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hontem fallou não descesse a explicações que reclamam tambem as que me são relativas.
Sr. Presidente, de sincero accordo com o meu nobre amigo o Sr. Conde de Lavradio, digo tambem, como S. Ex.ª que muito desejo a união da Familia Portugueza, mas estou convencido, de que não será com taes explicações, nem com a recordação de factos que deveriam esquecer-se, que essa união poderá ter logar. (O Sr. Conde de Thomar — Apoiado).
Sr. Presidente, S Ex.ª narrou a historia dos seus soffrimentos depois da batalha, ou derrota de Torres Vedras; mas S. Ex.ª teve esses soffrimentos em consequencia de haver tomado parte na revolta, como S. Ex.ª mesmo asseverou, ao passo que eu, Sr. Presidente, soffri tambem bastante por ir cumprir as Ordens da Soberana: mas seja-me permittido antes de entrar nestas explicações, approveitar a occasião para responder tambem ao meu nobre amigo o Sr. Conde de Lavradio, no ponto do seu elloquente e polido discurso, em respeito á repartição a meu cargo, durante o Ministerio a que presidi — de direito e não de facto, como S. Ex.ª disse.
S. Ex.ª, querendo atacar aquella administração, disse que, quando entrára no Ministerio, os cofres estavam inteiramente exaustos. e os Empregados do Estado com seis mezes, ou mais de atrazo em seus pagamentos: Eu, Sr. Presidente, estava então á testa de uma das repartições dessa administração, e de certo uma das mais importantes, pelas grandes sommas que para ella são geralmente applicadas; mas sou obrigado a dizer a S. Ex.ª, que não foi demasiadamente bem informado sobre este ponto, de que quiz servir-se para atacar aquella administração, porque facil é provar, que os prets estavam pagos em dia; é pelo que respeita aos soldos, o atrazo não excedia a 3 mezes; os quarteis tinham sido reedificados, ou quasi reconstruidos. (O Sr. Conde de Simodães — Apoiado); as massas decretadas para o fardamento do exercito, estavam tambem pagas em dia; compraram-se 350 cavallos na importancia de 8,000 libras para a remonta de um dos regimentos de cavallaria (e depois ainda se compraram mais 400 para os differentes corpos da mesma arma).
Agora cumpre dizer, Sr. Presidente, que quando essa Administração sahiu, essa Administração perdolaria e vexativa, que tanto tem soffrido, e tão recriminada ha sido pelo D. Par, existia nos cofres das differentes Pagadorias do Ministerio da Guerra a quantia de 67:276$751 réis; e bem pouco tempo depois, talvez que parte dessa som, ma fosse applicada para despezas bem pouco regulares, como as que se fizeram com os chamados corpos populares, que então impunham nas immediações da Capital. — Sr. Presidente, não é porque com esta declaração queira criminar alguem, longe dessa idéa, convenho em que era identicas circumstancias eu faria o mesmo, ainda que não fosse senão para me vêr livre delles (riso), só trago esta observação para provar, que aquella Administração deixou dinheiro quando sahiu do Poder, em contrario do que constantemente se houvera asseverado. Mas, Sr. Presidente, voltando ao objecto principal, voltando digo á estas explicações que bem desejava não se fizessem ouvir nesta Camara, por que, como já disse, não e por certo esta a maneira por que a Nação Portugueza ha de conciliar-se; impellido a fallar sobre tão desagradavel materia direi, o que julgar conveniente como Empregado que fui pela Administração de 6 de Outubro de 1846, a qual me encarregou de uma missão importante que eu devia cumprir, relatando o que soffri, bem como meus illustres companheiros, quando iamos unicamente no caminho da Lei desempenhar as ordens da Soberana.
Não occultarei que muito me satisfez o movimento de 6 de Outubro, bem como a queda da Administração que então deixou o Poder; não por que eu fosse inimigo pessoal de qualquer dos Srs. Ministros, bem pelo contrario, até de alguns delles era e sou particular amigo, como do Presidente do Conselho, o Sr. Duque de Palmella, e dos D. Pares o Sr. Conde de Lavradio, e Sr. Visconde de Sá da Bandeira, e do Sr. Mousinho de Albuquerque, cuja morte muito lamento; mas por que a politica da sua Administração não era aquella, que eu julgava boa e util o meu Paiz. (O Sr. Visconde de Semodães: — Apoiado.)
