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58 DIARIO DA DOS DIGNOS PARES DO REINO

segundo a occasião. Pois não vemos o governo ter esquecido os principios do seu programma, ir de encontro a elles quasi que em todos os actos da sua vida politica, e começar a proclamados agora, na hora da crise e do desalento do seu partido, para tentar reanimal-o, acalentando-o com a idéa de novas reformas? Lá só accende do novo o apagado pavio da reforma da camara dos pares. Já se pedem e já se proclamam as reformas politicas, senão pela bôca do governo, pelo menos pela voz da extrema esquerda do partido que elles representa no poder. Seja. Venha a reforma eleitoral dando representação ás minorias, como se todas as leis e systemas eleitoraes que temos tido lhes não dessem essa representação! O que tem faltado ao paiz é um systema eleitoral que lhe garanta a representação no parlamento da sua grande maioria, que é a que podo governo bem differente do que tem tido. Querem dar-lh'o? Accommodem o systema eleitoral á educação do nosso povo. Substituam o systema de eleição directa pela indirecta. Vale a pena modificar n'este ponto o programma, o celebre programma da noite de 16 de dezembro, cuja data deve ficar memoravel, como a da noite de 4 de agosto em França.

Tem graça, sr. presidente, ouvir faltar da representação das minorias quem confessava abertamente que até hoje a camara dos senhores deputados não tem significado, nem exprimido, senão a vontade dos ministros! Pois os srs. ministros não affirmaram isto no relatorio do seu programma? Não ouviu a camara ler isto mesmo?

Quando a gente se lembra, sr. presidente, do que é, do que tem valido para o povo o direito de votar! Saiam dos grandes centros de população, vão lá, vão ás povoações ruraes e perguntem aos eleitores, ou antes aos portadores de lista, quantos vexames, quantas arbitrariedades elles têem soffrido sob a pressão das influencias que os levam á urna!

Já alguem disse que para o povo o direito de votar significava apenas a obrigação de perder algum dia do trabalho. Disseram-no em França. Em Portugal sáe-lhe mais caro.

Mas emfim, vamos á reforma do nosso systema eleitoral. Eu sou por ella. Oxalá que seja accommodada, repito, á educação constitucional do paiz. Desconfio de que o não seja. Arreceio-me das garantias de liberdade da urna dadas por iniciativa de um governo ao qual devemos a arrematação do real de agua, as commissões de parochia no imposto de rendimento e outras bellezas de igual jaez,

E a este respeito me lembra, sr. presidente, um facto que, entre muitos, vem provar a firmeza de opinião dos nos nossos homens publicos.

Em 1874 dizia o sr. ministro da fazenda, que sinto não ver presente, no seu relatorio sobre o estado da fazenda do municipio de Lisboa, que era triste ver que de um imposto pesado, exclusivamente pago pelo povo de Lisboa, apenas o seu municipio recebesse, e a titulo de concessão ou subsidio, uma somma relativamente pequena. Annos depois vem o annuario estatistico da direcção geral das contribuições directas provar que o que Lisboa paga está em tal desproporção com o que pagam de imposto todas as outras terras do paiz, que chega essa desproporção a tocar as raias da iniquidade! Bem. Que fez o illustre ministro da fazenda para corrigir tamanhas monstruosidades? Applica-lhes como correctivo o imposto de rendimento! E a capital supporta isto? Supporta, e faz muito bem em supportar.

Sr. presidente, não desejo abusar da paciencia da camara, e limito-me a apresentar estas considerações, esperando ter o prazer de ouvir o sr. ministro do reino, e tendo talvez de tomar ainda a palavra no decurso d'este debate.

(O orador foi muito comprimentado.)

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Sr. presidente, eu pedi a palavra para dar algumas explicações que se exigem do governo.

Ouvindo as declamações tetricas, e as violentas censuras, que acabam de ser pronunciadas, eu devia suppôr que Catilina bate ás portas de Roma, ou que pelo menos muito funesta tem sido a gerencia do actual governo!

Em presença de tão sombrio quadro, como o que a caprichosa imaginação dos dignos pares desenhou aos olhos da camara, e em face de tão violentas o graves accusações, eu interrogo friamente a minha consciencia, consulto a historia, da nossa administração, examino as arguições, com que havemos sido flagellados, e não chego a descubrir os fundamentos do libello accusatorio, que contra nós é deduzido.

Sr. presidente, violámos nós algumas leis? Apontem-nas. Atacámos alguns artigos da constituição? Digam quaes foram, e formulem claramente a nossa accusação. Fizemos derramar o sangue do povo? Digam onde e como perturbámos o socego publico. Indiquem os factos em que podem firmar taes accusações. Declarem os nomes das victimas, e refiram as datas e os logares em que foram commettidos os attentados. Alterámos a paz interna, ou arriscámos as relações externas, que aliás temos diligenciado estreitar e desenvolver?

Apontem os factos, em que se apoiam, e formulem claramente as suas arguições. Desbaratámos a fazenda publica. Denunciem os nossos desperdicios, accusem as nossas prodigalidades, e censurem as estravagancias, com que havemos aggravado as despezas do thesouro.

Mas, se não violámos nenhuma lei, se não ofendemos as liberdades publicas, se não perturbámos a paz interna, ou externa, se não desbaratámos a fazenda, qual é a rasão d'esse estranho furor, com que se aggride o governo, e das vehementes instancias com que se pede a cabeça dos ministros? Qual é a accusação formidavel, grave, irrespondivel, que se faz ao governo? Em que se resumem todos os capitulos d'essa tremenda e assombrosa accusação? Na nomeação de dezeseis pares e na questão dos coroneis! Nada mais e nada menos!

O governo deve cahir, porque teve a audacia de propor á corôa a nomeação de dezeseis pares, e porque a questão dos coroneis foi resolvida, como a camara sabe, respeitando-se os direitos creados á sombra das decisões dos poderes legalmente constituidos!

Eis-aqui as rasões graves, solemnes, irrefragaveis, pelas quaes o ministerio deve caír, para dar satisfação á camara dos pares, justamente indignada, porque a corôa, no pleno uso das suas prerogativas, nomeou mais dezeseis pares!

Sr. presidente, não se diz quaes foram os crimes praticados pelo governo, quaes as leis calcadas aos pés, quaes os esbanjamentos, os desperdicios, as larguezas consentidas ou auctorisadas pelo gabinete.

Não se trata dos interesses vitaes do paiz; nem da solução dos mais serios problemas de administração, apenas se cuida de desaggravar a camara dos pares ultrajada e offendida porque a corôa se attreveu a usar dos seus direitos nomeando dezeseis pares, do mesmo modo que os nomeara no tempo das anteriores administrações!

Grande crime!

Como procederia a camara dos pares se um governo qualquer violasse a constituição ou attentasse contra os direitos dos cidadãos? N'esse momento solemne, n'essa gravissima conjunctura, como e em que termos viria ella pedir contas ao governo dos excessos e violencias da sua administração?

Não sei o que mais se poderia dizer para fulminar o governo pela ousadia dos seus attentados do que o que agora se diz em linguagem tribanicia, e em phrases inflammadas, porque o governo propoz á corôa a nomeação de mais dezeseis pares.

Pois realmente, por tão leves faltas, por tão vaniaes culpas, quer-se expulsar o governo das suas cadeiras?! Este