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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO N.º 12

EM 23 DE JANEIRO DE 1907

Presidencia do Exmo. Sr. Conselheiro Sebastião Custodio de Sousa Telles

Secretarios - os Dignos Pares

Luiz de Mello Bandeira Coelho
José Vaz Correia Seabra de Lacerda

SUMMARIO. - Leitura e approvação da acta. - Expediente. - O Digno Par Teixeira de Sousa deseja explicações do Governo quanto á publicação de uma portaria, inserta no Diario do Governo de hoje, e que nomeia uma commissão encarregada de estudar o que diz respeito ao consumo de aguardentes e alcooes. - Em seguida S. Exa. occupa-se do caminho de ferro do Lobito e de factos que se relacionam com o desenvolvimento d'esse porto. - O Sr. Ministro da Marinha promette responder na sessão seguinte ás considerações do Digno Par Sr. Teixeira de Sousa, respeitantes ao porto do Lobito. - Quanto á portaria publicada no Diario do Governo, pode assegurar que esta em nada contende com o andamento do projecto que se destina a resolver a questão duriense.

Ordem do dia. - Continuação da discussão do parecer n.° 18, relativo ao projecto que reforma a lei da contabilidade publica. - Usa da palavra contra o projecto o Digno Par Sr. José de Alpoim. - O Sr. Presidente participa que o Sr. Ministro das Obras Publicas vem na proxima sessão responder aos reparos do Digno Par Sr. Teixeira de Sousa. - Responde ao Digno Par Sr. Alpoim, defendendo o projecto em ordem do dia, o Digno Par Sr. Mello e Sousa. - No final da sessão o Digno Par Sr. Alpoim advoga os dizeres de uma representação em que os empregados da Contabilidade pedem que não sejam isentos dos beneficios que gozam outros funccionarios do Estado. - O Sr. Presidente diz que a representação a que o Digno Par alludiu foi distribuida pelos Dignos Pares. - Encerra-se a sessão, e apraza-se a seguinte, bem como a respectiva ordem do dia.

Pelas 2 horas e 35 minutos da tarde, verificando-se a presença de 20 Dignos Pares, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Foi lida, e seguidamente approvada, a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se o seguinte expediente.

Dois officios do Ministerio da Fazenda, satisfazendo os pedidos de documentos feitos pelos Dignos Pares Sebastião Baracho e Francisco José Machado.

Á secretaria.

O Sr. Teixeira de Sousa: - Sr. Presidente: eu tinha ha dois dias pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Marinha, para me dirigir a S. Exa. sobre um assumpto que não vou discutir, nem combater, mas apenas sobre elle chamar a sua attenção.

O assumpto é colonial, e afigura-se-me de uma grande importancia.

Antes, Sr. Presidente, peço licença a V. Exa. para mostrar a minha maior surpresa por um diploma que vem hoje publicado no Diario do Governo, que eu não posso bem comprehender sem explicação que me seja dada por algum dos membros do Governo.

Sr. Presidente: para attender ás justas reclamações dos povos da região duriense, o Groverno actual apresentou á Camara dos Srs. Deputados uma proposta de lei regulando o assumpto.

Esse assumpto é muito vasto, muito complexo, muito difficil. Contende com varios interesses que mais de uma vez se teem afirmado antagonicos. Desejo saber a razão por que, tendo passado a sessão legislativa começada em outubro, e estando já no começo da outra, ainda essa proposta não foi votada na Camara dos Senhores Deputados.

Mais: Não se harmonizaram ainda os interesses do norte com os do sul.

O que é certo é que n'esse diploma trata-se da questão da exportação dos vinhos do Porto; trata-se da questão dos vinhos licorosos, e do " Porto"; o " Porto" até com premio estabelecido.

N'esse diploma trata-se da aguardente e do alcool industrial, mas por maneira que não deixa de pesar notavelmente sobre os interesses do Thesouro.

Sobre aguardentes estabelece-se a a maneira por que se ha de effectuar o regimen do fabrico do alcool.

Sr. Presidente: de tudo se trata n'esse projecto de lei: dos vinhos do Porto, dos vinhos do sul, dos licorosos, dos do pasto com premio e sem premio, da aguardente e do alcool.

Parece que n'esse diploma em discussão na Camara dos Deputados se compendia tudo quanto é attinente á discussão d'este assumpto; e assim os povos do Douro julgavam que esse projecto de lei tinha tudo quanto interessasse á questão; e os habitantes do sul tambem assim o entendiam.

Não passaram muitos dias sem que na Sociedade de Geographia se realizasse uma reunião de vinicultores do norte e do sul.

Sr. Presidente: é por isso que estranhei ver no Diario do Governo uma portaria nomeando uma commissão encarregada de estudar o que diz respeito ao commercio de aguardentes e alcool, para o Governo apreciar todos os alvitres d'essa commissão e todas as informações, para attender, tanto quanto possivel for, aos interesses respectivos.

Então o Governo entretem-nos a todos nós, no Parlamento e fora d'elle, os do norte e os do sul, com o que elle entende ser a solução da crise vinicola, e no meio da discussão nomeia uma commissão encarregada de estudar o regimen dos vinhos, dos alcooes e das aguardentes?

Sr. Presidente: eu não quero discu-

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tir o projecto que está pendente de solução na Camara dos Senhores Deputados, nem esta portaria, mas o que é absolutamente indispensavel é que o Governo dê explicações claras acêrca dos intuitos d'esta sua ultima providencia.

Que é que a commissão vae estudar? Continua a discussão do projecto que está pendente na Camara dos Senhores Deputados ou o Governo adia essa discussão?

Vae a commissão, nomeada agora, esclarecer qualquer ponto do projecto que se discute na outra Camara?

V. Exa. comprehende que, para completo socego de todos, urge que o Governo dê explicações claras a este respeito.

Eu desejo conversar com o Sr. Ministro da Marinha sobre varios assumptos de administração colonial. Hoje inicio a minha serie de considerações acêrca do caminho de ferro do Lobito.

Sr. Presidente: V. Exa. está informado de que esse caminho de ferro, esse extraordinario melhoramento material, essa obra colossal, através de toda a Africa, está a caminho de uma realização completa e rapida. Eu tenho n'isso uma grande satisfação, porque vejo desfeito tudo quanto se dizia, as asseverações que se faziam, que tal concessão era uma burla e que esse melhoramento, longe de transformar a provincia de Angola, era a ruina d'ella.

Vejo com legitimo orgulho desmentidas todas as accusações que injustamente me eram dirigidas.

Sr. Presidente: n'essa occasião, n'essa luta ferida contra quem a tudo se arriscava para com nobre isenção servir o seu paiz, n'essa occasião dizia-se que esse caminho de ferro podia ser construido a expensas do Thesouro e até havia quem sustentasse que a construcção por conta do Thesouro podia ir mais alem.

Eu não discuto nem aprecio esses alvitres, nem os motivos que tinha para não concordar com elles, mas os factos demonstram que nós não tinhamos, nem temos, recursos para um caminho de ferro de 1:500 kilometros de extensão, nem para fazer o essencial, o necessario, para que o paiz tire um resultado que é legitimo esperar.

Sr. Presidente: esse caminho de ferro, na extensão de 1:500 kilometros, vae ligar o porto de Lobito a jazigos minereos de Catenga, e está encaminhado para ligar o caminho de ferro do Cabo ao Cairo.

Segundo a opinião de todos os que conhecem as circumstancias do sul da Africa, este caminho de ferro está destinado a fazer do porto do Lobito o mais importante emporio, e esse convencimento não vem de um homem que tenha ligado a sua responsabilidade a essa concessão.

V. Exa., Sr. Presidente, sabe que durante muito tempo se levantaram difficuldades de toda a ordem a contrariarem a construcção d'este caminho de ferro.

Hoje, homens importantes n'essa companhia estão convencidos de que esses melhoramentos são de grande utilidade para a nossa Africa occidental.

Nenhuma duvida pode restar sobre as vantagens que ha para os interesses europeus em transformar-se o porto de Lobito no maior emporio commercial.

Sr. Presidente: esse caminho de ferro está destinado a fazer do Lobito o emporio commercial de toda a Africa; d'isso é que não ha duvida; é opinião de todos e do proprio Sr. Ministro da Marinha.

Sr. Presidente: começaram já ha mezes a affluir navios de mercadorias destinadas ao caminho de ferro do Lobito.

Pois n'esse porto, já tão importante, não ha um farol conveniente. Ha muitos mezes que navios que ahi chegam, de dia e de noite, pediram ao Governo um farol que os guie, mas apenas ahi existe uma lamparina inutil.

Em compensação, os Governos de Portugal não se esqueceram de pôr á companhia concessionaria toda a ordem de difficuldades.

Basta citar um facto para se fazer uma ideia do que avanço.

O representante do Governo n'esse ponto informou por telegramma o Governo que a companhia concessionaria estava desembarcando material de guerra para fortificar o porto.

Nada se fez até hoje, de que eu tenha conhecimento, a não ser o crear se uma fiscalização especial n'aquelle caminho de ferro, a qual custa 14 a 16 contos de réis cada anno.

Quando eu geri a pasta da Marinha e tive occasião de fazer esta concessão, entendi que aos Governos cabia o proceder por forma a acompanhar o rapido desenvolvimento da construcção d'aquelle caminho de ferro, que tinha para Portugal vantagens primaciaes, sendo a primeira a de trazer ao porto de Lobito o commercio mais importante da Africa central.