Demittido pois aquelle Ministerio, fui nomeado pelo actual Presidente do Conselho para uma Commissão importante, e não tive a menor duvida em a acceitar, porque conheci bem, Sr. Presidente, qual era o fim da minha missão. Não era levar a guerra e o vexame aos povos, as prisões, os fuzilamentos; bem pelo contrario, ia apresentar-lhes o ramo de oliveira; aconselhar-lhes a paz e a conciliação; possuir-me de seus verdadeiros males, e curar de remediar-lhos. Com este pensamento, Sr. Presidente, cheguei ao Porto, e dirigi-me á Authoridade Suprema, que alli governava em Nome de Sua Magestade a Rainha, remettendo-lhe a Proclamação e mais peças officiaes, que me authorisavam, e convidando-a a que quizesse immediatamente comparecer na casa onde ia estabelecer o meu Quartel General. Sube então, que objectos de serviço tinham reclamado a outro ponto a presença daquella Authoridade, e neste caso fiz dirigir a minha correspondencia a quem no momento exercesse as suas vezes. Desembarquei, e declaro que desde o sitio do meu desembarque até á casa onde tencionava alojar-me, encontrei a Cidade no mais perfeito socego; e chegando alli, fiz logo officiar para os Commandantes das Divisões Militares mais proximas, que eram a quarta e a quinta, e esperei que o General que commandava naquella Cidade fosse logo encontrar-me, por isso que tinha ordens importantes a communicar-lhe, e estranhando a sua demora, mandei então o meu Ajudante d'Ordens a procura-lo, e mesmo assim bastante difficultoso foi que elle camparecesse, fazendo-o sem distinctivo algum militar, e parecendo bastante assustado. Nessa occasião, um meu Ajudante d'Ordens me participou, que os sinos da Cidade tocavam a rebate: perguntei então ao General, como encarregado da segurança da Cidade, qual o motivo daquella novidade; respondeu-me — que nada sabia. — Repetiram-se então as participações sobre o mesmo objecto, e momentos depois eu mesmo ouvi os alaridos da populaça desenfreada, que agrupando-se em magotes, não tardou muito em se approximar da casa em que eu estava: conheci logo que o seu fim era apprehender-me, e nesta circumstancia ordenei ao General, que mandasse immediatamente postar uma guarda ao meu Quartel General, ao que elle me respondeu, que a tropa lhe não obedecia; e exigindo-lhe o motivo de tal insubordinação, disse apenas — que não sabia. — Por esta occasião devo dizer, que eu lamento, Sr. Presidente, a conducta anti-militar daquelle General, e meu collega; e não menos lamento ser obrigado a asseverar, que á sua indecisão e inactividade se deve o incremento que tomou a rebellião, a qual tanto manchou as paginas da historia daquella Heroica Cidade. Continuarei, Sr. Presidente, a narração do acontecido.
