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tem preenchido o seu fim, gastam tres e quatro dias de viagem, e rara é a viagem em que não haja algum accidente. O Algarve tambem paga como as outras provincias 15 por cento para vias de communicação, e não as tem, e por tanto tenho pesar de me affastar da opinião do meu digno collega o Sr. Conselheiro Ferrão, mas não posso votar pelo seu adiamento.

O Sr. Ferrão — Sr. Presidente, existem para serem discutidos, outros projectos que envolvem augmento de futura despeza, e outros poderão ser, e de certo serão, apresentados da mesma natureza; e de todos deve resultar um encargo sobre que devemos sériamente reflectir.

Não posso negar-lhes o meu voto, demonstrada a sua necessidade ou utilidade. Mas o que eu sustento em principio, é que não convem votar uma despeza nova, sem previamente examinarmos, se temos na receita publica, margem para satisfazer, e se não tendo essa margem, devemos dar a preferencia a encargos mais urgentes, e aos legalmente existentes, que são de direito constituidos, quaes os que respeitam ao serviço do Estado e ao credito publico. Não me demove não ser grande a importancia mensal, de que se tracta. Nem eu a considero insignificante, porque destas e outras similhantes e que resultam as grandes despezas; assim como temos tambem insignificancias de receita que sommadas ellas nos dão uma importante receita. Intendo que na presença dos principios nem o Governo, nem a Camara deve attender á quantidade da despeza, se é grande ou pequena; para mim será muito grande, para a nação será pequena: mas em relação ao principio de que se não deve dispender extraordinariamente, ou addicionar outras despezas, quando ha algumas que se não podem preterir, e que e necessario satisfazer; digo eu, que será mais conveniente que este e outros projectos similhantes, que possam vir a esta Camara, não se discutam senão na presença do orçamento; porque votadas desde já essas despezas ficam sendo novos encargos do Estado.

Todavia não insisto na minha proposta, e fiz esta moção unicamente para cumprir com o meu dever.

O Sr. Visconde de Castro — Sr. Presidente, eu confesso que não partilho os receios do Digno Par. Sei muito bem que estamos em difficuldades financeiras, mas tambem sei que se nós aqui annullarmos todos os projectos, que tendem a desenvolver a nossa receita, nunca poderemos fazer cousa alguma (apoiados). Pois é justamente para que hajam meios, que nós devemos facilitar a nossa communicação com o Algarve, que pelo seu pescado, principalmente o do atum, pela exportação do álcool de uma das suas ricas producções vegetaes, e por muitas outras industrias que todos conhecemos, é hoje uma das nossas provincias de grande importancia, e necessita de uma communicação continua com os outros pontos do reino; e então não sei como havemos adiar um projecto que tende a dar-lhe meios para o seu maior desenvolvimento e prosperidade (apoiados).

Eu, realmente, tambem intendo que é cousa difficil fazer face ao deficit, e neste ponto partilho as idéas do Digno Par; mas não vejo que esta quantia de nove contos de réis, em relação á verba total das nossas despezas possa alterar sensivelmente as circumstancias do orçamento. Se a Camara intender que deve adiar este projecto, não terei remedio senão submetter-me, mas eu declaro que propugno por uma medida, que e de absoluta necessidade. Já aqui vieram outros projectos da mesma natureza para operações mais largas. Veiu aqui um projecto para subsidiar uma linha de vapôres para os Açôres e Africa, e para esta empreza tinha-se destinado sessenta contos de réis annuaes, mas infelizmente essa despeza não se fez porque a empreza se não póde organisar. Se por tanto aquella empreza em grande não teve logar, porque não havemos admittir esta em ponto mais pequeno, e que tanto cabe dentro daquella cifra, quando estamos vendo, e ninguem se atreve a negar, as vantagens que daqui devem resultar estabelecendo-se o ponto capital de concorrencia no maior numero de viagens? Na minha consciencia intendo que devo votar por este projecto, e digo mais que propostas desta natureza, devem ser sempre acolhidas pela Camara com a melhor boa vontade, para que todas as provincias reconheçam que nos occupamos dos seus interesses com igualdade, por isso mesmo que todas ellas pagam para o Thesouro o addicional de 15 por cento -para o desenvolvimento das suas communicações. Achando-se o Algarve tão atrasado em materia de estradas, não sei como nos poderemos justificar de lhe haver negado este unico meio de podér estabelecer uma boa e segura carreira de barcos de vapôr.

