SESSÃO N.° 11 DE 10 DE FEVEREIRO DE 1896 103
Eu não podia dizer que s. exas. não têem idéas.
Orador: - O que é facto é que, como s. exa. disse, os decretos dictatoriaes formam um grosso volume, e ninguem póde negar que o governo tem procurado por todos meios restaurar o prestigio do parlamento.
(Interrupção do digno par o sr. Marçal Pacheco, que não ouviu.)
O sr. Presidente: - Peco aos dignos pares que não interrompam o orador.
O Orador: - O que se discute é se houve ou não motivos que levassem o governo a assumir poderes extraordinarios, e n'estas condições não ouviu ao digno par, a quem está respondendo, um unico argumento que negasse a existencia d'esses motivos.
Dissera o digno par que não havia necessidade, que não era urgente que o governo assumisse poderes extraordinarios, porque a rasão que o governo tem dado até hoje para fundamentar o seu procedimento, é o ter havido na camara dos senhores deputados continuos disturbios, e o digno par não via que os disturbios fossem rasão para o governo assumir poderes extraordinarios.
Disse o digno par que em todos os parlamentos do mundo se faz obstruccionismo, mas em todos elles ha um regimento que é seguido, que é acatado, que dá ao presidente auctoridade para regular convenientemente os debates.
O que succedeu na outra camará?
Ninguem ignora que tres ou quatro homens são os bastantes para evitarem que uma assembléa possa funccionar regularmente.
Tres ou quatro homens decididos a não deixarem trabalhar, conseguem o seu fim, recorrendo a tumultos como os que se presencearam em 1894.
Na camara dos senhores deputados, em 1894, chegou a haver pateada, e a pateada não é argumento para discussões parlamentares.
A bulha e a pateada, quer num theatro, quer em uma assembléa, não consentem que as cousas deslisem com a regularidade precisa.
Foi o que succedeu na camara dos senhores deputados, e o presidente d'aquella assembléa legislativa não tinha então no regimento o meio de obstar a esses barulhos, e s. exa. sabe, sabe-o toda a camara, que para o regular func-cionamento das instituições é necessario que todos os seus elementos sejam livres, que possam exercer sem peias a sua acção.
Era o que não succedia na camara dos senhores deputados, isto é, havia quatro ou cinco homens que impediam que os outros trabalhassem.
Foi para obstar a este estado de cousas, foi para fazer cessar estas irregularidades que se apresentou um novo regimento, regimento que a opposição declarou formal e terminantemente que nunca acceitaria.
O sr. Conde de Lagoaça: - E fizeram muito bem.
O Orador: - Pois se fizeram muito bem, melhor fez então o governo encerrando a camara e dissolvendo-a depois, visto que ella impedia o regular funccionamento do poder legislativo.
O digno par a quem está respondendo manifestara o desejo de que o orador lhe dissesse, muito precisa e concretamente, o que pensava sobre um assumpto em que lhe attribuira auctoridade.
Fallou s. exa. no projecto de recompensas aos militares que se distinguiram na campanha da Africa e disse que bom seria que eu concordasse com s. exa. no que dispõe na sua proposta.
Veiu na ultima sessão disposto a dizer o que pensava sobre o assumpto mas como o projecto a que o digno par se referira, e que já mandara para a mesa, ia ser submettido ao exame da commissão de guerra, o orador ahi dirá as rasões que tem para não estar de accordo com s. exa.
(O discurso a que este extracto se refere será publicado na integra quando s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção que o digno par conde de Lagoaça mandou para a mesa.
(Lida na mesa, foi admittida, e considerada em discussão conjunctamente com o parecer, a seguinte proposta:
Proposta
A camara, reconhecendo que nenhum motivo de interesse publico levou o governo" a entrar no caminho violento da dictadura, e rejeita o projecto de lei em discussão; e sentindo que não haja uma lei de responsabilidade ministerial, passa á ordem do dia.
O sr. Conde de Bertiandos: - Sr. presidente, não desejava tomar, n'esta occasião, tempo á camara, mas fui forçado a pedir a palavra a v. exa., na occasião em que me dava a honra de responder-me o illustre relator da commissão, por quem eu tenho a maxima estima, o que succede a toda a gente que o conhece.
S. exa., com uma phrase de effeito, disse que eu estava fazendo opposição á opposição; tambem eu poderia dizer-lhe que, n'esse caso, se s. exa. está em opposição a mim, está de accordo com a opposição ao governo.
Sr. presidente, eu já expliquei a rasão por que estava aqui.
Creio que no sacrificio que faço, e isto que digo não envolve nenhuma falta de respeito para com a camara, presto um serviço ás instituições.
Venho porque, apesar de ter nesse ponto de estar em divergencia com amigos que muito considero, entendi que o meu logar era aqui, no parlamento; não vim, porém, para dizer ao governo Amen; não para dizer que elle fez muito bem, que a camara está bem constituida, etc.
Se a camara me quer aqui para isso, então tenho que sair.
Creio que, apresentando-me assim com esta franqueza, presto respeito e homenagem á camara dos dignos pares, e mostro toda a minha consideração por esta assembléa.
Disse o digno relator:
" Se nós não estamos constituidos legalmente, para que está aqui o digno par? Se nós não estamos legalmente constituidos, qual a rasão de ser das moções? "
E eu pergunto a s. exa.:
Se nós estamos completa e legalmente constituidos, para que discutirmos os actos de dictadura que modificaram esta camara?
Para que precisâmos sanccionar o que o governo fez?
O illustre relator entende que de um salto se póde proceder a essa sancção, e eu entendo que é necessario um estádio, para que tudo fique perfeitamente sanccionado. E essa apenas a differenca.
É, pois, uma questão de processo.
Parece-me, portanto, que se a camara votar a minha moção, não praticará nenhum acto contrario ao respeito que deve a si propria.
Ninguem mais atacou a moção. Eu deveria até estar contente, esperando que ella seja approvada, porque não vi ninguem pronunciar-se contra, a não ser o sr. relator, com aquelle argumento a que respondi mal, como sempre respondo a argumentos subtis como são os de um espirito tão culto e habituado ás discussões parlamentares.
Da parte do governo, sim, alguem me deu a honra de uma resposta; foi o sr. ministro do reino, que eu sinto não ver presente, e a quem já prestei na sessão anterior, todo o preito da minha consideração e estima pessoal.
S. exa. deu-me a honra de uma resposta; mas se bem me lembro, nada disse com relação especial á moção.
S. exa. respondeu-me na parte em que eu disse que não houvera ainda precedente que tivesse auctorisado o governo a fazer o que fez.
Sr. presidente, eu sabia tambem que havia precedente", mas eram precedentes de revolução, e não queria eu que fossem lembrados, mas o sr. ministro do reino não teve duvida em os recordar, fallando-nos da revolucionaria con-