Em seguida á resposta do General, de que ultimamente fallei, entrou na casa onde eu estava o Presidente da Camara Municipal, abraçando-me muito, como é seu costume, pois creio que todos conhecem quanto é amavel e polido o Sr. José Passos (riso do lado direito), e perguntando-me o que ia eu fazer ao Porto, respondi-lhe que cumprir as ordens de Sua Magestade, e que não tinha satisfação alguma a dar-lhe, aconselhando-o a que continuasse a desempenhar as funcções do seu cargo, e nada mais! então elle redarguiu, dizendo: = V. Ex.ª não faz cousa alguma nesta Cidade, o povo já está revolucionado, em consequencia de uma communicação que recebemos de Coimbra, pela qual soubemos os acontecimentos da Capital, noticiando a revolução que alli teve logar, e por muito favor se permittirá, que V. Ex.ª se retire: ámanhã, continuou elle, formar-se-ha uma Junta, para o que já se escreveu ao General Conde das Antas: portanto, não tem remedio senão partir immediatamente. Bem conheci então que os embaraços cresciam; mas como me persuada que não sou dos mais atacados de medo, fiz pouco caso desta confidencia, e continuei a fazer igual resistencia; mas que resistencia poderia eu fazer com seis ou oito pessoas, que me acompanhavam, uma das quaes alli está, que é o Sr. Conde da Ponte de Santa Maria? No entanto o povo continuava não só a aproximar-se da casa onde eu estava, mas já muitos invadiam a mesma casa, e nessa occasião um individuo, pessoa muito capaz, e de uma particular educação, um celebre Navarro, um famigerado miguelista, entrando sem decoro na Sala onde eu estava, medisse gritando com insolencia. = Eu sou representante do povo, e em nome desse povo venho dizer a V. Ex.ª, que sahia já e quanto antes desta casa, e venha para as casas da Camara, onde será bem tractado, aliás irá para o Castello da Foz, — por unica resposta ordenei-lhe, que se retirasse immediatamente, e voltei-lhe ás costas. Neste momento entrou de novo na Sala o Sr. Passos (José) volvendo da Cidade, e dizendo-me, que não tinha remedio senão embarcar, e que pouco tempo me restava para o poder fazer, ao que annui, porque o momento na verdade era bastante critico, e conhecendo a impossibilidade de desempenhar a minha missão, o meu desejo era affastar-me dalli, pois mesmo quando não fosse eu o alvo daquelles excessos, bastaria para horrorisar-me, ser testimunha de scenas tão brutaes.
Sahi pois acompanhado dos Srs. Conde de Santa Maria, Visconde de Vallongo, Visconde de Campanhã, dos Coroneis Adrião A. da Silveira Pinto, e Joaquim de Sousa Pinto Cardoso, dos Capitães do Estado Maior Francisco Peixoto, e A. A. Corrêa de Traçada, dos Tenentes D. Manoel de Sousa Coutinho, e Luiz Augusto de Almeida Macedo, e do Alferes de Caçadores Antonio Joaquim Simões, todos conduzidos a pé, e no centro de uma escolta, composta de 300 a 400 pessoas, na maior parte das infimas classes da sociedade, e entre as quaes se reconheciam alguns assassinos e malfeitores; e tambem alguns Officiaes da Guarda Municipal do Porto: estes ultimos não para nos vigiarem, mas (diziam elles) para evitarem que nos fizessem mal (apoiados).
Sr. Presidente, não ha côres com que se possa descrever o horror deste transito! e inacreditaveis parecem as monstruosidades que nessa noite tenebrosa se praticaram! mas desgraçadamente foram factos acontecidos na noite de 9 de Outubro de 1846!!! Chegados ao logar do embarque, não encontrámos alli barcos, porque traiçoeiramente nada se havia previnido: então estivemos aqui a ponto de ser fuzilados pelos amotinadores; mas o Sr. Passos lhes fallou, elles contiveram-se, e fomos conduzidos para o Castello da Foz. Durante este transito soffremos toda a qualidade de insultos; o ferro do assassino já me havia ferido; e o sangue de mais alguns dos que me acompanhavam já corria de algumas feridas recebidas então; os vestidos de outros já estavam rotos pela violencia com que nos empurravam: foi deste modo que transitámos até á Foz, debaixo de copiosa chuva que então cahia, e ao chegar alli, a não ser as diligencias e esforços do Governador do Castello, o Sr. Antonio de Passos de Almeida Pimentel, e de seus irmãos, que nada pouparam para nos salvar, e livrar-nos das garras dos assassinos, de certo teriamos sido victimas delles. Recolhidos ao Castello, foi este logo guarnecido pelo povo, ficando nós entregues á guarda dessas massas irregulares, sem disciplina nem ordem.
