bem vá augmentar o mal; o unico modo, digo, de saír destes dois escolhos, é estudar a questão por meio de uma commissão de inquerito, perante a qual se apresentem todas as pretenções, para que sejam discutidas e convenientemente avaliadas. Um trabalho sobre isto, apresentado depois á Camara, estudado por ella, discutido e votado, passando para a Camara dos Srs. Deputados, não póde deixar de merecer a consideração publica e levar aquelle cunho de imparcialidade e justiça que deve caracterisar todas as medidas que sáiam do Corpo Legislativo.
É pois neste sentido que vou mandar para a mesa a minha proposta, que espero sustentar no caso de ser impugnada; e sendo regeitada, inclinar-me-hei a optar entre dois males o menor, que é approvar o parecer da minoria da commissão. Mas eu considero a minha proposta tão logica e justa, que não duvido que a Camara a adopte.
É a seguinte, que vae tambem assignada pelo Sr. Conde de Mello.
Esta proposta era concebida nos seguintes termos:
«Proponho que se nomeie uma commissão de inquerito para examinar quaes são as preterições e outras injustiças que tem tido logar no exercito desde 1843 até hoje, e para apresentar uma medida generica que as possa remediar. Sala das sessões 14 de Janeiro de 1859. = Conde de Samodães. = Conde de Mello.»
O Sr. Presidente — Consultarei a Camara se admitte á discussão a proposta do Digno Par o Sr. Conde de Samodães.
Consultada immediatamente a Camara, foi a proposta admittida á discussão.
O Sr. Conde do Bomfim — Respeito muito as intenções do Digno Par o Sr. Conde de Samodães, e as idéas que apresentou; seja-me, porém, licito dizer, que o projecto que está em discussão foi já formalisado á vista das minuciosas informações que tinham havido, relativamente a uma grande parte da officialidade. É possivel que falte ainda alguma circumstancia attendivel, mas é certamente difficil chegar a um fim tão completo, que não haja ainda alguma a que se deva attender, e por isso digo que reputo essa mais completa investigação quasi impossivel, para, em vista desses esclarecimentos, não haver alguem que se queixe (O Sr. Visconde de Ourem - Peço a palavra); sendo certo que o que se tem tractado, principalmente agora, é de ver se as pretenções dos Officiaes a que se tracta de attender por este projecto são fundadas ou não em Lei, e não se haverá outros que tenham direito a ser indemnisados por outros motivos. (Sussurro.)
O Sr. Presidente — Peço attenção a Camara.
O Sr. Conde do Bomfim (continuando)— Tem-se mostrado as difficuldades que lembram, para que possa ser approvado o projecto de lei; a maioria da commissão referiu-as muito circumstanciadamente no seu parecer, e eu contestei-as no da minoria, e como um e outro stão impressos e distribuidos aos Dignos Pares, seria talvez facil, lendo-os, ver que não são maiores as difficuldades para se levar a effeito esta Lei, do que aquellas que havia para passar a Lei de 10 de Junho de 1843. As primeiras que occorreram á maioria foram, que a Lei não era clara, e muito difficil a sua applicação; mas permitta-me a maioria que eu diga, que tendo pertencido a uma commissão um pouco similhante aquella que o Digno Par, o Sr. Conde de Samodães, propõe, fiz já applicação da Lei que passou no Parlamento para as reformas, cujos principios ou fundamentos derivam das mesmas causas a que se refere o actual projecto, e para isso fui obrigado a ver com a maior attenção toda a legislação a respeito do direito a accesso; não será, pois, para admirar que eu esteja em tão grande divergencia das razões em que se funda a maioria, quando tivesse passado da maioria para a minoria da commissão que a Lei permittia o accesso, pois que effectivamente a Lei que eu aponto no meu parecer era o Regulamento de 1834, que muitos Ministros, que se seguiram até 1848, se não todos, pelo menos a maior parte, o cumpriram, dando accesso na terceira secção; para exemplo da execução, que oito diversos Ministros deram á Lei, bastará lembrar que ha Officiaes que, desde o posto de Capitães, estiveram sempre na terceira secção, e se acham hoje Generaes, como acontece aos Dignos Pares os Srs. Marquez de Fronteira, Visconde d'Athoguia, etc... A questão, pois, hoje reduz-se a examinar o que está effectivamente em presença da Camara, para se ver se ha de ou não administrar justiça aos Officiaes prejudicados na promoção de 1846 e 1847. Tanto pela maioria, como pela minoria da commissão, apresentam-se, creio eu, todas as razões que ha pró e contra: as que ha pró são as de legislação, e o ter passado já uma medida em maior escala a favor de outros Officiaes, que tinham entrado em uma revolução contra o Governo em 1837; e por esta occasião seja-me permittido mandar para a Mesa uma lista impressa em 1843, em que se vê que foi muito maior o numero a que aproveitou a Carta de Lei de 1843, restituindo aos postos Officiaes que tinham entrado em movimentos politicos, e que por isso estavam fóra do quadro do Exercito, do que o que se propõe agora; não sendo por isso de admirar que alguns dos Dignos Pares, que se sentam nestas cadeiras, subissem por esta Carta de Lei bastantes gráos acima dos seus camaradas, que tinham ficado servindo o Governo, em quanto elles estiveram fóra do quadro do Exercito, ou na terceira secção. Agora, demonstrado que a Lei existia, que a applicação della se fez successivamente, que ha um exemplo em muito maior escala do que o que se pertende agora, não alterando em nada então essa Carta de Lei a harmonia no Exercito, parecia que a medida benefica que vem proposta da Camara dos Senhores Deputados iria em grande parte sanar as reclamações a que alludiu o Digno Par, que acaba de fallar, e que será melhor attendel-as desde já, do que entrar ainda em novas investigações, que a final talvez nem possam aproveitar a ninguem, como já aconteceu em outras circumstancias. Mas se acaso se nomear uma commissão de inquerito, e se fôr prescrutar novamente uma materia que ha tantos annos tem sido prescrutada e elucidada por todos os modos, eu receio muito que a questão, em vez de acabar mais depressa, não acabará nunca. É o receio que eu tenho. Em quanto ao mais parece-me que a justiça dos Officiaes a quem este projecto aproveita, e que reclamam que a favor delles se faça o que, como acabo de dizer, já se fez em muito maior escala, em nada prejudicava o serviço, antes pelo contrario restabelecerá a harmonia no Exercito. Eu não posso ouvir dizer que não convem o projecto, que ataca a disciplina, direitos, etc.. porque todos os factos provam o contrario.
