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subir á tribuna para do alto della dizer francamente a sua opinião sobre a materia.
O orador ouviu lêr com estranheza o officio do actual Sr. Ministro interino da Guerra, o Sr. Visconde de Sá da Bandeira, em que S. Ex.ª diz que não podendo assistir á sessão de hoje, julga com tudo conveniente dever declarar que na sua qualidade de Par do Reino e de Ministro da Guerra rota pelo projecto em discussão; porque o illustre Ministro não se limitou a manifestar o seu voto como Par do Rendo, se assim o fizesse, elle Sr. Marquez ainda podia deixar passar essa distincção entre o Par do Reino e o Ministro da Guerra; mas pois que S. Ex.ª diz que vota como Ministro da Guerra, tornar-se-lhe necessario ouvir a explicação que dá a este respeito o Sr. Marquez de Loulé, como um homem illustrado e muito eminente na sciencia a que os alemães chamam a politica transcendente, esepera que o nobre Presidente do Conselho faça uma declaração franca e cathegorica, pela qual se conheça que differença ha (se a houver) entre o Sr. Ministro da Guerra, Visconde de Sá, e o membro solidario do Ministerio? Essa declaração espera-a para honra do Sr. Marquez de Loulé, que de hoje em diante ficará sendo um vulto importante no dominio da metaphysica, e tanto mais que ninguem melhor do que S. Ex.ª, não só como homem politico, mas tambem como chefe de partido, póde dar esta explicação. Desde que uma parte da imprensa se pronunciou pela conveniencia da adopção do projecto, em quanto que a outra parte o combate acompanhando ambas no seu pensar alguns membros desta casa, desde que alguns Dignos Pares já subiram á tribuna e declaram que este projecto era uma questão de direitos em que se tractava de administrar justiça, podia o orador entender que era por isso uma dessas questões livres em que cada um manifesta a sua opinião, e o Governo não é chamado a dar explicações. Mas quando outros Dignos Pares declaram que se o projecto fosse approvado, a disciplina militar seria offendida, o que outros negam chamando injustiça ao que se chama por alguns justiça, não póde reputar que seja uma questão em que o Governo se deva conservar mudo e quedo, consentindo que passe um projecto desta importancia sem declarar qual é a sua opinião a este respeito.
Por isso prescinde de emittir um voto qualquer antes de ouvir a opinião do Governo, que pela sua posição deve conhecer até que ponto a justiça e a disciplina possam ser offendidas com a approvação, ou a rejeição do projecto que veio da outra Camara. À tão pouco limita o seu pedido; e não tractará de fazer valer as razões que tem para mostrar a justiça da causa que defende nesta casa; o que deixará para depois, se vir que é necessario, e poder fazel-o.
O Sr. Aguiar, acabava o Sr. Marquez de Vallada de exigir que o Governo se pronuncie e dê a sua opinião sobre esta questão (O Sr. Conde de Thomar — Peço a palavra), e S. Ex.ª ficou mudo. Não lhe parece conveniente que o Sr. Presidente do Conselho reserve para o fim da discussão dar a sua opinião. O orador esperava que depois de acabar de fallar o Digno Par Marquez de Vallada, o Sr. Presidente da Camara convidasse ao Sr. Presidente do Conselho a satisfazer as exigencias do Digno Par Marquez de Vallada; mas como S. Ex.ª continua a dar a palavra sobre a questão, considerando talvez rejeitada por esta casa a proposta feita por aquelle Digno Par; não póde deixar de dizer que lhe parece indispensavel que o Governo se pronuncie, e dê a sua opinião, agora, e principalmente depois que se tem dito que a approvação do projecto, que veio da outra Camara, trazia comsigo funestas consequencias para a disciplina e harmonia que tem havido no exercito. Sente que apesar disso o Governo ficasse silencioso, e não desse os esclarecimentos a informações, que indispensavelmente deve dar.