No dia seguinte formou-se uma Junta, e eu esperava que essa Junta nos mandasse soltar; mas pelo contrario, Sr. Presidente, as ordens que deu essa Junta, foram para ficarmos incommunicaveis, de modo que os nossos creados não podessem alli entrar a fallar-nos, nem os nossos amigos, e que fossem aquelles, como foram poucos dias depois, barbaramente prêsos, e os nossos cavallos tirados; que nos não fossem entregues as nossas cartas de familia senão depois de abertas (Vozes — Ouçam, ouçam); que nos não fosse entregue papel algum sem ser visto pelos carcereiros, pois não estava confiada a nossa guarda a um só, mas sim a quatro, entre elles um tal Almeida Penha — homem muito capaz — (riso); e finalmente, que as cartas que escrevessemos ás nossas familias fossem em papel por elles trazido (mas pago por nós), e abertas. Sr. Presidente, era tal a vigilancia daquelles senhores, que nem: a comida podia entrar sem ser examinada (Vozes — Ouçam, ouçam), mettendo-se a mão em um prato que levava manteiga, partindo-se em pedaços os nabos (tenho vergonha de o relatar á Camara, — mas é preciso que isto se saiba) eram retalhados, para se vêr se levavam dentro alguma correpondencía!!! (Vozes — Ouçam, ouçam); o papel dos palitos abria-se, e espalhavam-se para tirar todo o escrupulo. — Deste modo fomos tractados. Todavia, devo declarar em alta voz nesta Camara, para que todo o paiz o saiba, que eu e os meus companheiros, a quem unicamente devemos favor, é ao Sr. Visconde de Sá da Bandeira (O Sr. Conde de Santa Maria — É verdade); esse cavalheiro tratou-nos sempre com humanidade, offerecendo-nos a sua protecção, e até o seu dinheiro, buscando todos os modos de melhorar a nossa sorte; e Se a nossa liberdade dependesse só delle, estou bem persuadido de que não teria sido retardada. Fomos tambem visitados, é verdade, por alguns membros da Junta, o Sr. Passos, o Sr. Seabra, e o Sr. Justino, os quaes nos dirigiram muito boas palavras; mas viu-se pelos resultados, que esta visita foi mais de inguerito, que de cumprimento, pois que á sabida deixaram ordens mais apertadas, que nos foram communicadas pelo tal senhor Almeida Penha, que logo veiu dizer-nos que não acreditassemos cousa alguma do que tinham dito aquelles senhores, pois que as ordens que acabavam de dar eram ainda mais restrictas: e deste modo passamos quatro mezes, não lhes tendo esquecido para maior segurança, fazer trancar parte das janellas, e entregar a nossa guarda ao batalhão d'Aveiro, e depois ao do conego Montalverne (signaes de espanto e horror), batalhão horroroso pela má gente de que se compunha, contando não poucos assassinos, e um commandante perverso. Eu tenho pena de fallar deste modo, e ter de continuar a relatar circumstancias desta natureza (Vozes — Falle, falle): o que se ouvia aquella gente, Sr. Presidente, eram os differentes planos de assassinar os prèsos, repetidas diatribes contra a Soberana, e não escapando nestes excessos mesmo o S. Conde das Antas a quem por vezes chamavam traidor. (O Sr. Conde das Antas — Por querer ir visitar a V. Ex.ª).
Foi assim que terminou a nossa estada no Castello da Foz, d'onde nos conduziram para a Cadêa da Relação do Porto, não omittindo que para recebermos algumas das poucas pessoas, que iam procurar-nos, era preciso que fossem munidas de uma ordem por escripto, contendo as assignaturas de todos os membros da Junta, deste modo
«Manda a Junta Provisoria do Governo Supremo do Reino, que o Governador do Castello de S. João da Foz de livre entrada a Luiz Teixeira de Sampayo Junior, Ajudante d'Ordens do Marechal do Exercito Conde das Antas, que acompanha o Official de Marinha de Sua Magestade Britannica Wasey, portador de uma mensagem da Duqueza da Terceira para seu marido, Palacio da Junta Provisoria no Porto, vinte e sete de Janeiro de mil oitocentos quarenta e sete. = Conde das Antas, Presidente = José da Silva Passos, Vice-Presidente = Antonio Luiz de Seabra = Sebastião d'Almeida e Brito = Justino Ferreira Pinto Bastos = Francisco de Paula Lobo d'Avila.»
