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SESSÃO BE 16 DE MAIO DE 1887 165

camara, como tribunal, quando tiver de absolver ou condemnar.

As declarações feitas pelo sr. presidente do conselho n'esta camara, ácerca da modificação ministerial, foram confirmadas por um membro d'esta casa do parlamento que era ministro da marinha, e que então deu a sua demissão.

Ninguem duvidava da palavra do sr. presidente do conselho, ninguem punha em duvida as declarações de s. exa.; o que se discutia era até que ponto essas declarações eram justificadas.

E ahi, sr. presidente, é que eu não posso deixar de deplorar a posição em que se collocou o governo, a tal ponto, que, convencido estou de que, se em vez de precipitada e tumultuariamente resolver que fosse preso um deputado, tivesse tido vinte e quatro horas de reflexão, o sr. presidente do conselho, com o seu juizo claro e sereno, seria q primeiro a não querer que se entrasse n'um caminho tão attentatorio das regalias parlamentares, e tão contrario ao que se acha estabelecido nas leis.

Quero crer isso, pelo muito respeito e consideração que tenho pelo sr. presidente do conselho.

Vinte e quatro horas de reflexão e s. exa. não faria o que fez.

Fel-o no primeiro momento, e hoje deve estar profundamente arrependido na sua consciencia como homem e na sua rasão como ministro da coroa.

Ora, eu não comprehendo a modificação ministerial como ella se fez.

Não vejo presente o sr. Henrique de Macedo.

Se s. exa. aqui estivesse, eu não tinha que augmentar ou diminuir uma só palavra, porque não é a s. exa. que me dirijo, é ao ministro da marinha que estava, é ao gabinete que ficou.

Eu não comprehendo, como disse, a ultima modificação ministerial.

Comprehendia a demissão immediata do sr. ministro da marinha, se no incidente que todos nós deploramos s. ex. se não julgava absolutamente isento de culpabilidade por qualquer acto, que eu não discuto nem aprecio; n'esse caso eu não comprehendo como podia o ministro da marinha assignar com os seus collegas a ordem de prisão. Se, pelo contrario, na sua consciencia se reputava completamente isento de culpa, completamente illibado de qualquer arguição que se lhe podesse dirigir, se não tinha havido determinação sua que o podesse vincular a responsabilidades de qualquer ordem, não comprehendo a sua exoneração.

Ou não assignava a ordem de prisão e demittia-se; ou, depois de assignada, conservava-se no seu logar.

Note-se que nisto não vae apreciação menos lisonjeira do caracter de um homem que eu estimo; vae unicamente a apreciação do procedimento politico de um ministro da coroa.

Não desejo, e n'este ponto creio que todos estamos de accordo, não desejo por forma alguma que se erga em precedente, em motivo determinante da saida de um ministro da conselhos da corôa uma aggressão pessoal.

Não é meio de derrubardo poder, não é meio de prostrar ministros; é um precedente que não póde ficar; mas, sem offensa para ninguem, e apenas como principio salutar, sincera e convictamente o digo, é necessario que os ministros não saíam do seu logar.

Discorri na sessão passada não sobre o facto que se dera, mas sobre o procedimento politico do governo; e assim discuti se esse procedimento podia justificar-se em presença das circumstancias independentes da natureza do delicto.

Sustentei como questão de principios que ao ministro da marinha em Portugal, segundo a legislação vigente, competiam sim attribuições superiores de administração no que tocava aos negocios da marinha, mas que fora disso, elle não era superior de qualquer official da armada; não era superior hierarchico; assim como sustentei que, qualquer que fosse a qualidade, a categoria, a posição de um membro do corpo legislativo, elle só era ou deputado ou par emquanto estava no exercicio da legislatura.

Se eu quizesse justificar esta affirmação, bastar-me-ía ler á camara o artigo 31.° da carta constitucional, que diz: "O exercicio de qualquer emprego, á excepção dos de conselheiro d'estado, e ministro d'estado, cessa interinamente, em quanto durarem as funcções de par ou deputado".

O sr. Ferreira de Almeida não exercia commissão de serviço; era unica e exclusivamente deputado; por conseguinte, o exercicio de qualquer emprego tinha cessado ante a sua qualidade de membro do parlamento. O local e as circumstancias do conflicto não provariam tambem a sua qualidade de representante da nação, e tão sómente essa qualidade?

Não comprehendo que, por se ter encerrado a sessão, como se se tratasse duma comedia politica em que caísse o panno, de prompto, de subito, por um rasgo não sei de que providencia, humana ou divina, houvessem cessado as funcções e a qualidade de um membro do corpo legislativo!

Ninguem podia dirigir-se ao sr. Ferreira de Almeida senão como a um deputado; e o incidente, o debate que se travara durante a sessão, não podia deixar de ser entre o deputado da nação e o ministro da corôa.

Mas quando ainda mesmo assim não fosse, sustentava eu na sessão passada que no meu entender, e em presença da legislação que nos rege, o sr. ministro da marinha não era superior militar hierarchico do sr. Ferreira de Almeida.

A verdade d'esta minha asserção, provo eu, não só com a legislação que nos é propria, mas com a de outros paizes, onde estes principios estão tão dogmaticamente definidos, que ninguem os contesta.

Vou citar o que está preceituado no codigo de algumas nações da Europa e a camara apreciará o fundamento das minhas convicções e a rasão por que defendo e sustento a minha asserção.

Na Italia, o regulamento de disciplina militar de 1 de dezembro de 1872 diz o seguinte, no artigo 21.°: "Ao ministro da guerra é devida obediencia de todos os militares pertencentes ao exercito".

O artigo 95.° contem identica disposição com respeito ao ministro da marinha.

Esta questão de auctoridade militar está preceituada por lei, e por isso subsistem ali sempre os principios geraes de disciplina e de subordinação.

Mas onde, como entre nós, não ha lei que tal preceito contenha, quanto ao ministro da marinha, vigoram os principios geraes de subordinação militar, definidos aqui e lá fóra, e esses são os que eu vou expor.

O que acontece na Hespanha? Vejamos o que se encontra no codigo penal do exercito hespanhol.

O artigo 169.° diz o seguinte:

"O militar que no acto de serviço de armas, ou por motivo d'elle, maltratar de facto a um superior, a cujas ordens se ache, incorrerá na pena de morte.

"Quando o serviço não for de armas, a pena será a de reclusão militar perpetua."

O artigo 17.° diz:

"Na mesma pena de reclusão militar perpetua incorrerá o que maltratar de facto a um superior que por motivo do seu cargo exerça auctoridade."

Finalmente, o artigo 171.° estabelece as penas para o mesmo delicto fôra dos casos comprehendidos nos dois artigos anteriores.

Aqui tem a camara como estes principios estão claramente definidos no codigo penal da justiça hespanhola.

Um dos commentadores mais notaveis d'aquelle codigo, o sr. D. Pedro Buesa y Pison que é auditor do tribunal militar, tratando de apreciar os principios que regulam os casos de que tratamos, diz, o seguinte: