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SESSÃO N.° 9 DE 25 DE MAIO DE 1908 13

titucional, que tantas vezes me tinham feito jurar quer como militar, quer em todos os actos da minha vida civil. Como militar a lei impunha-me a obrigação de defender a Carta Constitucional, por isso eu tentava todos os meios dentro da ordem para conseguir o seu restabelecimento.

Fui portanto á estação do Rocio na noite da chegada do Sr. João Franco do Porto, onde todos sabiam que os seus amigos lhe preparavam uma manifestação que não era mais do que acirrar os animos já sobreexcitados por tanta provocação.

Succedeu o seguinte quando eu estava na gare com um grupo de amigos, na maior intimidade:

Chegou-se junto a mim um soldado da municipal, de bayoneta callada, e disse-me:

- Tenho ordem de não consentir pessoa alguma na gare.

A esta frase respondi eu:

- Está aqui gente de ordem. Eu não venho aqui fazer mal a ninguem. Ao que o soldado me respondeu:

- A ordem que tenho é pôr os senhores lá fora.

- A gare - disse eu ao soldado - não pode ser de uma parcialidade politica. Eu só venho aqui para pedir que se restabeleça a Carta Constitucional e o imperio da lei.

O soldado ficou muito atrapalhado, mas eu não queria deixar o soldado em má situação, porque decerto tinha recebido ordena para assim proceder e mesmo porque me tratara com toda a urbanidade.

Dirigi-me então ao Sr. Ministro da Guerra, que estava a pequena distancia, a quem contei o que se passava e perguntando-lhe se a gare era só para os seus partidarios, pois ali havia gente até quasi á boca do tunnel que não era mandada retirar.

S. Exa. respondeu-me que podia sair, porque todos iam sair igualmente. Obedeci immediatamente e sai.

Nessa noite o Rocio parecia um campo de batalha, houve tiros dados pela guarda municipal.

Parece-me extraordinario que a guarda municipal começasse a dar tiros para o povo sem ordem superior.

Não pude averiguar se a guarda foi ou não provocada, mas decerto que a guarda não faria fogo sem para isso. ter recebido ordem muito instante.

São estas cousas que fazem com que o povo tenha má disposição para com a guarda municipal, porque ella é pela sua natureza encarregada de executar as ordens que recebe dos varios Ministros, como succedeu com respeito aos cidadãos que naquella noite estavam pacificamente na gare da estação do Rocio, para contrapor manifestação á manifestação que os amigos do Sr. João Franco lhe queriam fazer na volta da sua provocadora viagem ao Porto, onde tão mal recebido fôra. O Porto, cidade liberal por excellencia, não podia supportar sem protesto que ali se fosse fazer exhibição, do despotismo e pelo seu patriotico procedimento revindicou as suas nobilissimas tradições. Sr. Presidente: era para fazer estas considerações que eu tinha pedido a palavra antes da ordem do dia e como me não chegou pedia-a na resposta ao Discurso da Coroa.

Estas cousas agradam a uns e desagradam a outros, mas não podem deixar desse dizer.

Sr. Presidente: passo agora a referir-me á instrucção primaria, de que já outro dia me occupei, mas muito resumidamente.

Lamento que na resposta ao Discurso da Coroa se não fizesse uma referencia ao assunto. (Apoiados).

A instrucção primaria está num chãos e é preciso dar-lhe remedio pronto. A Camara vae ver que eu não fui exagerado nas considerações que fiz ha dias e ainda não tinha os documentos que hoje possuo, nem o conhecimento completo dos grandes absurdos em que se baseiam os programmas a que já me vou referir.

Eu fiquei admirado com a infinidade de materia que se exige ás crianças com sete, oito e nove annos para fazerem exame do primeiro grau de instrucção primaria.

Disse, e repito: nenhum de nós, se fosse fazer agora exame, ficava approvado.

Eu não gosto de fazer affirmações que não possa provar.

Peço licença á Camara para ler alguns trechos do programma, pois que sem documentos á vista não se acredita.

Isto não pode continuar, a mocidade fica anemica, doente, damos cabo d'ella, e em vez de fazermos sabios como pretendem, fazemos cretinos; pois o cerebro das crianças fica atrophiado com tanta cousa que lhe exigem em tão verdes annos.

Ora ouça a Camara o que se exige o uma criança de sete e oito annos para o exame de instrucção primaria do primeiro grau.

Alem do que se exigia no nosso tempo e que era razoavel pede o programma mais o seguinte:

Rudimentos de agricultura pratica: "Plantas, arvores e arbustos - descrição dos orgãos principaes das plantas. Raizes, caules, folhas, flores e frutos. Exemplos de plantas uteis e industriaes, alimenticias, ferruginosas, texteis, oleaginosas, tintureiras, medicinaes e venenosas".

Ora pergunto: qual é o meio que se proporciona ás crianças para poderem estudar este assunto; haverá algum jardim botanico em cada escola onde se vá estudar tanta especie de plantas? E notem V. Exas. que o programma pede rudimentos de agricultura pratica. Como se ministra esta pratica? Só se podia conseguir mostrando ás crianças esta especie de plantas.

Não ha, nem nas escolas nem proximo, nenhum terreno onde estas plantas existam. Não ha nada.

Mas não é só isso; V. Exas. vão ficar assombrados; ha mais:

"Terra, sua composição. Conhecimentos das diversas especies de terreno, argiloso, calcareo, silicioso e mimoso, por meio de amostras de cada especie, conservadas em frascos. Como se modifica a natureza dos terrenos por meio de adubos e correctivos; diversas especies de uns e outros, e effeitos que produzem".

Imagine V. Exa., Sr. Presidente, como é que com uma pequena porção de terra mettida num frasco os rapazes nesta idade de sete a nove annos hão de saber o que é um terreno arenoso, argiloso, calcareo ou humoso? Mas consta-me que nem esses frascos de terra existem nas escolas.

Ha ainda mais e melhor.

"Sementeira, mergulhia e enxertia, drenagem, afolhamentos, cultura e tratamento do pinheiro, sobreiro, castanheiro, oliveira e outras arvores frutiferas, que abundam no nosso país, dos legumes e cereaes; cultivo da vinha. Cuidados que exige cada uma d'estas culturas, trabalhos essenciaes e epocas em que mais convem fazê-los.

Fabrico e conservação do vinho e do azeite de oliveira".

Sr. Presidente: isto é quasi um curso de agronomia e talvez que alguns agronomos não o saibam.

A este respeito eu vou contar um facto que se deu commigo numa escola agricola.

Sendo eu governador civil de Santarem, e tendo visitado differentes estabelecimentos de instrucção, fui um dia acompanhado por uma senhora visitar a escola agricola de Santarem; não declarei a minha qualidade official, disse apenas que desejava visitar a escola, não encontrei o director, nem nenhum dos professores, por já ser tarde, talvez 5 horas tarde, no verão.

Quem me acompanhou e mostrou a