Parece, ao nobre orador, até indecoroso para o Governo o ficar silencioso. Verdade é, que ninguem o póde, de certo, obrigar a responder, mas não se segue por isso que o Sr. Ministro não esteja obrigado a dar a sua opinião; e a Camara tem direito a querer não só a pessoal do Sr. Ministro, mas a de todo o Ministerio.
O orador tambem deseja saber qual é o numero (e nisto dirige-se ao Sr. Presidente da Camara) de requerimentos que existem sobre a mesa, de um e outro lado. Em quanto á questão em geral, torna a repetir, que é indispensavel que o Governo se pronuncie, pois é-lhe indecoroso deixar de dar o seu voto. Portanto pede que se convide o Sr. Ministro Presidente do Conselho para explicar a este respeito.
O Sr. Presidente disse, que como o Sr. Presidente do Conselho não tinha pedido a palavra, elle não podia obrigar a S. Ex.ª a fazel-o.
Suscitou-se, por occasião disto, uma questão de ordem, de que resultou alguma agitação; mas, dadas mutuas e acertadas explicações, restabeleceu-te a tranquilidade, e continuou a discussão.
O Sr. Conde de Thomar sentiu vivamente que esta questão de ordem viesse perturbar a discussão, que tão bem caminhava; sendo comtudo inquestionavel que foi apresentada na melhor intenção possivel. A sua posição nesta Camara é clara e definida; é de opposição ao Governo, tem-no sempre declarado, tanto na sessão passada, como no principio desta.
Não se póde comtudo, e com sentimento seu, conformar com a opinião do Digno Par e seu amigo o Sr. Marquez de Vallada. A questão, como acaba de ser apresentada pelo Digno Par o Sr. Aguiar, é uma questão em que a Camara tem de julgar o direito destes ou daquelles Officiaes, e não se póde exigir, posta a questão assim, a opinião do Ministerio para dirigir a Camara. Não lhe importa que a opinião do Governo seja prò ou contra (apoiados), porque tem de julgar pelo direito, que se apresenta. Neste caso não é possivel que a opinião do Ministerio influa para que os Dignos Pares formem a sua... E que se não diga que esta é uma daquellas questões em que é indecoroso para o Governo o occultar a sua
opinião, mais que nunca o Governo deve abster-se de dar a sua opinião a fim de deixar maior liberdade á Camara (apoiados). Será este um assumpto que diga respeito á disciplina do exercito? Ainda hontem se disse nesta casa que nenhum podia respeitar mais a ella do que a conservação ou abolição das chibatadas; e entretanto disse o Sr. Visconde d'Athoguia, que o Ministerio da regeneração a que S. Ex.ª pertenceu, deixou essa questão aberta, fez mais; o Presidente do Conselho declarou-a questão ministerial, dizendo que largava a pasta, se não passasse o projecto. (O Sr. Visconde d'Athoguia — Pois estes que façam o mesmo.) Portanto oi Ministros podem ter opiniões differentes nesta questão. O presidente do Conselho, o Sr. Marquez de Loulé póde pensar de um modo e o Sr. Avila pensar de outro modo; então para que é esta insistencia, se se tracta de uma questão de direito? Para que querer prender a Camara com a opinião dos Ministros n'um objecto destes? Pois não é melhor deixar-lhe a ella toda a liberdade? (O Sr. Visconde de Castro — Muito bem.) Parece-lhe pois que a ordem pede que a discussão continue, mesmo para que aquelles que ainda não tiverem a sua convicção bem formada, possam, á vista das razões que se apresentarem, votar como lhes parecer melhor.
O Sr. Visconde d'Athoguia — (Sobre a ordem) Fui eu o que apresentou a idéa de ser preciso ouvir a opinião do Governo, por entender que sobre esta questão elle deve ter uma opinião formada, entretanto não vejo que o Ministerio se apresente, ao menos ainda com a franqueza que exige uma questão de tanta transcendencia; o paiz avaliará o procedimento do Ministerio.