O Sr. Ministro das Obras Publicas — Sobre a proposta de adiamento não tenho eu nada que dizer; mas se se tractasse da materia do projecto, parece-me que me não faltariam razões para a defender, se por acaso fosse impugnada; no entanto como é sómente do adiamento que agora se tracta, e não do projecto, não tenho que dizer. Se o adiamento não fôr admittido, então pedirei a palavra, a fim de apresentar as considerações que entendo devem levar a Camara a approvar este projecto.

O Sr. Ferrão — Eu declaro que para impugnar o projecto não tenho razões algumas, antes ao contrario tenho-as para o approvar; e nem posso deixar de concordar com o Digno Par o Sr. Visconde de Castro, quando disse que os povos do Algarve, pagando ha tanto tempo 15 por cento para estradas, e não tendo até hoje nem uma unica estrada, ou communicação que os ponha em contacto com as outras provincias do paiz, tinham todo o direito a que ao menos se ajudasse uma companhia particular a estabelecer communicações aquáticas, que promovessem o desenvolvimento da riqueza daquelle paiz; estas idéas realmente são acceitaveis, servindo-me das proprias expressões do Digno Par, ninguem duvida dellas; mas eu o que desejara é que este projecto ficasse adiado até que o Governo na discussão do orçamento nos fizesse vêr quaes eram as receitas com que conta para fazer face a estas, e a outras despezas que se propõem, e que eu por ora não sei donde hão de vir os meios.

Mas como o Sr. Ministro das Obras Publicas entende que a approvação deste projecto não creará embaraços alguns ás finanças do Estado, faz-me isto presumir que o estado dessas finanças não poderá talvez ser encarado sob um aspecto tão desfavoravel, como aquelle que eu julgava existia, e neste caso não terei duvida de retirar a minha proposta de adiamento, se a Camara m'o permittir.

O Sr. Conde de Thomar — As razões apresentadas pelo Digno Par o Sr. Visconde de Castro colhem completamente; se por ventura forem seguidas da declaração do Sr. Ministro das Obras Publicas — de que esta será a unica somma de despeza extraordinaria que a Camara vote, sem que saiba qual é a verba da receita que lhe ha de fazer face; mas se aquellas razões não forem seguidas desta declaração, então póde-se ficar entendendo que hoje vota-se esta somma de despeza, ámanhã outra, e assim successivamente outras muitas, caminhando a passos largos para a completa desorganisação da fazenda publica!

O argumento do Digno Par o Sr. Visconde de Castro, de que esta verba de 9:600$000 réis, applicada em beneficio do Algarve, é de justiça, e não passa, para assim dizer, de uma gota de agoa lançada no immenso lago de um orçamento de 12.000:000$000 réis, entende o orador que não póde colher, porque se o Algarve deve ter este subsidio, as outras provincias não teem menos direito a que se faça alguma cousa em seu beneficio: não é sómente o Algarve que não tem estradas, este mal sente-o quasi todo o paiz, e vê-se em todas as provincias; pois que estradas ha na provincia da Beira Alta? Nenhumas! Alli não se póde andar um quarto de legoa, sem se correr o perigo de quebrar a cabeça a cada passo; o Sr. Visconde da Luz, aqui presente, póde informar se não é verdadeiro o estado em que o orador mostra a provincia da Beira Alta?...

E que se não diga que a despeza que se vai fazer é muito insignificante, porque não é tanto assim; pois, além de se ir despender annualmente a quantia de 9:600$000 réis, para haver apenas duas carreiras a barcos a vapôr entre o Algarve e a capital, ainda se dá a essa companhia, que se formar para fazer a navegação, a vantagem de ter os seus barcos, e as materias primas destinadas ao concerto dos mesmos, livres de direitos, de modo que cada viagem que se fizer importará ao Governo muito mais de 400$000 réis, e isto não é possivel conceder-se, quando de mais a mais não se sabe d'onde ha de saír a receita, e não se ignorando qual é o máo estado das nossas finanças. Portanto, se o Sr. Ministro das Obras Publicas não declarar, que outra despeza não será votada extraordinariamente, sem que se apresente logo a verba da receita que a deve satisfazer, o Sr. Conde não póde votar por este projecto de lei.

O Sr. Ministro das Obras Publicas diz que a despeza neste projecto proposta nenhum embaraço traz ás finanças do Estado, e que tão longe está de ir aggravar a situação do Governo, que até lhe será de beneficio, collocando-o em melhor posição.

