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têem assento n'esta camara, mas nunca senti um orgulho tal como hoje, depois das palavras d'aquelle caracter tão probo, tão honesto e tão digno! Pareceu-me estar vendo um caracter tão virtuoso como o daquelle (fallo de Bordalou) que subindo: ao púlpito, rasgou o proprio livro que tinha sido condemnado em Roma apesar do convencimento de que n'elle se continham verdades incontestaveis! Era condemnado em Roma, tanto bastava para elle, digno ecclesiastico, condemnar a sua propria obra humilhando se ao principio da auctoridade. O sr. visconde de Sá saíu do ministerio por motivos que nós ainda ignorámos "apresentando se apparentemente o da reforma do exercito. Chegando aqui, depois de se lhe terem feito elogios n'esta camara, tão merecidos e tão devidos, diz: «Eu venho manifestar ao publico o accordo e harmonia em que estou com aquelles que eram meus collegas. A opinião que eu tinha quando me sentava nos bancos do ministerio é a mesma que hoje tenho.

Venho hoje aqui lembrar á camara que, quaesquer manifestações da sua benevolencia para comigo, não podem pôr de parte a estima devida aos que foram meus collegas, nem ter acção sobre mim!

Nilo renego a minha obra, mas declaro que ella tem defeitos, e que eu preferi saír do ministerio a que os meus collegas se achassem a braços com a responsabilidade proveniente de actos do que eu só quero a mesma responsabilidade. Mas por isso, esta questão não ficou em melhores circumstancias para o ministerio.

Esperava eu que o judicioso requerimento do digno par, o sr. Xavier da Silva, tivesse andamento; esperava que a discussão se encerrasse, nem se tinha apresentado aqui a idéa de que o sr. ministro da marinha havia de tomar parte na discussão, e quando ouvi tomar a palavra o sr. ministro da marinha, julguei que s. ex.ª ía lembrar á camara uma praxe parlamentar; isto é, que as interpellações deviam ser annunciadas antes de verificadas, e que alem d'isso, esta interpellação parecia mais proprio ser feita ao sr. presidente do conselho, actual ministro do reino, do que ao sr. ministro da marinha. Julguei que s. ex.ª queria invocar esta praxe parlamentar, e vinha dizer que o governo senão achava em circumstancias de responder immediatamente. E na verdade, se a interpellação tivesse seguido os tramites estabelecidos, era isso muito mais conveniente, porque todas as vezes que nós sustentarmos as boas praticas fazemos com isso tornar as nossas resoluções mais bem pensadas; damos assim maior prova de seriedade, e por consequencia muito maior jus ao beneplácito da opinião publica. O sr. ministro da marinha tinha feito grande serviço se tivesse invocado esta praxe parlamentar; não foi porém assim, antes pelo contrario, s. ex.ª entrou em discussão e estabeleceu principios. Esta é que é a verdadeira causa que me obrigou a pedir a palavra, e aproveitar a occasião para apresentar a este respeito a minha opinião.

Disse o sr. ministro da marinha: « Não se declare constitucional aquillo que o não é, porque isso tem muitos perigos, querendo assim dizer que a solidariedade não é constitucional.» Para isto trouxe a auctoridade do decano dos publicistas. Senão é o primeiro que tratou aquella questão, pelo menos foi o primeiro que a tratou com alguma latitude.

Não tratarei de analysar as doutrinas de Benjamim Constant, em que s. ex.ª estará mais versado do que eu, mas não posso consentir que se diga que esta questão não é d'aquellas que têem um caracter verdadeiramente constitucional.

Sr. presidente, já se póde conseguir uma lei de responsabilidade ministerial — eu quasi que podia deixar de tratar esta questão, por isso que os dignos pares, os srs. Seabra e Rebello da Silva a trataram tão claramente que eu pouco ou nada posso acrescentar. Mas não é para illustração da camara, mas para confirmação dos meus principios, para satisfação da minha consciencia, separando-me dos maus principios apresentados pelo sr. ministro da marinha. Assim como não é constitucional tudo o que a carta em si contém, tambem são constitucionaes muitas determinações que n'ella não vem. São responsaveis os ministros pela falta de cumprimento da lei, existe uma lei que determina que resoluções da natureza d'aquella que estamos tratando só possam ser tomadas em conselho de ministros. Os srs. ministros declarando que não tinham conhecimento do regulamento apresentado pelo seu collega, em virtude de uma delegação do poder legislativo, infringiram a lei que os manda ser solidarios, por isso que os manda tratar estas questões em conselho de ministros.