O Digno Par o Sr. Conde de Thomar referiu-se a uma questão que teve logar no Ministerio de que eu fiz parte, e em que o Presidente do Conselho tinha uma opinião differente da que eu sustentava, ambos expozemos as razões que tinhamos, a Camara decidiu contra a minha opinião, fui vencido mas não convencido; O Digno Par pois trouxe esse facto para sustentar a opinião que tem agora quando dispensa o voto dos Ministros nesta questão, não concordo com S. Ex.ª; pois não se ouviu ainda hontem dizer o Digno Par e meu amigo o Sr. Visconde de Balsemão, que votava pelo projecto, se o Governo dissesse que pela approvação delle não podia perigar a tranquillidade publica? (O Sr. Visconde de Balsemão — Apoiado.) Eis-aqui um voto condiciona], um voto que não se decide sem ouvir as explicações do Governo.
Que importa o que se tem passado na outra Camara, que é lá ouvido por um ou outro membro desta casa quando alli concorre? O que é official aqui é a explicação dada pelo proprio Governo, e é sempre costume perguntar-se-lhe aqui a historia de qualquer projecto de lei que vem da outra para esta Camara. Mas, Sr. Presidente, os Ministros guardam silencio, e entretanto a questão foi declarada politica, foi assim declarada pelo Sr. Visconde de Ourem como levando a sisania aos Officiaes do exercito, onde havia a maior fraternidade, e será então esta uma questão tão pequena que se possa admittir que o Governo fique mudo e quedo naquellas cadeiras?
O Sr. Presidente do Conselho (Levantando-se.) Eu já disse que não havia de fallar?!,. Pois não fallando logo immediatamente tira-se a inferência que o Digno Par está tirando, de que o Governo fica mudo e quedo?!
O Sr. Visconde d'Athoguia — Bem, nesse caso eu aguardo as explicações do nobre Ministro e Presidente do Conselho; espero porém que ellas venham antes de findar a discussão, e succedendo assim, retiro as observações que até agora tenho feito, no receio em que estava de que o Governo se não explicasse.
O Sr. Presidente do Conselho...
Mediaram algumas explicações entre o Sr. Marquez de Vallada e o Sr. Conde de Thomar, depois do que disse
O Sr. D. Carlos Mascarenhas — Requeiro que se prorogue a sessão até se votar o projecto.
Mandou por escripto a proposta, a qual, sendo posta á votação, foi approvada.
O Sr. Visconde da Luz — Sr. Presidente, depois da agitação por que tem passado a Camara difficil é entrar na questão com placidez: entretanto farei o possivel para o conseguir.
É com muita repugnancia e receio que entro nesta questão, pois por muito cuidado que haja naquillo que se disser, não póde deixar de se abrirem feridas que já estavam sanadas. Como homem, toda a gente fará justiça aos meus sentimentos de tolerancia e fusão, de que tenho em muitas occasiões dado provas (apoiados), e por isso desejaria muito dar o meu voto silencioso; mas não o posso fazer, sou membro desta Camara, membro da commissão de guerra, assignei o parecer da maioria, e alem disto, fóra desta Camara, tenho uma posição especial, como militar, e Chefe do Estado-maior-general: não posso deixar de dar uma opinião clara. Eu assignei o parecer da maioria, rejeitando o projecto; comtudo respeito a opinião particular do Sr. Conde do Bomfim. S. Ex.ª mesmo não podia deixar de tomar aposição que tomou: o Digno Par meu amigo, que em tantas revoluções infelizmente arrastou comsigo tão grande numero de Officiaes, que hoje reclamam, não podia deixar de tomar esta posição, e de se conservar na brecha. Eu louvo isto muito, digo-o agora, e disse-o já na commissão de guerra; mas estou intimamente convencido que S. Ex.ª pondo a mão na sua consciencia, como General não approvaria que se dessem hoje postos de accesso em favor de individuos que se levantaram contra o Governo legitimamente constituido. Mas elle não o póde fazer, porque foi envolvido com elles, e talvez fosse elle quem os envolveu nesses acontecimentos.
