SESSÃO N.° 11 DE 10 DE FEVEREIRO DE 1896 101
A opposição progressista d'esse tempo foi de uma correcção verdadeiramente irreprehensivel.
O illustre chefe d'aquelle partido muitas vezes poz o seu auxilio á disposição do governo, para acalmar quaesquer dificuldades que porventura se levantassem no meio dos seus correligionarios; e sempre o conseguiu, pela sua boa vontade, usando até muitas vezes da palavra.
Estavam, por exemplo, na memoria de todos, aquella phrase memoravel que s. exa. aqui proferiu, quando, elogiando o governo e as suas medidas financeiras, dissera: " que nenhum outro governo podia fazer melhor ".
Tudo corria, pois, admiravelmente.
Chegou-se ao periodo natural do encerramento da sessão, e ella foi encerrada.
Era de esperar que o governo aproveitasse esse ensejo de paz e concordia para reorganisar convenientemente o paiz, na sua ordem economica e financeira, onde mais urgentes se tornavam os cuidados governativos.
O governo, porem, - era uma verdade que havia sempre de sustentar - o governo não tinha idéas; vivia au jour le jour, não sabia o que havia de fazer; caminhava segundo a phantasia de alguns ministros. Por isso, n'essa occasião, quando tudo aconselhava serenidade, quando tudo indicava que deviam occupar-se serenamente dos negocios publicos, sem alimentar luctas politicas e partidarias, os ministros, no socego dos seus gabinetes, olhando uns para os outros, tinham dito: " O que havemos de fazer agora? "
" Vamos dissolver as camarás. "
Fôra ao acaso!
Pergunta agora que rasão houve para se proceder assim?
Se algum dos srs. ministros ou algum membro da commissão lhe responder, pede-lhe que explique a rasão que houve para se dissolverem as côrtes.
Estava na consciencia de todos que não houvera rasão nenhuma.
O governo dissolveu-as com o pretexto futil de consultar a opinião do paiz.
O governo tinha maioria nas camarás, e tanto assim que derrubara o sr. José Dias Ferreira.
O que era facto é que o governo dissolvera as côrtes em 7 de novembro, convocando-as para 7 de março.
O governo convocando as côrtes para 7 de marco sabia já que havia de infringir este preceito da carta constitucional.
O governo já sabia que não podia reunir as côrtes n'aquella epocha.
Para que as dissolvera sem haver necessidade?
O governo, convocando as côrtes para 1 de outubro, tirou á corôa todos os poderes que lhe confere o § 4.° do artigo 74.° da carta constitucional. Se o bem do estado e a salvação publica exigissem que a corôa usasse de qualquer d'elles, estava inhibida de o fazer, pela leviandade com que os srs. ministros lhe arrancaram nova convocação para 1 de outubro.
Se a opposição progressista não estava, quando as camaras então se abriram, animada dos intuitos de paz e concordia, de quem era a culpa?
Não era progressista, era independente. Deixou de acompanhar os srs. ministros, porque falsamente se chamam regeneradores, porque rasgaram os principios que estavam inscriptos na bandeira gloriosa do seu antigo chefe.
Mas, emfim; uma vez que os dignos pares, membros do partido progressista, tinham entendido não vir á camara, houvesse ali quem os defendesse.
Como correspondêra o governo á maneira por que foi recebido pela opposição progressista? Encerrando o parlamento, batendo-lhe com as portas na cara e entrando depois em dictadura. O que esperava que acontecesse em outubro? Que os membros d'essa opposição viessem mansos como cordeiros? Evidentemente não podia esperar isso. Quem tinha pregado a guerra senão os srs. ministros? Foram s. exas. que travaram a lucta. Todos os factos provenientes da dictadura pertencem á sua inteira e completa responsabilidade; ninguem mais tivera culpa d'isso.
Como se podia admittir que um disturbio causado por seis, oito ou mesmo dez homens, fosse motivo para praticar actos violentos e saltar por cima da constituição do paiz? Pois não tem havido desordens em todos os parlamentos do mundo, na Hespanha, na França, na Itália e até na Inglaterra, o paiz exemplar do parlamentarismo?!
E acaso se lembrou já algum governo d'essas nações de tomar taes desordens e disturbios como pretexto para encerrar o parlamento?
Acaso o governo progressista encerrou as camaras perante as arruaças que n'aquelle tempo eram capitaneadas pelo sr. Franco Castello Branco, actual ministro do reino, que tão saudosas recordações deixou no coração enternecido dos carpinteiros da outra casa do parlamento?
O mais que o partido progressista fizera n'essa conjunctura fôra pedir á corôa o adiamento das côrtes; mas governou tres mezes durante o anno, não infringiu o preceito da constituição, como fizera o governo actual.
Uma das rasões por que não approvava o bill era a convicção em que estava de que, votado elle, viriam novas infracções.
Dizia-se que o governo estava morto, começava a entrar em decomposição, e que, depois de passar o bill, haveria novidade. Não acredita em tal cousa. S. exas. gostavam muito de estar ali; não se iam embora; e o sr. ministro do reino, que sente não ver presente e tem muito amor áquellas cadeiras, só se retira n'um hypothese que não diz.
O orador prosegue criticando o procedimento do governo por occasião dos tumultos na camara dos deputados, especialmente a forma como ali foi proposto o novo regimento.
O governo já contava entrar em dictadura, por isso animava os tumultos.
O orador lê alguns artigos da carta, e em face d'elles accusa o governo de illegalidade no acto do encerramento das côrtes.
O orador cita phrases do livro do sr. conde do Casal Ribeiro: A carta e o pariato, e depois de largas considerações affirma que o que deu algum alento aos srs. ministros foram as victorias de Lourenço Marques e principalmente o fecho brilhante que lhe poz o heróico capitão Mousinho de Albuquerque, assegurando ali o nosso prestigio e o nosso dominio.
Passa a analysar a reforma eleitoral do sr. ministro do reino, e pergunta depois que tem feito até hoje a camara dos senhores deputados.
Sabe que não se póde ali alludir ao que se passa na outra casa do parlamento, mas póde fallar no que vem no Diario das sessões.
Consta-lhe que alguns deputados têem dito: " Esta camara não é como as outras. Venham para cá o orçamento. as propostas de fazenda e reino ".
O sr. Presidente: - Peço licença para observar ao digno par que lhe não é permittido referir-se aqui ás opiniões e pessoas dos membros da outra casa do parlamento.
O Orador: - Diz que acceita e acata a indicação do digno presidente; mas observa que foi o proprio sr. ministro do reino quem ali fallou na camara dos deputados. Demais elle estava alludindo á reforma eleitoral.
O sr. Presidente: - Uma cousa é discutir a reforma eleitoral, outra discutir as pessoas e opiniões dos srs. deputados.
O Orado?:-Apenas perguntava ao governo o que que tem feito a camara dos deputados, ou o que tem feito a reforma eleitoral até 10 de fevereiro?
Apenas votou o discurso da corôa.
A camara anterior, a que votou a lei de salvação publica, não mereceu consideração alguma j e agora o go-