Que no orçamento para o anno economico que ainda está correndo, votaram-se 58:000$000 réis para a companhia que havia de fazer a navegação a vapôr entre Portugal e as nossas possessões da Africa, e 11:000$000 réis para a companhia que havia de fazer igual navegação entre este paiz e as ilhas dos Açôres, isto é, uma despeza de réis 69:000$000, que a final não se despendeu, porque as companhias se não formaram. Por este projecto apenas se despendem 9:600$000 réis, resultando assim uma grande economia, posto que bem triste economia. Pediu á Camara que advertisse, que esta quantia de 9:600$000 réis é o maximo que se fixa, e o Governo quando houver de contractar ha de empregar todos os meios ao seu alcance para obter as maiores vantagens possiveis, além de que este subsidio não é permanente, mas por um prazo muito limitado.

O Sr. Ferrão — Peço licença para retirar a minha proposta de adiamento.

O Sr. Presidente — O Digno Par pede licença para retirar a sua proposta de adiamento: convem a Camara? (Signaes de assentimento).

Sendo retirada a proposta:

O Sr. Marquez de Ficalho disse que não se levantava para combater o projecto, mas unicamente para fazer algumas reflexões.

Se esta somma que se propõe é para effectivamente pôr em contínua communicação os povos do Algarve com o resto do littoral, o subsidio não é grande ainda que só se façam as duas viagens mensaes; mas se a companhia que se formar se limitar a levar meia duzia de passageiros, não servindo de desenvolvimento algum á industria e riqueza do Algarve, e fazendo a sua navegação como a tem feito essa companhia que tem apparecido para navegar a vapôr entre a capital e os portos do Algarve, ou como está acontecendo com a navegação a vapôr no Téjo, então o subsidio é muito elevado, e o Estado não deve pagar tão caro uma cousa de quasi nenhuma utilidade.

O orador quiz aproveitar a occasião para dizer que se deve attender sempre, e em primeiro logar, ás necessidades mais urgentes, applicando os fundos de modo que melhores resultados dêem ao paiz; se houver de applicar-se um fundo, e estiverem dois pontos que desse fundo necessitem, por exemplo, o ponto A e o ponto li, se o A fôr esteril, ou de pouco producção, em quanto o B é fertil e de uma grande riqueza, deve-se a este applicar o fundo com preferencia, para delle se tirarem as vantagens que promette, em quanto que do outro pouco ou nada haveria a esperar.

Uma das grandes habilidades em administração está na melhor applicação dos fundos destinados aos melhoramentos do paiz, e por isso e

que o anno passado se oppoz o orador ao modo pelo qual se propunha a repartição dos fundos applicados ás obras publicas, porque está persuadido que se quizerem continuar no errado systema de cada terra ou cada aldea ter a sua obra, póde-se já ter a certeza de que se hão de gastar consideraveis sommas, não só inutil senão até prejudicialmente.

Não tinha nada mais a dizer, porque eram apenas estas poucas reflexões que elle queria expender»

Posto a votos o parecer, foi approvado na generalidade, e na especialidade tambem, sem discussão; bem como a mesma redacção.

Entrou em discussão o parecer n.º 87.

Foi presente á commissão de fazenda o projecto de lei n.º 94, vindo da Camara dos Srs. Deputados, tendo por fim auctorisar o Governo a pagar a importancia do deficit liquidado da administração do Real Theatro de S. Carlos na época finda de 1856 a 1857; e a commissão, de accôrdo com a opinião manifestada na Camara dos Srs. Deputados pela sua commissão de fazenda, sobre a conveniencia de se prohibir ao Governo para o futuro a administração de qualquer theatro, e assim se evitarem, além de outros, os inconvenientes de se realisarem despezas, embora extraordinarias e aproveitaveis para as épocas subsequentes, para que o Governo não tinha auctorisação legal; attendendo todavia a que o Governo foi implicitamente relevado na Camara dos Srs. Deputados, por isso que foi por ella approvado esse excesso de despeza, tomando por ventura em consideração os objectos de necessidade em que teve logar; attendendo a que sendo forçoso pagar a quem ficou devendo, por virtude de contractos, fornecimentos ou serviços prestados, consentidos ou ordenados por conta do Estado, é de rigorosa justiça que se preencha o referido deficit; attendendo em fim a que, segundo a emenda feita á proposta originaria do Governo na Camara dos Srs. Deputados, as Côrtes teem de tomar contas circumstanciadamente ao Governo sobre a applicação das sommas por elle recebidas e dispendidas, e assim habilitar-se a providenciar de modo que se concilie o melhor desempenho do serviço dos theatros com o menor subsidio dos dinheiros do Thesouro; é de parecer que o dito projecto de lei deve ser approvado por esta Camara, a fim de que possa subir á Sancção Real.

Sala da commissão, 11 de Julho de 1857. = Visconde de Castro = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Visconde d'Algés — Conde d' Arrochella.