Sr. Presidente, esta questão não é uma questão politica, nem de numero, é uma questão de preceito de lei e de conveniencia. Em quanto á lei, declaro que não ha lei nenhuma que conceda direito aos Officiaes de reclamarem estes postos, não obstante o Sr. Conde do Bomfim aqui citar que se deram a Officiaes que estavam na terceira secção. Eu não conheço as circumstancias em que se achavam os Officiaes que foram promovidos nessa sessão, não sei se tinham alguma commissão que lhes desse direito a essa promoção; a não ser assim, nem a lei, nem as conveniencias lhe podiam dar direito, pois não se segue que possa ter direito a promoção um Official que está na sua casa gosando socego, e tractando dos seus negocios, não sei como se possa dar promoção a esses Officiaes. Os motivos por que alli os collocaram estavam legitimados pela mesma lei, que ainda hoje auctorisa a collocar na disponibilidade, e o simples facto de serem collocados nessa situação faz perder o direito a esse accesso.
Em quanto á conveniencia, sabe V. Ex.ª e a Camara qual era o absurdo que resultava do principio que se estabeleceu? É que para se despachar um Capitão em Major para servir haveria que despachar duzentos ou trezentos Officiaes para não servir! Esse era um dos maiores absurdos que podiam resultar do principio que o Sr. Conde do Bomfim estabeleceu (apoiados); por consequencia eu entendo que não ha direito nem conveniencia. Mas mesmo a lei de 1834, que estabeleceu o direito á promoção, é cada um na sua respectiva secção, não podem allegar direito da primeira para a segunda e da segunda para a terceira, a lei é muito explicita a este respeito, tudo o mais é querer sofismal-a.
Agora pergunto ao Digno Par meu nobre amigo: onde estavam esses Officiaes que se dizem preteridos?... Nessa occasião, em 29 de Abril de 1847, estavam na terceira secção? Não, estavam na revolta, estavam na revolução que se fez; por consequencia não estavam na terceira secção, não estavam em situação legitima e legal. Se a revolução do Porto tivesse triumphado, não só ficariam na terceira, mas teriam ido acima dos da primeira secção, estavam hoje com dois e tres postos, que já lhe tinham sido conferidos pela Junta. E os outros que combateram pela legalidade, como estariam? Eu não estava então aqui, acabava de chegar de Inglaterra, d'uma commissão a que tinha ido, e achei um Governo legalmente constituido, porque me parece que ainda não se tinham tirado á Augusta Soberana a Senhora D. MARIA II, de saudosíssima memoria, as attribuições de nomear o Governo que quizesse, por consequencia o Ministerio foi nomeado legalmente, e todos aquelles que foram contra não podiam deixar de ser considerados como revolucionarios. Acho portanto que direito não tem, nem podem ter, e conveniencia tambem não ha. Eu não receio que qualquer que seja a resolução que se tome nesta Camara, qualquer que seja a votação della, não receio, digo, que haja questão ou desintelligencia entre os Officiaes, confio no bom senso dos Officiaes do Exercito, desintelligencia existe hoje, mas é resultado de ter apparecido esta questão (muitos apoiados), porque se ella não tivesse apparecido, se esta questão não tivesse aqui vindo, não havia essa desintelligencia, os Officiaes todos viviam já como amigos, e na maior harmonia, uns seguros de que os não esbulhavam dos postos que tinham adquirido legalmente, e outros conformados com a sua sorte, visto que os principios da Junta, a que se ligaram na revolução, não tendo triumphado, elles não podiam exigir melhoras de situação, e conformavam-se com a sua sorte, de algum modo já melhorada com a resolução tomada pelo nobre Marechal Duque de Saldanha, obtendo da Augusta Soberana que se decretasse em dictadura o direito a uma graduação a todos os Officiaes do Exercito: qualquer que fosse a sua situação, o que effectivamente melhorou muito a sua situação, para que não fossem mais uma vez preteridos, e tanto melhoraram que alguns que então estavam no posto de Capitão estão hoje no de Tenente-coronel.