Sr. presidente, tambem não será constitucional a responsabilidade dos ministros? Diga-me V. ex.ª, já se póde conseguir em algum paiz uma lei de responsabilidade ministerial? Não. Pois se não ha essa responsabilidade effectiva, e com estes capciosos subterfúgios nos vierem tirar a garantia da responsabilidade moral, o que fica de verdade no systema representativo? Não podemos deixar de concordar com os oradores que fallaram antes de mim em que o governo procura eximir-se á responsabilidade, quando apresentando-se um dos ministros da corôa declara: «Eu era responsavel por este acto, saí do gabinete, os meus collegas não ficaram com responsabilidade alguma». E nobre para o ministro, mas não é decoroso para o ministerio. Então onde havemos de ir buscar a responsabilidade do governo, quando em cumprimento da lei fez um regulamento, ou quando deixando de cumprir a lei (o que não é menos grave), não cumpriu a auctorisação que as côrtes lhe deram, e que com tanta instancia foi solicitada?

Ponhamos a questão nos verdadeiros termos. Se a medida tomada em virtude da auctorisação dada ao governo fosse combatida em ambas as casas do parlamento, diríamos: «o governo andou bem, e andou bem porque a maioria obrigou-o a reconstruir-se»; porém todos sabem que o negocio não foi ainda tratado, e por isso podemos crer que tudo quanto na outra camara se passou a tal respeito, só poderia dar mais força ao governo para o tratar, por isso que via que a maioria, ali tomava Um caracter de opinião, em relação ao voto o da maioria dos membros do conselho de ministros.

Sr. presidente, a resposta ao discurso do throno era a occasião propria de analysar o que o governo havia feito com aquella auctorisação. A resposta podia ter uma emenda n'aquella parte, mas só depois de ter sido discutida na outra camara, só depois dos membros da camara electiva dizerem: «nós não podemos adoptar esta reforma, não estamos contentes com ella», é que tinha logar o saírem o sr. visconde de Sá e aquelles cavalheiros que se julgassem mais responsaveis por aquelle facto (apoiados). O que me parece, sr. presidente, é que nós andámos em busca da responsabilidade moral e não a encontrámos, ou procurámos alcança-la, e ella foge sempre diante de nós. E preciso que se note, que eu apresento unicamente a minha opinião sobre a materia, e não quero com isto dizer que desejaria saíssem todos os membros do gabinete em consequencia d'esta questão; o que eu queria era que o governo dissesse se tinha força para manter aquella proposta, e se esperando as decisões do parlamento, se conformava com ellas; desejava que me dissesse quaes foram as rasões por que o governo abandonou ou engeitou a sua medida tão querida (é tão querida que foi mencionada na resposta ao discurso do throno) ainda antes d'ella entrar em discussão.

Sr. presidente, com que fim deu o parlamento esta auctorisação? Foi com o fim de dar mais força á medida, e de desembaraçar o governo das difficuldades de uma discussão longa. '

Mas eu desejava saber qual ha de ser o governo n'estas circumstancias que ha de tornar a apresentar-se no parlamento a pedir lhe uma auctorisação d'esta ordem?

Sr. presidente, se aquella lei fosse annullada, mas viesse outra para a substituir, então poderiam dizer os srs. ministros que saíram: «Nós retiramo-nos porque não estamos de accordo com esse projecto que apresentastes.» Mas se isto se podesse fazer já estava feito, já na falla do throno diriam: «Não podemos adoptar o projecto que os nossos collegas apresentaram, mas aqui vos damos outro para o substituir».

Mas, sr. presidente, é preciso que fallemos com toda a franqueza; as cousas são o que podem ser, e nós estamos a tratar esta questão fóra do campo em que ella devia ser tratada. A questão devia ser discutida na outra camara depois da recomposição ministerial; não o foi, e por isso nós não fazemos mais do que perder tempo com a exposição | dos nossos principios, por isso que não tiramos resultado algum d'esta discussão.