Entendi tambem que os Governos deviam acompanhar essa construcção, de forma que, quando o caminho de ferro chegasse ao planalto, este se encontrasse em condições proprias para a colonização pela raça branca e se pudesse proceder á edificação de uma grande cidade na restinga do Lobito, cujo porto deve offerecer então todas as facilidades de embarque e desembarque.

Deixei o decreto no Diario do Governo, traçando o plano para a colonia do planalto, e foi expedida uma portaria ao governador do districto de Benguella, que é hoje governador geral d'aquella provincia, para reunir os elementos indispensaveis ao estudo completo do assumpto, engenheiros, medicos, commerciantes, emfim tudo quanto podia dar alvitres e opiniões sobre o estabelecimento de uma grande cidade no referido territorio.

Até hoje, segundo as minhas informações, não ha nada, absolutamente nada feito a esse respeito.

Mas como é que ha de resultar para o paiz alguma vantagem da construcção d'aquelle caminho de ferro, cuja conveniencia todos reconhecem, se nada temos preparado para a colonização no planalto, e se não temos no porto do Lobito senão a ponte, onde só podem acostar os vapores destinados a serviço de carga e descarga de mercadorias?

A concessão do caminho de ferro de Lobito foi feita no fim de novembro de 1902, a um subdito britannico que se obrigou, para garantia do seu contrato, a deixar em deposito uma importancia em moeda portuguesa correspondente a 100:000 libras sterlinas. Era esta a garantia da realização e effectivação de um contrato, pelo qual se obrigava a construir um caminho de ferro de 1:5OO kilometros de extensão. Poucos dias depois entrou no Ministerio da Marinha o requerimento de um grupo de capitalistas, apresentado por um advogado muito conhecido em Lisboa, pedindo a concessão da restinga do Lobito para ahi se edificar uma grande cidade, obrigando se a um deposito enorme, como garantia do seu compromisso.

Tão grande é a importancia reconhecida á restinga do Lobito, tão grande é o valor que se attribue á construcção do caminho de ferro n'essa região, que havia um grupo de capitalistas que se propunha a gastar milhares e milhares de contos para edificar ahi uma grande cidade, com encargos e obrigações para o concessionario, e cuja seriedade era garantida com um deposito muito avultado.

Não venho fazer reparos ao facto d'esta proposta não ter sido acceita. Por muitos meses essa proposta esteve no Ministerio, antes de eu deixar a gerencia da pasta de que era Ministro.

Trago este facto para mostrar a importancia colonial que para nós representou a ligação dos terrenos que cercam a bahia do Lobito.

Quando se fez a concessão do caminho de ferro de Benguella, houve quem

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pretendesse demonstrar que tal concessão, que ao Thesouro não custava um real, e que dava até 10 por cento do capital empregado em acções, e para o Thesouro dava uma parte, importante nos lucos, era dada concomitantemente com o caminho de ferro.

Não tinha sido assim.

Não se tinha feito a concessão de um unico palmo de terra; a companhia tem unicamente o terreno para a linha ferrea e as edificações necessarias para esse caminho de ferro ser construido.

O Estado ficou com soberania completa e integra na provincia de Angola.

Nada se deu ao concessionario senão o sufficiente para lançar, uma ponte de carga e descarga destinada á construcção da linha.

A soberania de Portugal devia ficar affirmada n'uma grande cidade a construir no porto de Lobito, que tivesse todo o caracter de uma grande cidade portuguesa.

Desenvolvi nesse ponto a minha energia e tenacidade.

Mas o tempo passou. O caminho de ferro está continuando para a sua conclusão.

Ainda hontem fui informado de que no Ministerio entrou um estudo sobre este caminho de ferro, que vae até ao kilometro 700.

A companhia quer todas as facilidades para poder ligar rapidamente o extremo da provincia de Angola.

Tudo leva a suppor que muito brevemente a provincia de Angola, que fez a gloria de Serpa Pinto e outros exploradores, que a atravessaram em circumstancias difficeis e perigosas, que todos nós conhecemos, poderá ser atravessada, entrando-se num comboio no Lobito, e saindo na outra costa, na Beira.

Não accuso ninguem, mas pergunto se, nestas circumstancias, é justo que se não dê um passo no que diz respeito ao estabelecimento de um plano para nos lançarmos na posse franca do planalto.

Digam-me se é prudente, se é conveniente termos o porto do Lobito inteiramente sem nada, sem coisa alguma feita pelo Governo do meu paiz.

Sr. Presidente: a unica edificação que ali se encontra é uma barraca onde está installada uma delegação da alfandega, para cobrar os direitos aduaneiros.

Ninguem ignora as enormes difficuldades com que a companhia tem luctado.

Basta dizer o seguinte: Quando quiz construir a sua estação terminus, disseram-lhe: "Não pode ser aqui; n'este ponto os terrenos são de primeira ordem, e hão de ter um grande valor de futuro .

Sr. Presidente: eu n'esta questão não faço politica, porque não estou a fazer nenhuma accusação ao Sr. Ministro da Marinha.

Eu sei muito bem as difficuldades em que lucta a administração colonial.

E n'este ponto digo mais: o Sr. Ministro da Marinha merece louvor do paiz, pois que foi um dos poucos que souberam resistir a essa corrente que então se levantou, a proposito da construcção do caminho de ferro. Viu com intelligencia, e viu com saber.

E, Sr. Presidente, sem querer tomar para mim o papel de propheta, devo dizer a V. Exa. que alguns prejuizos se poderiam ter evitado, se alguma vez mais se dessem ouvidos aos meus conselhos.

V. Exa. deve lembrar-se de que, quando se discutiu o projecto de construcção de uma linha ferrea de Mossamedes a Chella, eu mostrei a inconveniencia que havia em ser ella construida n'aquellas condições.

N'essa occasião, poucos entendiam como eu, mas hoje já se volta ao systema que aconselhei, segundo dizem os jornaes de grande informação.

Dizia eu, não com a minha auctoridade, que era pequena, mas com a auctoridade de muitos que se occupam de caminhos de ferro coloniaes, que um caminho de ferro de sessenta centimetros, destinado a ligar Mossamedes com o planalto, era perfeitamente inutil, e que o dinheiro ali empregado era deitado á rua.

Ponho agora toda a sinceridade nas minhas palavras, como punha ha pouco quando falava do caminho de ferro do Lobito.

Estão construidos 50 ou 60 kilometros d'essa linha; o material de circulação lá está, por signal que não é de primeira qualidade, pois ha dois dias os jornaes diziam que o Sr. Ministro da Marinha ia mandar pôr via ferrea nova, substituindo a linha ferrea de 60 centimetros por via ferrea de 1 metro.

Se assim acontecer, e ha de acontecer necessariamente, é porque o Sr. Ministro da Marinha vê alguma conveniencia n'essa transformação, mas Deus sabe se aquelle caminho de ferro foi construido por forma que possa adaptar-se-lhe agora uma via de 1 metro, sem se ter de recorrer a novas obras.

N'estas cousas nunca se deve pôr uma nota politica, e eu não puz nunca, nem porei essa nota n'estes assumptos, e por isso é que me dirijo ao Sr. Ministro da Marinha, para que ponha toda a sua influencia, zelo e devotada attenção para o que se dá com relação a este caminho de ferro.

(O Digno Par não reviu).

O Sr. Presidente: - É a hora de se passar á ordem do dia, não posso dar agora a palavra ao Sr. Ministro da Marinha.

O Sr. Ministro da Marinha (Ayres de Ornellas): - V. Exa. reserva-me então a palavra para a proximo sessão, pois V. Exa. comprehende que não é em poucos momentos que eu posso responder ás considerações que o Digno Par fez.

Tratando se de um assumpto que ingressa ao paiz, é o meu dever expressar a minha opinião, o que não é possivel em breves instantes.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Teixeira de Sousa: - Mas eu desejava ao menos que o Governo me desse a explicação que lhe pedi acêrca da portaria a respeito da commissão encarregada de estudar a questão dos alcooes.

É um assumpto urgente, que está pendente da outra Camara, e em poucas palavras o Governo me pode dar essa elucidação.

O Sr. Ministro da Marinha (Ayres de Ornellas): - Com respeito á portaria a minha opinião é que não contende com o projecto em discussão.

É uma portaria que se destina simplesmente a nomear uma commissão encarregada de estudar o regimen das aguardentes, mas não vae modificar o projecto em discussão na outra Camara.

É o que posso dizer n'este momento a S. Exa. sobre este assumpto: em todo o caso communicarei ao Sr. Ministro das Obras Publicas as observações de V. Exa., e elle, comparecendo n'esta Camara n'uma das proximas sessões, dar-lhe-ha explicações mais minuciosas, visto que é pela sua pasta que corre este assumpto.

(S. Exa. não reviu).

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do parecer n.° 18, relativo ao projecto de lei que tem por fim estabelecer as bases para a reforma da contabilidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para continuar o seu discurso o Sr. Alpoim.

O Sr. José de Alpoim: - Sr. Presidente: antes de entrar na serie de considerações attinentes a combater o projecto que está em debate, permitta-me V. Exa. que eu lamente profundamente que o nobre Ministro da Marinha não pudesse dar ao Sr. Conselheiro Teixeira de Sousa, nosso digno collega, senão a resposta curta e in-

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coherente que a Camara acaba de ouvir.