Não é conveniente, Sr. Presidente; e porque? Porque com as indemnisações alteraria no futuro a disciplina passando Officiaes mais modernos hoje para a direita de outros que por muitos annos os commandaram. Lei não ha que auctorise uma similhante promoção, se porém a queremos hoje fazer, que auctorise o Governo a conceder postos aquelles Officiaes que fizerem revoluções, ou para ellas forem, vamos a isso, eu a acceitarei, mas declaro a V. Ex.ª e á Camara que vou ámanhã fazer uma revolução, porque posso obter as vantagens que ella poder dar, se vingar, e nunca prejuizo (muitos apoiados. Vozes — Muito bem); por consequencia este projecto é inadmissivel.
Tem-se aqui argumentado muito com a paridade da Carta de Lei de 1843. Como esta medida possa ser comparada com aquella lei, não sei eu porque, pois não tem comparação nenhuma. V, Ex.ª e toda a Camara sabe que em 1836 houve uma revolução, da qual ninguem ainda quiz ser auctor (O Sr. Visconde de Balsemão — Mas houve-a); quem dirigia essa revolução tinha por fim fazer cahir o Ministerio que então existia, mas ninguem póde conter uma revolução, uma vez que ella se levante, e o resultado foi não só cahir o Ministerio, mas tambem a Carta Constitucional da Monarchia, que tanto sangue tinha custado! Houve depois outra revolta, ou contra-revolução, a que se chamou dos Marechaes. Essa era para restabelecer a Carta, mas teve a infelicidade de se mallograr: emigraram os individuos que nella se tinham mettido, e foram desquadrados ou tirados do quadro do Exercito os Officiaes, e alguns emigraram para Hespanha. As circumstancias mudaram passado algum tempo; os principios exaltados modificaram-se, e justiça seja feita ao Sr. Conde do Bomfim, que estando nos Conselhos da Soberana, fez restituir ao quadro do Exercito os Officiaes que tinham sido desquadrados, e pouco a pouco os foi mettendo nas fileiras. Isto prova bem os sentimentos de tolerancia que eu respeito em S. Ex.ª, mesmo porque os tem tido para comigo. Devo notar que a revolta dos Marechaes foi emprehendida em época em que a Constituição não estava discutida, nem promulgada, e não jurada: eu não estava em Portugal, mas ouvi dizer que os nobres Marechaes justificavam a sua tentativa procurando restabelecer o Código fundamental da Monarchia, porque ainda não havia Constituição jurada, pois que se a houvesse por certo não fariam aquella contra-revolução. Veio a revolução de 1842. E para que foi ella? Para restabelecer a Carta Constitucional, mas desta vez conseguiu a sua restauração, que posso dizer a contento, mesmo daquellas pessoas que tinham acceitado a sua queda. O Sr. Marquez de Loulé, que se acha presente, não poderá negar que eu tive uma conferencia com S. Ex.ª nessa época para o restabelecimento da Carta, e o meu nobre amigo o Sr. Visconde d'Athoguia (O Sr. Conde de Thomar — Então a cousa foi má, porque não foi feita por esses cavalheiros) lembrar-se-ha que esteve encarregado de certos trabalhos para esse effeito, e os individuos que estavam no Ministerio eram os primeiros que combinavam em se restabelecer a Carta, uma vez que não fosse por meio de revolução, e não ficassem collocados em má posição. Mas, como eu ia dizendo, veio a revolução de 1842, restabeleceu-se a Carta, e com ella as Camaras da mesma Carta, e foi então que se propoz na Camara dos Srs. Deputados a Carta de Lei de 1843; como objecto de indemnisar e restituir aos seus postos aquelles individuos que se tinham compromettido por aquelle Código que se acabava de restabelecer, que se fez esta proposta. Pois que? Entende V. Ex.ª e esta Camara que deviam ficar lesados aquelles individuos que se tinham compromettido pelo restabelecimento da Carta? Seria isso um contrasenso. Seria isso o maior contrasenso que se conhecesse. Foi com a mesma Carta que esses Officiaes haviam defendido e pertendido restaurar, e em consequencia do que tinham sido prejudicados, que depois com toda a justiça foram collocados na escala que lhes pertencia. E se isto assim foi, como me parece, não sei eu que comparação póde haver entre o procedimento dos que entraram no movimento de 1837 com o daquelles que entraram depois na revolução de 1846, porque os primeiros, triumphando com o restabelecimento da Carta Constitucional, não podiam deixar de obter aquillo que por direito lhes pertencia, em quanto que os segundos, tendo tido o infortunio de serem vencidos, não tinham remedio senão resignarem-se á sua má sorte.
