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24 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Achâmo-nos presentemente em uma situação nova.

O conflicto levantado ha camara dos senhores deputados por uma grande maioria, deu em resultado que o chefe do estado usasse da prerogativa que a carta lhe confere chamando aos conselhos da corôa o novo gabinete.

Eu, sr. presidente, não direi uma só palavra sobre o modo por que o poder moderador exerceu a sua real prerogativa, porque primeiro que tudo sou cartista, tenho sido cartista toda a minha vida, isto é, amigo e defensor da carta constitucional.

Sei quaes são os direitos que a nossa constituição confere ao chefe do estado, e sei que a cada direito corresponde um dever, e o meu n’este momento é respeitar o modo por que o chefe do estado usou das suas attribuições.

O chefe do estado entendeu dever nomear os ministros, que tenho a satisfação de ver presentes, em face do conflicto que se deu na outra casa do parlamento, demittindo o ministerio transacto, que havia perdido a sua maioria, obtendo apenas o apoio de insignificante minoria.

Dado, portanto, o casus billis, isto é, a separação da maioria que apoiava o ministerio, que foi substituido pelo actual, eu tenho que definir a minha posição, pois que a nenhum homem é licito o ser indifferente na questão politica. Eu entendo, sr. presidente, que na questão politica todos os que se não decidem por um partido são criminosos. Era a lei de Athenas, e eu passo desde já a definir a minha posição para escapar a este estygma, que as leis antigas lançavam sobre todo aquelle que no meio das lutas civis cruzassem os braços deixando que os cidadaos se digladiem e assassinem reciprocamente.

Declaro, pois, sr. presidente, que estou disposto a dar o meu fraco apoio ao ministerio actual, e seguir com a possivel assiduidade os trabalhos parlamentares, e explicarei as rasões que me impellem a tomar esta resolução.

O conflicto occorrido na outra camara tem uma significação de grande alcance, delimitaram-se os campos dos dois partidos, que se achavam confundidos n’um só partido pelo seu apoio commum prestado ao ministerio transacto. De um lado o partido que se denominou sempre regenerador, do outro lado o partido que outrora se chamou historico, e que fundido com o denominado reformista se intitula hoje progressista. O que é o partido regenerador sei eu, pois nasci no seu seio, e tive a honra de pertencer ao ministerio formado pelo sr. duque de Saldanha, e de que fez tambem parte o illustre presidente do conselho actual. (O sr. Presidente do conselho: — Apoiado.)

Circumstancias individuaes, quasi insignificantes, fizeram então com que eu pedisse a minha demissão de ministro, sem que por isso abdicasse os principies que esse partido professava, e que eu tenho sempre partilhado, (Vozes: — Muito bem.) ainda que me haja afastado um pouco das lides politicas. N’estes termos eu não podia faltar á minha consciencia, para unir-me ao partido chamado progressista alistando-me sob a bandeira, que nunca segui e menos poderia hoje seguir. Devo dizer, comtudo, sr. presidente, uma parte das rasões que para isso imperam no meu animo com relação a esse partido que arvora de novo a sua bandeira.

Sr. presidente, é publico e todos conhecem o larguissimo programma do partido historico reformado, reformista ou o quer que seja. Ora eu, sr. presidente, não posso acceitar esse programma na sua maior parte. Não é esta a occasião opportuna para entrar na demonstração especial do juizo que formo dos numerosos capitulos d’esse programma, nem isso me seria necessario no momento em que se trata de uma questão de consciencia; mas se me restasse alguma duvida ou hesitação com relação ao caminho que devia tomar, bastaria ver como os arautos d’esse partido, no dia seguinte aquelle em que o rei usou livremente da prerogativa que lhe concede a carta constitucional, apreciaram o acto do poder moderador, atacando violentamente o chefe do estado! Desde esse momento eu não podia ter mais hesitações. Isto me bastaria sem nenhuma outra consideração para me afastar completamente d’esse partido.

Sr. presidente, digo com franqueza o que sinto. Cada um tem o direito de pensar como quizer, não estranho, nem levo a mal que encare as cousas a seu modo, mas tenho o direito de pedir que se me conceda a mim o que eu concedo aos outros.

Era talvez escusado pedir a palavra para declarar que presto o meu apoio á situação presente, a minha qualificação havia de nascer do meu voto; todavia, entendi, como já disse, dever fazer esta declaração pelos motivos particulares que se davam a meu respeito com relação ao illustre ex-presidente do conselho de ministros, e me obrigavam a dizer a rasão porque me separei da sua politica.

Devo tambem dizer á camara n’esta occasião, que o meu apoio ao actual gabinete não póde significar uma cega subserviencia, nem assim o entendem os illustres cavalheiros que occupam os bancos do governo. (Apoiados dos srs. ministros.) S. exas. não poderiam acolher de bom grado um compromisso da minha pessoal dignidade, como da sua. (Apoiados dos srs.- ministros.)

O sr. Costa Lobo: — Não tinha a menor tenção de pedir a palavra na presente occasião, nem, tomando-a agora? tenho por fim exprimir a minha opinião com relação á maneira por que a crise politica, que se deu nos ultimos dias,, "foi resolvida.

Concordo com o digno par, que acaba de fallar, que não devemos entrar na discussão do uso que o poder moderador fez da prerogativa que a carta lhe concede.

Respeito as decisões do poder moderador, e acho mesmo uma superfluidade esta minha declaração. Nada, pois, tenho a dizer n’esta parte.

O meu intuito unico n’este momento, e isso me levou a pedir a v. exa. que me inscrevesse, é responder ao digno par, que me precedeu, o qual, sem provocação de qualidade alguma, entendeu que devia escolher esta occasião para atacar, n’uma linguagem violenta e acrimoniosa, não o partido que agora aqui se apresenta investido do poder, depois de o ter exercido por cinco annos com grave prejuizo da causa publica, mas aquelle que ha muito tempo está afastado dos conselhos da corôa...

O sr. Visconde de Seabra: — Eu não ataquei o partido progressista.

O Orador: — S. exa. não atacou o partido progressista!? S. exa. não só o atacou, mas pretendeu estigmatisal-o, attribuindo-lhe a responsabilidade da linguagem deploravel de certos jornaes..

Como sabe o digno par que a linguagem d’esses jornaes fosse auctorisada pelo partido progressista?

Se o procedimento da partido progressista na parlamenta estivesse em harmonia com os artigos d’esses jornaes, então tinha o digno par rasão em atacar esse partido.

Ainda que eu não tenho a honra de estar fillado n’esse partido, comtudo tenho sempre entendido que os seus principios na questão financeira são os verdadeiros. É essa questão é a unica que eu na actualidade julgo de momento para o nosso paiz. Por isso o tenho apoiado.

E quaes são n’este assumpto os principios do partido regenerador?

O artigo primeiro e fundamental do seu programma é a recurso ao credito. Quanto mais emprestimos, melhor. Não ha que pensar nos meios de satisfazer os encargos. A divida publica absorve já ametade da nossa receita. Pois para que a receita augmente, mais emprestimos. A divida fluctuante paga-se hoje com um emprestimo, e d’aqui a tres ou quatro annos está outra vez nas mesmas proporções. Pois para a saldar, outro emprestimo. Este emprestimo vence juros. Para pagar esses juros, outro emprestimo. Com todos estes emprestimos é impossivel extinguir o deficit. Não imporia, o deficit ha de acabar por si á força de emprestimos.

É n’estas proposições que se resolve o grande princi-