A verdade em toda a sua nitidez, mesmo para os que não conhecem o assumpto de que se trata, é que na Camara dos Senhores Deputados se está tratando ou discutindo um projecto com que se modifica o regimen das aguardentes e não ha duvida que faz parte integrante d'esse regimen a criação de umas instituições especiaes a elle referentes...

O Sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - E até expropriações.

O Orador: - Não se comprehende como estando uma lei em discussão no Parlamento, para reforma que seja definitiva ou tenha pretenções de o ser, se venha hoje n'uma portaria no Diario do Governo dizer ao paiz que essa reforma não está bem estudada e é indispensavel que sobre ella uma commissão exerça e faça quaesquer modificações.

V. Exa. vê o que ha de incoherente e contrario em todos os projectos do Governo.

Tudo isto é consequencia d'aquella precipitação febril, a que já me tenho referido, que faz que o Governo não tenha ideias assentes acêrca dos problemas da vida nacional.

O facto na sua singeleza é este: na Camara dos Srs. Deputados está era discussão um projecto referente aos vinhos, aos alcooes, ás aguardentes, projecto que, segundo dizem, concilia os interesses do norte e do sul; e depois d'este projecto estar em discussão o Governo vem dizer que não tem uma ideia fixa, e nomeia uma commissão para estudar o assumpto de que trata o projecto.

Eu digo a V. Exa. que se tivesse voz na Camara dos Srs. Deputados proporia que se interrompesse a discussão, porque não ha mais profundo contra-senso do que estabelecer um regimem definitivo, e a seguir, dizer que elle não é definitivo, porque se estuda outro.

Sr. Presidente: este assumpto é gravissimo, porque diz respeito a altos interesses do paiz. Sabe-se que hoje duas partes do paiz estão em conflicto uma com a outra e que as providencias tomadas com relação ao Douro não satisfazem. N'estas condições, publica-se no Diario do Governo uma portaria de que a Camara tem conhecimento. É, portanto, urgente que o Sr. Ministro das Obras Publicas aqui venha dar explicações e eu peço a V. Exa. o favor de o convidar a vir aqui ainda hoje, ou na proximo sessão, afim de responder ás perguntas formuladas pelo Digno Par, o Sr. Teixeira de Sousa. V. Exa. comprehende que este assumpto é tão
importante que o Ministro respectivo deve vir immediatamente á Camara, não podendo allegar a conveniencia de responder no dia seguinte, porque é urgente, está em discussão na Camara dos Srs. Deputados e deve estar, como diz o povo, na ponta da lingua do Sr. Ministro das Obras Publicas.

Repito, Sr. Presidente, peço a V. Exa. o favor de convidar o Sr. Ministro das Obras Publicas a vir ainda hoje a esta Camara, ou, sendo-lhe inteiramente im-possivel, na proximo sessão, na qual o Digno Par, o Sr. Teixeira de Sousa renovará as perguntas de hoje, as quaes não tiveram resposta alguma por parte do Governo.

Posto isto, vou tratar propriamente do assumpto para que pedi a palavra, proseguindo nas considerações feitas ante-hontem n'esta casa do Parlamento.

Expuz então qual fôra a genese da lei que se discute e mostrei que a sua gestação explicava o tumulto de incoherencias e deficiencias, a precipitação febril de innovações trazidas do estrangeiro.

Expuz o que havia de injusto em attribuir-se a erros e vicios de fiscalização, por parte de qualquer entidade ou collectividade, o que era consequencia inevitavel dos atropelos constitucionaes, dos attentados parlamentares praticados n'este paiz e que tornavam impossivel, impraticavel, a fiscalização das Côrtes, elemento essencial do nosso systema de contabilidade publica.

O Parlamento, como em 1895, por culpa do Sr. Ministro do Reino e como n'outros annos só funccionou por prazos curtos e por tal maneira irregularmente que bastava lembrar o facto, que entre nós se dá de em 1907 estarmo-nos administrando pelo orçamento de 1904-1905!

Sr. Presidente: as instituições importadas do estrangeiro mostram que aquillo que se trouxe de Inglaterra se não pode accomodar á feição do nosso paiz, significando assim o modo de ser constitucional d'aquelle povo, onde o poder legislativo se impõe, o que mostra a fundo a differença que ha entre a administração da Gran Bretanha e a nossa.

Disse eu que este projecto tinha sido trazido á Camara por uma forma irregular e contraria á maneira de ver é de proceder do fallecido e chorado Conselheiro Barros Gomes, a cuja memoria e serviços o partido progressista muito deve e eu a esse homem me refiro com grande encarecimento, sob todos os pontos de vista.

Agora vou cumprir o meu dever, que é mostrar á Camara que não falseei a verdade, e que a minha franca e firme exposição de hontem não havia sido feita jamais se não envolvesse um arduo plano de modificações á maneira precipitada e violenta como se apresentava este projecto.

O Governo apresentou ás Camaras, com data de 3 de outubro, a sua proposta de lei. É precedida de um brevissimo relatorio, indicando-se summarissimamente as modificações da lei antiga, sem elementos de estudo e de informação. É um documento baço, anodyno. Em todos os paizes, estas reformas são filhas de uma evolução lenta, estudadas com o maior vagar, não só porque a organização da contabilidade é um assumpto delicadissimo e attinente aos mais graves problemas financeiros e até politicos, mas ainda porque esbarra, a todos os momentos, com as questões constitucionaes - com o pacto constitucional de um paiz.

Tem sido citado na Camara, por oradores que defendem e atacam o projecto, o notavel livro de Besson, A fiscalização dos orçamentos em França e no estrangeiro. Elle mostra ahi como se procedeu em França quando, em 1900, o Ministro da Fazenda d'aquelle paiz quiz reformar o systema de contabilidade. Nomeou-se uma commissão especial, de que o Sr. Besson foi o relator geral. Essa commissão estudou as questões financeiras e constitucionaes ligadas á organização da fiscalização do orçamento; analysou as legislações especiaes da Belgica, da Inglaterra, da Italia: achou que, nas suas linhas fundamentaes, não convinham á estructura financeira e politica da França; e, subordinando a theoria á pratica, conservou-se no terreno da regulamentação existente. E comtudo a França é um paiz de rapidas e apaixonadas iniciativas! Se fosse a Inglaterra, tão tradicionalista e ponderada, não surprehendia; mas na propria França, o paiz dos rapidos commettimentos, ha todos os melindres em reformar ligeiramente a contabilidade publica. E, sobretudo, em introduzir na Constituição innovações estrangeiras.

Diz Besson que, com essas instituições estrangeiras, succede como com as flores tropicaes, tão maravilhosas no seu paiz de origem e que, transportadas para sob outros céus não tardam a estiolar e morrer. Pois nós, de um salto, importamos de Inglaterra innovações, esquecendo-nos que o nosso systema politico, o nosso modo de ver parlamentar, differem tanto d'esse paiz como o ceu azul de Lisboa e as claras aguas do nosso Tejo differem das brumas de Londres e dos enxurdeiros do Tamisa. O que n'esse maravilhoso paiz, tão forte de tradição e tão simples e austero de administração, é bom, pode ser aqui prejudicial. E é o, como o pro-varei; essas innovações foram estragadas na sua essencia, abastardadas e corrompidas na sua transplantação, e

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ficaram hostis á Constituição do nosso Estado. A reforma foi feita precipitadamente e - oh! triste signal dos tempos! - em contrario a usos e tradições do nosso paiz, conformes ás suas leis ou, pelo menos, com ellas intimamente ligadas. (.Apoiados).

Em 1879, o Sr. Barros Gomes quiz fazer a reforma da nossa contabilidade. Como é que procedeu esse grande e claro espirito, cujo fulgor enche de luz e gloria o partido progressista e aquece de doce saudade o nosso coração? Encontrando no artigo 19.° do regimento do Tribunal de Contas de 21 de agosto de 1878 a attribuição, imposta a esse tribunal, de dar, como corpo consultivo, parecer sobre todos os negocios em que o Governo lh'o pedisse ou o tribunal lh'o entenda dever dar, expediu-lhe a portaria de 8 de agosto de 1879, mandando que o tribunal consultasse com o seu parecer sobre a reforma da contabilidade publica "a fim de ser tomado em consideração para a elaboração da referida proposta". N'essa portaria accentuava-se o plano do Governo, pois indicavam-se as bases principaes, fundamentaes, d'essa reforma.

Em officio da mesma data, longo e luminosissimo documento que faz a honra de um homem publico, o Sr. Barros Gomes expunha e desenvolvia largamente essas bases e sobre ellas fazia largas considerações, até de origem historica, que eram como complemento da materia expendida na referida portaria. Decorridos dois meses, a 21 de outubro de 1879, foi enviada pelo Supremo Tribunal de Contas uma consulta assignada por membros seus, que se chamavam Rodrigues Sampaio, Serpa Pimentel, Barjona de Freitas e pelo insigne escriptor, distinctissimo funccionario, honra e lustre d'esta casa, o Digno Par Henrique da Gama Barros. É um documento, essa consulta, verdadeiramente notavel na doutrina e na forma. Foi em face d'esse trabalho que se organizou a proposta de lei, conformando-se o Ministro com a indicação do tribunal, excepto n'um ponto, como elle indica no relatorio das suas propostas de Fazenda apresentadas ao Parlamento. Que differença dos tempos de então e de hoje! Dos tempos... e dos homens - repito-o mais uma vez.