E alem disto acompanhados de uma pessoa de confiança da mesma Junta. Sr Presidente, mesmo com um Official da Marinha de S. M. B. que ia visitar-me hão foram os nossos guardas mais indulgentes, pois que poucos minutos depois de ser introduzido, indo acompanhado de um Official de Estado-maior, se ouviram gritos insolentes dos mesmos guardas, dizendo—Sr. Inglez, saia cá para fóra, que já lá está á muito tempo.
Continuarei, Sr. Presidente, contando a maneira, porque fomos mudados da Foz para as Cadêas da Relação: dividiram-nos em duas conductas, sendo a primeira que partiu composta dos Officiaes de menor Patente, ficando os Generaes para a segunda. Não deixarei de confessar, que durante o transito não fomos maltractados, e sei mesmo, que se deram ordens para se impedir, que attentassem contra as nossas vidas: a final chegámos ás Cadêas da Relação, onde já existia grande numero de prêsos politicos. tanto civis como militares, e alli soubemos, que em consequencia da epidemia que então grassava naquella prisão, houvera dia em que morreram vinte pessoas. Tambem soubemos, que os nossos contrarios faziam constar no publico, que nenhuma commodidade nos faltava, por quanto até os quartos eram forrados de papeis, atapelados, e até tinhamos fogão; mas nada disto era exacto: a verdade, Sr. Presidente, é que, as paredes estavam caiadas, e os telhados consertados; e pelo que respeita a commodidades bastará dizer-se, que em a noute em que chegou a primeira conducta, os Officiaes foram obrigados a dormir sobre o sobrado por não lerem chegado as suas camas proprias. Devo declarar, que alguma cousa devemos ao carcereiro, o qual, apesar de ser rustico, foi bastante humano, e humano por indole natural: digo isto, porque provava que não era com o fim de obter recompenças, fazendo-nos vêr as ordens do Ministro da Guerra, recommendando era todas que nos atormentasse (vozes — Ouçam, ouçam); mas a Junta ainda não contente com aquelle tractamento, nomeou uma Commissão composta de tres Officiaes Reformados, todos da sua confiança, a qual ia expressamente vigiar o modo, porque o carcereiro nos tractava, e evitar qualquer condescendencia da parte deste esta Commissão ia uma e duas vezes por dia á Cadêa fazer as suas averiguações; e como succedesse um dia cahir fóra de uma janella o lenço de um criado, isto chegou logo aos ouvidos da Junta, que imaginou serem signaes de convenção: fomos por isso chamados á presença da Commissão e reprehendidos; dizendo que se não nos abstivessemos daquelle procedimento, seriamos mettidos nas enxovias e postos a ferros (vozes — ouçam, ouçam). Eis-aqui, Sr. Presidente, o tratamento que a Junta do Porto, Eminentemente Liberal, Philantropica, e Justa dava a homens de certa cathegoria (O Sr. Conde de Thomar: — Da maior), que íam ao Porto no cumprimento de seu dever, não com idéas hostis, mas offerecer a paz e a ordem, em virtude d'ordens legaes mandadas pela Soberana (muitos apoiados).
Sr. Presidente, digo sinceramente, que muito sinto ser obrigado a tratar similhante materia, e bem folgaria, que S. Ex.ª o Sr. Conde do Bomfim não tivesse encetado a questão narrativa de certos acontecimentos, mas eu não podia deixar de o fazer, uma vez que se quiz atacar o Governo de quem recebi ordens, esse Governo justo, que estava legalmente instaurado pela Soberana por isso, Sr. Presidente, eu já disse e torno a repetir, que ponho de parte quanto passou, porque desejo sinceramente se façam todos os sacrificios para obter a união de toda a familia Portugueza; mas, Sr. Presidente, para chegar a tão nobre resultado, é preciso que esses sacrificios sejam sinceros, sejam reaes (muitos apoiados — muito bem, muito bem).