Quanto, porém, ao argumento de se terem já indemnisado alguns Officiaes, que se achavam nas mesmas circumstancias em que se acham estes a quem aproveita o projecto, direi que, analysando-se esse impresso, que aqui foi distribuido na Camara, effectivamente ha uns quarenta e tantos Officiaes que já foram indemnisados, cujos motivos eu classificarei em quatro grupos: uns foram indemnisados em consequencia do vencedor do movimento de 1851, o nobre Duque de Saldanha, ter querido remunerar os serviços que certos Officiaes haviam prestado a esse movimento, e essa remuneração, que o nobre Marechal propoz, foi approvada por um Decreto da nossa Augusta Soberana, a Senhora DONA MARIA SEGUNDA, de sempre saudosa memoria. Ora, parece-me que não quereremos hoje, nem mesmo convem discutir esse movimento de 1851. No entanto é um principio muitas vezes dito, e que eu não posso deixar de o acceitar, que toda a revolução é legal, uma vez consumada, e tendo sido consumada a revolução que teve logar naquelle anno, ella tornou-se por isso legal, e o nobre Marechal, entendendo que de algum modo deviam ser recompensado certos individuos, que haviam entrado no movimento, á frente do qual S. Ex.ª se havia collocado, a recompensa que deu a alguns foi o contar-se-lhes a antiguidade que elles pediram se lhes contasse, como se não se tivessem envolvido nos acontecimentos de 1846, que o mesmo nobre Marechal havia combatido, collocando-os na escala que, em virtude da antiguidade contada, lhes pertencia.
O segundo grupo é daquelles Officiaes que não haviam entrado na promoção de 1846, que se fez para os corpos da revolução de Almeida, regressados de Hespanha, os quaes, por desconfianças que o Governo tivesse, os havia deportado para praças de guerra, e que por isso, posto que partilhassem os principios daquella revolta, não poderam fazer parte activa della, tendo, pois, em 1846 sido indemnisados os Officiaes que haviam estado em Almeida, e emigrado, não o foram estes ultimos, ao que tinham um incontestavel direito. Foi isto de certo uma injustiça relativa do Sr. Visconde de Sá, que então era Ministro da Guerra, ao qual, dizendo-lhe ultimamente isto, o mesmo Ex.mo Sr. respondeu-me «esqueceu, mas havia de fazer-se.» Foi, pois, ao nobre Marechal Duque de Saldanha a quem pertenceu a gloria de remediar o mal feito, indemnisando esses Officiaes que tinham tanta justiça, como os outros que já haviam sido indemnisados.
O terceiro grupo é de Officiaes engenheiros, que allegaram que, tendo estado dirigindo os trabalhos das linhas da fortificação de Lisboa em 1833, e tendo já o curso da respectiva arma, lhes pertencia o posto de segundo Tenente, e tendo-se-lhes dado essa antiguidade que elles requeriam, foram buscar o logar que por essa antiguidade lhes pertencia.
O quarto grupo é daquelles Officiaes que, posto se achassem na terceira secção, quando teve logar a promoção de 19 de Abril de 1847, se achavam estudando dentro e fóra do paiz, com auctorisação legal, tendo por isso direito ás promoções que se fizessem na primeira secção, não podendo portanto ser preteridos. O nobre Marechal quiz remediar esta injustiça, talvez feita por elle, pois que a promoção, a que me refiro, foi feita na época em que S. Ex.ª era Chefe do Conselho de Ministros, e assim deu a estes Officiaes os logares que na escala lhes pertencia.
Aqui está, pois, a historia das indemnisações aos Officiaes, que se diz estarem nas mesmas circumstancias em que estão estes que pedem agora a approvação do projecto de lei. E no entanto di-