O Sr. Ministro da Fazenda tinha obrigação de proceder igualmente para habilitar o Parlamento com os elementos de estudo e de informações indispensaveis. Cabia-lhe até, perante a lei, esse dever.

O regulamento actual do Tribunal de Contas exara doutrina igual á do regulamento de 21 de agosto de 1878.

Assim o § 15.° do artigo 25.° diz que compete ao tribunal "tomar conhecimento dos assumptos sobre que for consultado pelo Governo, e dar a respeito d'elles o seu parecer". O Governo não ouviu, como é consoante a tradição e até os preceitos deduzidos da lei, esse tribunal. (Apoiados).

Mas ha peor: o artigo 315.° do regulamento de contabilidade publica fixou, em conformidade com o disposto na carta de lei de 25 de junho de 1881, que criou uma commissão permanente de contabilidade publica, as attribuições d'essa commissão. Entre outras attribuições ha a de "indicar as medidas de caracter legislativo que convenha serem adoptadas". É o § 3.° do artigo 315.°.

Ouviu o Governo essa commissão ou ouviu outras quaesquer que acaso os seus predecessores nomeassem?

Tencionando apresentar medidas de caracter legislativo, consultou-as?

Não. Não ouviu o Tribunal de Contas, não ouviu a commissão permanente, desattendendo assim duas estações officiaes, não interpretando as intenções da lei, nem se cingindo áquelle grande exemplo do passado - de tempos que eram ainda de escrupulosos respeitos constitucionaes e de uma generosa e desafogada politica, com partidos de programmas definidos, com homens publicos para quem o Parlamento era uma alta e nobre assembleia nacional. (Apoiados).

O Governo correu atrás de preconcebidas más vontades, poz de lado instituições que anathematizou instinctivamente, apresentou no Parlamento uma proposta de lei desacompanhada de todos os elementos de estudo, não fornecendo aos representantes da nação indicações officiaes, não habilitando para uma solução meditada e séria nem o seu espirito nem a sua consciencia. E, assim, a proposta nasceu inçada de offensas á Constituição do Estado; e em todo o seu decurso, desde a apresentação na Camara dos Deputados até agora, o pensamento do Governo não se define, é tremulo e incerto, vogando entre ideias oppostas, entre incoherencias e deficiencias. (Apoiados).

Hei de tratar das questões constitucionaes, algumas já abordadas por collegas meus e tendo ficado sem resposta, outras ainda não esboçadas ou apenas rapidamente desenhadas. Mas, antes, para se ver a lufa-lufa hysterica da proposta, tome-se um punhado das suas disposições. Ao acaso quasi! Procurarei somente aquellas que julgo ainda não haverem sido aqui, n'esta Camara, apresentadas.

Por exemplo:

Compare-se o artigo 34.° da proposta ministerial com o artigo 3.° da proposta saida da commissão de fazenda, e ainda tambem com o artigo 3.° da proposta que subiu á Camara dos Pares.

Aquelle artigo 34.° - já isto é um symptoma frisante - é o que passou a ser o artigo 3.°

Como se sabe, é fundamental em contabilidade a organização das contas por gerencias ou por exercidos.

A resolução do Governo, expressa no artigo 34.°, era que caducam todas as despesas que porventura não cheguem a ser ordenadas no anno economico.

Repare a Camara:

Anno economico, que é o da gerencia, começando, segundo a proposta, no dia 1 de julho e acabando a 30 de junho - e repare que a referencia é ás despesas ordenadas.

Pois n'esse assumpto, que devia ser ideia precisa e assente do Governo, apparece a commissão de fazenda a transformar radicalmente o que devia ser uma base fundamental, estendendo, no artigo 3.°, o prazo para a caducidade das auctorizações a mais trinta dias depois do encerramento do anno economico - isto é, alterando uma condição especial, basilar, da proposta.

Mas não fica ahi:

Na camara dos Deputados fez-se uma alteração ainda: não caducam as despesas não ordenadas, mas sim as despesas não liquidadas.

E o que diz o artigo 3.° da proposta saida da Camara dos Deputados.

Não ha uma prova mais frisante da inconsistencia da ideia governamental!

Ordenação e liquidação são duas cousas diversas: o prolongamento da gerencia por trinta dias é, em verdade, o restabelecimento de um exercido de um mez.

É curioso o que acontece com as penalidades, semeadas pela proposta com uma abundancia que ás vezes parece estar-se legislando para uma copia selecta de faccinorosos. Constitue mesmo essa abundancia e rigor de penas um dos titulos de gloria do Governo n'esta proposta: farta se por isso. A todos os instantes, suspensão, demissão, pena de peculato, pena de concussão - morra por ello! como diziam os nossos maiores. O Sr. Conselheiro Moraes Carvalho já se referiu ao que havia de estranho no artigo 6.° § unico, em que se applica a pena de seis meses de suspensão e de demissão, no caso de reincidencia, á infracção de se não enviarem as contas de gerencia, no prazo de quatro mezes, para o Diario do Governo, não se sabendo, pela proposta, quem sejam os responsaveis por se não indicar a quem cabe a remessa d'essas contas. O Digno Par Moraes Carvalho já tirou as deducções d'esta doutrina, que dá origem ás mais estranhas consequencias. Mas, mal ou bem, habil ou inhabilmente applicada, ha uma sancção.

Ha a tambem para as infracções consignadas no artigo 7.° a respeito da

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remessa de tabella e notas a que se refere o artigo 6.° da lei de 25 de junho de 1881 e a respeito de outros documentos. É tambem a sancção de seis mezes de suspensão, e, no caso de reincidencia, demissão.

Que sancção ha porem se, como manda o artigo 8.° da proposta de lei, a Direcção Geral de Contabilidade Publica não enviar para o Diario do Governo as contas provisorias da receita e despesa do Estado? O § unico diz que "não poderá sob qualquer pretexto deixar de se fazer a publicação mensal, a que se refere este artigo". Mais nada. Uma sancção platonica!

Pelos artigos 15.° e 16.° são tomadas providencias importantes. A Direcção Geral da Thesouraria "deverá publicar no Diario do Governo, até o fim do mez, a nota do estado da divida fluctuante". Que sancção é imposta a esta determinação, valiosa porque se refere á publicidade da divida publica? Nenhuma!

Pelo artigo 16.° "fica expressamente prohibida a venda de titulos na posse da Fazenda". E se essa venda se fizer? Qual é, tambem, a sancção d'esta disposição? Vê-se que, para assegurar a celeridade e publicidade das contas, se applicam em alguns casos penas graves: e, em outros casos importantissimos attinentes a essa publicidade e celeridade, assim como em outras circumstancias graves, não ha penalidade alguma! Effeitos e contradições que se explicam pela tumultuaria precipitação, sem norte e sem plano, da proposta governamental.

Outro caso ainda: o artigo 25.° designa a sancção para as concessões e contratos celebrados terem na minuta o visto e o registo do Tribunal de Contas. Tem a pena de nullidade. Mas essa pena não se estabelece para os contratos a que se refere o artigo 2 isto é, para quando os encargos d'esses contratos não tenham cabimento. Esse artigo fica sem sancção! Porquê, esta differença? (Apoiados).

Ha ainda, um facto curioso e demonstrativo d'essa precipitação. Com um ar soberano de incorruptivel moralidade diz a proposta no artigo 20.° "As sommas votadas para qualquer despesa publica não podem ter applicação diversa". Pois é a repetição quasi pelas mesmas palavras, do artigo 12.° do Acto Addicional á Carta. No seu § 1.° diz: "As sommas votadas para qualquer despesa publica não podem ser applicadas para outros fins senão por uma lei especial, que auctorize a tranferencia". Que significa a repetição, n'uma lei de caracter financeiro, de uma disposição comparada na lei fundamental do Estado? E que significa repeti-la quando, no parecer da commissão de fazenda da Camara dos Deputados, se diz que no projecto de lei se introduziram somente preceitos que representam innovação?

Que resposta foi dada n'esta Camara, para mostrar que não são anti-constitucionaes algumas das suas disposições? Nenhuma!

Ficaram sem replica nesse ponto concreto os bellos discursos dos Dignos Pares Moraes de Carvalho e Teixeira de Sousa, e ainda as observações tão nitidas e frisantes do Digno Par Campos Henriques.

É necessario insistir n'este ponto para mostrar o que ha de inexactidão nas affirmações repetidas de respeito á lei, ao Parlamento. (Apoiados).

O artigo 12.° diz que "as despesas certas com o vencimento do pessoal, segundo os quadros dos diversos serviços publicos, quando uma vez sejam incluidos no orçamento approvada, não ficam sujeitos a nova votação e discussão parlamentar".

É uma offensa aos direitos do Parlamento consignados na Constituição do Estado.

Argumentaram, e muito bem, os oradores precedentes que o artigo 144.° da Carta Constitucional diz ser "constitucional o que diz respeito aos limites e attribuições dos poderes politicos".

Acrescenta que a tudo o que não é constitucional pode ser alterado pelas legislaturas ordinarias".

Logo, portanto, o que for constitucional não pode ser alterado por essas legislaturas.