Sr. Presidente, de mais a mais a amnistia mandou esquecer todos os factos passados, e em virtude della já estes Officiaes deviam estar naquella altura que lhe compete; por consequencia o projecto é tambem tendente a fazer que se leve a effeito uma das attribuições mais essenciaes que tem o Chefe do Estado, que é a amnistia, e esquecimento, e desde que ella foi decretada, mal estão sendo denominados revolucionarios os Officiaes, que são ainda alcunhados de criminosos, em consequencia de não se lhes ter administrado justiça, como se tem feito a tantos outros que estavam exactamente nas mesmas circumstancias destes a quem aproveita o projecto.
Sr. Presidente, estou inteiramente convencido do que acabo de dizer, isto é, de que as Leis favoreciam para o accesso os que estivessem na terceira secção. Quantos Officiaes que estiveram na terceira secção, não passaram dos postos que alli tinham a outros mais graduados? E com quanto alguns estivessem então exercendo commissões aliás importantes, o certo é que na terceira secção foram promovidos, como já disse, e apontei exemplos de que alguns houve que, do posto de Capitão, passaram até ao de General, estando sempre naquella secção. E se elles tiveram esse accesso é porque a Lei lh'o facultava, logo como é que havemos negar agora a uns aquillo que se não negou aos outros?
A proposta para que se nomeie uma commissão de inquerito, não me parece que deva ser adoptada, porque essa commissão não nos podia provavelmente esclarecer mais do que estamos esclarecidos; e para que é que havemos de ir pôr difficuldades a um projecto que já por duas vezes recebeu a approvação quasi unanime da Camara electiva, e que deve merecer o apoio desta Camara, o qual de certo não deixará de fazer justiça?
O Sr. Visconde de Ourem — Sr. Presidente, usando da palavra, começarei por mandar para a mesa, por parte da commissão de guerra, cento e vinte e cinco requerimentos, com duzentas assignaturas de Officiaes do Exercito, dos quaes cento setenta e cinco pedem que seja approvado o projecto de lei que está em discussão, e vinte e cinco que o mesmo seja rejeitado. São portanto trezentos trinta e cinco os que pedem a rejeição do projecto, e cento setenta e sete os que pedem a sua approvação.
A commissão de guerra, julga occioso fazer um parecer especial sobre taes requerimentos, porque as allegações prò e contra, são as mesmas dos que já teve a honra de apresentar á Camara, as quaes não modificaram a sua opinião.
Agora entrarei na questão, máo grado meu, e com profunda magoa.
O Sr. Presidente — O que está em discussão é a proposta do Digno Par o Sr. Conde de Samodães.
O orador — Está promiscuamente; mas se V. Ex.ª declara, que só está em discussão a proposta do Digno Par, isso então é outro caso. No entanto digo. que o costume é entrar promiscuamente em discussão uma e outra cousa. Eu tencionava ír respondendo ao Digno Par o Sr. Conde de Samodães, e ao Digno Par o Sr. Conde do Bomfim, mas se por em quanto só se tracta da proposta daquelle Digno Par, então só responderei a S. Ex.ª...
O Sr. Visconde de Balsemão — A proposta do Digno Par o Sr. Conde de Samodães, apresenta ou contém uma questão prejudicial, da qual me parece que se deve primeiramente tractar.
Vozes — Nada, nada.
O Sr. Presidente — Eu entendi que a proposta do Digno Par, continha uma questão prejudicial, e por isso julgueis que primeiramente della a Camara se devia occupar, porque se approvasse a proposta, cessava a discussão sobre o projecto, e se não fosse approvada, então entrava-se na discussão do mesmo projecto; no entanto se a Camara quer que se discuta promiscuamente sobre uma e outra cousa, assim se fará.