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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 43

bilidade da corôa está fóra da discussão. Mas para que isto seja possivel constitucionalmente é necessario que haja quem tome a responsabilidade d’esses actos, aliás importaria a negação dos principios fundamentaes do systema representativo.

O sr. presidente do conselho, acceitando o encargo de formar o gabinete, tomou sobre si a responsabilidade do acto; mas não só a responsabilidade legal, ainda mesmo a moral, pelos conselhos que deve ter dado n’esse sentido, para que assim nenhuma responsabilidade possa ficar a descoberto para a corôa.

Estou certo que s. exa. diz que acceita todas as responsabilidades e acceita-as com facilidade porque, se lhe competem, e grandes de direito, de facto não tem nenhumas; s. exa. é dictador com as formulas representativas. Isto é que é inacceitavel, sr. presidente, contra isto é que protesto.

S. exa. entra e sáe do poder como e quando quer; s. exa. tem o cuidado de ter nas occasiões proprias guardada a uma pelas suas auctoridades; s. exa. preenche as cadeiras d’esta casa com os seus amigos. O conselho d’estado está quasi todo composto dos seus collegas e de amigos politicos; emfim todas as peças do machinismo representativo funccionam pela vontade de s. exa.

Narrar a historia dos ultimos annos é escusado, porque é de todos bem conhecida; vejamos, porém, qual a moralidade dos factos.

O sr. Fontes subiu ao poder em 1872, representando apenas uma diminuta minoria parlamentar; mas, como o seu partido era aquelle que havia mais tempo estava afastado do poder, dava-se como rasão a conveniencia de voltar a elle para se regular a rotação constitucional. Acompanhado pelos amigos do sr. marquez d’Avila, que s. exa. tinha ajudado a sair do poder, sustentou-se algum tempo perante o parlamento. Tendo de consultar o paiz por meio do suffragio, s. exa. arranjou com as suas auctoridades uma numerosa maioria na camara electiva, e propoz a Sua Magestade innumeras nomeações de membros para esta casa.

Em mais de cinco annos que s. exa. esteve no poder, póde affeiçoar á sua politica o conselho d’estado, e apoderar-se de muitos elementos favoraveis para lhe dar força; e um dia, sem que obice algum constitucional, conforme mandou dizer ao parlamento, para isso concorresse, largou subitamente o poder.

Sr. presidente, não me parece que a um ministerio seja permittido demittir-se sem obice constitucional, tendo a confiança da corôa e a do parlamento, e esta ultima tinha effectivamente o gabinete que em marco do anno passado pediu a sua demissão ao chefe do estado, não se podia demittir, não podia a situação que representava deixar o poder.

Podiam sair dois ou todos os ministros se a doença ou o cansaço os tivesse prostrado, mas a situação, se representava principios, se representava idéas, se tinha a confiança dá corôa, do parlamento e da opinião publica, se não era o acompanhamento de um dictador, não podia deixar a administração porque o sr. Fontes e Antonio de Serpa estavam doentes.

Não havia no mesmo gabinete homens com a capacidade bastante para interinamente substituirem os ministros doentes, tomar em a direcção politica? Pois os srs. Corvo e Sampaio não têem a confiança das suas maiorias, são apenas sub-secretarios do sr. presidente do conselho?

Parecia que não havia ninguem mais entre os membros do partido regenerador que estivesse nas condições de sobraçar as pastas que ss. exas. não podiam então gerir.

N’um paiz onde a logica do systema representativo vigorasse, entendia-se de certo que esses homens que deixavam o poder tinham feito a sua abdicação politica, e que o seu partido se julgava dissolvido.

Mas, sr. presidente, haveria no intimo da familia partidaria difficuldades que obstassem á marcha do gabinete? Amigos leaes mas severos, não quereriam continuar a ter a responsabilidade de innumeras prodigalidades e desvarios? Mas então faltava-lhe a opinião e caíam porque um obice constitucional o determinava.

A recepção que a maioria fez ao illustre marquez d’Avila com o ministerio que tinha formado era a confirmação de que maioria e governo demittido não podia continuar a gerir os negocios publicos. Outra cousa não me parece que fosse, pois não se póde admittir que significasse uma licença ao sr. presidente do conselho actual para tratar da sua saude.

O sr. marquez d’Avila, saindo da minoria, e investido no poder pela resignação da maioria, estava pela logica dos principios auctorisado á dissolução.

Na falta de outra indicação constitucional foi chamado para presidir á consulta do paiz um homem que pela sua respeitabilidade e moderação dava garantia a todos de que o poder não influisse apaixonadamente na urna.

Sr. presidente. É necessario que nós acatemos os principios, mas tambem é necessario que haja logica no procedimento de todos os que influem na governação do estado.

O conflicto dado ultimamente na outra casa do parlamento entre a maioria e o governo presidido pelo sr. marquez d’Avila em nada alterou o estado da questão. Mostrou, é verdade, que havia incompatibilidade entre a maioria e aquelle governo, mas de maneira alguma que essa maioria e os ministros demittidos em março passado estavam de novo habilitados a tomar o poder.

Se entre as attribuições do poder moderador tem rasão de existir a dissolução, eu não vejo que se possa apresentar outra occasião como esta para a aconselhar á corôa.

O sr. presidente do conselho actual não o entendeu assim; entendeu que era melhor investir-se do poder para dirigir as proximas eleições, procurando afastar da rotação constitucional um partido politico, que s. exa. detesta, e ao qual parece querer compellir a sair da senda constitucional.

Comtudo, sr. presidente, eu espero e creio que o partido progressista ha de aguardar sereno e digno, e escudado pela consciencia publica, .º dia da justiça, e permitia Deus que quando esse dia chegar, elle ainda possa cumprir a sua missão, sustentando perante a corôa os fóros populares, e defendendo a corôa do radicalismo.

Eu, sr. presidente, sou partidario do systema monarchico representativo, acompanhado de instituições democraticas, porque entendo que é o melhor systema para garantir a liberdade, e entre nós. tambem a independencia da nação.

Se alguma vez, o que Deus afaste, soar uma hora de perigo para a corôa, eu hei de estar entre os seus leaes defensores; mas tambem, sr. presidente, quando o systema representativo seja sophismado, quando os foros populares forem postergados, quando as liberdades publicas perigarem, hei de procurar um logar, ainda que modesto, no campo onde estiveram o duque de Palmella, o duque de Loulé, o marquez de Sá da Bandeira, o conde de Lavradio, Joaquim Antonio de Aguiar e muitos outros homens que, sendo sempre leaes á corôa, souberam ser guardas austeros das garantias e liberdades publicas.

Eu, sr. presidente, não desejei provocar discussão, nem fiz perguntas ao sr. presidente do conselho; póde ser porém que s. exa. queira ter a delicadeza de dizer alguma cousa ácerca do que eu acabo de expor. Se o fizer espero da lealdade de s. exa. que note bem a significação das minhas palavras e qual a responsabilidade a que dirijo as minhas arguições.

Espero da sua lealdade, que não fará como fez o ministro de Jorge IV, lord Temple, esse auctorisado superior-