Os poderes politicos são quatro, segundo o artigo 11.° da Carta e um d'elles é o poder legislativo, o qual compete ás Côrtes, segundo e artigo 13.° da referida Carta.

Da attribuição das Côrtes é, segundo o artigo 15.° §§ 6.°, 3.° e 14.°, "fazer leis, suspendê-las e revogá-las; fixar annualmente as despesas publicas; criar ou supprimir empregos publicos e estabelecer-lhes ordenados".

Portanto, o direito de fazer como lhe apraza o orçamento, que é uma lei; de fixar as despesas com os empregados publicos annualmente, de criar ou supprimir esses empregos em qualquer situação ou periodo parlamentar, não pode ser contestado ao Parlamento, porque é constitucional, é um direito e uma attribuição do poder legislativo.

Sendo-o, não pode ser alterado por uma legislatura ordinaria como a actual:

Como é, pois, que o Governo insere semelhante disposição?

Boa? Má? Que importa isso? É nulla: é de nenhum effeito; fere a Constituição; não ha dever de a acatar. E má; mas excellente que fosse, de nada serviria! (Apoiados).

Que responderam a este argumento os illustres oradores do Governo? Nada.

Ou pouco menos que nada. Argumentou-se com o artigo 63.º do regulamento do Tribunal de Contas, que prohibe incluir no orçamento do Estado toda e qualquer alteração no quadro, e vencimentos dos empregados publicos. O Sr. Ministro da Fazenda e o Sr. Sebastião Telles invocaram esse argumento. Mas não se lembraram de que essa disposição é feita somente para o Governo, feita para o executivo, feita para quem constroe, organiza, elabora a proposta do orçamento - que ha de ser apresentado ás Côrtes e servir de informação, de bases para a sua apreciação das receitas e despesas do Estado.

Todos os defensores da proposta governamental se refugiaram, com maior ou menor largueza, no argumento de que em Inglaterra se procede assim para com algumas despesas, taes como lista civil, pensões, divida publica, despesas parlamentares, etc. É isso o que se chama o fundo consolidado. Esqueceram-se, porem, de que n'aquelle paiz esse fundo abrange as chamadas despesas constitucionaes, as despesas de soberania, taes como as caracteriza Nitti no seu tratado. Esqueceram-se de que a criação d'esse fundo consolidado representa uma tradição, que remonta até o reinado de Guilherme III, no seculo XVII e que nasceu da necessidade de restringir os direitos da Corôa, fixando-lhe a sua dotação. Esqueceram se de que em volta d'essa despesa se agremiaram outras, a que foi affectado, consagrado um certo numero de rendimentos permanentes, sobre os quaes tambem não ha discussão por serem fixos e cujo excesso sobre as despesas inalteraveis é applicado ás outras despesas geraes e variaveis do Estado: Esqueceram tudo isto, que vem tão luminosamente exposto em Boucard e José, Marcé, Besson e outros escriptores que aqui foram citados pelos oradores precedentes e que eu consultei.

O fundo consolidado do orçamento inglez é uma cousa absolutamente diversa. E n'elle não se contém o quadro dos empregados publicos: por elle não se subtraem á discussão e votação do Parlamento os quadros da burocracia. Pelo contrario!

No seu livro classico O Governo e o Parlamento Britannico, diz Franqueville "que os estimates conteem a indicação das menores despesas com o funccionalismo". O orçamento contém não só o numero dos empregados e a remuneração de cada um d'elles, mas até as mais esmeuçadas informações: que um porteiro tem casa, gaz e carvão; que um servente recebe uma gratificação por trazer o lunch aos empregados; que outro servente recebe 3 libras por espanar os livros da Thesou-
raria; que uma mulher recebe 5 libras

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por anno por fazer serviço na galeria dos Senhores Deputados.

Não é curioso?

O exemplo da Inglaterra não pode ser invocado quanto ao funccionalismo. É absolutamente contraproducente. Em nenhum paiz encontra disposição igual á que se vae adoptar. Mas se houvesse? Seria inutil, porque em outra occasião o Parlamento alteraria essas despesas. Se não é no orçamento, é por leis es-peciaes. A disposição actual é contra a Constituição do Estado, um Governo liberal e legalista não pode, não deve praticar semelhante attentado.

E com o artigo 13.°? Prohibe elle que os Deputados e Pares possam, na discussão do orçamento, apresentar quaesquer propostas que envolvam augmento de despesa. É igualmente anti-constitucional. Prova-o a comparação dos mesmos artigos. Pelo § 8.° do artigo 15.° cumpre ao Parlamento fixar as despesas publicas, não podendo coarctar-se esse direito nem a maneira e occasião de o exercer. Argumenta-se com paizes estrangeiros, invocando-se o testemunho da Inglaterra e da França. Mas no proprio parecer está a condemnação da doutrina. São disposições regimentaes das Camaras d'aquelles paizes: isto é, disposições do seu regimento, disposições tomadas, como policia interna por assim dizer, por essas Camaras. Essas disposições divergem dos dois paizes. Na sua obra fundamental, Stourm publica os Standing Orders de 1706 e 1886 fixando a doutrina de que a Camara não acceitava proposta augmentando a despesa ou cerceando a receita. É, como se vê, uma tradição historica, sempre muito dominadora em Inglaterra: é uma consequencia, como explana Marcê, da sua modalidade constitucional, da alliança intima entre o Governo e o Parlamento. Mas os Standing Orders, alguns annos antes da guerra africana, desde 1894 e 1895, deixaram de produzir o effeito antigo. Diz Stourm que os regulamentos não existem senão sobre o papel. Este escriptor, como Nitti e outros, refere-se ás lamentações de estadistas inglezes sobre o augmento de despesa devido á iniciativa parlamentar: o Digno Par Moraes Carvalho expoz aqui, no seu eruditissimo discurso, as varias maneiras engenhosas, referidas por alguns escriptores financeiros, por que em Inglaterra se illudem, nos ultimos tempos, os Standing Orders Não os mencionarei por isso.

Em França levantou-se a mesma questão que hoje aqui se agita. Varios Deputados propuzeram a restricção da iniciativa parlamentar. Ergueu-se a difficuldade constitucional. A Constituição consagra a iniciativa dos Deputados sem limite: uma lei ordinaria não a pode restringir. Argumentava-se, tal qual como aqui, que a iniciativa não excluia a regulamentação, e que a iniciativa ficava de pé, subsistindo em toda a outra materia que não fosse o orçamento. Pois venceram os bons principios, porque a França é um paiz democratico e liberal, perfeitamente respeitador da Constituição. A Camara dos Deputados limitou, ella propria, a sua iniciativa, acrescentando ao artigo 51.° do seu regimento a declaração de que nenhuma proposta de augmento de despesa pode ser apresentada no orçamento, senão no prazo de tres dias depois da distribuição do relatorio em que figura o capitulo visado.

Como se vê, esta limitação é incomparavelmente mais reduzida do que as Standing Orders. Estabelece o prazo de tres dias, na propria discussão do orçamento: apenas prohibe absolutamente, no art. 5l.° bis, para augmentos e criação de ordenados, empregos e pensões. É uma limitação muito menor que a da lei proposta e que se discute agora. E a proposito pergunto eu: se a Camara tem faculdades, n'uma lei ordinaria, para prohibir a apresentação de propostas para augmento de despesas, porque não leva a sua doutrina a prohibir propostas para o corte ou diminuição de receitas? Isto é que seria o logico, isto é que seria correcto em quem invocou o exemplo da Inglaterra.

O Sr. Conselheiro Jacinto Candido poz em relevo o que havia de hypocrita e falso n'uma disposição que parece lançar aos membros do Parlamento o augmento das despesas publicas quando toda a gente sabe que pertence unica e exclusivamente aos Ministros. A elles, e mais ninguem. É um mau proceder a suspeita que este artigo envolve. Porem, justa ou injusta esta disposição, ficará sem effeitos praticos, sem sanccão, porque em nada obriga o Parlamento como anti-constitucinal que é. Se o não fosse, e se eu pudesse estatuir sobre o caso, quereria que as propostas de augmento de despesa fossem apresentadas só na discussão e votação do orçamento. Só então é que se poderia ver que repercussão, que reflexo, teriam na nossa vida financeira. Creio que muitas propostas tidas como uteis seriam postas de lado, se, ao discutir se o orçamento, se visse nitida e frisantemente a sua nefasta influencia orçamental.

Vou entrar n'um ponto melindrosissimo, porque representa a inversão de todos os preceitos constitucionaes e fere as noções do bom-senso pratico. Refiro-me á organização da commissão parlamentar de contas publicas. Essa commissão é criada no artigo 39.° e seus paragraphos. Compõe-se de 11 membros. São 6 Pares do Reino e 5 Deputados. Basta dizer isto!

A Camara dos Pares, assembleia de eleição regia, prevalece sobre a dos Deputados, assembleia de eleição popular. E prevalece exactamente na fiscaliza-ção do orçamento, quando a iniciativa orçamental pertence em todos os paizes constitucionaes á Camara dos Deputados, assim como a ella pertence a correlativa fiscalização!