PROJECTO DE LEI N.° 94.

Artigo 1.° É o Governo auctorisado a pagar a quantia de 19:762|,064 réis, importancia do deficit liquidado da administração do Real Theatro de S. Carlos na época finda de 1856 a 1857.

Art. 2.° O Governo dará conta ás Côrtes das quantias recebidas para o mesmo theatro e da sua applicação.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 10 de Julho de 1857. = Joaquim Filippe de Soure, Presidente == Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario.

O Sr. Conde de Thomar acaba de ser votado um projecto de lei, auctorisando o Governo a podér dar o subsidio de 9:600$000 rs. a uma empreza que se considera ser de grande utilidade; as razões em que se fundaram os oradores que sustentaram o projecto foram especialmente as da vantagem da exportação das ricas producções do Algarve, e da falta de estradas, e regulares communicações com aquella provincia: razões que não deixaram do produzir o seu devido effeito naquelles que julgaram mais a proposito que o mesmo projecto ficasse adiado até se saber quaes são as circumstancias financeiras do paiz. Agora tracta-se de auctorisar outra despeza; mas uma despeza já feita illegalmente, sem consideração alguma á Lei estabelecida a tal respeito. Despeza que o Governo não justifica de modo algum perante o Corpo Legislativo. Realmente seria curioso, observa o orador, ouvir os argumentos para demonstrar que os dinheiros publicos devem estar á disposição do Governo para os gastar como entender sem a auctorisação das Côrtes.

Disse que deveria começar por pedir que o Governo remettesse a esta Camara o Decreto ou Portaria que auctorisou a despeza a mais de perto de vinte contos de réis para o Theatro de S. Carlos na época de 1856 a 1857: deveria pedir a conta desta despeza, e uma relação dos objectos em que ella se fez, para ao menos se verificar se foi feita por bem da causa publica ou que fim se teve em vista; pois que a nação não deve ficar sem saber a razão porque, em quanto se pede ao Corpo Legislativo que vote o subsidio de 20 contos de réis annuaes para o Theatro de S. Carlos, depois se gastam 40 contos! (Apoiados.) isto é um engano, uma completa decepção. Se o Governo se apresentasse a pedir que em vez de se lhe votarem 20 contos se votassem 40 para subsidio sómente do Theatro de S. Carlos, não haveria representante algum da Nação que votasse similhante augmento (apoiados). E comtudo o que se fez é muito peior, porque augmenta-se a despeza, gasta-se o dobro do que se devia gastar, e engana-se a Nação, votando-se uma quantia que depois ha de por tal fórma ser excedida! Isto não póde tolerar-se que continue mais (muitos apoiados).

O Governo não tinha Lei alguma que lhe permittisse auctorisar tal excesso de despeza; e entretanto veio sem difficuldade nenhuma dizer ao Corpo Legislativo, que a despeza do Theatro de S. Carlos na época de 1856 a 1857 custou a mais dezenove contos e tanto, perto de vinte contos; e que as Côrtes devem auctorisar e sanccionar um similhante facto! E porque? Quem mandou gastar tal quantia? Quem é que tinha auctorisado esta despeza? Onde estão os motivos que mostrem que o bem da causa publica exigia que se fizesse a mais aquella despeza? Como é que se mostra essa conta, e se dá a relação dos objectos com que se despendeu esta grossa quantia? Como é que se não julga necessario vir primeiramente pedir um bill de indemnidade? Não sabe o orador se isto é com o actual Governo, ou com o passado, ultimo antecessor deste; vê sómente a entidade moral governo, sem querer saber que nome proprio o exercia; mas sente vêr assignado no projecto em que se pedem estas sommas o seu antigo collega e amigo o Sr. Avila, que tem mostrado em todas as épocas a maior repugnancia a que se gaste a mais insignificante quantia, uma vez que exceda a verba votada no orçamento pelas Côrtes.