Sr. presidente, o que é necessario confessar é que n'este paiz não ha força para organisar governos que possam caminhar desafogadamente a um certo e determinado fim, e não ha partido algum politico que seja capaz de arranjar governos d'este modo. Ha confiança de todos os partidos em certos homens, ha confiança do paiz em certos caracteres que estão acima de toda e qualquer discussão. Um d'esses caracteres é o sr. duque de Loulé, e é por esta rasão que as cousas se organisam como se podem organisar sem de maneira alguma se alterarem os principios.

Sr. presidente, nós estamos a olhar só para os interesses materiaes, e isso não póde fazer caminhar o governo a um certo e determinado fim. Nós estamos, como eu disse na sessão passada, a presidir a uma passagem politica difficil; estamos com os olhos abertos para os interesses materiaes, e não fazemos caso algum dos interesses moraes e politicos. O paiz está assim, e os paizes governam-se segundo o estado moral em que está a sociedade. E por isso que o despotismo é a civilisação das sociedades nascentes, segue-se depois governos absolutos, e só no completo estado de maduração civilisadora é que se alcançam os governos liberaes, apresentando por muito tempo, antes de se solidificarem, estas e outras decepções. Eu desejava pois ouvir as explicações do sr. ministro da marinha a este respeito. O meu fraco apoio n'esta questão e em todas as outras hei de dá-lo, não só a este governo, mas a qualquer outro, quando eu veja que o fim que tem em vista é um fim determinado.

Terminando estas poucas considerações, peço desculpa á camara de a ter intertido por mais tempo do que desejava.

O sr. Rebello da Silva: — Parece-me que estamos todos concordes em que o sentido das explicações do sr. visconde de Sá foi que as bases da organisação do exercito tinham sido apresentadas ao conselho de ministros, e que só os detalhes é que não haviam sido examinados por constituirem materia propria da especialidade da repartição.

Não nos entreguemos a illusões, não liguemos importancia demasiada aos maus precedentes, nem confiemos de mais n'estas marchas de flanco.

Se o facto das bases terem sido apresentadas ao conselho de ministros é ponto claro, queria eu que publicada a reforma se esperasse pelo voto parlamentar e pela opinião publica, e que o governo ouvisse a maioria das camaras. Sair um ministro, saírem dois, aberto o parlamento, sem que um acto do corpo legislativo o provoque, acho-o incrivel e de perigoso effeito no futuro.

Se o sr. visconde de Sá na defeza da reforma não alcançasse o apoio das camaras, devia então retirar-se do ministerio: era um acto natural e digno do seu caracter; mas antes!... Julgo precipitada a resolução e estranha a annuencia dos seus collegas. Devo acrescentar que, não sendo competente para entrar no merecimento da proposta do sr. visconde, comtudo ouvi a juizes habilitados que ha n'ella muitas providencias uteis a par de alguns lapsos desculpáveis em tão extenso e intrincado assumpto. Essa reforma, creio hoje, adoeceu menos pelo que tinha de mau do que pelo que tinha de bom. Assim se diz em muita parte.

Permitta o meu illustre amigo, o sr. ministro da marinha, o observar-lhe que desde que foi promulgada a lei de 1855 é lei do estado, e por mais contradictorios que fossem os seus auctores antes de a proporem, depois d'ella sanccionada essa invocação do passado de nenhum modo absolve as infracções d'ella; e se-lo-ía, e gravissima, a publicação do decreto da reforma, fundado em auctorisação amplíssima do corpo legislativo, sem o conselho de ministros tomar conhecimento d'ella, pelo menos das bases em que se firmava.

O que não julgo facil é conciliar as palavras do nobre visconde de Sá com as explicações do gabinete. Se o ex-ministro da guerra saíu do gabinete e os seus collegas ficaram, porque as bases da reforma não tinham sido apresentadas em conselho, como devemos explicar o equivoco? Executou-se ou não se executou a lei de 1855? Será bom sabermos isso.

Se as bases não foram conhecidas do conselho infringiu-se a lei que ordena que elle examine e approve todos os assumptos importantes, e nenhum o era de certo mais do que uma reforma filha de auctorisação legislativa concedida ao governo. Se não foram vistas deu-se por força voto de confiança ao ministro da guerra, e dado elle os seus collegas obrigaram-se como se tivessem discutido e approvado. O que significa pois a proposta do sr. ministro da guerra actual, pedindo não só a suspensão, mas a annullação da reforma? Annullação das proprias bases que se aceitaram!... Seria mais natural que o governo encarregasse o novo ministro da guerra de exprimir o seu pensamento, conservando o que o conselho de ministros entendia dever adoptar-se, e modificando o resto. Mas trancar e annullar tudo!... É quasi inexplicável, e pelo menos irregular.