Veio esta innovação da Inglaterra. Pois ahi, ao abrir-se o Parlamento, o Chefe do Estado, dirigindo se aos representantes da nação, lords e deputados, diz milords e meus senhores; mas, quando se refere aos subsidios para as despesas do Estado, apenas se dirige aos Deputados, aos communs, empregando só as palavras meus senhores, para significar o predominio do povo sobre as classes privilegiadas e para significar que só o povo, só quem paga o imposto, é que tem direito de o conceder. Como é que um Governo, que se diz liberal, pode offender assim os bons principios, dando á Camara dos Pares uma preferencia sobre a dos Deputados e em questão financeira, em questão fundamental? O Governo foi procurar esta instituição da commissão de contas á Inglaterra, mas adulterou a, porque n'esse paiz, n'essa commissão entram unicamente Deputados e é de uso fazer-se representar a minoria, mas não se estabelece o preceito, até impraticavel, alem de contrario ao principio das maiorias, que é caracteristico do systema parlamentar.

Mas, no nosso paiz, não ha nada mais nitidamente contrario á Constituição do Estado. Vejamos. Ha, com respeito a exame e inquerito exercido pelas duas casas do Parlamento, attribuições communs: e ha, por seu turno, attribuicões exclusivas de cada uma das Camaras. Por exemplo: o artigo 139.° da Carta diz que as Côrtes Geraes, no principio das suas sessões, examinarão se a Constituição politica do reino tem sido exactamente observada para prover como for justo.

Vê-se que ambas as Camaras teem iguaes faculdades de exame: e vê-se que ambas ellas podem exercer o direito com respeito á observação da Constituição do Estado, de nomear commissoes de inquerito, conforme o preceituado no artigo 14.° do Primeiro Acto Addicional á Carta, o qual diz que cada uma das Camaras das Côrtes tem o direito de, proceder, por meio de commissoes de inquerito, ao exame de qualquer objecto da sua competencia.

É da competencia de ambas, e ambas, portanto, podem nomear commissoes, o exame da observancia da Constituição. Mas ha assumptos privativos da Camara dos Deputados, como são os impostos e os recrutamentos, segundo o artigo 30.° da Carta - artigo que é completado pelo 36.°, o qual

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diz: " Tambem principiará na Camara dos Deputados, § 1.°, o exame da administração passada e reforma dos abusos n'ella introduzidos".

Reparou bem a Camara? Tambem principiará o exame da administração passada... O exame portanto da maneira como o orçamento, base fundamental da administração publica, se cumpriu, pertence á Camara dos Deputados: ou melhor, o inicio d'esse exame, o seu principio, só a ella pertence. Consoante o artigo 14.° que per-mitte as commissões de inquerito, só a Camara dos Deputados pode nomear, por ser somente objecto da sua competencia, commissões de inquerito para aquelle determinado fim. Portanto, a Camara dos Deputados, e só ella, pode nomear a commissão com os poderes de inquerito e investigação, consignados no § 3.° do artigo 39.° da proposta de lei em discussão. O que o Governo propõe é uma commissão mista da Camara de Pares e da Camara de Deputados, e com predominio d'aquella sobre esta: é a inversão de todos os principios e uma offensa á Constituição do Estado. Esta só admitte commissões mistas nos termos do artigo 5.° da lei de 3 de abril de 1896.

O Sr. Conselheiro Jacinto Candido, no seu brilhante e habilissimo discurso, poz em relevo o que havia de estranho em se dizer que os Pares e Deputados seriam escolhidos nas minorias. Insurgia-se, pelo menos com respeito á Camara Alta, contra semelhante terminologia, destoante das tradições e do genio intimo d'essa casa. E, realmente, que são essas instituições maioria e minoria, onde a ellas sequer se referem as nossas leis, que papel teem na Constituição do Estado? E, admittindo que se lhes dê personalidade legal, quaes são as minorias? Minorias, traz a ideia de partidos organizados. E os Pares e Deputados que a esses partidos não pertençam, e que por isso talvez melhor representem o paiz, estão inhibidos de fazer parte d'essa commissão? E, havendo varias minorias, como escolher os representantes, se ha só tres membros em cada numero dos escolhidos pelos Presidentes das Camaras?

Ha ainda um ponto curioso que não foi referido até agora e que mostra a leviandade com que se organizou esta proposta. O artigo 39.° diz que essa commissão será constituida no começo de legislatura, sendo portanto a sua nomeação um dos primeiros actos do Presidente.

Que actos parlamentares se praticaram no começo para definir maiorias e minorias?

Que votações houve?

Não se pode levar mais longe o desrespeito pelo Parlamento e até pelo bom senso!

Quiz-se transportar de Inglaterra uma instituição que n'ella floresce, mas ali é uma commissão somente da Camara dos Communs, como não podia deixar de ser no paiz mais liberal do mundo, e que ali tem uma missão muito mais alta do que a proposta no nosso paiz. Aqui é apenas uma commissão de inquerito e investigação; em Inglaterra é menos uma commissão de fiscalização do que a organizadora permanente do verdadeiro Codigo da Contabilidade Ingleza. Como diz Stourm, os seus relatorios dão, sobre cada ponto importante ou litigioso, a solução que para o futuro deve formar jurisprudencia para as administrações. Esses relatorios não teem, por voto do Parlamento, sancção official; mas são grandes lições de contabilidade e administração.

Como se vê, é profunda a differença entre o que se vae fazer no nosso paiz e o que se pratica na Inglaterra.

Estragou-se uma instituição d'ali transplantada.

Mas se pudesse ainda dar quaesquer resultados, essa instituição tal como está, esses resultados seriam paralysados pelo proprio funccionamento do nosso systema parlamentar. Essa instituição presuppõe um funccionamento legal, honrado, com Côrtes funccionando normalmente, em prazos determinados.

Que garantias ha de que isto aconteça, quando se vêem claros symptomas de renascimento do poder pessoal?

a ainda um ponto a considerar.

O Digno Par Sr. Mello e Sousa, no seu discurso, verdadeiramente á altura da sua reputação, mostrou inclinar-se para a doutrina de que a commissão parlamentar de contas devia ser composta somente de Deputados. E disse que, se tal proposta ou emenca fosse feita, era natural que o Governo, querendo collaborar com o Parlamento, a acceitasse.

O Digno Par Sr. Mello e Sousa ignora por certo o que se passou na outra Camara, aliás não faria tal asserção. Ali o talentoso Deputado o Sr. Dr. Antonio Centeno mandou para a mesa uma proposta, assignada tambem pelos Srs. Dr. João Pinto dos Santos e Moreira de Almeida, para a criação de uma commissão de contas.

Um simples additamento ao regimento, uma simples disposição regimental bastaria para tal fim.

Outro assumpto. Tratemos do visto. Succede com elle o facto estranho de uns oradores o encarecerem como sendo uma funcção essencial da fiscalização e outros o amesquinham como cousa somenos. Julgava eu, e toda a Camara, que a entrega do visto a uma unica entidade era uma grande conquista que o Governo se arrogava. O Sr. Espregueira vem dizer que não. Pois a proposta do Governo julgou-o tão importante que lhe attribue a poderosa faculdade de garantir a rigorosa execução do orçamento. São as textuaes palavras. Parece até que a reforma foi feita só para arrancar ao Tribunal de Contas o visto e entregá-lo a um funccionario unico. E o Sr. Mello e Sousa encareceu este facto por maneira que contrasta com o superior desdem que o Sr. Espregueira lhe consagra.

Eu sou partidario da fiscalização preventiva. Mais completa seria a fiscalização se pudesse fazer-se, como na Inglaterra, á criação das despesas - ali tão severamente exercida por essa entidade impessoal chamada a Thesouraria e a que tão largamente se referiu o Sr. Moraes de Carvalho. Mas a fiscalização preventiva tem dado excellentes resultados, na Belgica e na Italia, conferida a um Tribunal de Contas. Na Italia este exerce funcções até politicas, constitucionaes: e a sua fiscalização financeira, em determinadas hypotheses orçamentaes, não admitte que o Ministro da Fazenda use da faculdade de manter a ordem con riserva, á semelhança do que se ordena no artigo 32.° e seus paragraphos da actual proposta de lei - e que ha de ser um dos meios de entre nós se illudir a fiscalização. Tem havido desfallecimentos no funccionamento d'estes tribunaes? Qual é a instituição que os não soffre? Nenhuma!

A quem deve ser confiada a fiscalização do orçamento? A um corpo collectivo como o Tribunal de Contas? A uma entidade só como o fiscal geral, na Inglaterra? Não é occasião de aqui o discutir. Ambas as entidades teem dado excellentes resultados: o fiscal geral na Inglaterra e o Tribunal de Contas n'outros paizes. Porque não deu esta corporação do Tribunal de Contas os mesmos resultados no nosso paiz? Em ambas as casas do Parlamento se tem asseverado, e ainda aqui o fez o Sr. Conselheiro Jacinto Candido, que o Tribunal de Contas não exerceu melhor a sua funcção por culpa dos Governos.

Eu não tenho elementos para julgar: por isso, quereria que o Tribunal de Contas houvesse sido consultado e expuzesse as suas razões. Diz-se que a responsabilidade individual é preferivel ás responsabilidades collectivas. Mas não se pode estabelecer essa responsabilidade desde o momento que, pelo regimento de 30 de abril de 1899, na parte relativa ao funccionamento do Tribunal de Contas, como tribunal fiscal, se diz no artigo 15.° que o serviço será feito ás semanas por todos os vogaes effectivos e supplementares?