E como é que se quer justificar e absolver o Governo? Dizendo-se no parecer da commissão da outra Camara, e no da commissão desta, que se vota e auctorisa este augmento prohibindo ao Governo o continuar a ter por administração o theatro de S. Carlos (apoiados). É a condição que se põe; mas o que é que aconteceu este anno? Lá. está por administração o theatro! De modo que, se então o theatro custou ao Governo vinte contos a mais do que devia custar, estando sempre muito concorrido como esteve: o que acontecerá agora, que nos primeiros mezes desta época esteve completamente abandonado em consequencia do terrivel flagello que acabamos de soffrer! Conte pois o Governo com uma despeza ainda superior á antecedente; e de futuro não sabe o orador o que será, porque com quanto se tenha estabelecido, que deve acabar o systema de andar o theatro por administração do Estado, se se ter o programma offerecido ás emprezas que delle queiram tomar conta, acham-se condições que tornam impossivel a acceitação. Bastará considerar o artigo em que se diz, que a empreza que tomar o theatro de S. Carlos apresentará previamente uma lista triplice dos nomes dos primeiros cantores que houverem de ser escolhidos. É possivel que algum cantor de primeira ordem queira sujeitar-se a ser inscripto n'uma lista, que ha de vir a Lisboa, para esperar saber se fica acceito, ou se é recusado?! Quem não sabe que o engajamento de um primeiro cantor é muitas vezes negocio de poucos minutos? (Apoiados.) Pois um similhante artigo, tornando inadmissivel o programma, não tende a tornar perpetua ao Governo a administração do theatro de S. Carlos? De certo (apoiados); e por consequencia a nação terá de concorrer não só com vinte contos, mas com quarenta, ou ainda mais, conforme o que está acontecendo.

E ha-de-se deixar passar este projecto pela simples razão que nos dá o parecer? O orador respeita muito os membros da illustre commissão, está convencido de que deram esta opinião sómente para se desembaraçarem deste projecto nos ultimos dias da sessão passada; mas tambem se persuade de que se tivessem reflectido bem sobre o contheudo do mesmo projecto, reconheceriam que se estabelecia aqui um precedente terrivel, qual o de reconhecer o Parlamento que se devem pagar todas as dividas que façam os administradores da fazenda nacional, uma vez que elles digam que as fizeram em nome do Governo. É o caso de que se tracta. Diz-se que, sendo isto feito por conta do Estado, não ha remedio senão pagar. E onde está a Lei que auctorisou a fazer tal despeza por conta do Estado? Onde está o acto ministerial, Decreto ou Portaria, que auctorisou esta despeza? Se existem os Ministros que referendaram esse Decreto ou Portaria, são elles responsaveis para com a nação de terem violado a Lei, e terem (permitta-se-lhe a expressão, que não é pessoalmente offensiva) delapidado a fazenda publica, pois foram applicar para fins que a Lei não reconhecia, a receita que era votada para outros objectos.

Quem assegura a Camara de que, passado o precedente, o administrador das maltas do reino não faz ámanhã a despeza de cincoenta contos por meio de um contracto em nome do Governo? E como a despeza esteja feita, e o fosse em nome do Governo, o Parlamento, depois de ter votado, este projecto de lei, não póde deixar de votar tambem essa despeza, porque o precedente fica estabelecido. Não é possivel tal admittir, mesmo que se diga que se vota com a condição de que a administração do theatro não continuará a andar por conta do Estado, pois, como já mostrou, bem longe de se ter evitado isso, continuam as cousas do mesmo modo. publicando-se um programma que torna impossivel a administração do theatro por differente fórma (muitos apoiados).

O orador não póde, como membro desta Camara, e representante dos direitos dos contribuintes, deixar de protestar contra esta despeza illegal, contra esta illusão, contra esta completa decepção. Ao menos quer que se entenda que com quanto julgue que o theatro de S. Carlos é uma cousa indispensavel em Lisboa, e está prompto a votar o subsidio indispensavel para elle existir, por isso que entende que é um meio de civilisação, e ao mesmo tempo os offerece de subsistencia a centenares de pessoas (apoiados), comtudo não póde querer que a despeza seja tal, que vá lançar um grande encargo sobre a nação (apoiados), encargo incompativel com as nossas circumstancias e com a satisfação de outras necessidades a que é tanto ou mais preciso que se não deixe de occorrer (apoiados), e sobre tudo não póde já mais querer que se peçam 20 contos para depois se gastarem 40. (O Sr. Ferrão — Peço a palavra.)

Disse que estimaria muito que o Digno Par o Sr. Ferrão possa justificar, na presença da lei e dos principios, o abono destas sommas, pois a circumstancia de se dizer, como se diz, que se acha involvida n'este negocio uma pessoa muito respeitavel por todos os titulos (apoiados), e que o orador nos seus negocios particulares teria desejos de servir como seu venerador e amigo, nada disso póde influir dentro desta Casa quando se tracta dos dinheiros publicos (O Sr. Brito do Rio apoiado, apoiado). Quando se tracta dos dinheiros publicos ha outras razões, e é necessario effectivamente que o Governo justifique a razão porque vem pedir esta exorbitante somma, dispendida illegalmente sem prévia auctorisação da Parlamento.