Não me quero aqui valer da distincção feita pelo sr. ministro da marinha entre decretar e publicar a proposito da allusão feita á reforma no discurso da corôa; não merece perder-se tempo aqui com essa questão de maior ou menor rigor na propriedade dos vocábulos. A idéa é que importa e essa lá está. O governo citou e especificou a organisação do exercito. Que o fizesse sem a ver e sem a conhecer, quando a lei lhe ordena o contrario é que não sei conciliar com o alto conceito que fórma da capacidade de ss. ex.ªs

Não quero azedar o debate nem desejo dar-lhe maiores proporções do que deve ter hoje; porém a todos os precedentes citados pelo sr. ministro da marinha, sobre o modo por que alguns secretários d'estado saíram dos gabinetes, eu podia juntar outros recentes e nada edificativos. Limitar-me-hei a observar que este ministerio não é a primeira vez que se recompõe, e que por isso mesmo deve ser circumspecto e melindroso no modo por que o faz. Não é bom costumar o paiz a suppor a responsabilidade uma ficção risonha.

Os precedentes maus não se invocam nem se imitam, porque não fundam principios, e desde que existe uma lei, e que ella firmou os preceitos da solidariedade ministerial, ella, e não os precedentes, é que rege (apoiados).

Acerca da responsabilidade do gabinete não venho inventar principios novos, nem estabelecer doutrinas suspeitas. O que disse acha-se nas paginas de qualquer livro elementar de direito publico. O que conclui é que desejo muito e todos de certo desejam o mesmo, que se explique o equivoco d'esta situação. Nenhum ministro é obrigado a aceitar as idéas do seu collega ou do seu antecessor, mas tambem nenhum ministerio é obrigado a sacrificar ás situações o decoro e a lealdade dos principios, que estão muito acima dos homens e dos interesses fugitivos da occasião.

Em tudo isto o que me preoccupa é a verdade dos principios, é a doutrina da solidariedade. Salva ella, explicada ella de um modo orthodoxo e constitucional, fico satisfeito.

Estou alguma cousa fatigado e por isso não alargarei mais estas reflexões, desejo que o nobre ministro pela benevolencia que tem para comigo, e pelo respeito que lhe tributo, me esclareça. Como é que nas primeiras explicações dadas sobre este assumpto se observou que o sr. visconde de Sá não apresentára ao conselho de ministros as bases da reforma, e agora se vê que só lhe não deu conhecimento dos detalhes? Eis o primeiro ponto. O segundo é senão tendo o conselho examinado a reforma, e ignorando as suas bases, foi cumprida a lei de 23 de junho de 1855, e podia como acto de gabinete ser citada no discurso da corôa a organisação do exercito? Mais ainda. Houve depois algum debate no conselho de ministros sobre as bases da reforma que justificasse a saída extemporanea do sr. visconde de Sá? Creio que nenhum d'estes pontos encerra segredo distado, e que poderemos saber se o nobre visconde ficou em minoria, ou se os seus collegas se conservaram, e elle se retirou, tendo todos concordado em lhe dar voto de confiança para executar a auctorisação relativa á reforma do exercito, unico modo de conciliar o facto com a lei de 23 de junho de 1855.

O sr. Ministro da Marinha: — Notou que as explicações do sr. visconde de Sá condiziam completamente com o que o governo tinha dito. S. ex.ª tinha apresentado as bases da reforma, que eram as mesmas pelas quaes saíu a lei que auctorisou a reforma militar; mas não apresentou os detalhes, isto é, a propria reforma.

Fazendo variadas considerações para mostrar que não havia causa que podesse auctorisar uma crise, lembrou o aphorismo de Benjamin Constant, que é perigoso fazer artificialmente questões que o não são essencialmente; e passou a mostrar como este assumpto estava n'esse caso.

O sr. Presidente: — Estão ainda inscriptos para antes da ordem do dia alguns dignos pares, e eu vou dar-lhes a palavra pela ordem em que os inscrevi; o primeiro é o digno par o sr. Eugenio de Almeida.

O sr. Eugenio de Almeida: — E para mandar para a mesa um requerimento pedindo alguns esclarecimentos ao governo.