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Não ha assim uma responsabilidade individual? E, se lhe falta sancção, não podia fixar-se n'um outro regulamento? Far-se-hia assim uma obra simples de evolução e não haveria a necessidade de augmentar a despesa e de criar uma entidade contraria ás regras adoptadas em todos os paizes - a absoluta independencia, da administração, da entidade individual ou collectiva encarregada da fiscalização preventiva. N'esse ponto ha um absoluto accordo em todos os tratadistas. Na Belgica zela-se tanto essa independencia que os membros do Tribunal de Contas são nomeados pelas Camaras, renovados de seis em seis annos, e não podem ser parentes nem affins, até o quarto grau, de qualquer Ministro ou chefe da administração.

Na propria Inglaterra, julga-se que o fiscal geral não é bastante independente por ser nomeado pelo Governo, comquanto só possa ser demittido pela Camara dos Communs, e por ter á sua ordem duzentos empregados, que com o seu assistente e com elle constituem o Audit Office, e cuja nomeação é da thesouraria.

Emfim, admitta-se ou não a preferencia da fiscalização exercida por um empregado unico, o que não pode é admittir-se que elle seja um funccionario dependente. E o director geral da contabilidade é-o: se exerce as funcções do visto e n'estas tem garantias de independencia, exerce junto do Ministro outras funcções n'aquella qualidade, como mostrou o Sr. Teixeira de Sousa, que o collocam n'uma dependencia e subordinação accentuada. A absoluta independencia, ou tribunal ou entidade individual, é absolutamente necessaria.

Foi o exemplo da Inglaterra que influiu no animo do Governo. Por certo. Mas adulterou a feição, porque lhe cerceou o caracter de independencia que tem na Gran-Bretanha. E n'este mesmo paiz se teem accentuado censuras contra a entrega a uma só entidade das funcções de fiscalização previa. Encontra-se n'um artigo de Victor Marcé, na Révue Politique et Parlamentaire, de 1900, sobre a fiscalização do orçamento do Estado em Inglaterra, um resumo dos ataques parlamentares feitos em Inglaterra no Parlamento, e reclamando a substituição do Controller General por um tribunal.

Em resumo, não julgo bastante demonstrado, por falta de esclarecimentos e averiguações, que o Tribunal de Contas não pudesse cumprir a funcção do visto. Parece-me que, com esse tribunal, se podiam accentuar responsabilidades individuaes, aperfeiçoando o regulamento. Entendo que a entrega do visto a um funccionario de administração, com outras funcções que d'ella o tornam dependente, é um principio absolutamente opposto, como em todos os paises se julga, ás normas severas de uma boa fiscalização. Só conheço um paiz onde o director geral da contabilidade seja ao mesmo tempo fiscal supremo das finanças. É a Russia. Não parece, depois dos desastres burocraticos revelados pela ultima guerra, e demonstrativos de uma pessima fiscalização dos dinheiros publicos, que seja uma nação a imitar!

Já vae longo o meu discurso e, por isso, não me deterei em outros pontos do projecto, tanto mais quanto já foram tratados pelos meus antecessores. Quereria referir-me ainda ao facto estranho de o Governo prolongar, por um mez, o periodo da chamada gerencia. É a substituição d'este processo de organizar contas pelo systema de exercicio, com todos os inconvenientes d'este. A primitiva ideia do Governo era-me mais sympathica. Sou partidario da gerencia, que o Sr. Teixeira de Sousa chamou contas de caixa, em contraposição a exercicio, que chamou contas moraes. Ha quem attribua mais rigor scientitico ao exercicio, mas, sendo o systema das gerencias exercido sincera e honestamente, esse argumento desap-parece, porque se pode fazer a comparação das gerencias, como se faz a dos exercicios. As vantagens da gerencia proveem da maior rapidez na producção das contas, o que permitte organizar-se o orçamento com previsões e avaliações mais recentes, e ao Parlamento exercer a sua fiscalização n'uma epoca proximo dos factos realizados.

Na Inglaterra, na Italia, nos Estados Unidos applica-se o systema da gerencia. As contas encerram-se definitivamente no prazo de um anno. Para compensar o que n'isto haja de violento, organizou a Inglaterra a conta especial de Paymaster General, aberta no fim do anno financeiro, com as auctorizações do fiscal geral e thesouraria. O Paymaster recebe uma somma de 50 a 55 milhões de francos, que, durante tres mezes, pode ser applicada, depois do encerramento da gerencia, a despesas ordenadas antes do encerramento do anno economico.

A conta do Thesouro, diz Stourm, é fechada irrevogavelmente na data de 31 de março, mas deixa-se ao Paymaster, ao activo da conta particular que lhe é aberta, um fundo sufficiente para liquidar o atrasado. Podia entre nós, por um processo identico, dependente de uma convenção com o Banco de Portugal, organizar se serviço semelhante. O que não pode nem deve é usar-se o systema de um verdadeiro exercicio de treze mezes, denominado inexactamente gerencia.

Tambem desejaria muito fazer considerações sobre os creditos extraordinarios, e varios pontos do projecto.

Não me demoro, porque não seria ouvido. N'esta altura da discussão seria preciso possuir, como hontem disse, as palavras douradas de que o poeta Moschetti, segundo referiram o Sr. Moraes Carvalho e Mello e Sousa, usou para cantar as bellezas do Quaderno, ou seja o orçamento. Julgo que nem com essas strophes prenderia a attenção da Camara! Ha um ponto, porem, em que ainda quero tocar. Refiro-me ao artigo 48.° da proposta que permitte abrir creditos, necessarios para a liquidação das contas constantes d'esse artigo, a da gerencia do anno economico de 1906-1907 e a dos exercicios findos até 31 de dezembro de 1906. Quer dizer: fica o Governo auctorizado a legalizar todo o passado, todos os erros e abusos, sem vir dar conta ao Parlamento! Pode isto ser? Que diz o Sr. Ministro da Fazenda? É proprio de um Governo liberal e de moralidade trium-phante?

Em meu nome e dos meus amigos, manifesto-me contra a proposta. Contra, porque não se procedeu legalmente e regularmente á elaboração d'essa proposta, desacompanhada de todos os elementos de informação. Contra, pelos attentados constitucionaes que ella encerra. Contra, pela má organização do visto, pelas disposições relativas á gerencia. Contra, emfim, porque a proposta não dá todas as condições positivas e serias de realizar a indispensavel fiscalização da maneira como se executa o orçamento.

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. foi cumprimentado por varios Dignos Pares}.

O Sr. Presidente: - Cumpre-me participar ao Digno Par Sr. Teixeira de Sousa que o Sr. Ministro das Obras Publicas não pode comparecer á sessão de hoje, mas espera poder aqui vir na proximo sessão, antes da ordem do dia.

O Sr. Mello e Sousa (relator): - Antes de entrar no assumpto da ordem do dia e de responder á bella oração que acaba de pronunciar o Digno Par Sr. José Maria de Alpoim, referir-se-ha á commissão nomeada para estudar e apreciar a orientação a seguir com respeito aos alcooes e ás aguardentes. Permitte se dar explicações a este respeito, porque o Digno Par Sr. Teixeira de Sousa classificou esse assumpto de urgente, e porque elle, orador, está indicado para fazer parte d'essa commissão.

Durante o tempo em que o Governo esteve estudando o projecto que está em discussão na Camara dos Senhores Deputados, foram-lhe dirigidas varias

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reclamações dos agricultores e, entre ellas, uma acêrca do regimen da aguardente e dos alcooes, para os quaes se pedia a régie.

N'essa occasião, o Governo respondeu aos agricultores que esse assumpto não estava estudado nem por parte do Governo, nem mesmo por parte dos reclamantes, que concordaram em que fosse nomeada uma commissão para estudar se haverá ou não vantagem em alterar o regimen das aguardentes e dos alcooes, no sentido das reclamações apresentadas.

Como muito bem disse o Sr. Ministro da Marinha, isso em nada contende com o projecto em discussão na outra Camara.

Dada esta explicação, que melhor será exposta pelo Sr. Ministro das Obras Publicas, ao entrar no assumpto em ordem do dia, para não causar a Camara, passará a referir-se, embora muito rapidamente, aos pontos principaes tratados pelo Digno Par Sr. José Maria de Alpoim relativamente ao projecto em discussão, a muitos dos quaes já, todavia, teve occasião de se referir.

Um dos ataques do Digno Par ao projecto provém do Governo não ter consultado o Tribunal de Contas, nem ter ouvido o seu parecer.

Disse S. Exa. que essa consulta está preceituada na lei e é tradição e procedimento do partido progressista, com quem o partido regenerador-liberal está ligado.

Não conhece o orador disposição legal alguma que obrigasse o Governo a consultar o Tribunal de Contas acêrca do projecto, nem lhe parece que essa consulta esteja nas tradições do partido progressista.

Em 1897, foi pelo Sr. Ressano Garcia, então Ministro da Fazenda, apresentada á Camara uma proposta de lei alterando as funcções do Tribunal de Contas. Pode o orador assegurar que, n'essa occasião, o partido progressista não se manteve em tal tradição.

Quanto ao visto previo, deve dizer-lhe que é certo ser tirado ao Tribunal de Contas, mas fica a fiscalização posterior, bem mais importante. (Apoiados).

Assim, de forma alguma se quer insinuar que o Tribunal de Contas não satisfaz, tanto mais que se deixa na sua alçada essa importante attribuição. (Apoiados).

