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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 65

dadeiros principios constitucionaes? Não sabemos tambem como e quando se deve aconselhar ao poder moderador o uso acertado d'aquella importantissima prerogativa?

Não sabemos nós todos, que a não ser para premiar um ou outro serviço relevante, a não ser em casos excepcionaes e só quando ha conflicto entre o poder executivo e a camara dos pares, é que é licito aconselhar ao Rei a nomeação de novos pares, a modificação d'esta camara?

Muitos governos têem havido que antes de propor ao Rei á modificação d'esta camara lhe têem aconselhado a consultar a vontade do paiz, ácerca do conflicto. Effectivamente este seria o melhor conselho a seguir, sé as eleições no paiz, em logar de serem feitas pelos regedores e cabos de policia, exprimissem a vontade genuina do povo. Como ás opiniões do sr. presidente do conselho têem sido contradictorias é os principios postergados pelo governo, desejo que o sr. presidente do conselho declare quaes os motivos que o levaram a propor á corôa á nomeação de novos pares.

Ouvi já aqui declarar por parte do gabinete, que a rasão por que o governo aconselhou a Sua Magestade aquella nomeação fôra com o intuito de fazer passar a reforma administrativa, e uma projectada lei eleitoral com a representação das minorias. Esta declaração maravilhou-me ou antes fez-me rir, porque no fundo não vejo senão o negocio de Torres Vedras. Confesso, sr. presidente, que em toda esta manobra não vejo outra explicação; não vejo mais, repito, que o negocio de Torres Vedras. É verdade que por parte do governo tambem hontem sé declarou que não fôra esse o motivo, e que já não fazia questão ministerial d'aquelle caminho de ferro. N'esse caso é porque já sé fez n'outro tempo questão ministerial. Não se faz hoje porque os ventos são contrarios. É este é systema do governo. N'este ponto o sr. ministro das obras publicas não póde por fórma alguma acceitar a doutrina e a declaração do governo, porque todos sabem o modo como tem corrido o negocio de Torres Vedras, e a parte que o sr. ministro das obras publicas tem tomado n'esta negociação como ministro e como particular.

Todos sabem, porque é do dominio publico, e a imprensa tem asseverado, que. aquelle caminho de ferro tinha sido concedido a certos concessionarios, que queriam formar uma empreza, da qual o sr. ministro das obras publicas fazia parte. Todos sabem tambem que em Lisboa e em todo o paiz correram impressos com a assignatura do sr. Saraiva os prospectos para a empreza. Posta a questão n'este terreno, a susceptibilidade e o brio do sr. Saraiva de Carvalho deviam-no apressar já na sessão passada a desvanecer no publico as más impressões que tudo isto causará. A questão póde não ser ministerial para o governo, para quem ella o é decididamente é para o sr. ministro das obras publicas.

A honra e a dignidade do ministro e a de homem particular estavam e estão empenhadas na discussão d'aquelle projecto, e por isso eu esperava que s. exa. o anno passado empregasse os seus esforços para o fazer discutir nesta casa do parlamento. Quanto vale e quanto póde o apego áquellas cadeiras!

Não succedeu como eu presumia e como era de esperar. Apesar do nome do sr. Saraiva de Carvalho estar seriamente envolvido e compromettido nesta melindrosa negociação, s. exa. não só não obrigou o governo a fazer discutir o projecto, mas ficou silencioso ao ouvir a declaração de que o seu caminho de ferro já não constituia questão ministerial para o governo!

Como explicar este facto, ou antes, como explicar o phenomeno de ver applacada com duas palavras, a susceptibilidade do sr. ministro das obras publicas? É porque o governo via e sentia a atmosphera carregada n'este recinto, e querendo navegar com todos os ventos estaria prestes a alijar ao mar o seu collega, se elle se não submettesse.

Se assim não é, que o diga o sr. ministro das obras publicas.

É necessario que todo este negocio se explique. Não comprehendo que venha hoje declarar-se que não sé faz questão ministerial do contrato de Torres Vedras, porque se applacou a susceptibilidade do sr. Saraiva.

A natureza d'elle, a fórma porque foi negociado,- as declarações que se fizeram na outra camara, tudo isto põe o sr. ministro em condições de não poder deixar de provocar a discussão e de fazer questão ministerial d'aquelle contrato. Assim o exige o brio e o pundonor do sr. ministro das obras publicas. Será possivel que alguns dos novos pares, tendo votado o referido contrato na outra camara, o votem segunda vez?

O sr. Pires de Lima: - Peço a palavra.

O Orador: - Imagino que não, faço justiça ao caracter de s. exas. para acreditar que não procederão d'essa fórma, se o governo lhe fizesse pedido tão affrontoso.

A fornada, permitta-se-me a expressão, ou a modificação d'esta casas seria, como tambem se disse, por causa da reforma da lei eleitoral? Não póde ser.

Não se póde tomar a serio uma similhante declaração. Pois o governo actual tem a auctoridade, o prestigio para propor a reforma da lei eleitoral? O governo actual, que fez toda a qualidade de vexame, que exerceu no animo dos eleitores toda a corrupção, que demittiu e transferiu com a maior intolerancia os empregados, que apedrejou os eleitores, que fez correr o sangue, que atropelou a lei como lhe convinha, que nomeou cabos de. policia nas vésperas das eleições, está lá no caso de pensar em similhante reforma? Pois esse governo que conduziu os eleitores arregimentados pelos regedores e cabos de policia, como provei com documentos, poderá nunca querer a liberdade da urna? Um governo que assim procede póde querer que as eleições sejam livres? Póde querer a genuina, a verdadeira expressão da vontade popular? Pois a actual lei eleitoral não contem em si todas as cautelas e providencias para deixar a uma livre e desaffrontada? Essa lei não será liberal bastante, não satisfará a todos os requisitos necessarios para se fazer uma eleição livre? Creio que sim. Bastava que o governo cumprisse o seu dever, que administrasse em vez de eleger. Mas o que fez o governo? Atropelou a lei para perseguir os eleitores e os elegiveis, fez guerra crua e acintosa aos homens eminentes deste paiz, empregou os meios mais abjectos para os afastar do parlamento, e, repito, derramou o sangue nas assembléas eleitoraes, nomeou, á ultima hora, regedores e cabos de policia, demittiu e transferiu empregados pela simples suspeita de que votariam no candidato da opposição! Um governo que procede assim tem auctoridade bastante e o prestigio necessario para fazer crer que deseja sinceramente a reforma da lei eleitoral, a fim de que a uma fique completamente desaffrontada? Isto não é senão lançar poeira aos olhos do povo. (Muitos apoiados.) Portanto, não se póde acreditar que o governo queira a reforma da lei eleitoral para nos dar uma lei que garanta a independencia e a liberdade do eleitor.

Os homens que dão amnistias para livrar dos tribunaes os criminosos e falsificadores, que depois empregam na fiscalisação do real de agua e n'outros logares, não têem auctoridade nenhuma para propor essa reforma.

Os criminosos e os falsificadores foram amnistiados pelo governo, e o sr. ministro da fazenda escolhe-os de preferencia para a fiscalisação do real de agua! Os precedentes e os predicados d'estes galopins eleitoraes são os mais adquados e dão as melhores garantias para o serviço ser bem feito. Não é verdade, sr. ministro da fazenda?

Aqui tem v. exa. como o sr. ministro da fazenda pretende resolver a questão financeira e cobrar impostos os mais odiosos. Em vista d'estes factos, que são verdadeiros, em vista d'estes acontecimentos, que não se podem contestar, quem acreditará que a fornada fosse motivada pela reforma