Respondendo agora ao que S. Ex.ª disse, ácerca de uma revolta, direi simplesmente, que para fazer revoltas, não tenho vocação alguma (apoiados), e que se uma unica vez tomei parte n'um desses movimentos, d'accôrdo com o Sr. Duque de Saldanha, foi porque até então não havia jurado a Constituição de 20 (apoiado), e vingavam nessa época os resultados da revolução de setembro; e então confesso a verdade, que nessa tomei parte, e fui infeliz, que é do que tenho pena.
Sr. Presidente, rematarei dizendo, que para nada esquecer á Junta do Porto, a fim de tornar mais penosa a nossa situação, não poupando a escolha do que mais poderia desgostar-nos, e sobre todos a ruina decretou, Sr. Presidente, a minha demissão da Presidencia do Supremo Tribunal de Justiça Militar, e do lugar de Governador da Torre de Belem: bem certo estava eu de que, ou a rebellião vencia e eu me considerava de tudo demittido, ou era vencida, e então se disconsideravam os seus decretos; mas não posso deixar de confessar, Sr. Presidente, que muito me magoou, vêr figurar entre as assignaturas daquelle documento da Junta do Porto, o nome de hum collega meu aquém eu havia nomeado para aquelle mesmo Tribunal. (O Orador concluiu no meio de muitos apoiados; e vozes de — Muito bem, muito bem).
O Sr. Fonseca Magalhães — Sr. Presidente, é a primeira vez que tenho a honra de fallar na Camara dos Pares do Reino, e é a primeira vez, porque ainda ha pouco tempo recebi de Sua Magestade mais este testemunho da sua real benevolencia; e faltando logo nesta occasião solemnissima, não posso occultar a V. Em.ª e á Camara, que o faço com grande repugnancia; mas assentei que tinha uma obrigação forçosa de fazer aqui ouvir a minha debil voz, e com a mesma sinceridade, com que na outra Camara, por muito tempo a fiz escutar; pela benevolencia dos meus collegas, e de quem mais assistio ás discussões. Sr. Presidente, eu temo muito que esta nova época, annunciada do alto do Throno, e repettida pela commissão da resposta ao discurso do mesmo Throno, esteja mais distante de nós do que eu quizera. Essa resposta a esse discurso, que eu me honraria de subscrever, e que exprime em todas as suas palavras e frases, porque em nenhuma dellas se devisa o contrario, um pensamento civilisador de paz e união, digno desta Nação, digno do Throno, e dos Corpos Legislativos, é d'uma Nação illustrada; mas eu receio o tumulto das paixões, que ainda vejo ambulantes, as quaes quizera vêr adormecidas e socegadas: receio muito que isso ainda senão possa verificar; e eu sou o mesmo homem que tenho sido até agora, perdoe-se me um instante fallar de mim, de quem se disse que nenhum partido representava, porque era nenhum contava soldados, não apresentava chefe, não tinha ninguem, não era partido, não era nada. Eu sou o homem da paz; Sr. Presidente, e é pena que se diga, que o homem de paz neste paiz, não tem partido algum! (apoiados) mas eu não o creio; pois por ventura não existirá fóra do campo dos excessos, quem possa levantar a sua voz com liberdade a favor da Patria, chamando esses homens enfurecidos ao campo da paz? pois quem não vê o que se tem passado entre nós, e quem é que quererá vêr continuadas por mais tempo as desventuras do seu paiz? De certo que de nenhum dos lados da Camara, nem daqui para fóra, porque nenhum homem honesto, de bom coração, e amigo do seu paiz o póde desejar. Mas, Sr. Presidente, o bom coração, e o amor pelo seu paiz, todos dirão que possuem, porém eu digo que tenho manifestado que o possuo, e talvez hoje o possa provar. Sr. Presidente, a revolução entre os partidos não ha de vir, senão com a sentença odios restringendo, favores ampliando!
Sr. Presidente, o Throno deu uma amnistia, uma amnistia e sem excepções; aqui está estabelecido o maior elogio, que se póde fazer á Augusta Soberana que reina sobre nós: não é necessario mais. O que depois disso era indispensavel, o que era consequente, era que esse acto tivesse toda á validade e amplissima validade, e para todos (apoiados). A primeira excepção que se fizer a este pensamento, é um atroz quebran-