O Digno Par Sr. Jacinto Candido é que declarou que, apesar de não ter havido taes referencias, queria mostrar á Camara como no Tribunal de Contas era feito o serviço do visto.

S. Exa. disse então que era membro do Tribunal de Contas, embora pouco activo no serviço do visto, mas, como o assumpto se estava discutindo na Camara, tinha lá ido, dizendo: " Eu quero saber o que é isto do visto".

Foi então que S. Exa. soube o que era o visto e como elle se fazia.

O Sr. Telles de Vasconcellos: - Pede licença ao Digno Par para lhe dizer que o serviço do visto, no Tribunal de Contas, é feito pontual e regularmente por um dos seus membros, que semanalmente é d'isso encarregado, referendando as ordens que lhe são enviadas da respectiva repartição.

O Digno Par Sr. Jacinto Candido, tendo estado algumas vezes ausente do Tribunal de Contas, não pôde ser tão activo no serviço do visto, mas tem sido applicado por todos os membros do tribunal, e sempre com a maior regularidade pelo vogal que está de semana.

O Orador: - Agradece a explicação do Digno Par.

Não se permittiria censurar nunca o Digno Par Jacinto Candido, tanto mais na sua ausencia.

Pareceu-lhe que S. Exa. pelas palavras que pronunciou, só ha pouco tinha tido conhecimento do que era o visto, e até ficara surprehendido pela forma brilhante como eram feitos os mappas e livros respectivos.

O que é verdade é que as ordens de pagamento são referendadas por um vogal do Tribunal de Contas depois de examinadas por uma repartição.

N'esta questão todos os tratadistas entendem que a responsabilidade da fiscalização se deve retirar a todos para a dar por completo ao Ministro da Fazenda.

Entre nós não se estabelece isso por causa dos sagrados e immortaes principios que não permittem que o Ministro da Fazenda, que tem de arranjar dinheiro para tudo, tenha preponderancia sobre os seus collegas. (Apoiados).

Disse o Digno Par Sr. Alpoim que, tendo nós copiado da Inglaterra o logar de fiscal geral, o fizemos de maneira que parece ter-se imitado a Russia.

O orador applaudir-se-hia se entre nós se criasse um fiscal geral como o da Russia, porque ali esse funccionario tem uma alta preponderancia e goza de todas as vantagens inherentes ao cargo dos Ministros.

O Sr. Conde de Lagoaça: - Mas não lhe tem dado bons resultados.

O Orador: - Aponte o Digno Par um facto que o prove.

O Sr. Conde de Lagoaça: - Pelo menos houve quem referisse que o dinheiro destinado a armamento e munições de guerra, em vez de ter essa applicação, fôra desviado para outros fins. A existencia do fiscal geral das finanças, pelo menos, não evitou estes abusos. ..

O Orador: - A asserção do Digno Par não é justificada, pois que o fiscal geral nenhuma responsabilidade pode ter nesses casos, que essa entidade não podia evitar; e refere como a Russia se manteve sempre em condições unicas quer na guerra, quer na paz.

Não está provado que na Russia a fiscalização das contas publicas não seja feita na devida ordem.

O Sr. Conde de Lagoaça: - Não percebe o enthusiasmo do Sr. Mello e Sousa pelo absolutismo da Russia. S. Exa. é contrario aos nossos immortaes principios.

O Orador: - Desde que tudo se expurgasse de maneira a que não fossem dados logares a quem não tem competencia para os exercer, nem posto a fiscalizar quem não tem força moral para exercer fiscalização, não se importava que fossem postos de parte os immortaes principios. Até mesmo o paiz applaudiria que elles fossem sacrificados. (Apoiados).

A propria França democratica tende a criar um fiscal geral, como tem a Russia, e que, sob o ponto de vista da fiscalização das contas publicas, que nada tem com a guerra, lhe tem dado os melhores resultados.

A Inglaterra e a Italia não teem neste ponto melhor fiscalização que a Russia. Poderá haver abusos na Russia, mas na Inglaterra, em questão de applicação dos dinheiros publicos, encontram-se tambem muitas irregularidades.

O Sr. Teixeira de Sousa: - Que se corrigem só com votos de censura.

O Orador: - Está o Digno Par enganado.

Ainda não ha muito tempo um Ministro foi ali obrigado a repor uma quantia que tinha mandado dar a um funccionario com o ordenado, porque esse funccionario não tinha direito a receber tal quantia.

Uma das censuras do Digno Par Sr. Alpoim, ao projecto, foi pelo numero de artigos que elle encerra.

A esse reparo poderá o orador responder com as considerações apresentadas pelo Digno Par Sr. Jacinto Candido, que atacou o projecto sustentando que era necessario fazer a codificação completa das disposições acêrca da contabilidade publica.

É opinião dos jurisconsultos que se devem retirar das leis novas os artigos que já estejam em leis anteriores, por-

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SESSÃO N.º 12 DE 23 DE JANEIRO DE 1907 115

que, segundo elles dizem, isso torna as leis mais perfeitas.

O Sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - Peço licença ao Digno Par para lhe observar que n'esse caso está muito imperfeita a proposta relativa á lei de imprensa, introduzindo disposições novas, juntamente com disposições antigas...

O Orador: - Não é jurisconsulto. A opinião que expoz é a que tem ouvido aos jurisconsultos, porque n'esse ponto não perdoaria a si proprio se porventura se arrogasse o direito de emittir opinião.

Disse o Digno Par Sr. Alpoim que o projecto atacava os preceitos constitu-cionaes.

O Sr. José de Alpoim: - Desejava que o Digno Par lhe dissesse se é inexacto o que a esse respeito affirmou, porque em sua consciencia não comprehende que não sejam inconstitucionaes as disposições dos artigos 12.° e 13.°

O Orador: - O Digno Par Sr. Jacinto Candido não ligou importancia a isso, porque se ao Parlamento se tira a faculdade de tratar, por occasião da discussão do orçamento, de alterar os quadros fica-lhe o direito de se occupar d'esse assumpto em qualquer outra occasião.

Com respeito á commissão de contas é certo que ella deveria ser constituida só com membros da camara dos Senhores Deputados, mas se isso se dispusesse no projecto, um dos ataques seria pela falta de consideração pela Camara dos Pares.

O Sr. José de Alpoim: - A Camara dos Pares não podia julgar-se desconsiderada uma vez que o assumpto não é da sua competencia.

O Orador: - Está de accordo em que se fizesse isso.

O Sr. Presidente: - Informa o Digno Parede que faltam cinco minutos para dar a hora de encerrar a sessão e um Digno Par pediu a palavra para antes do encerramento.

O Orador: - Não deseja ficar com a palavra reservada, por isso vae terminar.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador: - O facto de se dispor que a commissão seja tambem composta de membros d'esta Camara não tem outra explicação senão a consideração do Governo pela Camara dos Pares.

Por ultimo, a proposito da campanha contra o auditor fiscal geral em Inglaterra, diz que ella é feita por aquelles que, em nome dos principios liberaes, combatem a fiscalização dos dinheiros publicos, porque apenas defendem os principios da liberalidade...

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(S. Exa. foi muito cumprimentado por varios Dignos Pares).

(O Digno Par não reviu este extracto, nem as notas tachygraphicas).

Consultada a Camara sobre se permittia que o Digno Par Sr. José de Alpoim usasse da palavra antes de encerrar-se a sessão, resolveu affirmativamente.

O Sr. José de Alpoim: - Antes de V. Exa. abrir a sessão, fui procurado por algumas pessoas que se interessam em que seja attendida uma representação dos empregados da contabilidade publica, que reclamam contra algumas disposições do regulamento em projecto.

No meu discurso esqueci-me de fazer referencia a essa representação, com os fundamentos da qual estou inteiramente de acordo.

De facto, não é justo que estes empregados fiquem privados de beneficios que se concedem a outros funccionarios.

Assim o entendo, e assim o entenderá a Camara, estou bem convencido.

O Sr. Presidente: - Essa representação já está na mesa e até foi distribuida pelos Dignos Pares.

O Orador: - Eu não mando para a mesa nenhuma representação; apenas quiz n'esta casa do Parlamento juntar a minha voz á d'esses empregados reclamantes.

O Sr. Presidente: - A ordem do dia para sexta-feira 25 do corrente é a continuação da de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 5 horas e meia da tarde.

Dignos Pares presentes na sessão de 23 de janeiro de 1906

Exmos. Srs.: Sebastião Custodio de Sousa Telles; Marquezes: de Avila e de Bolama, de Sousa Holstein; Condes: de Arnoso, do Cartaxo, de Figueiró, de Lagoaça, de Paraty, de Tarouca, Moraes Carvalho, Alexandre Cabral, Pereira de Miranda, Santos Viegas, Teixeira de Sousa, Telles de Vasconcellos, Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Ayres de Ornellas, Vellez Caldeira, Serpa Pimentel, Ernesto Hintze Ribeiro, Veiga Beirão, Dias Costa, Ferreira do Amaral, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Baptista de Andrade, D. João de Alarcão, Gusmão, Mello e Sousa, José de Azevedo, José Luiz Freire, José de Alpoim, José Vaz de Lacerda, Julio de Vilhena, Luciano Monteiro, Pessoa de Amorim, Poças Falcão, Bandeira Coelho.

O Redactor,

ALBERTO BRAMÃO.

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