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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 67

recenseamentos, de fórma que com o elemento da auctoridade o governo nada tivesse a receiar do resultado.

O sr. Braamcamp, o presidente e chefe do partido progressista, era o cumplice d'esta artimanha eleitoral. S. exa. consentia que se preparassem recenseamentos para burlar os eleitores!

Para dar tempo a que elles se arranjassem não teve duvida de reconsiderar, e de faltar completamente ao compromisso tomado perante o parlamento.

Sr. presidente, desgraçado paiz em que os homens publicos, nas posições as mais elevadas, e que deviam ser os primeiros a dar o exemplo de moralidade, se soccorrem a estes tristes e deploraveis expedientes.

É necessario que o publico e o paiz conheçam estes factos para os condemnar é impedir que elles se repitam. Para a camara ver como o actual governo se preparava para as eleições, basta dizer-lhe que um dos novos pares da penultima fornada, representante de um circulo da capital, se conservara na outra camara até aos ultimos dias da sessão, vindo tomar assento n'esta, quando já não havia tempo para se declarar á vacatura ou se o havia a, camara dos senhores deputados não o quiz fazer!

E sabe v. exa. e a camara porque se fez tudo isto? Porque o recenseamento n'aquelle circulo apesar das falsificações ainda não dava vencimento ao governo, e portanto o meio de evitar pela capital a eleição de um deputado da opposição era este expediente baixo e indecoroso.

Sr. presidente, o que me admirava era que o nome honrado do sr. Braamcamp se prestasse a estas vergonhosas artimanhas.

A mim pesava-me ver a representação nacional incompleta, e com tão frivolas rasões o governo reconsiderar.; procurei pois obrigal-o a definir-se, e a tomar uma posição decidida; para esse fim interroguei de novo o sr. presidente do conselho, perguntei-lhe quando fazia tenção de mandar proceder á eleição, e pedi-lhe que declarasse positivamente, sem subterfugios nem evasivas, qual o dia destinado.

S. exa. respondeu com a maior precisão que mandaria proceder á eleição em julho, e que o decreto para esse fim já estava assignado. rosto que clara e categorica fosse a affirmativa do governo, o sr. presidente do conselho reconsiderou mais uma vez e as eleições não foram feitas senão em outubro. Que triste decepção! Lamento que o sr. Braamcamp não veja o alcance das suas reconsiderações.

Não sabe s. exa. que a palavra de um presidente de conselho de ministros, de um homem respeitavel e respeita do, que é chefe de um partido, deve ser um penhor serio e seguro de que o que esse homem prometteu ha de ser fielmente cumprido, salvo algum caso de força maior?

Explique-se, responda, sr. presidente do conselho, mostre e prove á camara que houve caso de força maior que o impediu de cumprir a sua palavra; a sua honra, a sua dignidade exigem que se faça luz e se esclareça completamente este facto.

Considero muito o caracter individual do sr. Anselmo Braamcamp, mas como ministro... como ministro. .. Confesso sinceramente que estou descoroçoado com tão repetidas e frequentes reconsiderações, incoherencias e expedientes pouco decorosos.

Quando um homem tão serio senão lembra do seu passado e esquece as suas tradições, para praticar tantas e tão graves faltas, é porque um motivo occulto, mais poderoso, que os seus bons desejos e que a sua vontade o domina; e eu que particularmente tanto respeito o sr. Anselmo Baamcamp, sinto que s. exa. senão se tenha libertado desse poder que o influenceia tão nefastamente e que o tem feito passar por tantas humilhações.

Sinto infinitamente que assim aconteça, porque tenho, repito, pelo caracter particular do sr. Braamcamp a maior veneração. Conhece-se perfeitamente que quando o sr. presidente do conselho se deixa arrastar pelos seus instinctos e convicções, procura ser fiel a seus precedentes, não polluir a sua historia, desempenhar-se da sua palavra e satisfazer aos seus compromissos. Conhece se que s. exa. deseja marchar pelo caminho direito, mas que ha uma força maior, irresistivel, que o obriga a desviar-se d'esse caminho.

Antes de passar a outros assumptos insistirei ainda por alguns momentos na nomeação de novos pares.

Quanto á modificação d'esta casa do parlamento, o governo explica esse seu acto e justifica o seu proceder na realidade de um modo admiravel, justifica-o com os precedentes! Quer dizer que o governo não tem idéas fixas, não tem principios definidos, não tem convicções proprias, nem doutrinas assentadas; os seus principios, o seu unico movel, o incentivo dos seus actos são unicamente os precedentes!

Se um governo praticou infracções de lei, este. ministerio julga-se auctorisado a praticar iguaes infracções, e entende que o precedente o justifica e colloca na esphera ilegal. Só houve um governo que decretou reformas detestaveis, do mesmo modo este ministerio se julga eximido de responsabilidade se decretar iguaes reformas. Se houve um governo que praticou actos de corrupção e de violencia, contrarios á moral e á justiça, este governo tambem julga-se logo auctorisado a praticar actos similhantes!

Não posso deixar de me revoltar e protestar contra similhante doutrina.

Os precedentes, sempre os. precedentes, eis a sua eterna e unica justificação!

Se fizemos mal, dizem, tambem os que nos .antecederam procederam do mesmo modo.

Isto será systema de governo? Significará alguma cousa, a não ser a ausencia completa de idéas e principios governativos?

Não significará tudo isto a decadencia moral dos representantes de um partido que rasgou o seu programma, que calcou as idéas substanciaes do seu credo politico e as substituiu no poder pela glorificação das contrarias, das que combateram quando estavam fóra d'aquellas cadeiras?

Ferve-me o sangue nas veias, e sinto refluir me ás faces, quando vejo os homens que accusavam os antecessores de immoraes desculparem-se agora com os precedentes, isto é, com os actos que condemnaram!

Aqui tem v. exa. o que se está passando. Aqui tem v. exa. a fórma por que os negocios politicos deste paiz estão desgraçadamente correndo.

Sr. presidente, peço a v. exa. e á camara desculpa do calor com que estou fallando.

Fallo com este calor, porque é isso- da minha organisação e da minha natureza. Não desejo offender ninguem, porque entendo que os homens publicos se devem respeitar mutuamente: condemno os factos; e se expresso assim as minhas opiniões é porque é esta a fórma por que o meu temperamento mo permitte fazer, e é esta a sua feição caracteristica.

Respeitando, muito, sr. presidente, os avisos de v. exa., não me referirei nunca ás discussões da outra casa do parlamento, mas direi simplesmente, e de passagem, que a representação nacional está dividida pelas duas casas do parlamento, e quando as eleições são feitas pela fórma por que o têem sido, as garantias todas estão n'esta casa, onde se encontram os homens mais eminentes de todos os partidos, homens encanecidos no serviço publico, que tão exuberantes provas têem dado do seu amor ás instituições e aos principios. Nas crises as mais difficeis, nas situações as mais embaraçosas, esta camara tem dado as mais altas demonstrações do seu bom senso. Mostrou-o na modificação que fez ao principio de hereditariedade, exigindo pela lei de 1845 um curso superior e rendimentos necessarios aos filhos dos pares para tomarem assento n'esta casa; mostrou-o quando dispensou algumas das suas prerogativas: por exemplo, dando licença para, que prosigam processos